Foi um ano bom para si. Foi considerado o melhor chef do mundo e o DiverXO entrou finalmente na lista do World’s 50 Best Restaurants, em 20.º lugar. O que é mais difícil no seu trabalho?
O mais difícil, desde que abrimos o DiverXO, é conseguir continuar a surpreender as pessoas depois de 15 anos – e o DiverXO continuar a ser uma referência a nível mundial. Acho que isso é o mais difícil.
Quão difícil é encontrar o equilíbrio entre sabor e criatividade?
Para mim o mais importante numa mesa é a combinação de criatividade e sabor. Às vezes, perde-se o foco do sabor, em detrimento da criatividade e do conceito do prato. Ambas são importantes e é muito difícil fazer um conceito que seja muito criativo e que tenha muito sabor, mas quando os dois ocorrem no mesmo prato é a máxima expressão da emoção numa mesa.
Como muitos outros chefs, tem vários negócios. Qual é a importância disso e como é que consegue conciliar tudo?
Graças a esses outros negócios, divirto-me muito mais no DiverXO. Tive muitos anos a fazer só o DiverXO. Fazer outros negócios, outros restaurantes, outro tipo de cozinhas, ajuda-me a cozinhar no DiverXO com mais vontade. Digo sempre que cozinho no DiverXO e que, nos outros negócios, faço as criatividades: sou eu quem pensa os pratos, mas tenho uma equipa muito boa à minha volta e são eles que levam a cabo o dia-a-dia dos restaurantes. A nossa filosofia não é abrir muitos restaurantes, não vamos abrir 50 restaurantes no mundo. Já o podíamos ter feito porque já nos ofereceram muitas oportunidades para o fazer – mas não temos pressa. Tudo o que fazemos, queremos fazer bem. Eu envolvo-me muito em todos os meus restaurantes, envolvo-me muito quer seja um foodtruck de cachorros quentes (GoXO), quer seja o StreetXO. Envolvo-me muito em todos os negócios. É por isso que não podemos abrir muitos restaurantes, eu sou só um.
Mas tem vida?
Tenho vida, é difícil, sobretudo quando estás tão dedicado aos teus negócios e ao teu restaurante. É difícil separar o dia-a-dia do restaurante e dos negócios da vida pessoal, mas nos últimos anos dei-me conta de que é necessário. Se não encontras o equilíbrio entre uma coisa e outra, não há futuro.
Receber o título de melhor chef do mundo ou ter três estrelas Michelin pesa? Sente a pressão?
Eu sinto sobretudo a pressão das expectativas dos clientes. O facto de sair em diferentes publicações, seja Michelin, Best Chef Awards ou o 50 Best, que valorizam e premeiam o nosso trabalho, significa que as pessoas chegam ao DiverXO com mais expectativas. O que mais pressão me gera é atingir as expectativas dos meus clientes, quero que saiam do restaurante e pensem que tudo valeu a pena, que é verdade, que se superam as suas expectativas.
E como vê a crítica gastronómica?
Bem. Acho que cada vez há mais gente preparada para falar de gastronomia, não somente os críticos gastronómicos, mas o público em geral. Agora, o cliente está cada vez mais preparado para entender o que come e ter uma opinião sobre isso.
Diz que as coisas estão a mudar para melhor. De que forma?
Os tempos mudam e tudo muda. Por exemplo, no tema da crítica, hoje há muita gente que, não sendo crítico, é cliente, viaja pelo mundo para comer, e ganha uma voz com [plataformas como] o Instagram, [onde] diz o que lhe parece. Tudo muda. No mundo da indústria, creio que as pessoas que chegam agora para ser cozinheiros ou empregados de sala também pensam de forma diferente. Quando comecei, há 22 anos, era normal trabalhar 16 horas por dia. Acho que os tempos mudaram, as pessoas mudaram: querem trabalhar e trabalhar no que gostam e trabalhar duro, mas também querem ter vida pessoal. É normal, é saudável e devemos lutar para que seja assim.
Vale tudo na cozinha?
