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Youth: esta peça de teatro é um jogo e você decide o final

Escrito por
Miguel Branco
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Youth, nova peça da [In]quietArte com encenação de Leonardo Garibaldi, está no CAL – Primeiros Sintomas. Fizemos parte deste jogo-espectáculo passado numa casa onde o público tem um papel decisivo.

Primeiro o público escolhe o moderador de entre um lote de seis actores. Depois, aquele a quem saiu a fava dá letras (A, B, C, D, E) enquanto anuncia – assim entre o tom de voz de videojogo e uma gravação de apoio ao cliente, se quer que este actor seja a personagem A prima a tecla zero – que neste espectáculo não há tempo.

Há um grupo de amigos, que também são letras/personagens, que vem passar uns dias de Verão à casa de família de um deles a 300 quilómetros de Lisboa. Isso sabemos. O resto, o que vai acontecer, saberemos depois. Mais: escolheremos mais tarde. Sim, que Youth, espectáculo da estrutura [In]quietArte de Leonardo Garibaldi e Filipe Abreu, é mais uma experiência do que uma narrativa. A encenação é precisamente de Leonardo Garibaldi e o texto, bom, o texto não existe.

O moderador dá a ordem para que se faça a primeira cena. Os amigos entram na tal casa e o anfitrião sugere as regras de utilização, normalmente todos se descalçam, conhecem a casa de banho, o quarto, a varanda, a cozinha, a sala. Montam-se as camas – aquela coisa improvisada com colchões tripartidos e sacos-cama – e vai-se comprar o jantar. Ora estas são algumas das marcações definidas, mas tudo o que é dito pelo elenco é dito de improviso e a cada récita a coisa pode ir de “há wi-fi?” a “estou a tentar ser vegetariana, por mim jantamos soja”.

Às tantas o moderador manda parar a cena e pergunta ao elenco e ao público o que acharam, o que gostavam de ver diferente. E assim sucessivamente, a cada cena, neste jogo-espectáculo. “Isto teve para ser uma adaptação de Romeu e Julieta, meio assim Morangos com Açúcar, de um grupo de amigos que vão passar umas férias. Mas o espectáculo foi crescendo e fiquei muito mais interessado na experiência, como é que vou criar um diálogo com o público. Há um objectivo para cada cena, isto é, eles sabem que têm que ir a esses sítios, a forma como chegam lá é que muda sempre”, explica Leonardo.

E muda mesmo. Para quem está na plateia a ser provocado, vá por nós, isto não é como ir ver uma peça onde estamos confortáveis no escuro da nossa cadeira. A coisa enerva, porque, como em tudo, os afectos rapidamente mostram o tornozelo e às tantas já queremos que B ou C sejam felizes e que D morra. Sim, porque o moderador, numa das pausas, também nos diz que no final há alguém que morre. Não precisa de ser daqui, mas há alguém que morre.

O ambiente é muito teenager, malas, águas, pacotes de batatas fritas, os pertences amontoados no sofá, telemóveis sempre na mão, dificuldade em dormir porque há aqui danças inacabadas que geram insónias regulares. E o público no meio disto, com poder de decisão, a querer inclinar a história para o seu lado. “Adoro texto, quero muito encenar textos, mas acho que tenho de perceber onde estou a nível criativo, qual é a minha linha. Sinto que a forma mais fácil é criando um diálogo, é perguntar. Há sempre um problema com este tipo de criação, que é não parecer virtuoso, mas aqui o que importa é o público, que cada espectador saia a pensar que teve espaço para dizer o que queria e que o que disse teve consequências no que estava a ver”, diz o encenador. E há lá melhor coisa do que poder decidir o final de uma história, quantas vezes não estamos de fora a suspirar por mudanças drásticas no enredo? Muitas. Essa ansiedade acaba em Youth. No fim é seguir para casa certo das decisões tomadas. Ou voltar no dia seguinte e virar tudo ao contrário.

Encenação: Leonardo Garibaldi. Com: Ana Valente, Bruno Bernardo, Filipe Abreu, Mário Coelho, Rita Silvestre e Soraia Tavares

CAL – Primeiros Sintomas. Rua de Santa Engrácia, 12 A. Qui-Ter 21.30. 6-8€ 

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