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Não há ameaças de expulsão ou outro tipo de pressões a que já nos habituámos, infelizmente, a acompanhar, apesar de a renda ter também subido. O que há é um novo bairro, uma nova dinâmica. Entre tantas novidades, Miguel Reino quer lembrar-nos que há clássicos que se mantêm, em tempos cada vez mais difíceis, como acontece com o seu Aqui Há Peixe, há 15 anos no coração do Chiado.
“O Chiado mudou muito. Aquele bairro emblemático que tinha lojas boas, restaurantes bons agora virou um centro comercial, como outro qualquer, mas ao ar livre”, diz-nos Miguel, depois de um almoço mais tranquilo do que desejava. Não é sempre assim, ainda são muitos os clientes habituais, talvez sejam menos os passantes. “Estamos em Lisboa desde 2009, quando foi aquela grande crise. Mas fomos fazendo a casa devagarinho, degrau a degrau. Tínhamos muitos portugueses, porque o Chiado ainda tinha muitas empresas e residentes. As pessoas vinham passear para o Chiado, mas foi mudando”, conta o proprietário e chef, irmão de Gigi, hoje na Quinta do Lago.
É, aliás, com Gigi que a história do Aqui Há Peixe começa, ainda na Comporta, na Praia do Pêgo. “É uma casa desde 1996, já são 27 anos. É uma grande história”, afirma Miguel, que já antes teve outros negócios na restauração. “Temos clientela desde os primeiros projectos, até mesmo desde o Brasil, onde começámos o negócio”, contextualiza.
No Chiado, entre o Largo do Carmo e o Largo Rafael Bordalo Pinheiro, o restaurante dedicado ao peixe e ao marisco foi fazendo o seu caminho com pratos emblemáticos, e que se mantêm na carta, como a picanha de tamboril (28€), o arroz negro de choco (22€) ou os carabineiros à Miguel (51€). “Tivemos um pico bom em 2013/2014, quando houve aquele boom do turismo. Aí, a clientela começou a misturar-se, até chegar o covid”, recorda. “Depois do covid, já se sabe, mudou tudo e o Chiado mudou muito”, reforça. “As empresas foram-se embora e eu acho que os portugueses vêm menos devido ao trânsito caótico. Tem que haver aqui um certo ordenamento, senão o português deixa de vir”, lamenta o responsável. “Qualquer pessoa acaba por se afastar quando é complicado chegar ao lugar”, defende, enquanto garante não ter subido muito os preços, apesar de sofrer também com o aumento das rendas. “Renovámos o contrato este ano. Actualmente, é um grande esforço. Pela renda, pelos encargos do covid”, explica Miguel. “A matéria-prima aumentou e nós nem por isso aumentámos. Reduzimos a margem de lucro, não a margem de peso. Mantemos exactamente um robalo para dois entre as 800 gramas e o quilo. O pregado tem 1,2kg/1,1k para pessoa se sentir bem. Isso é o nosso lema há 40 anos: é para se sair satisfeito. O cliente sair com fome não dá”, afiança, sempre bem disposto, destacando também o prato do dia (17€), disponível ao almoço. “Hoje era um arroz de pampo. Ontem, foi arroz de lingueirão. Às vezes é massa, outras vezes é raia. É o que der o mercado”, revela.
E há uma longa lista de entradas que satisfaz também o desejo de uma refeição à volta de petiscos, das amêijoas à Bulhão Pato (21,50€), à salada de polvo au vinaigrette (15€), até às lulinhas salteadas com alhinho e coentros (15€). As sobremesas têm a mão de Mafalda Reino, a mulher com quem Miguel divide a gestão do restaurante (e a vida). Tanto há mousse de maracujá (9€) como encharcada de ovos (9€).
“Também abriu mais concorrência. Há mais restaurantes. Está mais diversificado. Agora, acho que restaurantes típicos também não há muitos. Começam a aparecer outras tendências e a gente quer-se manter fiel à tradição, que é o peixe do nosso mar. Queremos dar o genuíno”, argumenta, com a esperança de ainda assistir a uma nova transformação na zona. “Lisboa também é de épocas, de modas e de bairros. Quando estávamos com o restaurante de picanha nas Janelas Verdes, aquilo era uma loucura por causa da noite. Hoje, não tem ninguém”, aponta.
Mudar de morada já esteve em cima da mesa, mas Miguel ainda não está preparado para contar outra história. “Não quer dizer que tenhamos que ficar aqui, nada é eterno. Se tivermos de mudar, mudamos”, admite.
Rua da Trindade 18A (Chiado). 211 344 228. Ter-Sex 12.00-14.30/19.00-22.30, Sáb 19.00-22.30
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