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SANATORIUM: uma forma terapêutica de ir ao maat

Uma clínica efémera, que combina arte e psicologia, foi instalada no maat. São nove os tratamentos propostos que prometem desligar-nos do mundo, por momentos, promovendo o museu como um local de encontro e partilha.

Cláudia Lima Carvalho
Editora de Comer & Beber, Time Out Lisboa
SANATORIUM
Gabriell Vieira
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Entrar num museu e ser recebido por alguém de bata branca, qual consultório médico, não é habitual, mas pode bem ser a tradução literal da arte como forma de terapia. Quantas visitas a museus, quantas obras de arte não têm um efeito catártico sobre o visitante? Não é por acaso que tantas vezes, em frente a várias peças, os museus e galerias dispõem de bancos, para que se possa ficar ali sentado, simplesmente a apreciar. E é precisamente um momento de paragem e reflexão que o maat – Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia propõe com SANATORIUM, do artista mexicano Pedro Reyes, uma exposição que não é uma exposição, mas antes uma instalação performativa e participativa em formato de clínica temporária, na qual o visitante pode participar em nove terapias. 

No espaço da Central Tejo, as batas brancas dos guias dos museus, aqui terapeutas, e as cores das paredes (brancas e verdes claras) do espaço onde está SANATORIUM dão o mote para a experiência. Não é difícil esquecer-se de que está num museu e, por momentos, é como se desse realmente entrada numa clínica terapêutica. 

Na apresentação à imprensa, Inês Grosso, curadora da exposição, destacou a importância de apresentar SANATORIUM nesta altura, depois de dois duros confinamentos. Nunca se falou tanto de saúde mental, nem nunca se esteve tanto alerta para o tema. “Estamos simbolicamente a chamar à atenção para temas importantes”, disse a curadora, para quem esta clínica efémera “é um espaço de diálogo, de encontro e partilha”. “Não podia ser mais actual, contundente.”

SANATORIUM
Gabriell Vieira

À entrada, somos então recebidos por um terapeuta que, num pequeno momento de conversa, quase como se fosse uma triagem, e depois do preenchimento de um pequeno formulário, nos sugere duas ou três terapias – e é nesse momento que nos transformamos em pacientes. Inês Grosso alerta, no entanto, que isto é um espaço de jogo e não pretende substituir qualquer terapia ou serviço social existente. “É uma simulação que lida muito com a subversão daquilo que associamos habitualmente a este tema.”

No total, são nove as terapias propostas, sendo que uma existe apenas online, e duas são feitas em grupo. Pedro Reyes não pôde viajar para Portugal, devido à pandemia, mas preparou tudo em ligação directa com a curadora – em Setembro, quando SANATORIUM chegar ao fim, talvez o artista consiga estar presente. 

Apesar de ter sido concebido para o Guggenheim de Nova Iorque, em 2011, e de já ter viajado pelo mundo ao longo do tempo, a situação que a covid-19 impôs obrigou a que também SANATORIUM fosse repensado para o tempo que se vive agora. “Após o confinamento, as pessoas estão ansiosas pelo encontro, e o SANATORIUM oferece um lugar para isso. Não apenas para ser ouvido, mas também para se ouvir. Um dos princípios do SANATORIUM é: se queres curar-te, começa por curar os outros. É muito bom ter ajuda, mas é ainda mais gratificante ajudar os outros”, diz Reyes no booklet que acompanha esta intervenção artística. “A interacção entre paciente e terapeuta é já um espaço de encontro”, aponta Inês Grosso, com a certeza de que este é um “projecto muito transformador”, e é por isso que não pode existir sem pessoas, são elas as peças fundamentais disto tudo. 

SANATORIUM
Gabriell Vieira

O que o artista mexicano propõe, através de uma série de terapias concebidas pela apropriação de técnicas de teatro, da psicologia Gestalt, do estado de fluxo, de actividades de grupo e jogos de construção de confiança, de coaching corporativo, do psicodrama, da hipnose, da sabedoria e da cultura popular, são tratamentos placebo. “A ideia é que essas terapias não pedem ao público que se sujeite a um sistema de crenças, como fazem as religiões. É como se retirássemos elementos práticos dos rituais escolhendo as realidades que encenam ou aquilo que possibilitam como um processo psicodinâmico”, explica o artista no mesmo booklet. 

As terapias, uma a uma

“Museu das Vidas Hipotéticas”, “Vacina Contra a Violência”, “Goodoo”, “Citileaks”, “Ex-voto”, “Mudras”, “Casino Filosófico”, “Mirrorring” e “Teste de Compatibilidade para Casais” (realizada online) são as terapias propostas no maat. 

SANATORIUM
Gabriell Vieira

No “Museu das Vidas Hipotéticas”, por exemplo, é proposto que o paciente reflicta sobre a sua vida, do nascimento até à morte, compondo uma maquete com os objectos que contam essa história – há dezenas de objectos à escolha. Já em “Goodoo”, o exercício proposto é o oposto ao vudu. Aqui, faz-se o bem, personalizando um boneco com cinco amuletos ou símbolos. Com a ajuda do terapeuta, coze-se tudo e “activa-se” cada ponto; no final, o boneco pode vir para casa ou para ser entregue à pessoa a quem desejou o bem. Em “Citileaks” é pedido ao participante que escreva o seu segredo mais íntimo e o coloque dentro de uma garrafa, podendo depois ler o segredo de outra pessoa. Em “Mirrorring”, pensada especificamente para o maat, o paciente é levado para a rua e desafiado a imitar os gestos do terapeuta, imaginando o que sente, e vice-versa. Já em “Vacina Contra a Violência”, é-lhe pedido que encha um balão e desenhe nele a cara da pessoa que mais o magoou. Depois, colocará o balão em cima de um saco de boxe em forma de boneco, para poder depois despejar toda a raiva e frustração, até que o balão rebente. Por sua vez, a terapia proposta online pede-lhe simplesmente que junte às suas frutas preferidas as do seu parceiro, e faça um sumo. O sabor dirá se são compatíveis. 

SANATORIUM
Gabriell Vieira

Tudo o que se pede é que vá sem pressas e com predisposição. O tempo em cada terapia é variável. E se quiser experimentá-las a todas, precisará de mais do que uma visita, visto que a cada ida são propostas duas a três experiências. 

SANATORIUM está no maat até 20 de Setembro. 

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