Livros, Escritor, Charles Dickens
©DRCharles Dickens por Frith em 1859
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A loucura necessária para escrever bons calhamaços

São épicos empreendimentos literários, alguns com mais de 4 mil páginas e que, em certos casos, demoraram décadas a escrever

Mariana Morais Pinheiro
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Sabia que, com mais de 11 milhões de palavras escritas em urdu, distribuídas por mais de 8 mil páginas em 56 volumes, Devta é considerada a maior obra literária de sempre? Do escritor paquistanês Mohiuddin Nawab, foi escrita ao longo de 33 anos (entre 1977 e 2010) e publicada mensalmente, durante este período, na revista Suspense Digest. Conta a história de um homem com “incríveis” poderes telepáticos.

Vai daí, andámos a reler alguns dos melhores e mais volumosos livros de sempre e contamos-lhe as rotinas extravagantes dos seus autores. A lê-los, é agora, que tem mais tempo.

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A loucura necessária para escrever bons calhamaços

1. Em Busca do Tempo Perdido

De Marcel Proust
Número de páginas: 4215 (Versão original)

Com mais de um milhão e 200 palavras, uma obra tão megalómana como esta teria, inevitavelmente, de ser escrita por alguém igualmente excêntrico. Entre 1908 e o ano da sua morte, em 1922, Marcel Proust retirou-se da sociedade e fechou-se no seu pequeno apartamento em Paris a escrever aquela que viria a ser uma das maiores obras de todos os tempos. Tanto em extensão como em reconhecimento. Em Busca do Tempo Perdido está dividido em sete volumes e aborda temas variados, que vão de relatos sobre a Primeira Guerra Mundial a assuntos da vida privada do autor, de teorias sobre a natureza da arte à homossexualidade. Proust escreveu-o durante a noite (levantava-se por volta das três ou quatro da tarde), deitado na cama e encostado a duas almofadas. Subsistia graças a uma dieta espartana, mas muito francesa, que consistia em grandes doses de café e dois croissants. Além de muito ópio, claro, como era costume consumir-se na época e que este dizia aliviar-lhe a asma crónica de que sofria.

2. Os Miseráveis

De Victor Hugo
Número de páginas: 2783 (Versão original)

Foi durante um exílio de 15 anos na ilha britânica de Guernsey, no Canal da Mancha, que Victor Hugo escreveu, entre outras obras, Os Miseráveis, livro publicado pela primeira vez em 1862. Está dividido em cinco volumes, cada um contendo vários livros (48), perfazendo um total de 365 capítulos. Ao todo, o manuscrito original – que retrata a pobreza e as desigualdades sociais que grassavam na França do século XIX –, soma 655.478 palavras, facto que o coloca na lista dos livros mais longos alguma vez escritos. Segundo Daily Routines, de Mason Curry, o escritor francês tinha hábitos peculiares antes de se sentar a escrever (na sua pequena secretária estrategicamente colocada em frente a um espelho) a obra que o catapultaria para a fama. Acordava com o som do tiro de canhão vindo do forte perto de casa, lia as cartas que a amante – que o tinha seguido para o exílio –, lhe enviava, comia dois ovos crus e tomava um banho de água fria, esfregando-se com uma luva de crina de cavalo, no terraço no topo da casa, perante os olhares curiosos (ou escandalizados) de quem passava na rua.

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3. Guerra e Paz

Leo Tolstói
Número de páginas: 1225 (Versão original)

Por falar em rotinas, as deste escritor russo, que se obrigava a escrever todos os dias, não eram tão extravagantes como as de Victor Hugo (pelo menos os dois ovos que comia pela manhã, acompanhados de uma chávena de chá, eram cozinhados). Ainda assim, era adepto de uma prática à qual hoje chamaríamos de “jejum intermitente”, uma vez que só voltaria a sair do escritório, onde se trancava a escrever durante todo o dia, por volta das cinco da tarde. Era nesta altura que se tornava um ser mais sociável e aproveitava até para tocar um pouco de piano em família. Profundamente crítico, considerou Guerra e Paz “repugnante” quando o viu publicado. Mas a História far-lhe-ia justiça. Esta obra, que relata os eventos históricos das guerras napoleónicas, através da vida de cinco famílias da aristocracia russa, não só é um dos livros mais volumosos de sempre, como é também um clássico da literatura universal.

4. A Dança dos Dragões

George R.R. Martin
Número de páginas: 1056 (Versão original)

Vamos fazer um pouco de batota nesta lista de colossos, uma vez que se geraram sérias dúvidas relativamente à quantificação desta epopeia literária. A Dança dos Dragões é o maior livro da saga As Crónicas de Fogo e Gelo, de George R.R. Martin, que se iniciou, em 1991, com o volume A Guerra dos Tronos. Começou por ser uma trilogia, mas conta já com cinco livros (este é o mais recente, publicado em 2011), e o autor está a trabalhar afincadamente nos dois últimos, que terão, aproximadamente, 1500 páginas cada. Quando chegar ao fim, a empreitada terá, mais coisa menos coisa, cerca de 7 mil páginas – facto que a colocará no topo desta lista. Enquanto não fica completa, Martin já descansou os fãs: diz estar fechado em casa a trabalhar, a são e a salvo da Covid-19, no seu computador sem ligação à internet, para não ter distracções, batendo texto no WordStar, um processador criado em 1978 e já bastante obsoleto. Mas funciona e é isso que importa.

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5. Os Cadernos de Pickwick

Charles Dickens
Número de páginas: 936 (Edição Tinta da China)

Não se pode dizer que Dickens fosse um homem de poucas palavras. Num dia bom, escrevia cerca de duas mil. Quando o dia lhe corria mesmo bem, podia fazer o dobro. Extremamente metódico, gostava de trabalhar em profundo silêncio – mandou inclusivamente instalar uma porta extra no seu escritório para bloquear ruídos indesejados. Tal parece ter resultado, uma vez que deixou um legado de 20 obras, metade delas com uma dimensão considerável, como é o caso de David Copperfield, Oliver Twist ou Os Cadernos de Pickwick. Este último, uma das obras mais divertidas do autor, que é um dos nomes maiores da literatura inglesa e mundial, recorre à comédia de situação, de linguagem e de personagem para contar as aventuras de Samuel Pickwick e dos seus amigos e companheiros de viagem – Tupman, Snodgrass e Winkle –, pelo interior de Inglaterra.

6. A Divina Comédia

Dante Alighieri
Número de páginas: 896 (Edição Quetzal)

Dar nome a uma rua ou a uma descoberta científica tornou-se uma façanha (ainda que reservada a poucos) mais ou menos recorrente. Termos o nosso nome associado a um adjectivo é que já não é para todos. Está, a bem da verdade, guardada para uma elite produtora de grandes feitos, onde figura, por exemplo, Dante Alighieri, poeta italiano renascentista que viveu no século XIV e que escreveu uma obra tão portentosa que perdura até aos dias de hoje como uma das mais épicas da literatura universal. A Divina Comédia é um poema escrito em três partes, Inferno, Purgatório e Paraíso, que estão divididas em 33 cantos cada e que ao todo somam 14.233 versos, também chamados de tercetos dantescos. E, como dizíamos, o adjectivo “dantesco”, relativo a Dante, significa “aterrador”, “infernal”, “que causa grande medo ou terror”. Não é de admirar. Afinal, tem mais de 100 mil palavras para ler.

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