Não. Acredito que não, está bem que haja muita liberdade na cozinha. É verdade que não há regras escritas sobre o que vale ou não, mas nem tudo vale.
O que o continua a surpreender?
É difícil encontrar pessoas que surpreendam agora, mas quando vejo um cozinheiro com muito talento e que faz alguma coisa diferente, sobretudo algo diferente que não se parece com nada, é quando me surpreendo. Quando encontro coisas que não são iguais às de nenhum outro restaurante.
Espanha tem uma tradição gastronómica muito forte. Por que sente necessidade de romper com isso? A verdade é que faz as coisas de forma diferente...
Eu faço diferente, mas para poder fazer diferente tive de aprender durante muitos anos a tradição gastronómica espanhola. Fazemos um pouco de tudo. O DiverXO é um espírito livre a nível criativo, pretende ser único no mundo e não se parecer com nada. Bebe da gastronomia espanhola, mas também bebe das gastronomias de outras partes do mundo, é um restaurante absolutamente livre a nível criativo. Mas, para chegar aqui, tive de aprender todas as bases da cozinha tradicional espanhola. Eu gosto de cozinhar tudo, gosto de dizer que sou um cozinheiro total, porque tão depressa gosto de fazer cozinha vanguardista no DiverXO (foto) como uma paelha.
E como descreve a sua cozinha?
Creio que é muito criativa, vanguardista, com muito sabor, muita alma, muita raça, muito intensa e creio que única. É difícil dizer que é melhor ou pior, é até impossível. O que podemos dizer é que diferente de tudo, é única.
É por isso que não se sente o melhor do mundo?
Dizer quem é o melhor do mundo é muito difícil, ainda por cima numa profissão como a nossa onde não existem verdades absolutas. Quem é o melhor cozinheiro do mundo actualmente? Há muitas pessoas, começando por Espanha. Há cozinheiros muito bons também aqui em Portugal, em França, em Itália, em Singapura, em Nova Iorque. Há cozinheiros muito bons em todo o mundo. Dizer quem é o melhor do mundo é difícil, e a verdade é que não me sinto o melhor do mundo.
Então quem é para si o melhor chef do mundo?
Também não sei. Não sei se isso do melhor cozinheiro do mundo existe. Acho que houve gente que ao longo da história mudou a gastronomia mundial, pessoas como Joël Robuchon, como Ferran Adrià. Também não digo que sejam os melhores do mundo, mas mudaram a história da gastronomia mundial. Dizer quem é o melhor acho que é impossível.
Mas qual é a importância deste título para si?
É um título importante reconhecerem o teu trabalho a nível mundial. Eu interpreto o título não como sendo o melhor do mundo, mas como sendo um dos melhores do mundo – e reconhecerem-te como um dos melhores do mundo é incrível. É verdade que é muito importante e gostamos disso, mas acredito que há essa diferenciação, acho que o prémio não é para o melhor cozinheiro do mundo, o prémio abre-te a porta para que te reconheçam como um dos melhores do mundo.
E o que se segue agora?
Muitas coisas. Uma das coisas de que mais orgulho tenho na minha carreira é encontrar sempre novos desafios para continuar a avançar. Vamos abrir um restaurante novo em Dezembro/Janeiro em Madrid que se vai chamar RaviOX, uma espécie de dumpling bar, mas vinculado ao mundo da pasta em geral. Vamos abrir o StreetXO no Dubai no ano que vem e vamos mudar o DiverXO de localização em Setembro de 2023. Vai ser uma localização incrível, que permitirá redefinir as regras do nosso próprio universo. Há sempre uma data de coisas, além disso, sou jovem, tenho 41 anos, tenho muito por fazer, tenho muita vontade e muitos sonhos.
Sente-se uma rock star?
Não me sinto uma rock star. É verdade que me dei conta de que há muita gente que admira o meu trabalho e admira o que fazemos, que me admira como pessoa. E isso é um pouco pesado, impõe-me muito respeito. Não me sinto uma rock star porque entendo que tudo o que geramos é a consequência do que fazemos. Sinto uma pessoa muito querida e admirada, mas não uma rock star.