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“Fado ao Contrário”, é um atrevimento com piano, percussão e guitarra eléctrica. Mas a tradição continua lá.
Pedro Moutinho deu a volta, virou-se para a frente. Depois de cinco álbuns dedicados aos clássicos do fado, quis “ir por outros caminhos”, experimentar outras sonoridades. Convidou Filipe Raposo e deu-lhe carta branca para produzir, orquestrar, levar outros músicos. O resultado, Fado ao Contrário, é um disco em que a guitarra portuguesa, a viola e o baixo convivem com o piano, a percussão e até a guitarra eléctrica. O fadista vai ao São Luiz, esta sexta-feira, mostrar a sua ousadia artística.
“Venho de um disco muito tradicional”, diz Pedro Moutinho, enquanto faz contas aos fados antigos que gravou desde 2003 – “à vontade uns 40 e poucos”. Um percurso que culminou precisamente com O Fado em Nós (2016), gravado ao vivo no Museu do Fado, em Alfama. Uma homenagem. Feito isso, “estava na altura de arriscar” de levar a voz para lá das fronteiras do fado. Amélia Muge, Márcia, Pedro de Castro, Maria do Rosário Pedreira e Manuela de Freitas contribuíram para esse processo, com músicas e letras vivas e frescas, mas foi Filipe Raposo que deu corpo e sentido a tudo.
“É um grande músico”, elogia Pedro Moutinho. O pianista, que não é estranho ao universo do fado (trabalhou com Camané e Ricardo Ribeiro), contribuiu com “bom gosto”, “criatividade” e “conhecimento musical”. “Os arranjos são uma mistura de bom gosto e simplicidade. Tudo flui de uma forma muito natural.” Um dos momentos mais inspirados de Filipe Raposo no disco, avalia Moutinho, está na dança de instrumentos que se ouve em “Força do Mar”, uma canção de Márcia cujo arranjo inclui a guitarra eléctrica de André Santos. “Quando o Filipe me falou em guitarra eléctrica, comecei a imaginar rockalhada”, ri-se. “Fiquei assustado.” Mas o diálogo que o produtor orquestrou entre cordas e piano deixou-o sem reservas. “Acho que é genial.”
Moutinho nasceu e cresceu em Oeiras, onde desagua o Tejo e a água já é salgada. “Quando era miúdo, ia passear à praia. Mesmo no Inverno. O mar não era só aquela coisa de ir para a praia para me divertir, era para reflectir, para pensar nas coisas”, recorda. “Força do Mar” faz a ligação a esse mar físico e calmante, e àquele mar que imita a vida com o seu vai-e-vem. O fadista explica: “Muitas vezes vou à frente, mas depois parece que dou três passos para trás.” O que acontece de duas formas no disco.
Primeiro, no alinhamento: apesar de parte dos 11 temas ser nova, dando vários passos em frente, “Uma pena que me coube”, que Amélia Muge compôs para o disco de 2012 com o grego Michales Loukovikas, dá um passo atrás; “Tragédia da Rua das Gáveas”, um original de Vitorino, de 1984, recriado como fado-canção, dá mais um; e quatro fados clássicos, incluindo “Maldição” e “Foi um bem conhecer-te”, cantados sem artifícios, dão outros tantos. Segundo, o tema-título, “Fado ao Contrário”, composto de forma a avançar às arrecuas de refrão em refrão. “Só mesmo a Amélia Muge para ter essa criatividade. O fadista decidiu arriscar ao sexto discoEspero que toda a gente perceba: cada vez que acabo a frase, começo a recuar, a recuar, até ir ao refrão. Fiquei muito feliz com isso.” A letra é de Maria do Rosário Pedreira, que nos sugere que, quando uma relação não está a funcionar, tentemos ao contrário, de outra maneira.
No São Luiz, Pedro Moutinho será acompanhado por Filipe Raposo (piano), José Salgueiro (percussão), André Dias (guitarra portuguesa), Pedro Soares (viola) e Daniel Pinto (baixo).
São Luiz Teatro Municipal. Sex 21.00. 12-15€.
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