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O que une Benfica e Venda Nova? Um festival em cima de uma rotunda

Chama-se Entre Portas e, mais do que um festival, é uma pergunta: por que é que duas freguesias vizinhas, de concelhos diferentes, não se juntam para fazer coisas? Programa vai até ao fim do ano.

Rute Barbedo
Escrito por
Rute Barbedo
Jornalista
Portas de Benfica
DR/Google | | Portas de Benfica
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É uma rotunda, mas não uma qualquer. Nas Portas de Benfica, que separa os concelhos de Lisboa e da Amadora e os bairros de Benfica e Venda Nova, passam carros, mas também há peões, oliveiras, serviços institucionais e uma associação instalados nos chamados "castelinhos", os edifícios que faziam de porta e alfândega na passagem para Lisboa. É aqui, com o bairro das Pedralvas ao cimo, túneis em volta e um letreiro metálico a sinalizar a entrada na Amadora que se vai fazer o festival Entre Portas, de 5 a 7 de Setembro, fruto de uma colaboração entre as duas juntas de freguesia locais, que não se esgota naqueles três dias.

"É um projecto que tem sido namorado há um ou dois anos" e que agora se afina no terreno, conta Ricardo Marques, presidente da Junta de Benfica, à mesa da cinquentenária pastelaria Scala, no concelho vizinho, mas a escassos metros da sua freguesia. "Serve também para criar um sentimento de pertença. Estamos mais perto de Benfica do que do centro da Amadora", complementa Rafaela Heitor, que lidera a Falagueira-Venda Nova. E é para repetir todos os anos, daqui para a frente, contrariando aquela tradição dos vizinhos de costas voltadas. 

Quinta da Granja, Benfica
DRQuinta da Granja, Benfica

A programação começa este mês, de Fevereiro, com um desfile de Carnaval entre as duas freguesias. "Vai começar na Quinta da Granja e vem até este lado, Venda Nova", descreve Ricardo Marques. Em Abril, acontece uma feira de emprego; em Maio, da saúde; "em Junho, são as festas"; em Julho, levam-se os fregueses até ao Festival Músicas do Mundo, em Porto Covo e Sines. Pelo meio, haverá acantonamentos no Parque Silva Porto, uma viagem com séniores até ao Norte de Espanha e outra, ainda, à ilha do Príncipe, com quem Benfica estabeleceu recentemente um protocolo de cooperação. Tudo sempre com fregueses dos dois lados.

Ainda sem data, está nos planos a organização da "Real Rota das Tascas e Petiscos". "Já tem nome e tudo", atira o presidente da Junta de Benfica, com Rafaela Heitor a levantar o véu sobre um dos fortes candidatos a integrar a lista: a Taberna da Tia Rita, um clássico da Porcalhota. "Imagine o que é as pessoas virem pela Estrada de Benfica, irem conhecendo as diferentes tascas que aqui temos, até à Elias Garcia", entusiasma-se Ricardo Marques.

A lista de actividades pode não fugir muito ao habitual de muitas juntas de freguesias. O novo é serem duas a fazê-lo em conjunto, permitindo ligar territórios e "quebrar barreiras", como frisa a presidente da Venda Nova. É o que se pretende.

Dois palcos, 20 mil pessoas

Em Setembro, o festival, gratuito, será o culminar deste acto de vizinhança. Fechada ao trânsito, a rotunda das Portas de Benfica vai acolher dois palcos: um para talentos emergentes e "actuações mais locais", como o cante alentejano, cantares do Minho ou as batucadeiras, e outro para artistas como Ivandro (dia 5), Os Quatro e Meia (dia 6) ou Carolina Deslandes (dia 7). As estimativas da organização é que apareçam entre 15 mil e 20 mil pessoas (embora o recinto tenha capacidade para 40 mil). Na ala Norte, será a área da restauração, essencialmente alimentada por projectos, associações e colectivos locais.

Carolina Deslandes
DRCarolina Deslandes

"É uma oportunidade para mostrar também toda a multiculturalidade desta zona. De um lado pode estar a feijoada e do outro a cachupa, enquanto um grupo romani se junta para uma guitarrada", exemplifica Ricardo Marques.

Transportes, parques e outras colaborações intermunicipais

O evento é apoiado pela Câmara Municipal da Amadora (e não pela de Lisboa) e não pode deixar de ser visto sob uma lente política, tocando num ponto sensível, o da ausência de cooperação territorial e entre instituições (note-se que tanto a Junta de Freguesia de Benfica como a da Falagueira-Venda Nova são lideradas pelo Partido Socialista, pelo que diferenças partidárias não se colocam). "Temos de deixar de ter medo de acabar com barreiras físicas", exclama Rafaela Heitor.

Parque da Matinha da Venda Nova, Amadora
DR/GoogleParque da Matinha da Venda Nova, Amadora

Porém, há outras, como enumera o colega. "Há anos que falamos sobre a possibilidade de cooperação num transporte que facilitasse as deslocações em todo este território, um eléctrico ou um BRT [Bus Rapid Transit] contínuo, que serviria à volta de 150 mil pessoas só neste atravessamento", analisa o autarca de Benfica. Para não falar das ciclovias que terminam nas zonas-limite, sem continuidade territorial. Outro dos projectos intermunicipais por avançar seria a criação de um parque nas traseiras do Cemitério de Benfica, com extensão até à Venda Nova velha. "O Entre Portas não é sobre isto, isto são outras coisas. Mas o que estamos a fazer dá um sinal político forte de que tem de haver cooperação", defende Ricardo Marques. 

Por mais bairristas que possam ser, os moradores de Benfica e da Venda Nova não fazem as suas vidas cingidos às fronteiras administrativas. E foi isso, aliás, que Ricardo Marques e Rafaela Heitor tentaram explicar logo no início da conversa com a Time Out, na Scala. Que, durante décadas, quem viveu na Venda Nova ia à "praça" de Benfica fazer as suas compras e punha muitas vezes os filhos na escola da freguesia. "40% dos clientes do comércio de Benfica são da Amadora, 17% de Odivelas. As coisas fazem-se muito com a população à volta, ninguém olha a linhas", diz Ricardo Marques.

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