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Uma carta aberta à cenoura ralada

Escrito por
O Provedor
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Uma salada é o que o homem quiser. Não há limites. Pode ter maionese e legumes aos cubos, como a salada russa. Pode ter pedaços de moluscos marinhos, cebola e pimentos, como a salada de polvo. Pode ter pêssegos em calda, laranja e uvas e ser uma salada de fruta (já agora: esta é uma péssima receita de salada de fruta).

Mas nos restaurantes de Lisboa uma salada é uma salada. Um acompanhamento uno e indivisível composto por alface, tomate, cebola e cenoura ralada – o “topping” de referência para este conduto. Um pormenor de sofisticação desnecessário e praticamente irrelevante, mas que nos faz reflectir: todos os outros legumes estão lavados ou descascados. A cenoura vai um passo à frente: submete-se também à ira de um ralador. Para quê?

O crítico de culinária desta revista, Alfredo Lacerda, é céptico em relação à presença deste legume desfeito. Acha-o desnecessário, um enfeite tolo produzido por algum cozinheiro demasiado entusiasmado com os seus gadgets de cozinha. Mas o Provedor do Lisboeta tem um lugar no seu coração para esta serradura cor-de-laranja, os flocos de cenoura, as raspas de vitamina A. Não acrescentam nada ao prato, não fazem nada pela nossa dieta (trata-se, por regra, de um pequeno montinho) e não enobrecem de nenhuma forma o legume que faz os olhos bonitos. Apesar de ser um elemento a mais na nossa gastronomia, é um hábito carinhoso e tosco que apreciamos. Esta revista nunca irá fazer uma lista dos Dez Melhores Restaurantes para Comer Cenoura Ralada, mas lutará sempre pela preservação deste gesto fútil.

O Provedor do Lisboeta é um vigilante dos hábitos e manias dos alfacinhas e de todos aqueles que se comportam como nabos e repolhos nesta cidade. Se está indignado com alguma coisa e quer ver esse assunto abordado com isenção e rigor, escreva ao provedor: provedor@timeout.com

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