Ultimamente tenho sido levada, em situações diferentes e em horários diferentes, para lá da linha de comboio na zona do Cais do Sodré. Um passeio de bicicleta de manhã, em dificuldades extremas para não derrubar estrangeiros a fotografar o rio, uma noite de copos nos bares da zona, que acaba sempre em conversas em frente ao rio (obrigada Outono-Verão), um almoço de peixe por aqueles restaurantes e, recentemente, um jantar no Lisboa Rio, numa noite de fim-de-semana.
O espaço é conhecido de outras épocas – foi, durante anos, o Bar do Rio e foi, durante meses, o Station, restaurante-disco pan-asiático – e é agora de novo um restaurante/clube, com uma bonita esplanada virada para a água e a doca onde atracam os cacilheiros. Perfeito para um almoço, fotogénico para um fim de tarde, também apetecível ao jantar, mas com uma esplanada a pedir iluminação e mais vida.
Aliás, todo o restaurante precisa de vida. Não dos colaboradores, todos extremamente simpáticos, a perguntar vezes suficientes (demasiadas, até), se estamos a gostar dos pratos, mas de mais gente a circular (havia quatro mesas ocupadas para além da nossa). E no minuto em que me sentei, olhei à volta e vi a sala semi vazia, mas com aquela belíssima vista, fui de imediato transportada para as Docas. Sim, esse complexo de restaurantes e bares onde ainda é fácil encontrar uma mesa livre quando o resto da cidade está à pinha e só aceita jantares lá para as onze da noite.
Quanto à comida, confirmaram-me, está nas mãos de Telmo Frias desde a abertura, no arranque do ano, chef que trabalhou no restaurante de José Cordeiro do Terreiro do Paço. Segundo um texto desta mesma publicação, aposta numa cozinha portuguesa mais evoluída, onde os ingredientes são cozinhados o mínimo possível. Num dos casos, o do acompanhamento do atum grelhado, vinha mesmo quase cru. Falo de uma cama de batatas aos cubos, claramente a precisar de mais tempo de cozedura. Quanto ao atum em si (20€), um naco metade em nacos, metade inteiro (lá está a nouvelle cuisine), sem grande graça, algo seco, regado com um azeite com pesto e pedaços de tomate.
Nos pratos principais provou-se também um risoto de lavagante (24,50€), prato pouco nacional, mas ainda assim com um bicho saboroso, a vir inteiro, sem casca, em cima do risoto a dois-três minutos de estar mesmo no ponto. Pena. Bom o sabor a marisco, bem casado com o queijo e outros temperos.
Banais os legumes ao carvão (5€), vindos de um forno a carvão da cozinha, a curgete e a beringela no ponto, os brócolos e a couve-flor muito duros e sem grande sabor [fosse eu dona do estabelecimento e usaria legumes mais nobres, mesmo que isso implicasse subir o preço]. Desinteressantes as batatas bravas (4€), ou devo dizer os gomos de batata frita com casca e nico de maionese a precisar de alho, tomate e picante.
O melhor da noite foi mesmo o creme de maracujá com suspiros e caramelo (5,50€), servido num copo (sai mais um toque de nouvelle cuisine). Uma sobremesa perfeitamente equilibrada entre o creme do maracujá, o estaladiço dos suspiros e um leve toque a caramelo.
Não chega, contudo, para salvar uma refeição onde se pedem preços altos, 80€ duas pessoas com vinho, o que se cria de novo não cumpre, e a aposta em bons produtos não sobressai particularmente em nenhum prato. Dali a noite poderia ter continuado para o andar de cima, onde o club, dizem, abre por volta da uma da manhã, quando os últimos clientes terminam o jantar. Mas às 23.30, pessoas nem vê-las, ambiente mais de domingo à noite do que de “friyay”. Hei-de voltar a ser levada para lá da linha de comboio, mas não sei se para jantar no Lisboa Rio
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.