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The Black Mamba: “Decidimos usar a exposição [da Eurovisão] para mostrar quem somos”

A banda portuguesa acaba de lançar o novo disco, ‘Last Night in Amsterdam’. O concerto de apresentação vai ser no Coliseu dos Recreios, no dia 17 de Janeiro.

Hugo Geada
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Hugo Geada
Jornalista
A listening party do álbum foi no Roterdão
Ana ViottiA listening party do álbum foi no Roterdão
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O auge de fama para qualquer artista é a altura ideal para lançar um trabalho novo. Com The Black Mamba não foi assim. Venceram o Festival da Canção e conquistaram o 12.º lugar na Eurovisão, em 2021, alcançando o maior momento de fama da sua carreira. Ainda assim, não era a altura certa para lançaram o seu novo disco.

O grupo tinha uma ideia a marinar desde 2018 – quando ainda andavam a apresentar The Mamba King. Inspirados por uma viagem a Amesterdão e pelo livro Hippie de Paulo Coelho, Pedro Tatanka (voz e guitarra), Marco Pombinho (teclas), Rui Pedro Pity Vaz (baixo), Guilherme Gui Salgueiro (teclista), Miguel Casais (baterista) e Francisco Fernandes (percussão) tinham a ambição de criar uma “ópera funk” com canções inspiradas em histórias que ouviram sobre esta cidade, com elementos de funk, soul, blues, rock psicadélico e outros estilos que adoram ouvir.

Esta sexta-feira, 15 de Novembro, Last Night in Amsterdam, o quarto disco de The Black Mamba, foi finalmente lançado para o público e o grupo não poderia estar mais orgulhoso pelo trabalho final. Estivemos na listening party do disco, não só para ouvir as canções, mas também para falar com o grupo sobre este novo trabalho, a importância do humor na música e as loucuras de Amesterdão. Ainda tivemos oportunidade de ouvir os pensamentos do road manager, Fernando Piçarra, que inspirou as músicas Crazy Nando e Nando Lost His Mojo.

Quando é que surgiu a ideia e a vontade de gravar Last Night in Amsterdam?
Pity:
São dois momentos diferentes. Em 2018, no início da tour do disco anterior, The Mamba King, surge a ideia de se fazer um disco baseado nos sons dos anos 70. Isto coincidiu com umas semanas nos Países Baixos, a fazer música e a curtir tipo putos. Todos os dias surgiam inspirações diferentes. Mas a grande vontade para começar a gravar surge depois do Festival da Canção, depois da nossa vitória. Embora o Tatanka, no início, estivesse sempre com medo que fôssemos todos apanhar covid-19, houve uma fase em que ele relaxou e começámos a juntar-nos todos os dias. As músicas foram surgindo naturalmente. Por exemplo, a Crazy Nando surge num dia em que o Gui chegou atrasado para uma filmagem da RTP. Ele entrou no estúdio a dizer que tinha tido um sonho onde a banda estava a criar uma música sobre o Fernando Piçarra, road manager do grupo.

Imagino que tenha sido angustiante toda esta demora. O vosso último álbum saiu em 2018. Vocês ganham Eurovisão em 2021, mas este novo trabalho só é lançado em 2024. 
Miguel Casais: Nós ainda fomos lançando alguns singles pelo caminho. Quando ainda estávamos a fazer entrevistas para a Eurovisão, e só nos perguntavam sobre a Love Is On My Side, o Pity ignorava e só falava sobre a Crazy Nando (risos). Quisemos aproveitar toda essa exposição para mostrar o que estávamos a fazer em paralelo.
Tatanka: O disco demorou o tempo que tinha de demorar. Tivemos que ter paciência. Este é um álbum complexo, com músicas longas, com muitas passagens e existe uma narrativa que liga todos os temas. Isto demora tempo. Ainda tivemos a Eurovisão pelo meio que nos obrigou a focar nisso, mas que depois também serviu como gasolina para arrancarmos.
P: Existe também outra razão. Quem escreve todas as letras é o Tatanka. Nós fazemos a música rápido, porque somos seis pessoas. 
T: A maior dificuldade foi criar um elo de ligação entre todas as faixas. A história vai-se desenvolvendo e tudo tem de bater certo. Existe ainda outro factor. É importante os músicos sentirem que têm algo para dizer. Se sentir que não tenho nada de relevante para acrescentar, prefiro ficar calado. Hoje, há artistas que sentem a necessidade de lançar músicas de dois em dois meses, mas depois não sai nada. É por isso que não acredito nesta conversa de intervalos entre discos. Existem momentos certos para escrever e deitar coisas cá para fora. Caso contrário é um processo muito superficial. 

