Diz-se clássico do que resiste ao tempo e serve de modelo; diz-se também do que é sóbrio, do que é tradicional ou do que é apurado; diz-se ainda do que é regular e habitual. E tudo isso se pode dizer do Moisés, casa já antiga do Saldanha, onde só agora me estreio. Mas enfim, também se diz que nunca é tarde para descobrir os clássicos.
Dou por mim neste esforço lexicológico enquanto me decido entre as pataniscas com arroz de feijão (9,20€) e o steak au poivre (18.95€). Estou numa das mesas da sala sobrecomprida e vou tirando a pinta à freguesia, com uma certa inveja dos lugares ao balcão de inox. Dou um trago no tinto da casa, limpo os beiços a um guardanapo de pano branco imaculado e concluo que um restaurante clássico é mais ou menos isto: uma carta tradicional com opções de cozinha internacional, um certo afã de cervejaria, um toque de elegância antiga, escolhas para almoço diário ou jantar especial, uma clientela que trata o empregado pelo nome e se despede até amanhã. Vou nas pataniscas.
Percebo que são prato do dia à terça-feira, numa carta onde conto umas trinta entradas, variando umas cinco a seis por cada dia da semana. A massa não tem mais de um dedo, quase estaladiça, enxuta q.b. e bem temperada, e faz-se acompanhar por um arroz de feijão simpático, caldoso sem ser malandro, com alguma batota de porco a dar gosto. Na mesma refeição, provam-se umas lulas grelhadas, que não são frescas, mas cuidadosamente descongeladas, chegam no ponto de grelha, regadas com um molho de azeite, manteiga e limão – clássico. Num segundo dia fico bem impressionado com umas bochechas de porco no forno com batata assada, e uns filetes de peixe galo temperado a preceito e polme perfeitinho, que por regra se servem com salada russa, mas que preferimos com a açorda bem perfumada que tínhamos avistado junto a uns jaquinzinhos.
Resta-me lamentar o pão, que chega na forma tristemente já clássica de bolas de farinha branca em saco plástico, e gabar as óptimas farófias, uma peça de doçaria clássica que lamento encontrar pouco – fosse uma tradição espanhola, havia de estar em tudo quanto é comedor.
Em resumo, tudo seguro, sóbrio e conforme aos costumes, sem grandes percalços nem surpresas. Como um dia terá dito Mário Jardel, um clássico é um clássico e vice-versa. Claro que basta pesquisar um pouco para suspeitar que isto talvez seja apenas a repetição sem critério de uma citação errada a correr pela internet. Mas isso também já é um clássico.
*Os críticos da Time Out visitam os restaurantes de forma anónima e pagam pelas refeições.