Chego lançado com fome e invisto na carne. Peço o bife de touro frito, trazem-me um bitoque de vaca grelhado. Ansiava eu por um naco sanguinolento, sai-me uma chicha ressequida. Fico como quem fosse ver uma corrida na Monumental de Las Ventas e acabasse numa garraiada em Vendas Novas. Ainda ponho os óculos – que sem eles não vejo um boi – mas confirma-se o engano, que o empregado, com a altivez de um forcado do Aposento da Moita, só a custo admite.
A casa diz-se popular e com razão. Está sempre ao barrote, clientela indígena, sem sinal de nómadas, o ecrã na CMTV, a actualidade comentada em directo no balcão de inox. A carta faz-se de grelhados, comida de tacho e peixe frito, umas coisas melhores que outras, mas tudo com razoável apuro e preços em conta. Ora isso vale muito nesta geografia de 10 mil euros o metro quadrado. E é isso que me tem feito regressar sempre que por aqui ando.
Já aqui comi boas favas e bom cozido, já almocei mediania, mas nunca saí com azia. Na investida anterior, por exemplo, fui nos filetes com arroz de tomate. O arrozinho malandro, bago firme, saboroso apesar do travo de tomate enlatado, e o filete panado, bem frito, louro, uniforme, enxuto, bom tempero. Ao lado uma salada triste e esmorecida, como é tradição nacional.
Uma semana antes, fui num lombo no forno e também não me saí mal. O suíno fatiado, cozinhado com paciência, a laranja a cortar a gordura, a batata frita de boa estirpe (pena o óleo saturado), umas boas migas verdes a dar contraste àquele cenário de cores quentes. Bom. Melhor nesse dia a maminha alhada. A princípio, confesso, senti um certo desconsolo entre a promessa erótica do nome e a banalidade missionária do prato: a vaca alagada no feijão preto, a batata frita um pouco molenga, as tais migas de couve a fazer cama. Mas os olhos, que também comem, às vezes enganam – a carne era tenra e saborosa, no ponto, e o todo o conjunto estava bem simpático. Como alguém notou na mesa, já me meti em piores alhadas com maminhas (piada de gosto popular que fez sucesso na praça).
Em suma, já provei um pouco de tudo e de tudo isso guardei a ideia de uma cozinha funcional, segura e confortável, exigências básicas para um restaurante de todos os dias. Ainda não me atirei à francesinha, sempre muito requisitada, uma javardose com cinco dedos de altura, que mais parece um molotof. Nesse dia terei de tirar a tarde. Mas voltemos a hoje.
Quando enfim chega o bife de touro à portuguesa, apresentam-me um naco com um dedo de altura, frito com alho, tenro e rosado ao meio, ovo a cavalo e batatas fritas apeadas. Não será de um miúra corrido em Sevilha, mas é uma boa peça de bitoque. No fundo, o resumo perfeito das minhas experiências na Popular do Capelo: às vezes parece que vai haver tourada, mas acaba sempre por correr bem.