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Dantes, revistas e jornais. Agora, livros. É deles que está repleta a antiga tabacaria que ocupava o número 86C da Rua Marquês Sá da Bandeira, junto à Gulbenkian. A Photo Book Corner abriu de fininho em Junho e trouxe um universo que já existia online para uma loja especializada em livros de fotografia.
Rui Ribeiral é quem dá o corpo ao manifesto pelo projecto, mas nem tudo começou com os livros, esses vieram bem mais tarde. Nos anos 90, Rui estudou Fotografia na Ar.Co ao mesmo tempo que trabalhava numa loja de discos para pagar o curso na altura.
O interesse pelos estudos foi azedando e pela música foi crescendo a cada dia. Acabou por largar a escola e entrar pela indústria discográfica adentro, criando a própria editora em 2005 com nomes como Norberto Lobo ou Lula Pena. Foram anos felizes até aparecerem os serviços de streaming, altura em que acabou por largar a editora e voltar a olhar para a fotografia.
“Continuei a gostar de fotografia e comprava livros quando podia. Seguia muito os blogues que existiram no início da década sobre livros de fotografia, sobretudo americanos, e estava a par de tudo o que esgotava e valorizava e que ia saindo no mercado”, conta Rui. “Decidi: vou vender livros em vez de discos”.
Nessa altura, em 2012, pôs online um site e começou assim a Photo Book Corner, quase inteiramente virada para o mercado internacional, uma vez que por cá era difícil encontrar clientela que olhasse para os livros de fotografia. “Na época apostei em livros que faziam parte de listas internacionais dos melhores livros e comecei a chamar a atenção assim, não foi fácil, mas o crescimento foi acontecendo”, diz.
Abrir a loja física, oito anos depois, foi só o culminar de tudo, até porque, para Rui, estes livros devem ser vistos ao vivo, tocados, sentidos, cheirados. Encontrou o espaço e acabou por abrir silenciosamente em Junho, altura ainda frágil depois do confinamento em que as pessoas começaram a sair mais à rua.
“Tenho três filhos pequenos e como estou sozinho no negócio comecei também a precisar de um espaço para trabalhar, para ser não só loja mas também escritório”, explica. “Abrindo a loja tenho esperança de encontrar mais clientes portugueses. Há muita gente com paixão pela fotografia e artistas que têm trabalho, mas que não têm capacidade nem oportunidade de ver o seu trabalho exposto e as instituições cá são muito fechadas, quase uma elite”.
A loja não é grande e a oferta, mesmo no site, é limitada, uma vez que Rui sempre apostou forte nas novidades e em obras inéditas. “É um negócio perigoso, porque os livros são caros e não convém que fiquem parados muito tempo, é preciso estar em cima do mercado e ver o que vai saindo”, conta.
Todo o processo é feito por ele, um one man show dos livros de fotografia: compra, vende, é ele quem dá a cara todos os dias na loja, que embala e que faz os envios para que cheguem perfeitos ao cliente. JH Engström, Gianni Melotti, Yael Martinez, Yumiko Izu, Wang Juyan, Stephen Shore, Joao Miguel Barros, Helena Almeida, Leila Jeffreys, Xiaoxiao Xu, Daido Moriyama, Joji Hashiguchi ou Takashi Homma são alguns dos muitos autores com livros no repositório da Photo Book Corner.
“É um negócio muito giro porque está sempre ligado ao coleccionismo. Muita gente vem aqui porque gosta, mas há pessoas que não percebem e começam, por exemplo, a comprar por impulso ou porque gostam da capa do livro”, refere. “E começam a criar curiosidade sobre o tema, faz nascer uma paixão que é muito bonito de acompanhar in loco com os clientes”.
No espaço, há algumas imagens expostas que Rui quer, em breve, conseguir que façam parte do catálogo de vendas, uma forma de dar oportunidade a alguns artistas e fotógrafos de verem o seu trabalho em exposição.
As dificuldades da sobrevivência de negócios como este são reais e, diz Rui, muito depende do “investimento das próprias instituições e de quem está à frente da cultura”. Todos os anos, em Novembro e com a ajuda do Arquivo Municipal de Lisboa, é habitual realizar-se uma feira de livros de fotografia que já em 2019 não aconteceu devido a constrangimentos financeiros.
“É uma pena, porque a falta de aposta nesta área também faz com que não consigamos fazer eventos maiores e com fotógrafos e autores estrangeiros, coisa que acontece em muitas cidades europeias”, refere. “Gostava que em Portugal as pessoas descobrissem mais estes livros. Gostava que a minha loja ajudasse nesse sentido, como uma espécie de descoberta de um mundo novo”.
Rua Marquês Sá da Bandeira, 86C. Seg-Sex 11.00-17.00, Sáb-Dom 12.00-18.00 (a loja estará fechada para férias na última semana de Agosto e na primeira de Setembro).
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