1. Mesa de Marisco no Ramiro
    Fotografia: Arlindo CamachoMesa de marisco no Ramiro
  2. Restaurante Ramiro - Sala
    Fotografia: Arlindo Camacho
  3. Restaurante Ramiro - Ameijoas
    Fotografia: Arlindo Camacho
  4. Ramiro
    Fotografia: Arlindo Camacho

Crítica

Cervejaria Ramiro

4/5 estrelas
  • Restaurantes | Frutos do mar
  • Intendente
  • Recomendado
Alfredo Lacerda
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A Time Out diz

Ei-lo à nossa frente. O lobo mau da Almirante Reis, o monstro de cauda serpenteante, o grande papão da restauração lisboeta. São 19.05, quinta-feira de Julho, quando enfrentamos a fila de espera do Ramiro.

Cá fora mais de 70 pessoas, umas espalhadas pelo passeio, outras dentro da sala de espera exterior, um rectângulo fechado com decoração de merchandising de cervejeira. Aproximamo-nos da máquina das senhas, à porta, tiramos uma e ficamos a observar, fechados nesse galinheiro internacional.

A tal máquina chama os números ao mesmo tempo que eles aparecem num ecrã, qual repartição de Finanças. Mas não é fácil perceber a lógica da fila. Um grupo de japoneses acabados de chegar entra directamente sem passar pela máquina de partida. 
O funcionário à entrada confere uma lista de nomes manuscrita, fala por um walkie talkie, abre-lhes caminho.

Mas afinal pode-se reservar no Ramiro?, pergunta-lhe o meu amigo. “Pode-se, sim”, responde o recepcionista. “Mas só por email”, concretiza. (Cheira-me a spam, mas em todo o caso aqui fica o endereço: geral@cervejariaramiro. pt.).

Logo a seguir entra um tuga 
de camisa florida, justa e aberta, abraça o homem, sorrisos e palmadões nos costados. Acto contínuo e está lá dentro, para escândalo silencioso de camones e conterrâneos.

É melhor bebermos qualquer coisa. Ao balcão dão-nos duas fichas, uma espécie de moedas,
e mandam-nos regressar ao galinheiro. É aí que está a torneira onde nós próprios introduzimos as fichas e nós próprios tiramos a cerveja que nós próprios pagamos (2€). Pelas 19.45 a máquina chama-nos: quarenta minutos depois, é a nossa vez.

No interior, um bruá enche o piso térreo como no refeitório
da universidade. Indicam-nos que subamos ao primeiro andar. Nas salas em cima, longe da cozinha principal, a turba está ainda mais solta e ruidosa. Há jovens americanos aos urros, 
uma mesa de mulheres etilizadas entremeando-se com uma mesa de homens etilizados, imperiais voando entre mesas, som de panelas, pratos, copos, um empregado esbracejando uma lagosta histérica no ar como um número de circo, gargalhadas, a haste do bicho espetando o braço do meu amigo, siga a marinha, siga o marisco.

Um casal de namorados ao nosso lado, transforma-se no centro das atenções. Ele parece vocalista de uma banda indie, barba comprida, ela parece namorada de um vocalista de uma banda indie, magra, saia abaixo do joelho e t-shirt. Pedem tudo do bom e do caro e muito. Lagostins, camarões tigre, por fim uma lagosta gigante. Quando a travessa da lagosta poisa, fumegante, o bicho aberto em dois, ouve-se uma exclamação de espanto, o som no estádio quando Roger Federer falha um smash fácil. Um grupo de brasileiras levanta-se de máquinas fotográficas em punho, cerca o casal e dispara sem dó sobre o crustáceo esventrado. No momento da factura, são
 240 euros, preço que podiam ter pago num jantar romântico num Michelin, mas que pagam ali alegremente, deixando mais uma nota de 20 e moedas de gorjeta.

Mesa pronta, tablet para vermos o menu. Calha-nos um empregado tristonho, uma excepção. A maior parte são alegres e extrovertidos, alguns com muitos anos de sala e de Ramiro, grandes especialistas na matéria. Começamos com percebes, grandes, carnudos, pena estarem ainda muito quentes (55,17€/kg. Nota: todos os preços acabam em décimas pouco redondas. O Ramiro tem
os preços mais esdrúxulos da restauração nacional). Seguem-se as ostras (11,97€/kg), uma para cada, frescas e gordas, de calibre ligeiramente maior do que o tamanho premium.

No entretanto, já chega uma nova dose de torradas de papo-seco empapadas em manteiga, e ainda bem — passam 30 minutos até chegar o próximo prato, para muitos o rei do Gambrinus, os incontornáveis carabineiros. Os bichos são finalizados na chapa, mas devem primeiro ter sido cozinhados rapidamente em água com bastante sal e malagueta. Vêm inteiros numa poça de margarina evitável, com gomos de limão para servir a gosto. Deve-se primeiro separar a enorme cabeça do corpo, com o máximo de cuidado para 
os sucos não fugirem: a ideia é chupá-la, mastigar bem a casca, fazê-la em pedacinhos. Não é bonito de se ver, mas sabe bem. Como em quase todas as coisas de comer, é na casca que está o sabor. Confecção impecável, a carne suculenta, saborosíssima, um petisco extraordinário, 15 euros que devemos gastar (81,35€/kg).

Para finalizar com os mariscos, a santola (23,17€/kg). O empregado mostra-a na mesa antes de ir para 
a panela. Já não está activa, mas é pesada e ovada. O recheio serve-se na carapaça, sem artimanhas mas prejudicado por resquícios da água da cozedura, excessivamente salgada e, tal como acontecera com os percebes, ainda muito quente.

Por fim, o prego do lombo (4,17€) sempre num nível extraordinário, com o alho no ponto certo, o sal no ponto certo, bife tenro, fino, mal passado. Aconteceu, contudo, uma mudança de marca de mostarda — e não foi para melhor.

Balanço. Jantar de bom nível. Houve erros, houve a espera, mas no final comeu-se bem e pagou-se pouco. Eu e o meu amigo tentámos adivinhar a conta – e pecámos ambos por excesso: pusemos mais 50 euros do que acabou por ser
a factura, justíssimos 40 euros a cada um.

Há outras marisqueiras com bom marisco em Lisboa, não há nenhuma com esta relação qualidade/preço. Depois, o Ramiro tornou-se num fenómeno. É impressionante como o restaurante é hoje uma fábrica sofisticada de comida
– e é interessante observar esse espectáculo de logística e cozinha. Basta pensar que ao longo da refeição mudaram-nos de prato quatro vezes, e que isso significará mais de 2000 pratos numa noite – e podemos especular sobre outras contabilidades e admirar o resultado.

O problema maior é, claro, 
a espera. Desde que Anthony Bourdain pôs a casa no seu programa No Reservations (e depois dele muitos outros, noutros programas), que conseguir mesa é um calvário. Mas não há alternativa. A maior fila da Almirante Reis continua incontornável.


*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.

Detalhes

Endereço
Avenida Almirante Reis, 1 H
Lisboa
1150-007
Transporte
Metro Intendente. Eléctrico 28
Preço
40-80€
Horário
Ter-Dom 12.00-00.00
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