1. Eliseu dos Leitões
    Francisco Romão Pereira
  2. Eliseu dos Leitões
    Francisco Romão Pereira

Crítica

Eliseu dos Leitões

4/5 estrelas
Em Carnide há um sítio com nome de restaurante da Bairrada e um porquinho a condizer, garante o crítico Alfredo Lacerda.
  • Restaurantes
  • Carnide/Colégio Militar
  • Recomendado
Alfredo Lacerda
Publicidade

A Time Out diz

Já se sabe que encontrar um bom leitão à Bairrada em Lisboa é mais difícil do que encontrar um bom governo. Mas sucede que ele existe, algures em nenhures. 

A caminho do restaurante, com dois jovens ainda a recuperar das coboiadas no NOS Alive, um deles questionou: “Pai, estás a levar-nos para onde? Nunca estive aqui? Isto é o quê?”

Isto era Carnide, a caminho de Telheiras. Da estrada principal, cortámos para a urbanização do Bairro da Horta Nova e, logo ali, eis o dito Eliseu. A primeira surpresa foi o restaurante estar meio vazio, sabendo-se que era domingo, dia clássico de romarias ao leitão. 

Hesitámos em ficar na esplanada, mas cedemos ao ar condicionado e à apresentação cuidada do interior, toalha de pano e flutes na mesa. 

As flutes são um mistério para mim. As pessoas adoram flutes: dêem-lhes bolhinhas em flute e elas sentem-se cheias de chique, mesmo que o nariz fique de fora da experiência, mesmo que seja um meio seco docinho, docinho.  

Dizem-me que é por causa das bolas de ar a subir e pode bem ser, mas ainda assim prefiro beber vinho num copo onde consiga cheirar o vinho, que retenha algum aroma do vinho. 

Flutes para trás, por favor.   

Fizemos então o pedido. Croquetes de leitão. Cabidela de leitão. Pão e manteiga. Uma dose de leitão e outra de cabrito assado. 

“Não será pouco?”, questionou-se a empregada. 

A questão pode ser pertinente, mas quando um empregado reage assim, o cliente pensa: “Olha este a tentar fazer-me pagar.” Formulação mais indicada: “As nossas doses de leitão vêm com seis pedaços pequenos.” Basta ser objectivo, o cliente depois decide o que é pouco e muito.  

Siga. 

Belíssimos croquetes de leitão, com fiapos da carne húmida. Ao lado, para imergir, tacinha de molho à base de pimenta e pingo do bicho, porventura demasiado gordo, a precisar de acidez (vinho?). Ainda a abrir, uma bolinha de pão saloio, bem aquecida e gulosa, acolitada de manteiga da casa, também à base de pimenta. 

Chega então a cabidela de leitão, que é uma semi-desilusão. Carne figadal saborosa, mas sem mais cortes à mistura (e sem que se informe o cliente), e um molho espesso e plano, outra vez a precisar de acidez, como por exemplo um bom vinagre bairradino, que os há. 

Essa acidez podia vir também do sangue, mas ele falha aqui. A origem da palavra “cabidela” remete para um guisado de miudezas de aves, ricas em sangue, mas nas vísceras porcinas de matança industrial, naturalmente, o sangue escasseia. 

Confirma a empregada: “Não acrescentamos sangue, é só com o que vem na carne.” Certo, não chega.

O que chega é o leitão, meia dúzia de pedaços rodeados por meias luas de laranja (já pouco doces, claro), onde se incluíam duas ou três costelas, para a mesa não se digladiar. Como sabemos, as costelas estão para o leitão como as pernas estão para frango. 

Carne húmida, sem gordura a mais, de um animal pequeno (sim, que há aí leitões com idade para serem pais), pele vidrada e estaladiça, tudo saboroso – eis um leitão da Bairrada em Lisboa, sim senhora. 

Batatas chips caseiras, fritas no ponto, saborosas. Saladinha de tomate e alface e cebola nova à parte, fresca, escassa de sal e vinagre, para o meu gosto. 

Então e o cabrito? Ora, o cabrito não veio. A empregada não percebeu o pedido e, muito simpaticamente, pediu desculpa e sorriu. Também não percebeu o pedido da Coca-Cola, que nunca chegou, mas sorriu sempre. E sorrir faz toda a diferença. 

Na hora de pedir sobremesa, a mesma empregada feliz não hesitou: “Eu adoro o pão-de-ló”, atirou, revirando os olhos de prazer. Era bom o pão-de-ló, com a parvoíce de vir adornado de açúcar em pó, como se faltasse doçura ao bolo.  

A carta de vinhos tem coisas bem boas da Bairrada, mas com a prole encostada às boxes devido ao vodka manhoso de Algés, na véspera, fiquei-me pela água – que o que havia a copo era poucochinho. 

Em síntese. O Eliseu é um sítio raro onde podemos comer leitão à Bairrada com segurança. A dose de leitão vale 22€. A dose de cabrito vale outros 22€. Com umas afinações em alguns pratos e no serviço, podia muito bem ser local de peregrinação domingueira. Ou se calhar é melhor assim.

Detalhes

Endereço
Condomínio Parque Colombo, Rua Álvaro Benamor, 2 B
Lisboa
1600-894
Preço
30€-35€
Horário
Dom 12.30-15.00, Ter-Sáb 12.00-15.30/ 19.00-22.00
Publicidade
Também poderá gostar
Também poderá gostar