[title]
Estamos de frente para o Jardim Constantino, num dos recantos mais pacatos da freguesia. Depois de anos fechada, a porta número 116B está novamente aberta. Lá dentro, espera-nos uma pequena recepção, civilizada e silenciosa. A partir daí, é descer quase a pique um sem número de degraus – três andares para debaixo da terra, segundo ouvimos dizer. À medida que descemos, sentimos a música aproximar-se. Chegámos à sala, uma espécie de mezzanine com vários níveis que converge para um único ponto – uma pista, onde os olhares de quem assiste estão sobre as cabeças de quem dança.
A configuração do espaço é, no mínimo, especial. Um tesouro enterrado no subsolo lisboeta que a empresária Vanessa Cotrim encontrou e não quis largar. "Este espaço tem história", exclama a proprietária. "Já foi muitas coisas. Ouvi dizer que abrigou o primeiro after de Lisboa, nos anos 80, e também já foi um bar de striptease", continua. Estamos no antigo Passerelle 2, estabelecimento encerrado há mais de uma década. À chegada, Vanessa soprou o pó, pintou as paredes de preto e posicionou a luz estrategicamente. Chamou-lhe Noir Désir, o sítio que abre à noite, mas apartado da movida lisboeta.

"Sempre imaginei um lugar onde a noite pudesse respirar com calma, sem pressa de acabar. Fugir do centro foi intencional. Quisemos criar um refúgio. Lisboa vibra, dança, explode. Isso é bonito, mas também há beleza no silêncio, nas ruas menos percorridas. O Noir Désir quis ocupar esse lugar entre o visível e o escondido. E quem nos visita não vem por acaso, vem por desejo. E isso faz toda a diferença", explica. As noites funcionam através de guestlist até à uma da manhã (noir@noirdesir.pt). A partir dessa hora, são cobrados 12€ por pessoa, com uma bebida incluída.
Vanessa Cotrim está longe de ser uma estreante nestas andanças. Criou a Lesboa Party, as festas voltadas para o público gay e lésbico que arrancaram em 2006 e revolucionaram a noite lisboeta. O conceito acabaria por embarcar no Tejo na sua versão Lesboat. Em 2016, abriu o primeiro espaço. A Alfaiataria começou por ser ali entre Santos e a Lapa e mudou-se mais tarde para o Cais do Sodré, onde acabaria por fechar portas. Sem margem para falsas modéstias, a empresária assume a vocação para criar espaços do zero, sempre no contexto da noite. "Nasci com o dom de criar conceitos – uns compreendidos, outros nem tanto –, eventos que juntavam música e performance, além de transformar espaços comuns em lugares mágicos", recorda.

Vanessa recusa os rótulos que habitualmente categorizam a noite. Diz que, tal como a noite que quer construir, também o público é "diverso, surpreendente e cheio de nuances". Por vezes, é a própria a assumir o controlo da pista. Outras noites, há concertos, DJs convidados, performances e eventos que contribuem para dar visibilidade ao espaço. Em Maio, o Noir Désir será o bar oficial do IndieLisboa. "Neste primeiros meses temos observado e sentido o que o público pede e ajustado o ritmo." Fala numa comunidade de clientes habituais, atraídos pelo ambiente underground, pelos cocktails ou vinhos e pela proposta musical que pode oscilar entre a pop e a electrónica, sem remorsos.
Expandir o Noir Désir é uma desejo que já existe. Não através da abertura de outro espaço mas através de inovações na programação e até mesmo criando "momentos fora de portas". "Acredito que pode tornar-se num ponto fundamental da noite lisboeta, mas há nossa maneira. Não pelo barulho, mas pela consistência."
Rua Passos Manuel, 116B (Arroios). Sex-Sáb 23.00-04.00. Entrada livre (guestlist até à 01.00)/12€
🪖 Este é o nosso Império Romano: siga-nos no TikTok
📻 Antigamente é que era bom? Siga-nos no Facebook