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“Se as abelhas desaparecerem, temos apenas quatro anos de vida”

O Jardim Zoológico de Lisboa assinala 140 anos de actividade esta terça-feira, 28 de Maio. A festa faz-se com a inauguração do Jardim das Abelhas, no Roseiral.

Raquel Dias da Silva
Jornalista, Time Out Lisboa
Jardim das Abelhas
© Jardim Zoológico de LisboaJardim das Abelhas
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São 09.00 da manhã quando chegamos ao Jardim Zoológico de Lisboa. As portas ainda não abriram ao público e há um grupo de educadores do Centro Pedagógico pronto para nos receber. A ideia é fazermos uma visita guiada e aprendermos, por um lado, a importância das abelhas e de outros insectos polinizadores na biodiversidade dos ecossistemas; e, por outro, quais as grandes ameaças a essas espécies e o que aconteceria se desaparecessem. O convite está relacionado com a inauguração do novo Jardim das Abelhas, um espaço e exposição permanente, que abre portas no Roseiral esta terça-feira, 28 de Maio, data em que se celebram também os 140 anos do parque.

Jardim Zoológico de Lisboa
© Rui Miguel SerraAs abelhas são essenciais para a polinização das plantas, o que é essencial para que herbívoros como as zebras tenham alimento

“Normalmente as pessoas vêm ver os animais e esquecem-se que isto é um jardim, que começou como uma colecção de plantas de diferentes cantos do mundo, como aquele jacarandá, por exemplo, que é uma árvore originária do Brasil. Mas, agora, queria que se focassem ali na nossa zebra, que se alimenta de feno. É um animal herbívoro e, se perdermos polinizadores como as abelhas, que fertilizam as plantas, provavelmente a maior parte dos herbívoros não teria o que comer”, alerta a investigadora Assunção Duarte, que integra a equipa de educação pedagógica do Jardim Zoológico de Lisboa. “E, reparem, eles são grandes, comem muito.”

Jardim das Abelhas
© Rui Miguel SerraJardim das Abelhas

Há cerca de 20 mil espécies de abelhas no mundo – a abelha-europeia, ou Apis mellifera, é a mais conhecida, graças à sua produção de mel e cera –; e, de todos os agentes polinizadores, as abelhas são responsáveis pela polinização de até 80% das culturas mundiais. Quando andam de flor em flor (podem visitar até duas mil flores por dia em busca de néctar e pólen), transportam consigo o pólen do órgão masculino para o feminino, permitindo a fecundação e o nascimento de novas plantas, frutos e sementes. É um serviço vital para a natureza, a agricultura e até o bem-estar humano. Infelizmente, há várias pressões globais que estão a fazê-las desaparecer, desde doenças capazes de afectar colmeias inteiras até às alterações climáticas, que causam uma dessincronização entre a floração das plantas e o ciclo de vida dos polinizadores.

Jardim das Abelhas
© Rui Miguel SerraJardim das Abelhas

“Na Península Ibérica, há muita lavanda e alecrim, e a sua floração é óptima para as abelhas, que são os principais polinizadores. Se tiverem quintais ou jardins, plantem muitas flores de campo, porque é uma maneira de contribuir para a sua alimentação e para o serviço que nos prestam”, sugere Assunção. “Não sei se já repararam nas zonas verdes da cidade, mas agora começamos a ter plantas mais farfalhudas, com muita floração, e é precisamente para promover a conservação dos polinizadores.” Isto quer dizer que – tome nota –, se um jardim parecer menos cuidado, porque as ervas são muito altas, na verdade é só a natureza a funcionar e é muito importante não interferir. Há inclusive especialistas que recomendam o corte de apenas dois terços dos jardins.

colónia de abelhas
© Rui Miguel Serra

Em Lisboa, há mais de 150 espécies de abelhas selvagens identificadas, a maior parte praticamente inofensivas, incluindo uma abelha muito rara, a abelha-das-flores-de-pés-peludos, ou Anthophora plumipes, que já foi registada no Parque Urbano do Vale da Montanha; e a abelha Ceylalictus variegatus, que foi avistada na Praça de Londres, numa planta da espécie Abelia grandiflora, e que até 2020 só tinha registos no Alentejo e no Algarve. Se quiser saber mais sobre estas e outras espécies de insectos polinizadores, a Câmara Municipal tem um guia dos Principais insectos polinizadores em Lisboa.

O que é que acontece se as abelhas desaparecerem?

“O Einstein nunca vestiu um fato de apicultor, mas ele dizia que, se as abelhas desaparecerem da face da Terra, a humanidade tem apenas quatro anos de vida. ‘Acabam-se as abelhas, acaba-se a polinização, acabam-se as plantas, acabam-se os animais, acaba-se o homem.’ E é de facto verdade”, avisa o fundador da Apiestrela, Luís Estrela, que é advogado de formação e apicultor de vocação, e que muito contribuiu para o novo Jardim das Abelhas no Roseiral do Jardim Zoológico. “A apicultura é uma actividade bastante exigente, sobretudo porque a capacidade de sobrevivência das abelhas tem diminuído e, com o colapso das colónias, temos registado quebras de 40% a 50%. E eu vivo a 200 quilómetros de distância do local onde se encontram as colónias de que cuido, o que é completamente irracional em termos de gestão, mas é uma paixão da qual não abdico.”

Jardim das Abelhas
© Rui Miguel Serra

Sensibilizar as famílias para o impacto das abelhas nos ecossistemas. É esta a principal ambição da nova exposição permanente do Zoo, que deu lugar também a um novo espaço no Roseiral. No Jardim das Abelhas, ou Bee Garden, como se lê na placa à entrada, é possível compreender a complexa estrutura social deste insecto e todo o trabalho que desenvolve até à produção do mel, bem como a clara relação de dependência entre o trabalho das abelhas e a reprodução de espécies vegetais que servem de alimento para nós e para outros animais. Dividida em diferentes núcleos, a mostra inclui informações sobre os diferentes estágios de vida da abelha – ovo, larva, pupa e abelha adulta –, a arte e ciência da apicultura – incluindo um exemplar de uma colmeia artificial e de máscaras e outros utensílios necessários à sua manutenção –, ameaças e, claro, boas práticas de conservação.

Jardim das Abelhas
© Rui Miguel Serra

“Ainda há muito desconhecimento em torno desta problemática, incluindo vários mitos acerca do comportamento das abelhas, e é fundamental educar. Esta exposição é uma maneira de abrirmos portas ao diálogo”, assegura Luís Estrela, que nos desafia a visitar a estufa já esta terça-feira, 28 de Maio, até porque o Jardim Zoológico está a celebrar os 140 anos com programação e ofertas especiais. Por exemplo, se também fizer anos hoje, tem direito a uma entrada grátis: basta ir às bilheteiras e apresentar o seu documento de identificação. Já dentro do parque, além de estarem previstos vários momentos de enriquecimento ambiental, durante os quais vai poder observar as técnicas de caça de diferentes espécies, os visitantes vão ser surpreendidos, de forma aleatória, com bilhetes duplos para revisitar o zoo, descontos na loja e até vouchers de viagem. Mas, atenção, o Jardim das Abelhas encontra-se na zona de acesso livre (para a qual não precisa de bilhete), e é também aí que se vão realizar “Conversas com o Apicultor”.

Jardim Zoológico de Lisboa. Horário de Verão: Seg-Dom 10.00-20.00 (última entrada às 18.45). 18€-20,50€ (grátis até aos dois anos) | Jardim das Abelhas: Roseiral, na zona de acesso livre

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