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A brasileira sai do armário com o seu primeiro álbum a solo, Cavala, e uma digressão que passa pelo Musicbox na quarta, 17. Falámos com a cantora e compositora sobre este disco feminista.
“Pai, gosto muito dos homens, sim/ De tê-los ao alcance da boca, sim/ Mas, no calor da manhã quem me fez delirar foi uma mulher.”
Em “Amor Verdade”, uma das dez canções do seu primeiro álbum a solo, Maria Beraldo não esconde a sua orientação. Nem quer. Cavala, lançado agora em Portugal e editado em 2018 no Brasil, é um “álbum autobiográfico”, confessa a brasileira de 30 anos.
Normalmente, o seu nome costuma vir associado a outras bandas e artistas e foi preciso uma mudança de vida para sair do armário e ganhar fôlego para compor. Trabalhou com Elza Soares, é clarinetista da banda de Arrigo Barnabé e também faz parte da banda paulista Quartabê, que já tocou em Portugal.
“A minha chegada na metrópole, o meu contacto com o Arrigo Barnabé e com todo um contexto de compositores e de trabalhos inspiraram-me muito”, conta a cantora e compositora por telefone. “Também o contexto político da cidade [me influenciou]. Foi o momento em que eu comecei a sair do armário e a falar da minha sexualidade. Isso tudo combinado foi o que me fez começar a compor.”
Quando se mudou de Florianópolis, sua terra natal, para São Paulo, o álbum – curtinho, com 24 minutos e até então “um sonho” – começou a ganhar forma na sua cabeça. “Percebi o quanto tinha sido reprimida e quanto todas as mulheres lésbicas são reprimidas e de como é importante falar sobre isso porque a gente precisa se identificar com seres humanos para conseguir encontrar as nossas vozes.”
Não tem problemas em dizer ao Brasil inteiro que é lésbica, nem a Portugal, onde se estreia a solo com cinco concertos, o primeiro já no sábado no Festival Tremor, em São Miguel, nos Açores, e o seguinte em Lisboa, na quarta, 17, no Musicbox. Também vai passar pelo Porto, por Barcelos e por Aveiro e, quiçá, pelo caminho, servir de inspiração a outras pessoas – a inspiração que não teve quando cresceu.
“Senti muita falta de na minha adolescência e na minha infância ter referências de mulheres assumidamente lésbicas. O meu trabalho é forte nesse sentido. O facto de dizer que sou lésbica deixa muitas pessoas incomodadas porque acham que isso é uma intimidade, não é uma coisa necessária. Isso também é homofobia. As mulheres lésbicas são condenadas a se esconderem e se você não tem exemplos, você acha que não é possível.”
Mais que um álbum militante ou de “resistência”, como lhe chama, Cavala é um álbum “feminista de uma maneira geral”. Aliás, tem recebido mensagens de apoio de mulheres bastante diferentes, como as das suas letras, que a ajudaram “na sua evolução”.
Numa das canções, “Helena”, Beraldo fala sobre o nascimento de uma sobrinha. Em “Maria” refere- -se à sua avó de Minas, “que se matou por lá também”, canta. “Cavala”, que acabou por dar o nome ao álbum, foi inspirada numa bailarina com quem teve um relacionamento. “Ela estava fazendo um trabalho de dança e esse trabalho se chamava ‘Égua’. Fui fazer uma música para ela e saiu cavala em vez de égua”, recorda. “Essa palavra, cavala, foi tomando conta de mim. Primeiro era a Patrícia [a tal bailarina], depois começou a ser eu e depois começou a ser muita gente.”
Quarta, 17, 22.30, no Musicbox. Rua Nova do Carvalho, 24 (Cais do Sodré)