A melhor coisa do Coyo Taco é ficar na rua a beber margaritas e a ver as pessoas passar. O mexicano do Príncipe Real tem um balcão virado para a calçada, passadeira de turistas de Birkenstock empurrando carrinhos Maclaren, e podemos estar de cotovelo no parapeito da janela-bar a bebericar esta sofisticação enquanto o corpo se abastece de vitamina D. No primeiro almoço, batia um sol de alterações climáticas e o azul eléctrico da casa tornava o sítio ainda mais estival, a pedir chinelos e calções, tequila e playlist de hip-hop hispânico.
A refeição abriu assim na rua, com uma coyo margarita, da lavra do mixologista do Pesca, Fernão Gonçalves. Segundo a carta, leva tequila Olmeca, lima e tajín. O “tajín” deve referir-se à marca comercial Tajín, à base de chiles, lima desidratada e sal marinho, e era o pó que bordejava o copo. Fresca, equilibrada, com uma acidez cítrica veraneante. Seguiu-se um outro cocktail, desta feita com tequila Jose Cuervo, ananás assado em sumo e hortelã, com um gelado paleta do mesmo no topo – açúcar excessivo para pré-almoço. O preço do primeiro cocktail não ofendeu (6€), o último custou o dobro e ofendeu um bocado. Acompanhados do guacamole coyo (8€, finas e crocantes as chips, o guacamole pecou pelo abacate, verde e insípido), à laia de entradinha para ensopar álcool, foi brincadeira para 26 euricos de entradas e bebidas. Tesos mas felizes.
Uma vez lá dentro, o restaurante é uma sala comprida com a cozinha aberta a correr paralela às mesas, de uma ponta à outra da sala. O formato é parecido com o do vizinho Tapisco (também Multifood), embora sem lugares ao balcão. Na cozinha quase só estrangeiros, do lado de cá quase só empregadas portuguesas. A avaliar pelo volume da música, o que se pretende é aquele ambiente festivo de taqueria, mas o que temos é diferente. Entre os funcionários, eles parecem imigrantes inexpressivos e maquinais de cadeia de fast food; e elas parecessem estagiárias simpáticas e ansiosas. A clientela, por seu lado, mostrou-se igualmente amorfa, quase só turistas do tipo de turistas que vão a Portugal e decidem que o que é mesmo fixe é comer mexicano.
De resto, não há a vibração das coisas novas, talvez porque o Coyo Taco não seja uma coisa nova. Apesar de ser um projecto Multifood, o primeiro restaurante Coyo nasceu em Miami e há outros quatro no mundo. E nestas coisas, mesmo que não saibamos da história, dá a ideia de que se sente a cópia. Pode ser só porque está tudo demasiado estilizado e arrumado, tudo demasiado certinho com o logotipo, a decoração, o design e o HACCP. Ou pode ser porque falta a alma do dono, do cozinheiro, do chefe de sala. Falta a pessoa a marcar o restaurante.
Estava nestas deambulações quando surgiu a minha companhia, um amante de mexicanos (restaurantes) e de comidas picantes. Começámos pelo taco mais popular do Coyo, as carnitas de pato: o bicho desfiado, cebola roxa, coentros e queijo em pó cojita (de vaca, ao estilo Parmesão) a dar-lhe uma injecção de umami. Logo ali percebemos que íamos precisar de mais fogo e começámos a testar os picantes. Puseram-nos cinco tacinhas diferentes sobre a mesa, cada uma com seu molho picante. Disseram-nos que a ordem obedecia à escala de Scoville, do mais picante para o menos picante. Provámos o primeiro e era saboroso e fumado e pouco picante. Seguimos a ordem até ao número cinco e o número cinco, também saboroso, continuava a ser pouco picante. Não se notava qualquer escala. Podíamos comê-los todos à colher sem um rubor na face.
À mesa chegou logo o segundo taco, o cochinita pibil, porco com picles de cebola e achiote, queijo, coentros e, supostamente, habanero. O habanero, como se sabe, é um chile mexicano já com poder incendiário, mas aqui praticamente não se sentiu. O achiote estava igualmente discreto. Condimento popular no Caribe, é conhecido em Portugal como açafroa, sendo muito usado na culinária açoriana em molhos e sopas de peixe. Em todo o caso, para darmos intensidade ao cochinita socorremo-nos de outro molho arrumado na mesa, este em frasco comercial. O Valentina, apesar de marcar apenas 900 unidades na escala de Scoville, revelou-se uma maravilha. A consistência anda entre o Sriracha e o Tabasco, e é frutado e acídulo, feito à base de chiles puya, da região de Jalisco.
Veio a seguir o taco de pescado, um filete de robalo com pico de gallo, guacamole, coentros e alioli de chipotle (outro tipo de chile), tudo confinado numa tortilha de trigo. E ainda a tempura de peixe com guacamole. Ambos assim-assim.
A toada do assim-assim haveria de se repetir noutro almoço onde se provaram os frijoles, burritos de carne assada (uma massa mole quase indistinta) e o taco de pollo al carbon (outra massa mole e farinhenta). Melhor do que a média, a quesadilla de camarão, mas não tão boa para justificar os 16 euros. Acompanhou o repasto uma horchata, aqui feita de leite de arroz e não da tradicional chufa valenciana, bem mais interessante e surpreendente.
Nas sobremesas, as opções são curtas, com uns churros pesados e gordurosos, para molhar em doce de leite e chocolate (fraquinhos); e uns gelados paletas de vários sabores, industriais e medianos os provados, de limão (a lembrar o recheio do Fizz) e doce de leite (a lembrar baba de camelo).
Em síntese. O Coyo Taco é um sítio agradável com uns cocktails bons e comida mexicana mediana. É verdade que quase tudo é fresco e feito na casa, mas isso não passa para o prato. Faltou quase sempre sabor – como se andassem a poupar nas marinadas e nos temperos. E faltou o prazer do risco e do picante.
Comparando com outros mexicanos da cidade, como o Pistola y Corazon ou o Cascabel, este Coyo está um nível abaixo na comida. Comparando com outros sítios onde se pode beber uma boa margarita na rua, todavia, não tem rival.
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