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Neste mercado não se compram batatas, trocam-se ideias para o futuro

O ‘Mercado das Madrugadas’ serve para debater a liberdade, os males no mundo e um amanhã melhor. A peça ocupa o Largo de São Domingos até domingo. A entrada é livre.

Beatriz Magalhães
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Beatriz Magalhães
Jornalista
Mercado das Madrugadas
ALIPIO PADILHAMercado das Madrugadas
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Fechado, rodeado de andaimes e coberto de pó, o Teatro Nacional Dona Maria II continua em obras e o palco ainda não está pronto para receber nenhuma peça. Ali ao lado, no meio da rua, holofotes não os há, mas também dá para montar uma sala de espectáculos. A partir desta quinta-feira, o Largo de São Domingos passa a ser centro de um Mercado das Madrugadas. Patrícia Portela procura criar um diálogo acerca da mudança e de como poderá ser o amanhã. Melhor, espera ela. A entrada é livre e todos são bem-vindos a juntar-se à festa. 

As luzes já estão acesas e as bancas amarelas montadas. É quarta-feira, o dia anterior à estreia. Passa um pouco das cinco da tarde, o sol ainda está quente e no meio do largo há ensaios a decorrer. Apesar do estaminé que ocupa este espaço, quem por ali passa não faz grande caso do que está a acontecer. A falar ao telemóvel, com sacos de compras nas mãos, os transeuntes atravessam o mercado e seguem a sua vida. Alguns chegam a parar, com olhares curiosos, a tentar perceber o que está diferente, o que mudou neste largo. E é exactamente da ideia do que mudou e do que ainda pode vir a mudar que surge a obra.

Mercado das Madrugadas
ALIPIO PADILHAMercado das Madrugadas

“No fundo, este projecto cresceu dessa minha vontade de perceber o que é que se acciona no corpo, como é que o corpo tem de estar para ter vontade de mudar. Acho que uma das coisas mais graves da nossa vida, actualmente, é que parece que nos tiraram aqui uma energia vital qualquer. Portanto, há uma certa sensação de impotência que é castradora e paralisante e eu queria perceber como é que isso se activa”, explica Patrícia Portela, que assina o texto e encenação da peça. 

Para reflectir e discutir estas temáticas, foi na praça que a encenadora encontrou o lugar ideal. “Não damos fórmulas de coisas que deviam ser para o futuro, mas promovemos. O mercado é isso, a praça é isso. Promovemos um encontro na praça entre pessoas de todos os géneros, de todas as classes, de todas as profissões, para estarem juntas a conversar, a trocar ideias, a trocar histórias e a trocar desejos para o futuro.” É talvez a única diferença que se vai encontrar entre este mercado e outro qualquer, é que não há nada à venda. Nem fruta, nem legumes, nem flores. Antes, este mercado ambulante, este “sítio que é de todos”, faz-se das pessoas e de um convite a celebrar a liberdade, a protestar contra tudo e a agir.

Mercado das Madrugadas
ALIPIO PADILHAMercado das Madrugadas

Da vida que abarca o Largo de São Domingos, o espectáculo também ganha uma dimensão e uma dinâmica próprias. A movimentação de várias gentes é constante e há quem também goste de ocupar um banco e estar lá um bocado, enquanto espera por algo ou alguém. E também muito já lá aconteceu, desde “bruxas” queimadas a judeus mortos. Séculos, décadas e anos passados, este largo continua aqui, mas conta novas histórias. Hoje, o Largo de São Domingos é um ponto de encontro e é essa ideia que o Mercado das Madrugadas quer reforçar. “Podes fuzilar numa praça, podes decapitar numa praça, podes coroar um rei, podes matar uma bruxa, mas também podes fazer a revolução, também podes encontrar um amigo, também podes descobrir uma coisa nova, também podes descansar. É isso, recuperar a ideia de nós irmos para a praça”, sublinha a encenadora.

Mercado das Madrugadas
ALIPIO PADILHAMercado das Madrugadas

Além de um elenco de actores, ao qual se juntam os espectadores, conta-se com a presença de um conjunto de coros – o Coro Menor, o Coro da Câmara de Cascais, o Coro Relâmpago de Aveiro e o Coro Gemas d’Aveiro –, que também contribui para o carácter híbrido patente nesta criação. “É uma nova forma de teatro de rua”, que é tanto de teatro como de conversa, como de dança, e que promove "o encontro entre o espectador habitual de uma casa como o Teatro Nacional e o espectador de rua que costuma passar ali e o espectador que, se calhar, nunca iria a um espectáculo dentro de um edifício como aquele porque não sente que aquele espaço é para ele." O Mercado das Madrugadas é um pouco de tudo, feito um pouco por todos, e quer passar uma mensagem clara, que se ouça para lá deste lugar onde agora se instala.

Largo de São Domingos. 9-12 Mai. Qui-Dom 20.00. Entrada livre

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