A vista para a cozinha da Bread and Friends, no número 8 da Avenida Fontes Pereira de Melo, faz parar quem passa. É que o chef de padaria, Tiago Vaz, entra ao serviço pelas 03.30 (quatro horas antes do horário de abertura, às 07.30) e é possível vê-lo a trabalhar a partir da rua. Lá dentro, a paisagem estende-se, com uma das paredes em vidro. A ideia é tornar o processo totalmente transparente e convidar os clientes a acompanhar a produção, tanto do pão de fermentação longa como da pastelaria de assinatura. O conceito é do grupo Sana, que não se esqueceu do hábito bem português de beber café e apostou também numa máquina de torrefacção, instalada mesmo à entrada do espaço.
Crítica
E lá fui arrastada para mais um brunch dominical, num daqueles sítios que me arrepiam de caras: cá tínhamos mais um híbrido entre McDonald’s e lobby de hotel de 3 estrelas e meia, tudo assim muito a querer parecer sabe-se lá bem o quê.
Em direcção à mesa, passei pela montra que olhei de soslaio, tentando não resvalar do meu desinteresse, mas logo fui impelida a analisá-la com genuína atenção: a oferta era muita, muitos clássicos da pastelaria francesa, muitos folhados bonitos, e pronto, também aquelas coisas de agora, uns inquietantes fulgores cromáticos.
Na mesa aterraram umas quantas variedades. Atirei-me ao cruffin de doce de leite (2,50€). Que extraordinária criação! A parte exterior eram camadas folhadas tostadas, estaladiças, com aquele toque castanho da manteiga forneada. E mal se ultrapassa essa casca, encontramos uma densidade de massa levedada, tão gulosa, e nem sequer entendo como é que aquilo é uma mesma massa, conseguindo duas texturas tão diferentes! O recheio de doce de leite é muito cremoso, abaunilhado, na quantidade certa para aligeirar a massa, e os cubinhos de amêndoa queimada no topo encerram em harmonia esta trinca castanha.
Na senda do folhado, enfiei de seguida o dente numa perfeitinha tarte de pêra (2€), em forma de, imagine-se, pêra.
O estilo era o mais clássico possível: a massa bem folhada e de sabores irrepreensíveis, uma finíssima camada de creme de pasteleiro equilibrado, só disposto para acamar devidamente as fatias de pêra, exímias, no ponto perfeito de cozedura, mantendo uma resistência vigorosa à trinca. E que dizer do tostado abusado na base, introduzindo uma dissonância na suavidade da restante construção? Achei perfeita.
De sobremesa, comi um muffin de limão (2,50€), um pouco menos consensual: se a massa era deliciosa, muito parecida à receita tradicional das madalenas (o melhor bolinho do mundo), o creme de limão – um casamento entre um curd e um glacé – apareceu demasiado doce e o limão soou-me um pouco sintético. E depois, era enfeitado por um farelinho verde (que tara será esta de enfiar coisas verdes nos bolos?) com um sabor perfeitamente inútil. Ainda assim, a perfeição da massa imperou. E o conteúdo venceu a forma.
*Os críticos da Time Out visitam os restaurantes de forma anónima e pagam pelas refeições.