O Bessa Hotel, onde o Tabik está alojado, é um destes novos sítios da Baixa com bom aspecto. Passamos por ele e apetece dormir uma sesta: imaginamos uma recepcionista prestável, lençóis imaculados, room service, um silêncio bibliotecário. Da rua vê-se um hall sofisticado, nórdicos esparramados em sofás; e logo ao lado vidros de alto a baixo mostram a sala do restaurante toda em madeiras claras. A arquitectura convida também os lisboetas a entrar – não para pernoitar mas para almoçar.
O chef residente, Manuel Lino, veio inaugurar a cozinha no ano passado com selo de jovem esperança. No currículo tinha uma passagem pelo El Celler de Can Roca, na Catalunha, que ficou em primeiro lugar no concurso Melhor Restaurante do Mundo, em 2013, promovido pela revista Restaurant; e um projecto na Comporta ecologicamente sustentável e arrojado, feito à base de produtos locais.
No Tabik, Lino anunciou uma proposta “moderna, para se tornar moda numa zona cosmopolita da cidade”. Estando-se a falar da Avenida da Liberdade, temia um preçário para turistas e imigrantes gold, mais bar de gins e outros clichés do século XXI. O slogan da casa – “fusão de arte e tradição” – também soava pouco auspicioso.
Numa primeira visita ao almoço, todavia, fiquei a saber de um menu executivo com um preço justo (19,95€) e boas sugestões. A abrir, uma extraordinária terrina de pés de porco e espuma de alho, com uns aros de cebola e vinagre a cortar a gordura. Depois, vieram umas bochechas de porco com batata doce, tudo impecavelmente cozinhado, sem grandes invenções e na dose certa. O meu amigo foi pelo peixe-espada, suculento, dourado, com umas migas de tomate levemente picantes. Comida saudável, bem feita. Nas sobremesas, o nível de sofisticação subiu com uma ricota com texturas de bolacha e o conjunto pêra, citronela e gengibre – cremosa e fresca.
Noutro almoço, repetiu-se a mesma fórmula. A experiência foi um grau abaixo, destacando-se uma entrecôte maturada saborosíssima e uma entrada de cogumelos e curgete fraquinha. Nada muito maluco ou nunca visto.
Faltava a prova do jantar. Em conversa com um dos empregados (simpáticos e esforçados) ficara a saber que à noite é que era. À noite havia mão de chef. E havia cocktails.
Foi por aqui que a incursão nocturna começou – e de forma impressiva. Mal nos sentámos, surgiu um dos barmen residentes. A abordagem não foi impositiva. O jovem explicou calmamente o conceito, fez a pedagogia da mixologia, quis saber o que procurávamos, deu-nos tempo para pensar. Nós pedimos algo audaz, foguetório. E o James on fire prometia isso: whisky Jameson fumado e sumo de limão. Minutos depois um cheiro a queimado invadiu a sala, com alguns comensais revirando os olhos à procura dos extintores. O barmen usava um maçarico para chamuscar um pedaço de alecrim e uma nuvem de fumo sobrevoava as mesas. Menos, menos.
No copo, a sensação tornou-se ainda mais forte. Parecia que estávamos a beber um carvão.
O resto do jantar não apagou a sensação de desapontamento. Peixinhos da horta com maionese de lima, couscous com legumes grelhados e molho massala – ambos pouco impressionantes. O mesmo do atum com tomate e pimento assado, o peixe em cubos braseados, os elementos desligados, a ideia vista e revista. Desilusão final: o rabo de boi com puré de cherovias, promovido como bestseller, estava demasiado adocicado e monótono.
A brincadeira custou mais de 40 euros e não foi melhor do que as refeições ao almoço. Essas, sim, um bom negócio.
*As críticas da Time Out dizem respeito a uma ou mais visitas feitas pelos críticos da revista, de forma anónima, à data de publicação em papel. Não nos responsabilizamos nem actualizamos informações relativas a alterações de chef, carta ou espaço. Foi assim que aconteceu.