[title]
“Chefs que gostam de má música não sabem cozinhar.” Quem o diz é o britânico Adam Purnell, que deixou Berlim este ano para abrir no Cais do Sodré um listening bar que garante ser “um restaurante a 100%”. A descrição pode ser confusa, mas de forma simples e resumida o Dhalia é o sítio aonde se vai para ouvir música, através de um sistema de som clássico e de alta qualidade, para beber um bom vinho natural e comer o que a época tem para oferecer. Daí que a importância dada à música seja tanta como aquela que é dada à comida.
A música não está lá como acessório, como meio para animar uma noite. É para ser ouvida, de fio a pavio, com os silêncios entre faixas e as pausas que a troca de discos impõe. Num listening bar, conceito institucionalizado no Japão desde os anos 1950, e que nos últimos anos se tem estendido ao resto do mundo – Lisboa inclusive –, os discos são cuidadosamente escolhidos de uma colecção que decora o espaço atrás do balcão. Aqui só entram vinis, não se fazem misturas, não se inventa. “É o oposto de uma discoteca, é mesmo para se apreciar a música do disco”, diz Adam, destacando a colecção de “soul, música brasileira, jazz, hip-hop clássico, disco, house”. E de cada vez que um vinil está a tocar, a capa é exposta, para que se saiba sempre o que se está a ouvir.
Na cozinha, as regras são menos apertadas e os limites são apenas impostos pela sazonalidade. “Tudo se resume à criatividade dos chefs”, aponta o gerente, que foi desafiado a mudar de vida pelos quatro sócios por trás do Dahlia: David Wolstencroft, Hamish Seears, Tiago Oudman e Harrison Iuliano.
“O David teve esta ideia há muito tempo, e visitou vários listening bars no Japão. Ele sabia que queria abrir um listening bar com vinhos naturais, mas depois ao falar com os outros sócios chegaram a esta ideia de restaurante”, conta Adam, relembrando que na primeira vinda a Lisboa no final do ano passado, quando Berlim vivia confinada, acabou por conhecê-los e ficar a par das suas ambições. “Na altura a ideia era muito simples, mas foi ficando cada vez maior e eu acabei a fazer um pouco de consultoria, a dar algumas ideias do lado operacional porque é o que faço há muitos anos”, explica, contando que depois de uma vida infeliz em Londres ligada à publicidade, decidiu deixar tudo e mudar-se para Berlim, onde entrou no mundo da restauração. Já regressado a Berlim, meses depois da passagem por Lisboa, foi desafiado a assumir a gestão do Dahlia. “Eu estava feliz em Berlim, ainda não tinha decidido, mas vim a Lisboa por uma semana e mudei logo de ideias”, diz.
Adam tinha como condição gostar do chef e da equipa. Queria ter uma palavra a dizer nessa escolha e assim aconteceu. À frente da cozinha está Vítor Oliveira, que já tinha dado nas vistas nas Damas, e Gabriel Rivera. “A vibe entre nós foi incrível, a criatividade é maravilhosa. Eles são tão apaixonados com tudo, não só com comida. Falam de música, arte”, diz Adam entusiasmado. “Depois encontrei-me com o Rony [Hernandez] e nessa altura eu sabia que não queria cocktails, porque é outro nível de esforço, é preciso mais staff, mas estive 20 minutos com esta pessoa, tão apaixonada por cocktails, que bastou fazer-me uma bebida e eu percebi que ia ter cocktails.”
E assim nascia o Dahlia, com uma esplanada que dá para cerca de 20 pessoas com outras tantas a poderem sentar-se no interior, de paredes rosa e sofás verdes.
Apesar do foco parecer estar na música e nos vinhos naturais, com uma carta com cerca de 30 referências (portuguesas e de países como França, Espanha, Itália ou até Nova Zelândia), a comida é preparada com todo o cuidado e técnica. “Todos os dias, os chefs vão ao mercado, temos fornecedores locais, usamos tudo o que é da época e o mais local possível”, garante Adam.
Na carta, há três entradas, quatro pratos de vegetais (todos disponíveis em opção vegan), quatro pratos de carne e peixe e duas sobremesas. “Não é uma lista gigante.” Até porque mudará conforme os ingredientes disponíveis na estação.
Por enquanto, pode começar pelas ostras fresquíssimas a saber a mar (5€, duas) e provar a couve-flor caramelizada com chimichurri e creme de amêndoas (7,5€) ou a beterraba curada, com laranja e vinagrete de pistachios (6,5€). Nos pratos de carne e peixe, dois para cada, encontra um camarão selado com chilli bisque e kimchi (10,5€), uma lula frita que acompanha com arroz frito com tinta de lula e aioli (13€), ou um frango frito com molho de sésamo picante (10€) e umas costeletas de borrego seladas, com cominhos e queijo caseiro (13,5€).
“O que nos uniu aqui foi a nossa paixão por vinhos, em específico por vinhos naturais”, conclui Adam, com esperança de que os dias cheios no Dahlia se tornem parte da banda sonora da cidade. “A zona é óptima, temos bons vizinhos, só queremos uma boa vibe.”
Travessa do Carvalho, 13. Ter-Sáb 18.30-23.00.
+ Curae recebe noite dedicada a plantas e cerveja artesanal
+ Leia, grátis, a edição digital da Time Out Portugal desta semana