Quando entro num imponente hotel de cinco estrelas, sou recebida com sorrisos e simpatias de quem passou pela Escola de Hotelaria, encaminhada por salas e escadas de pedra antiga para uma bonita sala de jantar e peço, como prato principal, uma garoupa com puré de alho francês que vale 22 euros, fico à espera que venha um prato com a mesma elegância que o cenário onde é criado. E que corresponda ao valor que por ele pedem. Ora isso não aconteceu n’A Fábrica de Santiago. O que chegou à mesa foi uma posta de garoupa de pele tostada, o interior ligeiramente seco, assente numa cama de espinafres e salicórnia, tudo misturado sem cuidado, o puré à volta espalhado de forma tosca.
Falando deste prato em específico, mas à luz do que foram todos os outros que vieram para a mesa, senti-me a conhecer o trabalho de alguém recém-saído da Escola de Hotelaria (o que sei não corresponder à verdade), com todas as ideias-chave do ensino. Vi a combinação de sabores – esqueci-me de referir que o puré vinha pingado com azeite de trufa, essa praga que assola tudo, desde pizzarias a restaurantes de hotel –, a linha do empratamento, os pinguinhos e folhagens que ajudam o prato a ganhar vida... Achei que havia muitas boas intenções, havia técnica e produtos de qualidade (apesar da secura da posta, o sabor da garoupa denotava frescura). Mas o que veio para a mesa não encheu o olho, não teve aquele aspecto bonito de um prato-para-fotografia, e nem sempre valeu os euros pedidos. E acima de tudo não encaixou com um boutique hotel na Costa do Castelo, cujos quartos e interiores dão vontade que seja Dia dos Namorados todos os dias.
Veja-se, logo de arranque, o couvert. Um cesto de pão alentejano, quatro fatias muito grossas – estando num hotel não pude deixar de achar que são as mesmas que se põem no cesto ao lado da torradeira rotativa do pequeno-almoço –, uma crosta estaladiça, mas um interior frio e massudo. Ao lado, azeite com vinagre balsâmico (boring), pasta de atum (sim, atum) e manteiga de ervas com alho. Está bom para uma tasca gourmet do Bairro Alto, está mal para um hotel cinco estrelas. Veja-se também o amuse-bouche, um folhadinho tosco de queijo de cabra em massa filo, em cima de azeite e vinagre, debaixo de uma chuva de cebolinho. Um embrulho muito em voga há 10 anos, que julguei nunca mais ter de pôr a vista em cima.
Muito boa a sopa de peixe, um creme picante, com pedaços de peixe desfiado. Mas cara: 7,50€. Bons também os legumes assados com esparguete dos mesmos e molho de tomate. Bom, mas trapalhão. Uma torre de curgete, beringela, abóbora e espargos, em cima de uma pequena brunesa de legumes, sobre um niquinho de molho de tomate. Funcionaria melhor como acompanhamento de uma carne ou peixe do que como um prato a solo.
Em dose XL, cortado em triângulos (!), o lombo de novilho, com gratin de legumes e jus de vinho do Porto. Tudo montado à escola de cozinha, o gratinado de legumes típico dos anos zero. Um prato bom, mas a não valer 23€.
De sobremesa um brownie de chocolate, coulis de morangos e gelado de nata. Tudo servido num prato de sopa de tamanho grandinho, cujo resultado só podia ser um: enjoativo.
Acabo como comecei: pela simpatia e sorrisos de quem atende. Serviço condizente com as estrelas do hotel, comida a pedir mais aprumo e imaginação. Ou então preços mais baixos. 42,50€ por pessoa, só com um copo de vinho é ajustado à turistada que visita o Castelo. Tentar abrir assim o hotel aos lisboetas pode não correr bem.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.