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A Avenida de Roma é a recordista de "entalados" de Lisboa, embora haja mais pela cidade. Mas de onde veio a moda destas esculturas meio contorcionistas?
Nos anos 50, sobretudo no bairro de Alvalade, os novos prédios que surgiam começaram a ter uma espécie de esculturas/altos relevos na estreita faixa sobre a porta principal. O arquitecto Francisco Keil do Amaral chamou-lhes “os entalados”. O nome não só pegou como ficou – já nos anos zero, em 2005, o prémio BES Revelação foi atribuído a "3 Entalados", obra do artista plástico Ramiro Guereiro, que partiu destas figuras.
A história dos entalados é uma história de vaidades. Para darem um ar mais distinto aos seus prédios de rendimento, e assim atraírem pessoas dispostas a pagar mais por mais status, os promotores imobiliários quiseram ter esculturas na fachada principal dos seus prédios, à moda dos prédios de luxo dos anos 40, português suave, construídos nas avenidas Sidónio Pais e António Augusto Aguiar. Mas não tinham a tarefa facilitada. O desenho dos prédios de habitação do Plano de Alvalade, menos português suave e mais modernista, não contemplava espaço para elementos decorativos, e a CML tinha regras muito estritas quanto à inclusão de obras de arte na fachada principal (100 cm de altura x 40 cm de profundidade, a 2,5 metros acima do passeio).
A solução encontrada pelos promotores foi um dois-em-um: barata e vistosa. Por cima da porta principal dos prédios encaixaram, a custo e às vezes em poses um pouco contorcionistas, figuras de cimento pintado de branco, feitas a partir de moldes, mas que passavam bem por verdadeiras esculturas em pedra (até porque o modelo original era criado por escultores como Soares Branco, que assina boa parte delas).
No livro Lisboa, uma Cidade em Transformação (1969), Keil do Amaral, embora reconhecendo que algumas peças eram até “bem construídas e modeladas, dentro do seu convencionalismo académico”, manifesta-se contra este “estranho tipo de esculturas”, em conflito com o desenho dos edifícios e tendo como único objectivo o lucro, e chega ironicamente a propor a criação da Associação Protectora de Lisboa e das Mulheres Entaladas entre as Portas e as Sacadas.
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