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Estranhas luzes no céu à noite, pessoas inquietas e atemorizadas, súbitas aparições de naves alienígenas. São imagens inesquecíveis de Encontros Imediatos do 3º Grau (1977), um dos maiores e mais característicos filmes de Steven Spielberg. Mas elas já aparecem, em versão mais artesanal e ingénua, em Firelight, um dos filmes amadores de ficção científica (FC) que, em 1964, um jovem Spielberg rodou com a ajuda e participação de familiares e amigos, e que prenunciava aquele que seria, anos mais tarde, um colossal sucesso de crítica e comerciais do realizador, então visto como o “jovem prodígio” de Hollywood.
As imagens destes filmes amadores, mas já ambiciosos e, dentro do possível, tecnicamente elaborados, de FC, de guerra e de terror, que o autor de O Tubarão rodava na adolescência, bem como os “home movies” da família Spielberg, são o principal interesse do documentário biográfico Spielberg, realizado por Susan Lacy para a HBO, que o canal codificado TV Cine 2 exibe esta terça-feira, 12 de Dezembro, às 22.00. É que este trabalho com duas horas e meia de duração é um panegírico desatado de Steven Spielberg, ao qual falta distância do biografado, rigor analítico e sobretudo espírito crítico – basta dizer que os fracassos e os piores filmes do realizador são passados pela rama ou nem sequer referidos.
Spielberg apresenta-se assim como um documentário feito por uma admiradora fervorosa do realizador, destinado aos seus admiradores fervorosos. E está profusamente atestado com imagens de filmes e de rodagem (incluindo dos começos de Spielberg no departamento de televisão da Universal, onde assinou telefilmes e episódios de séries como Columbo ou A Regra do Jogo) e generosamente repleto de depoimentos, do próprio Steven Spielberg e de familiares, amigos, colaboradores (John Williams, por exemplo), actores (Harrison Ford, Tom Hanks ou Cate Blanchett), realizadores, sobretudo da sua geração, como George Lucas, Martin Scorsese, Francis Ford Coppola ou Brian De Palma, e (poucos) críticos.
A realizadora não traz a público nada de significativamente novo para aqueles que conhecem bem os filmes do autor de Parque Jurássico e têm seguido com alguma atenção a evolução da sua carreira. E por falar nisso, outros dos aspectos menorizados por Susan Lacy neste trabalho são o papel de Steven Spielberg como inspirador e produtor de filmes de outros cineastas, bem como de séries de televisão, inclusivamente animadas, desde Indiana Jones-Crónicas da Juventude a Os Tiny Toons; e ainda a sua influência – bastante criticada nalguns sectores - sobre géneros clássicos, e muito cultivados no cinema americano, como a ficção científica, o terror e o fantástico. O que sobra a “Spielberg” em informação e documentação visual, falta-lhe em reflexão e contraditório.