Antiga Camponesa
Francisco Romão PereiraAntiga Camponesa

Crítica

Antiga Camponesa

4/5 estrelas
O restaurante de André Magalhães é um exercício exigente entre sazonalidade e consistência. Alfredo Lacerda teve lá um almoço satisfatório e um jantar muito bom
  • Restaurantes | Português
  • Chiado/Cais do Sodré
  • Recomendado
Alfredo Lacerda
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A Time Out diz

Quando lá chegámos, o restaurante estava lotado, pouco passava das 20.00. Eu e a minha companhia, sem reserva, pensámos desistir, mas fomos aconselhados a esperar. Em boa hora. Passados 15 minutos, começou a debandada. 

No tempo em que o Bairro Alto era um território lisboeta, frequentado por portugueses, 20.30 era a hora a que os restaurantes começavam a encher. Mas isso era antigamente, quando no Adamastor residia outra Camponesa e o preço da habitação em Lisboa não comia mais de 80 por cento do salário médio. 

Hoje em dia, quem manda nos horários e nas rendas são turistas e expats — e come quem quer, paga quem pode. Na sala, nessa noite, podiam só estrangeiros, tudo a mastigar receituário português — este firme e melhor do que noutros tempos. 

Apesar do cozinheiro executivo ser um irlandês, Gareth Storey, o menu era André Magalhães vintage. Ainda que quase sempre ausente, o chef e gastrónomo é a cara e a carta do novo projecto do trio à frente desta Antiga Camponesa, o mesmo que fez da Taberna da Rua das Flores um sucesso, e onde também entram os sócios do costume, Bárbara Cameira e Tiago Alves. 

As diferenças para a Taberna, a cinco minutos dali, estão sobretudo nisto. Se na Taberna passou a haver um menu estável de pratinhos para partilhar, aqui manda o que está em forma no mercado e nos fornecedores habituais do grupo; e manda — ainda mais — essa máquina de expelir e reinventar receitas que é a cabeça de André Magalhães. 

Cozinhar com as estações não é um exercício fácil, pelo que muitos dos que enchem a boca com a “sazonalidade” acabam por tropeçar num ou noutro tomate em Dezembro, num ou noutro morango em Janeiro — ou então nunca conseguem consistência. Não será o caso da Antiga Camponesa.

Neste jantar, a carta podia ser um excerto queirosiano, a varrer o continente e as ilhas, com nota artística aplaudida pelo abade Custódio. Alguns exemplos. Mexilhões com manteiga de chouriço. Cogumelos Língua de Vaca [é o nome dos cogumelos] de fricassé. Barrica de atum curada com molho de vilão. Lagartos de porco alentejano com salada de favas. Silarcas à Gomes de Sá. 

Do que se provou, tudo bem feito e saboroso, com destaque para a elegância do fricassé, para o contraste da acidez do molho de vilão com a gordura do tunídeo, para a delicadeza das favinhas (descascadas, tenríssimas) que acompanharam os lagartos e para a frescura da panqueca de acelgas e agriões, com o chèvre da Maçussa a espevitar tudo.  

Sublinhar ainda a ostra que arrancou a refeição, de calibre intermédio, gorda e fresca como poucas, e o clássico azeite da colheita da família de Magalhães, instalada na povoação de Carlão, em Trás-os-Montes, mais suave do que os transmontanos típicos, equilibrado e belíssimo. 

O serviço ao jantar esteve a grande altura — na competência, ritmo, simpatia e atenção —, mas o mesmo não se pode dizer da experiência ao almoço. Aliás, o almoço foi em tudo mais frouxo do que o jantar — e nem o isco de um menu mais económico (enfim, enfim) me livrou de amargos de boca. 

O restaurante parecia outro, e em parte era, porque a equipa de sala era diferente e a de cozinha estaria a meio gás. Apesar da sala quase vazia, e de haver metade das opções em carta, a comida foi entregue lentamente e começou oleosa, com carapauzinhos fritos — de textura moída — e um pratinho de enchidos fritos a nadar em gordura. 

Destaque, ainda assim, para o “magusto” de pão, couves e ovo estrelado, maravilhoso, e para a tiborna de cebolinhas novas assadas, com requeijão, também notável. 

Quanto ao espaço, é confortável e bonito, sem ser especial. 

Ponto comum negativo a ambas as refeições: os preços. Almoço com menu de almoço (!), sobremesa e um copo de vinho: 40€ por pessoa. Jantar a dois, com a garrafa mais barata da carta (interessante e carote), uma ostra, um couvert, uma água, quatro entradas (sem pratos principais!) e uma sobremesa, tudo para partilhar: 45€ por cabeça. 

Não vale a pena discutir-se da justiça da factura ou se isso é responsabilidade de André Magalhães e companhia ou se é culpa do país e do desgoverno de cinco séculos. O que é uma evidência é que estes preços são puxados para os portugueses ou, pelo menos, para o português médio, principal leitor desta rúbrica. 

O meu conselho, por isso, é que façam umas poupanças, escolham jantar em grupo de quatro pessoas e que reservem ou vão no segundo turno, mais relaxados, a seguir aos americanos. Outra opção — informou-nos uma das empregadas de mesa — são as tainadas servidas nos almoços de sábado, cozinhadas pelo próprio André Magalhães, a 27€ por cabeça, sem vinhos.

Detalhes

Endereço
R. Marechal Saldanha 25
Lisboa
1200-086
Preço
40-60€
Horário
Seg-Sáb 12.00-15.30, 19.00-22.30
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