[title]
A fachada em quadrículas douradas é a primeira coisa que chamará à atenção até o leitor mais distraído. Aproveite para matar logo a curiosidade espreitando pela janela aberta para a rua. Erik Ibrahim e Inês Santos, os donos, querem que o Terroir seja palco de experiências gastronómicas com preços acessíveis – a comida está a cargo de Miguel Vaz, chef que já pisou e comandou várias cozinhas, e tudo acompanha com um bom vinho nacional. Numa degustação completa, à carta ou em modo snack à janela.
“A transformação que houve em Portugal nos últimos anos em termos de hotelaria e restauração fez com que em nós crescesse o bichinho de tentar fazer algo”, conta Erik, que em conjunto com a mulher tirou o curso de hotelaria e esteve num management training na China. No regresso, a troika impediu-os de voltar à área e enveredaram por um campeonato completamente diferente, o da distribuição de medicamentos.
Mas não perderam a vontade de comer bem e partilhar experiências à mesa. Depois de muitas viagens pela Ásia, Oceânia e Europa, houve um conceito que lhes ficou na cabeça. “Cruzámo-nos com um restaurante em França que funcionava muito ao balcão. As pessoas comiam de pé, bebiam, partilhavam”, recorda. “Aqui o conceito inicial era o de partilha, de tapas criativas. Entretanto conhecemos o chef Miguel Vaz, que pelo seu background e tipo de comida fez com que houvesse uma evolução do conceito. Já não era tapas, mas sim uma coisa mais moderna”, explica.
O menu é agora algo em constante mudança, consoante a sazonalidade dos ingredientes – ainda que a pandemia tenha mudado muito o mercado e “aquela facilidade de ligar de manhã para nos entregarem um ingrediente à tarde já não seja bem assim”, reflecte Miguel Vaz, o chef que passou pelo Lapa Palace, 100 Maneiras em Cascais, Fortaleza do Guincho, Hotel Albatroz, Herdade do Esporão, Largo ou Bairro do Avillez.
Assim que cruzar a porta, tem vários detalhes para reparar antes de se sentar ora ao balcão (num bonito mármore claro e cortado em forma de meia garrafa de vinho, permitindo uma cozinha aberta) ora nos sofás de veludo azul profundo. Do espelho que dá profundidade à sala saem ramos, obra do artista plástico Martinho Pita, que aludem a uma vinha. Seguindo caminho, encontra os bichos de Daniela Rodrigues, que retratam a história da filoxera, praga (qual Covid-19 do vinho) que assolou as vinhas na Europa no século XIX.
Já sentado, pode escolher um menu de degustação de seis (27€) ou nove momentos (35€) ou fazer uma escolha à carta, sendo que a recomendação é de seis a sete pratos para cada duas pessoas. Por agora, à escolha, há uma paleta de guacamole com cornflakes picantes (3,50€) – antes, houve um outro gelado de pauzinho, de gaspacho –, batata doce roxa com leguminosas, avelã e aroma de trufa (3,50€), ostra a baixa temperatura com espuma de coco, raspa de lima e ovas de arenque (3,50€), uma bola de berlim salgada, fofa, com recheio de bacalhau e chouriço de porco preto (4,50€) ou um pão a vapor com tinta de choco e mexilhão (4,50€). Tudo com apresentações cuidadas e interessantes, diferentes.
A carta, que não tem qualquer distinção entre entradas ou pratos principais, como se quer nos novos bistros, tem ainda, por agora, um prato menos consensual de fígados de galinha e aipo de coentrada, caramelizado tal qual crème brulée e com pétalas de cravo delicadas no topo (4,50€), um prato com barriga de porco cozinhada 12 horas com muitas especiarias, figo e pipocas de porco com azeitonas (7,50€) ou touro bravo, pêssego e cogumelos shiitake (8€).
Para sobremesa, duas opções, uma mais fresca, outra mais surpreendente e chave de ouro. A primeira tem frutos vermelhos cozinhados em calda de citrinos, com espuma de lima e manjericão (3€), a segunda apresenta-se como “chocolate, miso, funcho e menta” (3,50€). Tem um potenciador de sabor que normalmente não está associado a sobremesas, o umami, e tem caramelo salgado, espuma de chocolate com 70% de cacau, miso e compota de menta com funcho.
“Tentamos que seja um espaço acessível a todos em termos de preço, sem nada proibitivo. Se olharmos para o menu, há até coisas de cozinha molecular. Se alguém quiser vir provar uma coisa out of the box, consegue”, diz Erik.
A acompanhar tudo isto, e porque a ideia é realmente ter uma experiência gastronómica completa, há uma carta de vinhos inteiramente nacional (à excepção do champanhe, claro está, da região de Champanhe), com consultoria de Rodolfo Tristão e que rodará a cada dois meses.
E para poder ir fazendo um pairing e não subir a conta desmesuradamente, aqui há vinhos a copo em duas doses diferentes. “A ideia é realmente elevar a experiência ao máximo. Podemos tentar arranjar um pairing que dê para dois, três pratos, mas para conseguir que seja o pairing perfeito e não estar preocupado com o preço, há estas doses mais pequenas”, acrescenta o proprietário.
Neste momento, e porque apesar do tempo frio vir aí (ou não, que 2020 é uma caixinha de surpresas) ainda não estamos na estação fria, há apenas vinhos brancos e tintos com uma graduação não muito alta. Há também opções de vinhos naturais, de baixa intervenção.
A carta de bebidas guarda ainda mais umas surpresas, como os cocktails de base vínica, como o Touriga, com uma base de gin mas com vinho tinto touriga nacional (9€), o Ninfa Spritz, a dar uns toques de mojito com lima e hortelã mas uma base de vinho Ninfa sauvignon blanc do Tejo (7€).
“Terroir é bastante associado ao vinho mas todos os alimentos têm o seu terroir. É o conjunto que de vários elementos que fazem a identidade do vinho: o clima, a orientação da terra, os métodos de vinificação, a própria casta. O que queremos transmitir, e indo buscar as palavras do nosso consultor vínico, o terroir é a impressão digital do vinho e nós queremos transparecer a nossa identidade”, diz.
Tanto o vinho a copo como os cocktails e a própria carta podem ser todos pedidos à janela, seja no horário específico do seu funcionamento (uma hora e meia antes da abertura do restaurante para jantares), seja durante o serviço normal, enquanto espera por uma mesa, por exemplo. Em breve, também terão opções prontinhas para pegar e levar para um piquenique, assim como dicas dos melhores lugares para estender o farnel.
Rua dos Fanqueiros, 186 (Baixa). 21 887 3823. Qua-Qui 18.00-19.30 (janela exterior), 19.30-23.00 (refeições). Sex-Dom 12.30-15.00/18.00-19.30 (janela exterior), 19.30-23.00 (refeições).