Houve um tempo em que os restaurantes chineses se transformaram em japoneses. O fenómeno aconteceu um pouco por todo o mundo à mesma velocidade a que o Ocidente descobriu o sushi. Essa mudança só se deu porque os chineses, pais da gastronomia asiática, eram mesmo capazes de fazer rolinhos de olhos fechados e mãos atadas.
Em todo o caso, para os gourmets tugas foi uma chacota pegada.
Sucede que o mesmo oportunismo comercial acontece agora com a nova vaga de asiáticos trendy que surgiram em Lisboa como cogumelos shitake. A diferença está nisto: à frente dos asiáticos cool estão europeus que nunca rechearam uma gyoza mas sabem umas coisas sobre marketing, conhecem umas pessoas e fizeram umas viagens.
No caso em concreto do Atari Baby, o dono é Akis Konstantinidis, um grego a viver em Portugal há mais de vinte anos, que abriu um restaurante de conservas de inspiração semiportuguesa, o Can the Can, e dois semimexicanos, o Mez Cais e o Las Ficheras, todos muito bonitos e situados no olho do furacão turístico de Lisboa.
Neste Atari Baby, ao Cais do Sodré, Konstantinidis terá querido trazer para Lisboa o mesmo tipo de ambiente e cozinha que viu em Tóquio, valendo-se do imaginário dos jogos de computador dos anos 80. O restaurante, com néons e mesas rebaixadas, tem uma vibração simultaneamente futurista e decadente. A música electrónica marca o ambiente e faz as pessoas baterem o pé, antecâmara para uma noite agitada nas casas nocturnas em redor.
Apesar do preâmbulo, é preciso dizer que a comida, de influência japonesa, também não é má. Há inclusive coisas acima da média. O arroz do sushi, por exemplo, estava muito bem feito. Gostei igualmente do tori-kara-age, uma tempura de frango. O problema é que, fora isso, o resto foi medíocre.
A tempura de camarão surgiu com o polme pesado e ensopado em óleo. As gyozas de vegetais estavam demasiado cozidas, a massa mole e grossa, sem a devida caramelização na chapa. O ramen comia-se mas não tinha a profundidade e a complexidade do caldo japonês tradicional. A salada de algas wakame bem aromatizada com óleo de sésamo mas excessivamente doce. As takoyaki eram as clássicas bolas de polvo mas só com um longínquo aroma ao molusco. O yakitori de frango sem nada de especial, espetadas secas e monótonas besuntadas no molho enjoativo do costume. Por fim, o sashimi de atum e salmão apareceu seguro, mas com os peixes (para toda a obra) sem expressão
Pior e muito significativo da filosofia destas casas: a sobremesa. Na segunda visita, a empregada recomendou um cheesecake de maracujá, “muito saboroso”. Veio uma coisa desconstruída, que era um montículo de base de bolacha de gengibre, com um creme manhoso industrial por cima e uma polpa de maracujá de lata capaz de encher a boca de aftas antes de o café chegar. Preço: cinco euros.
Tudo junto, visto e revisto, este Atari Baby é um sítio razoável para se jantar, aquecer motores e ver miúdas e miúdos giros. O problema é que a comida não entusiasma, sendo que alguns pratos têm mesmo atalhos que prejudicam. No fundo, como nos sushineses.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.