Se há 10 anos me tivessem dito que a beterraba ia ser o vegetal-rei na Lisboa de 2024 eu teria dado uma gargalhada. Os portugueses nunca amaram beterraba, em parte porque não a sabem fazer, em parte porque beterraba pode ser uma coisa chata – culpa nossa.
A beterraba dos portugueses sabe a terra e serve-se com escasso tempero. Os poucos portugueses que gostam de beterraba são só gulosos, querem da beterraba a sucrose e nada mais.
Sucede que a cozinha dá muitas voltas e os restaurantes de Lisboa, hoje em dia, não servem, necessariamente, portugueses.
Neste Maluca, num jantar de casa cheia (só abrem aos jantares), só vi uma portuguesa, o resto tudo estrangeiros. E os estrangeiros, sobretudo os do Norte da Europa, amam a beterraba.
A beterraba do Maluca é excelente e eu sou capaz de lá ir, de propósito, para a comer. Fica um pouco abaixo da beterraba do Tricky’s – a melhor do mundo – mas está logo no degrau a seguir.
Na génese, temos a dita cortada em tártaro, mas depois há amêndoas secos tostadas, gema curada e picles de mostarda e azeite – doce, ácido, picante, untuosidade – uma pista de dança aos saltos dentro da boca.
A aceitação dos clientes deve ser boa, porque o prato está na carta desde que o Maluca nasceu, vai fazer um ano. Antes disso, o casal fundador já ali morava – Yann Rotundo e Stéphanie Graisier, ele de ascendência itálico-portuguesa, ela suíça –, mas estava no campeonato das sandes e dos brunchs.
A viragem levou-os para a esfera do neo-bistrô, com o que isso significa de pratos para partilhar, de sazonalidade e sustentabilidade, mais vegetais que proteína animal, mais vinhos naturais que convencionais.
No jantar correu tudo bem, a começar no pão da padaria doBeco, impecavelmente reabilitado no forno, bom para ensopar no azeite com picles de pepino laminados.
Continuou com a tal beterraba, seguiu-se a couve-flor com miso e cogumelos shitake (bom menos), avançámos depois na polenta sob desfiado de pato com queijo (bom) e concluímos os salgados com porco malhado de Alcobaça (uma das três raças autóctones portuguesas) e puré fumado (bom mais).
Nos doces, duas opções: uma pera assada com chocolate branco e uma mousse com alho negro. Fomos pelo alho negro, claro. A mousse era dessas que se mantém de pé e vinho com pedaços do alho fermentado, a dar-lhe um kick de acidez e exotismo, bem bom.
O preço dos pratos varia entre os 12€ e os 17€, sendo que se recomendam no mínimo dois por pessoa. Se lhe juntarmos o vinho e uma sobremesa, a conta andará entre os 30 e os 40 euros.
Em síntese. Santos tem um belo representante da neo-bistronomie cool, um sítio de dimensão humana, com gente estrangeira e arty a iluminar as paredes brancas e limpas. Bom produto, técnica sem piruetas, simpatia e conhecimento no serviço. De resto, é um dos poucos lugares para se jantar a um domingo e a uma segunda-feira à noite. Ide.