Sempre que passo na D. Pedro V, vejo este Pão à Mesa cheio. Ora portugueses, ora turistas, ora gente sentada na esplanada, ora pessoas lá dentro. Uma fauna com ar descontraído, de garrafas de vinho à frente, pelo que me parece que o sítio tem aquela boa onda das imagens de Lisboa que andam a circular nas revistas estrangeiras. Mas a verdade é que nunca lá tinha ido até me ter sido incumbida a (dura) tarefa de avaliar o restaurante.
Decidi cumpri-la num dia de semana quente em Lisboa. A esplanada tinha as sombras ocupadas e sentei-me no interior. Sala de tamanho médio, decoração a madeiras e outros tons escuros, frases de Fernando Pessoa em inglês e português escritas na parede (?), muito calor (dá para aumentar o ar condicionado?) e um cheiro a caril intenso a entrar pelas narinas mal passei a ombreira da porta – percebi depois que a culpa nem era tanto da cozinha, mas do facto de ser o prato do dia e estar a sair para várias mesas.
Fiz a pergunta óbvia dos almoços – “também têm pratos à carta?” – e fiquei feliz de não ter de escolher entre o caril de frango e o peixe espada grelhado, porque afinal tinha vindo aqui conhecer mais um restaurante com conceito de Lisboa: desta vez à volta do pão, com consultoria de António Amorim, chef de que já não ouvia falar desde os tempos do Blend, no Bairro Alto.
Falo do conceito, porque antes de ler a ementa do Pão à Mesa, Com certeza – Bistro (tanto nome, porquê? Bistro, porquê?), lê-se uma pequena introdução sobre a reinvenção da cozinha portuguesa “utilizando um dos nossos elementos mais Nobres: o PÃO!”. Por isso mesmo tratei de o incluir em alguns dos pratos pedidos. Primeiro o couvert, um pão variado, azeite virgem, manteiga sazonal (?) e queijo picante. Ora o pão variado eram três fatias de pão de forma de trigo 100% banal e uma fatia de broa de milho grossa e seca; a manteiga era apenas... manteiga amolecida; o azeite era normal, as azeitonas idem, o queijo picante, ligeiramente amanteigado, era bom. Segundo, um dos pratos best of de 2015 (2015!), um pão saloio de pica-pau com milho e padróns. A carne, dura e com alguns nervos, vinha aos bocadinhos, misturada com batatas, alguns (poucos) bagos de milho e dois pimentos padrón. Tudo isto dentro de um pão saloio, apresentação a fazer jus ao nome, receita em si, não.
Da lista “2017 As Novidades...”, uma salada biológica de variedades de tomates, presunto, requeijão e azeite. Bons os tomates, frescos, de diferentes tons e sabores, bom o requeijão, banal o presunto de pacote (vinham quatro fatias idênticas, rectangulares). E uma patanisca de bacalhau e camarão, que se tratava de uma reinvenção do prato, a atirá-lo para a liga dos souflés, por ser feito no forno. Nem bom, nem mau, só um nadinha massudo e salgado.
De sobremesa, uma mousse de leite condensado, ou melhor, um leite condensado cozido ainda com grãos de açúcar. Gulosa, claro, mas também sem grande história. Por tudo, paguei 50€, com duas limonadas ácidas.
O preço não é um problema do restaurante, até ajustado às doses, já o serviço é muito atrapalhado – e parece-me haver aqui também alguma falta de cuidado em certas matérias-primas, sobretudo naquilo que lhe dá o nome: o pão.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.