Mas imagino que devem ter existido conversas internas, depois de toda a projecção da Eurovisão, sobre lançarem logo um disco e aproveitarem toda essa plataforma.
Gui:
 Houve. Especialmente quando regressámos da Eurovisão. Estávamos a pensar qual seria a melhor forma de capitalizar este momento porque é uma exposição que nunca mais vamos ter.

Enquanto músico também deve existir aquele receio de cair no esquecimento.
T:
Vivemos um bocado atormentados durante o período que antecedeu o Festival da Eurovisão e logo a seguir. Mas rapidamente percebemos que, simplesmente, não íamos conseguir concretizar todos os nossos planos. Isto foi algo que nos permitiu relaxar e ficar mais tranquilos. Durante um ano, não fiz nada. Estava tudo pronto, faltava fazer uma letra e eu não fiz nada. Sentia que não tinha nada para dizer e que ia sair uma coisa forçada. O facto de não conseguirmos utilizar este momento para fazer o disco foi algo que tivemos de nos conformar, mas seguimos em frente e, quatro anos depois, lançámos o trabalho que queríamos. 

Acham que também foi benéfico ter passado este tempo de forma a perderem e ultrapassarem o rótulo de banda da Eurovisão?
MC:
Não acho que seja um mau rótulo. Nós já tínhamos alguma exposição em Portugal e mantivemo-nos sempre fiéis ao nosso som. Tivemos que nos adaptar um pouco aos moldes da Eurovisão, mas nunca deixámos de ser os Black Mamba. Isso foi unânime e estamos em paz com isso. 
Fernado Piçarra: Este é um disco muito corajoso. Traz um universo que é diria está em contraciclo com a própria indústria. É uma extensão natural do som da banda que vai recuperar muitas das coisas que se fazia nos anos 60 e 70. Há aqui um lado muito narrativo, semelhante ao que faziam bandas como os Camel, Yes ou os Jethro Tull. É preciso coragem para recuperar este tipo de conceito porque vivemos numa sociedade muito mediática, onde tudo tem de funcionar ao segundo, tem de ser imediatamente consumido e o êxito é muito efémero. Este é um disco que vai ficar para sempre. No futuro, muitos vão questionar porque é que este grupo fez um disco com todas estas referências. Posso ser suspeito, por estar tão por dentro da vida da banda, mas respeito muito o facto de estarem agora a lançar um disco, de peito aberto e dizer: eu não quero saber, isto é o que somos e é a nossa essência.
T: O que muitas pessoas talvez fariam era lançar um Love Is On My Side 2.0. Nós decidimos usar a exposição [da Eurovisão] para podermos mostrar quem somos realmente. Andámos muito tempo ao sabor da maré. Andávamos a ser influenciados por pessoas que não deveríamos ter ouvido. Quando ganhámos o Festival da Canção, tivemos todos os olhos postos em cima de nós, tivemos a coragem de lançar a Crazy Nando e concluir esta ópera funk. Foi um importante momento de mudança e alterou para sempre o paradigma dos Black Mamba.

