Devíamos evitar ir zangados para os restaurantes, mas às vezes acontece. Éramos quatro ao almoço, eu tinha dormido pouco, a filharada estava embezerrada.
Quando o empregado do Leonetta apareceu com o menu, perguntei-lhe que pratos eram mais populares. O primeiro que ele sugeriu foi o papardelle de lagosta. O mais caro de todos. Achei suspeito e irritei-me. Não devia.
“O prato que mais sai é o mais caro?”, perguntei. Ele respondeu: “Por acaso é, mas se preferir, tem o papardelle com ragu de salsicha, que também é muito pedido, e talvez o bottoni com ricota”.
Vieram duas das sugestões mais outros três pratos, incluindo uma salada de folhas verdes, de boa frescura e sabor, excelente para abrir o palato.
Depois, quatro pastas, uma delas como pasta do dia: a carbonara. Surgiu correcta, o guanciale bem, o pecorino a ligar a massa bem, agradou à criança e ao adulto. Pior o linguine em açafrão com mexilhões, que não se mostraram crocantes como anunciado, e lula assada, borrachosa. Um prato falhado que não ofuscou os restantes.
Com os bottoni, subiu-se de nível, discos de pasta e queijo ricota a nadar num molho de tomate denso, cheio de acidez e frutos secos, bom para beber com o tinto Valpolicella, de notas suaves e corpo médio.
Por fim, o grande teste. Seria mesmo o papardelle nero com lagosta um fenómeno? É raro o prato mais caro da carta ser também o mais pedido. Diz-me a experiência que, para isso acontecer, temos de estar perante um sucesso excepcional.
As papardelle eram fitas de pasta fresca, um tagliatelle mais largo, aqui porventura pintadas a tinta de choco. O prato pareceu caótico, muito cheio de cascas: de mexilhão (magros) e de amêijoa (magras) e de uns camarões médios, cabeça e tudo.
Quanto à lagosta veio uma metade cortada ao meio, da cabeça ao rabo. A carne estava cozinhada no ponto, um pequeno naco suculento, envolvido numa bisque sedosa de mascarpone e funcho.
No final, o prato passou a prova, cheio de sabor, com o molho enqueijado a preservar os sucos marinhos. Não era marisco de primeira, mas era marisco decente, o que, tendo em conta o preço (24€) pareceu uma boa relação qualidade-preço. Ou seja, pode ser que o empregado tivesse razão e que este se tenha mesmo tornado no prato mais popular da casa.
Nas sobremesas, gostei de ver o tiramisù à fatia, com o mascarpone espumoso e fresco. Mas a panacota mostrou-se falhada, porventura devido ao excesso de gelatina, a partir-se em vez de ter a textura de um pudim sedoso.
Nada que apague a boa qualidade geral da comida deste Leonetta – que todavia pode não ser o único trunfo do restaurante, um caso de sucesso, com filas à porta (já foram maiores), turnos até às 16.00 e reserva com caução.
No grupo, causou particular sensação (positiva) a decoração, as paredes forradas de quadros sem uma coerência particular, madeiras escuras, um candeeiro enorme à entrada, estética vintage com um certo fake, ainda assim eficaz.
Quanto ao serviço, eficiente e competente, acima da média na categoria de preços em causa, ou seja, entre os 35 e os 50€, neste género de casas procuradas por turistas.
A propósito da clientela, é curioso vermos algumas notas que o restaurante indica aquando da reserva online. Por exemplo, que não são permitidas “máscaras” ou “balões” e que “não se disponibiliza serviço de vestiário, portanto não são permitidas bagagens, mochilas, etc.”
No final, saí mais contente do que entrei e só me voltei a abespinhar quando trouxeram o ATM para pagar a conta já com 8,5 por cento de gorjeta, sem o indicarem, sequer.
A empregada, questionada sobre o assunto, explicou de forma transparente como são divididas as gorjetas por todos os funcionários, uma contabilidade que tem em consideração o número de horas que cada um trabalha. Fez também questão de elogiar os proprietários, do grupo belga Vida Plena, que têm na carteira outros restaurantes deste segmento (Farés, Dallas, Javá, etc.), normalmente espaços bonitos com comida muito decente, por vezes boa mesmo, e um serviço de sala que sabe o que faz.
As minhas desculpas ao empregado que levou comigo. No final, acabou tudo bem.