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Seja hip-hop, seja rock, todos são estrelas no karaoke

O karaoke voltou a estar na berra. Para perceber o fenómeno, pegámos no microfone e fomos em cantigas.

Teresa David
Escrito por
Teresa David
Jornalista
Hua Ta Li
Mariana Valle LimaKaraoke no Hua Ta Li
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Há algo de libertador em cantar a plenos pulmões. João Almeida sabe bem disso. Todas as semanas, o consultor homenageia os seus ídolos do rock (e volta e meia uma certa boyband dos anos 1990 – olá, Backstreet Boys, bons olhos os vejam!) no palco do Golden Vista, um restaurante com karaoke, aberto desde Março de 2022, nas Docas. “Vou largar todas as minhas energias. Sei que ali posso ser eu mesmo e consigo esquecer um bocadinho os problemas”, conta à Time Out. E a julgar pela lotação do espaço ao fim-de-semana, não é o único. 

O karaoke não é só para pessoas como o João, que sabe cantar e até já fez parte de uma banda. É para todos. E essa é uma das razões que o tornam tão popular em países da Ásia como o Japão, onde nasceu, algures nos anos 1970, e agora em Lisboa, onde tem vindo a ganhar um novo fôlego na cena nocturna. Veja-se o caso de Bruno Simões, que não tem qualquer ligação à música, mas dá tudo no palco no Golden Vista. “Para mim, o que é mais interessante é a possibilidade de, no convívio, juntares essa componente musical em que não és só passivo. És parte activa, fazes parte da festa, contribuis para animar os teus amigos e quem lá esteja”, afirma. Para isso interpreta as músicas de Elton John, Robbie Williams, ABBA ou Queen. Em português, diverte-se com as canções de Quim Barreiros ou com as baladas de Tony Carreira. “Se tu fores numa de ‘vou cantar aqui o meu nicho indie que eu gosto muito’ vais ter mais algumas dificuldades em mobilizar as pessoas”, justifica.

Golden Vista
Francisco Romão PereiraBruno Simões no Golden Vista

Jean Baptiste, dono do grupo que detém o Golden Vista, com microfone aberto nas noites de quarta a domingo, explica este novo apreço pelo karaoke com “uma demanda muito forte, a nível global, para experiências de entretenimento mais personalizadas”. E garante que, além do divertimento, este tem uma função de auto-expressão. “Dá para ver, no nosso karaoke, as pessoas a transformarem-se”. Algo que Bruno Simões corrobora. “Pessoas que são naturalmente extrovertidas não terão, em princípio, problema em ir para o palco, mas também é uma oportunidade de ver pessoas que não são tão expressivas no dia-a-dia a exporem-se de uma forma inesperada.” 

O sucesso do espaço nas Docas é só um exemplo. Desde o ano passado, para colmatar os efeitos da pandemia, o Navega, na Baixa, que é restaurante, bar e sala de concertos, enche a casa uma vez por mês para uma noite de karaoke. “É o nosso lado mais extrovertido, mais out of the box”, admite a responsável, Mariana Axel. É nestas noites que a anfitriã e cantora prestes a lançar o seu primeiro álbum, Inês Monstro (também mestre de cerimónias no Golden Vista), faz a festa acontecer. O seu trabalho é sentir o público e dar-lhe a confiança para entrar na festa. “É um momento em que as pessoas podem desprender-se daquilo que a vida lhes exige: dos trabalhos, das famílias, das relações, das emoções”, afirma. “Não precisas de saber cantar para vir cantar a um karaoke, precisas só de ter vontade de estar a cantar. Mais tímido, menos tímido. É um espaço de libertação, é um espaço em que tu te deixas ir”, sublinha. 

Para a energética Inês, ser a MC deste tipo de eventos tem um significado diferente. “Eu sempre gostei muito de quebrar a quarta parede com o público, de estar o mais próxima possível. Como cantora tens sempre medo da exposição, mas realmente começas a dominar o teu medo quando passas mais tempo no palco. Tenho amigos que cantam e que são tímidos e eu digo sempre ‘vai ao karaoke’". 

Inês Monstro no Navega
Francisco Romão PereiraInês Monstro no Navega

A febre faz-se então sentir no Golden Vista e no Navega, à boleia de anfitriões como Inês Monstro, mas também em sítios mais clássicos, como é o caso do restaurante de comida chinesa Hua Ta Li, no Martim Moniz, que já aluga salas privadas para karaoke há mais de 10 anos. “No princípio eram só chineses, mas antes da pandemia o número de portugueses começou a aumentar. Agora vão quase todos os dias”, diz um dos responsáveis, David Zhu. O mesmo acontece com o restaurante e bar Statvs, no Parque das Nações, casa de karaoke há uma década. 

Nesta nova onda, o karaoke também marca presença em moradas mais alternativas, como no Rove, um bar com a assinatura do chef Shay Ola, no largo Camões, que em Novembro se estreou com um karaoke de hip-hop. A noite correu tão bem que Shay quer repetir a proeza uma vez por mês. “É muito engraçado ver as pessoas a tentar fazer rap”, revela. Para o chef, um fã assumido de karaoke, “secretamente, toda a gente se quer sentir uma estrela. E mesmo que se trate de um péssimo cantor, toda a gente vai apoiá-lo. Acho que é por isso que as pessoas adoram o karaoke”. 

Mike El Nite na Musa de Marvila
Mariana Valle LimaMike El Nite na Musa de Marvila

E se um karaoke dedicado ao hip-hop é inovador, a Musa de Marvila leva a coisa para outro nível com um “karaoke mágico”, ou seja, um karaoke com autotune. A ideia, que passou da teoria à prática em Dezembro do ano passado, é do artista Miguel Caixeiro, mais conhecido como Mike El Nite. “Achámos que era uma ideia demasiado boa para ser desperdiçada”, sublinha Bárbara Simões, da Musa. Na base, está uma missão: provar que o autotune não facilita tanto a vida aos cantores como parece. “Há muitas pessoas que dizem ‘não sabe cantar porque usa autotune’. Então pensei que podíamos pôr essas pessoas a cantar com autotune e assim provarmos que não é só chegar lá e cantar”, descreve Mike El Nite. E como Inês Monstro, Miguel Caixeiro também encontra valências em ser anfitrião no karaoke da Musa. “Aquilo que melhora na minha performance como artista é a capacidade de ser host e de estar aqui a entreter e a falar com as pessoas. Existe essa coisa de saber levar um evento de quase de cinco horas, ir mantendo a energia.” 

Para o artista, “o karaoke é sempre divertido. É universalmente divertido. Mas eu acho que durante muitos anos os sítios que faziam karaoke começaram a ser vistos como um bocado saloios, fora de moda. Mas tudo dá a volta e a verdade é que é uma fórmula divertidíssima”. Nas noites mágicas na Musa, Mike El Nite já testemunhou “grandes momentos com Adelaide Ferreira”. Além disso, “há sempre Spice Girls, Britney Spears, Lady Gaga, Alejandro Sanz. A minha lista é curada nesse sentido, dos anos 1980, 1990 e 2000”. 

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