No centro deste disco estão os Países Baixos e Amesterdão, uma cidade sobre a qual querem escrever desde 2018. O que é que vos fascina nesta cidade? 
G: Podia ser Amesterdão, como qualquer outra cidade onde estivéssemos todos juntos. Nós tivemos a viver na mesma casa, íamos tocar a duas portas ao lado, todas as noites e isso foi muito importante para o grupo. Amesterdão também tem um estilo de vida muito boémio, que está ligado às origens da banda, que no início tocava muito no Bairro Alto. 
T: Isto permitiu-nos voltar às raízes, a tocar em bares e em clubes. Em Portugal já estávamos cheios de mordomias e chegámos lá e fomos actuar em sítios sem condições nenhumas. Isto foi importante, permitiu-nos olhar para trás e chegar à conclusão que não é o material de topo de gama ou os hotéis de cinco estrelas que nos fazem querer continuar a fazer música. Toda esta camaradagem está muito patente no disco.

Estavam a falar de Amesterdão e das loucuras que existem nesta cidade. É por isso que este disco tem tantas influências psicadélicas?
T:
Amesterdão foi uma cidade muito relevante em termos culturais. Agora, é uma capital turística, tal como Lisboa. Chegas lá e, pronto, há erva e um mar de turistas. Já tinha ouvido relatos fascinantes sobre como tinha sido um sítio revolucionário e muito à frente da época, há 50 anos. Nessa viagem tive a oportunidade de conhecer o dono da Bulldog [a primeira coffee shop de Amesterdão], que me contou imensas histórias, por exemplo, de quando ia preso por vender marijuana, e me explicou o processo de legalização. Só cinquenta anos depois é que estamos a ver países como os Estados Unidos a tentar fazer o mesmo. Isto é inspirador e há muita magia neste sítio. Muitas das personalidades que conhecemos inspiraram este disco.

Qual foi a coisa mais louca e estranha que viram lá?
MC:
Vi um gajo vestido de bebé que andava com um dildo na mão. Os turistas andavam atrás dele, a rir e a fotografar, mas ele ia a correr atrás das pessoas para lhes bater. Existem muitos freaks, é preciso ir lá e ver com os próprios olhos.

Mas diriam que a pessoa mais importante deste disco é o Crazy Nando? Ele até tem duas músicas dedicadas a ele.
T:
 O nosso Fernando é fundamental por todas as histórias, companhia e ajuda que foi dando à banda ao longo do tempo. Mas também temos de destacar a senhora que partilhou a história connosco [que inspirou a canção Love Is On My Side]. Foi graças a ela que demos o pontapé de saída. Se não fosse essa música, na verdade, não teríamos tido o  ímpeto e a motivação para fazer o resto do disco. Se calhar, nunca passaria de uma ideia que tinha ficado na gaveta. Foi o destino e ele leva o seu tempo a mostrar o seu caminho.

Neste disco, é bastante óbvio que The Black Mamba são filhos das suas referências. Do Curtis Mayfield, ao Stevie Wonder, aos Funkadelic... Houve algum artista menos óbvio na criação deste álbum?
T:
Uma das maiores influências –  especialmente nas partes das narrações e dos instrumentais mais freaks – foi o Frank Zappa. Ele também tinha muitas influências do soul e do funk e conseguia transformar tudo isto no seu próprio universo.  Além disso, a comédia que ele imprimia no seu trabalho foi algo que nos inspirou bastante. Há muita música que é demasiado séria. É importante conseguirmos fazer as pessoas rir. A maior parte das pessoas tem uma vida de merda e gostam de ouvir músicas como o "Crazy Nando" e divertirem-se. 
P: Houve uma fase que nos levávamos demasiado a sério. Muitos amigos nossos, depois de ouvirem a "Crazy Nando", disseram que estes é que são os verdadeiros Black Mamba. 

Coliseu dos Recreios (Lisboa). 17 Jan (Sex). 21.30. 15€

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