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JOANA ESTRELA
O segredo é fazer-se o que se quer fazer. Ainda estava na faculdade e já fazia zines para apresentar em feiras de publicações independentes. Daí até ser editada “à séria” foi um instante. Primeiro pela Plana – uma banda desenhada sobre um ano de voluntariado na Lituânia, a ser reeditada em breve pela Chili Com Carne –, depois pela Planeta Tangerina – já são oito livros, dois com texto de Ana Pessoa, seis escritos e ilustrados por si. O Mana, que lhe valeu o Prémio Internacional de Serpa para Álbum Ilustrado em 2016, foi o verdadeiro pontapé de saída. “Foi a primeira edição do prémio”, recorda Joana Estrela, como quem ainda não acredita que o ganhou. “Queria contar uma história sobre a relação com a minha irmã, de quando éramos crianças. Mas nem sempre penso muito no público-alvo. Tenho uma ideia para um projecto e atiro-me.” Por outro lado, as soluções gráficas até costumam surgir-lhe depois.
Neste momento, partilha, está a escrever uma espécie de policial para pequenos leitores. “Só texto, para já. Era uma coisa que queria experimentar, fazer algo mais complexo, que demorasse mais tempo a planear”, revela. E, enquanto não tem data de lançamento para anunciar, convida as famílias a fazer parte da sua estreia no teatro. O LU.CA – Teatro Luís de Camões fez-lhe uma encomenda e ela desafiou o amigo Nicolau, ilustrador e músico, a reinterpretar consigo a fábula de Esopo O Rato do Campo e o Rato da Cidade. “Há um texto, mas também há desenho e música ao vivo”, conta sobre o espectáculo Dois Ratos, que ainda espera levar a muitos pontos do país. “No início estava muito preocupada, agora sinto que uma peça pode ser aquilo que quisermos.” E um livro, com ou sem ilustrações, também.
ANDRÉ CARRILHO
A vocação é coisa de família. A mãe dedicava-se sobretudo às artes aplicadas mas também desenhava muito bem. E o tio Vítor, que hoje em dia é escultor, costumava fazer caricaturas que fascinavam o pequeno André. Mais tarde, aos 18 anos, estreou-se como cartunista no jornal Ponto Final, em Macau. Foi o começo de uma carreira abençoada, não por obra e graça do Espírito Santo, mas por um talento particular. “O talento que é preciso”, revela-nos André Carrilho, que não só fez nome cá dentro, como chegou às mais prestigiadas publicações internacionais, “é o de saber reconhecer oportunidades únicas. Tudo o resto aprende-se e é relativo. Depois é trabalhar muito, o máximo que a gente consiga.” É o que tem feito. Está constantemente à procura. Foi assim, aliás, que começou a explorar a aguarela, numa altura em que viajava muito sozinho, ainda sem saber que, um dia, a técnica serviria para ter conversas sérias com os filhos.
É essa a génese de A Menina Com os Olhos Ocupados, com o qual se estreou na literatura para a infância, em 2020. “Eu sou da geração que fez a transição do analógico para o digital, e comecei a ter saudades do que é fazer à mão. Às vezes o que interessa é o processo de lá chegar.” E, às vezes, o mais bonito é mesmo o acaso. Como o telefonema inesperado, dois anos depois, para transformar o álbum ilustrado numa curta de animação. Em breve, haverá também uma série, promete. Quanto aos próximos livros, o protagonista terá de ser um menino. “O primeiro e o que se seguiu [Senhor Mar] são inspirados na minha filha, e o meu filho já me exigiu ser a personagem principal”, conta, entre risos. “Neste momento estou muito virado para as questões ecológicas, do meio ambiente e do aquecimento global.”
INÊS VIEGAS OLIVEIRA
É no Bairro do Alvito, em Alcântara, num sótão transformado em atelier, que nos encontramos. A um mês de ser mãe, seria de esperar que Inês Viegas Oliveira abraçasse o ócio, mas as suas ferramentas (lápis, pincéis, canetas) não pesam nada, muito pelo contrário – são também uma forma de sair de si e manter as engrenagens da imaginação e da criatividade a funcionar. Até porque, confessa, se há coisa que não sabe fazer é parar de procurar respostas. Foi essa curiosidade insaciável que a levou a estudar Física e mais tarde, num volte-face, a redescobrir-se enquanto pessoa-artista. “Tinha uma vontade muito grande de comunicar aquilo que sabia, que estava a aprender, e a certa altura, quando percebi que me poderia servir do desenho, inscrevi-me, de uma forma até um pouco ingénua, num curso de ilustração infantil”, conta Inês, que acabou por se pós-graduar em Ilustração na Universidade Autónoma de Lisboa, aonde agora dá aulas, e se estreou na literatura para a infância com O Duelo (edi. Planeta Tangerina), que venceu o Prémio Nacional de Ilustração em 2022.
Dois anos antes, em 2020, foi a única portuguesa seleccionada para a exposição de ilustração da Feira do Livro Infantil de Bolonha. “Foi uma surpresa, mas abriu-me muitas portas. Quando estás a começar é difícil, porque ninguém conhece o teu trabalho.” Agora é diferente. Amiúde, por entre os seus projectos pessoais, incluindo a edição da revista literária Limoeiro Real, surgem-lhe convites e oportunidades. “Estou a fazer um livro de não-ficção, para crianças a partir dos oito, o que envolve muita investigação, que adoro, e a desenhar para um outro, da APCC [Associação para a Promoção Cultural da Criança], com texto da Susana Moreira Marques, que admiro muito. Em princípio, esse sai ainda este ano. Tenho tido muita sorte.”
GONÇALO VIANA
O sonho sempre foi fazer carreira a desenhar, mas só depois de três anos em Londres, a trabalhar como arquitecto, é que Gonçalo Viana descobriu que, afinal, podia ser uma realidade. “Quando voltei a Lisboa, um bom amigo meu tinha começado a ilustrar. De repente, percebi que era um trabalho.” Agora não se vê a viver de outra coisa. Começou como cartunista no Diário Económico e desde então tem colaborado regularmente com a imprensa, em Portugal e no estrangeiro. Talvez pela forma singular como, com humor e poesia visual, desconstrói realidades complexas. Um talento que também lhe serviu na hora de se estrear na literatura para a infância, com Troca-Tintas e Haja Paciência (ed. Orfeu Mini). “As crianças não põem uns óculos especiais para andar no mundo, vêem as mesmas coisas que nós. É mais uma questão de temáticas e de linguagem. Em termos de ilustração, o que procuro é oferecer-lhes desenhos divertidos e surreais, porque apreciam o humor e a dissonância, e o mais importante, mais do que ensinar qualquer coisa, é fazer com que gostem de livros e gostem de ler”, diz-nos.
“É um trabalho de amor. Primeiro porque, tal como quando trabalhava como arquitecto, há uma marca que fica, neste caso o objecto-livro. Depois porque, de certa forma, estamos a tocar na vida das pessoas. Por exemplo, o Troca-Tintas foi editado na Coreia e eu acabei por ver, já não me lembro como, um desenho feito por uma criança coreana que se inspirou no livro. E isso é fantástico, é como se uma parte de mim estivesse lá.” Para o ano há mais, revela. Está a trabalhar no próximo álbum ilustrado. Pelo meio, espera continuar a arranjar tempo para o essencial: “Para experimentar, para arriscar, para falhar.” O resto é o que chama “trabalho pão com manteiga”.
*Este artigo foi originalmente publicado na revista Time Out Lisboa, edição 671 — Outono de 2024.
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