O Caldo Verde é um daqueles restaurantes que caiu no esquecimento. No meu, certamente e, a julgar pelas mesas vazias num dia de semana ao jantar, no de mais gente. Passei vários anos sem lá ir, mas este Verão, no rescaldo dos Santos Populares, acabei a comer umas sardinhas na esplanada. Não foram as melhores do ano – essas comi-as na Costa Vicentina, a sair da grelha a pingar –, mas estavam óptimas. Vi-as serem assadas na grelha da rua, provei-as com a salada mista da casa e com os pimentos em tiras e, por uma hora, matei algumas saudades do restaurante.
Voltei lá há uns dias, disposta a matá-las completamente, mas não tive a sorte dos tempos antigos. “Queria as lulas recheadas, se faz favor”; “Desculpe, não temos sempre, já quase só fazemos por encomenda”; “Ok, então eram os filetes de tamboril”; “Está com azar, também não temos”. Tentei a sorte com o último prato de peixe da ementa fixa, o bacalhau à Brás, e recebi um sorriso envergonhado. “Esse tive, mas acabou ao almoço.”
Percebo que as mesas vazias obriguem a equipa a fazer uma gestão racional do stock, mas por outro lado, não ter na ementa aqueles que eram dois pratos bandeira da casa tira algum do encanto ao Caldo Verde. Eu sei, eu sei que há dezenas de tascas modernas e restaurantes que reinventam o tradicional e atraem os foodies todos desta cidade – atenção que gosto de uma ou outra dessas chafaricas –, mas tenho pena de ver sítios como este serem obrigados a cortar naqueles que eram os seus trunfos. Adiante.
O restaurante já não tem o brilho nem as enchentes de outros tempos, nem nada do que comi estava excepcional, a ponto de me pôr a salivar. Mas tem aquela comida caseira, bem feita, sem falhas, em doses fartas e sem preços proibitivos. Não é uma tasca, é antes um restaurante de comida tradicional, serviço despachado, daqueles onde não me importo nunca de voltar – mesmo quando falham as especialidades.
Desta vez, fui à refeição completa e com companhia. Primeiro uma sopa transmontana. Um caldo a puxar para o salgado, onde nadavam feijões manteiga, pedaços de feijão verde e de esparguete cortado em bocadinhos. Simpática. Melhor, o caldo verde (era o mínimo...), com a couve numa cor viva, rodelas de chouriço, sabor apurado, e muito bom para mergulhar o pão – nota negativa para o papo-seco, já apanhado em fim de dia, mais húmido do que fresco.
Já que de peixes não havia nada da carta fixa, pedi um bacalhau à lagareiro, dos pratos do dia. E não me arrependi. Posta grande, com passagem pela brasa, bem tostadinha por cima, a lascas a saírem perfeitas a cada garfada. Vinha com pedaços de alho bem tostados e batatas cozidas, cebola às rodelas e uma piscina de bom azeite a regar tudo isto.
Veio também uma especialidade da casa, desta feita carnívora, um bife com natas e cogumelos. Posta grande da vazia, molho, lá está, de natas e cogumelos, algum alho e ao lado um enorme prato de batatas caseiras.
O remate foi dado com uma baba de camelo, sem reinterpretações e espumas disto ou daquilo.
No espaço de uma hora estava a refeição servida, engolida, a conta paga (22€ por pessoa com meia garrafa de vinho) e eu de volta à rua.
Não serve o propósito de jantar num desses sítios da moda, com um grande grupo, a dar para a fotografia das redes sociais, mas serve o propósito de encher bem a barriga e não deixar lá as últimas poupanças do mês.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.