As chamuças indianas são muito boas, normalmente cheias de cebola, por vezes atomatadas, húmidas. Mas as chamuças nepalesas de frango, gordas e com a massa dura como vidro, de recheio mais pálido e menos especiado, são também extraordinárias.
A chamuça nepalesa pede molhos adicionais. Faz parte do ritual ir encharcando-a com pequenas colherzinhas de molho de iogurte com hortelã ou de molho picante de malagueta verde e depois debicá-la.
As chamuças do Nepal Curry House (NCH) são das melhores de Lisboa — e são a melhor maneira de se arrancar o jantar, mas também de o fechar, talvez só com uma sopa de lentilhas a aconchegar.
Para refeições completas e cheias, a seguir, podemos prosseguir com os pastéis de vegetais, dos onion bajis (bolinhos de cebola fritos, cheios de sementes de coentros), à pakora (pastéis de legumes variados, com chutney), sempre sabendo que, entre isso e os principais, haverá momos.
Os momos da Nepal Curry House, de origem tibetana, são raviolis moldados na casa e são saborosos. Se andar nos treinos de malagueta, peça os chilli momo (o nível “spicy” é mesmo “spicy”), fritos ou cozidos, pincelados de um molho agridoce capaz de o pôr a suar do bigode em menos tempo que um nepalês faz uma masala.
São muito rápidos e gentis, os nepaleses. No NCH, a empregada de mesa que estava a servir, sozinha, na minha última visita, foi a mais incrível que vi nos últimos tempos.
Ela não servia só as mesas, sozinha, a sala cheia e barulhenta, subindo e descendo as escadas de acesso à sala na cave, tirando cafés, levantando e lavando a loiça. Ela também explicava os pratos e sorria, num exercício de paciência, foco e força impressionantes.
Já disse aqui e repito. Os nepaleses são os ajudantes de cozinha que toda a gente quer em Lisboa, por estes dias, por boas razões. Nos restaurantes de fine dining ou nas churrasqueiras, estão por todo o lado, de volta dos tachos ou de volta da copa. Mas aparecem, também, cada vez mais, à frente das suas próprias casas – assumindo a sua culinária.
E ainda bem.
É preciso perceber-se que as raízes da cozinha nepalesa são as mesmas de boa parte dos países do Indostão, mas há diferenças. Em Lisboa, os nepaleses não têm um território fixo. A grande concentração de restaurantes indostânicos, por estes dias, acontece na Rua do Benformoso, ao Martim Moniz, mas aí mandam os bengali e os restaurantes do Bangladesh.
Os nepaleses estão um pouco por toda a cidade, mas em particular entre o Intendente e a Alameda.
É precisamente na Alameda que vive este Nepal Curry House. Ali mesmo ao lado, ao final do dia, o relvado fica cheio de gente, imigrantes jogando à bola ou apanhando o sol que se deita lá do outro lado, atrás do Instituto Superior Técnico.
Alguns dos desportistas amadores acorrem directos para as mesas do NCH, ainda de bola de futebol na mão, e despacham uma dose de momos com uma sopa thukpa, de massa grossa, antes de voltarem para casa.
Há uma meia dúzia de anos que o Nepal Curry House permanece nas mesmas mãos. A carta é prolixa, com todas as secções do costume e os pratos separados pelo tipo de matéria-prima ou pela técnica: lamb, chicken, fish, prawn, tandoori. Há ainda uma dúzia de pratos vegetarianos.
Os caris são todos feitos de raiz, com alguns menos comuns, como o caril de peixe (pescada) com tamarindo, folha de caril e mostarda. E têm todos aromas perfumados de sementes e folhas de verdade, feitos por quem sabe de pós e poções.
Resta dizer que a consistência do NCH é rara. Muitas casas do género abrem e fecham em poucos meses. A sua sobrevivência explica-se pela qualidade, pelo serviço, pelo bom senso de quem gere e pelo preço – quatro coisas que vão andando cada vez menos juntas, nesta cidade.
Longa vida.
Vão lá. Com respeito.