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Os Slowdive foram uma das maiores bandas de shoegaze dos 90s. Calaram-se cedo, mas regressaram em 2014, depois de duas décadas de silêncio. Quinta-feira dão o primeiro concerto em Lisboa.
"Barulhinho bom" não é só um disco de Marisa Monte de 1996. É o que muita gente faz. Foi o que os Slowdive fizeram entre 1989 e 1995. E o que voltaram a fazer desde que se reuniram em 2014. Ao contrário de uns e outros que se reúnem, eles melhoraram com os anos, como sabe quem os viu quando tocaram no Primavera Sound ou em Paredes de Coura ou quem ouviu o álbum do ano passado. Como vai ficar a saber quem os vir quinta-feira no Lisboa Ao Vivo.
Mas voltemos ao princípio. Ou pelo menos ao final dos anos 80. Quando o shoegaze começa a ser codificado em Isn’t Anything, dos My Bloody Valentine; quando Neil Halstead e Rachel Goswell, dois amigos de infância, se juntam a mais três moços de Reading e roubam o nome a uma canção de Siouxsie and the Banshees; quando nascem os Slowdive.
O primeiro álbum, Just For A Day (1991), conta-se entre os melhores exemplares do género. Durante os seus três quartos de hora, nuvens de ruído cobrem um oceano melódico, o belo e feio confundem-se nas suas canções. É bom, mas Souvlaki (1993) é ainda melhor. É uma obra-prima. É música cálida e narcotizada, sedutora sem ser atiradiça. São 40 minutos de êxtase pop divididos por dez canções que são sonhos lindos. E ainda há Pygmalion (1995), um disco onde efabulação pop, música ambiental à moda de Brian Eno e pós-rock confluem.
Uma semana depois da edição de Pygmalion, contudo, os Slowdive são despedidos pela editora Creation e separam-se. Passado um bocado, três dos seus membros começam a fazer country onírica como Mojave 3. Fim.
Pelo menos até 2014, quando um convite para tocarem no festival Primavera Sound e a vontade de voltarem a partilhar um palco é o suficiente para regressarem. Para começarem a escrever um novo capítulo. “Tudo de uma forma muito orgânica”, nas palavras do guitarrista Neil Halstead. Entretanto, concerto puxa concerto, linha de guitarra puxa linha de guitarra, canção puxa canção, e em 2017 lançam um disco novo: Slowdive.
É o que vamos ouvir esta quinta-feira no Lisboa Ao Vivo. Um disco que existe fora do tempo e mesmo assim se mantém actual. É de 2017 como podia ser de 1997, como se eles nunca se tivessem separado. E é melhor que qualquer outro álbum do género feito no presente século, à excepção de m b v (2013), dos My Bloody Valentine. Se partilha o nome com a banda é porque representa bem quem eles foram, quem eles são, quem podem vir a ser.
A música é expansiva e estelar, mas à sua maneira simples, ao mesmo tempo luminosa e enevoada. Estão lá as melodias paliativas, os ritmos espaçados, as guitarras distorcidas, as vozes amolecidas pela droga e pelo vinho (não sabemos se foram mesmo amolecidas pela droga e pelo vinho). É uma experiência beatífica.