Três livros sobre outras pandemias

Esta obra que consagrou o escritor franco-argelino, vencedor do Prémio Nobel da Literatura, começa com uma desvalorização, como acontece com quase todas as pandemias ou catástrofes iminentes. Numa manhã nos anos 40, na cidade de Orão, na Argélia, Bernard Rieux sai do consultório e tropeça num rato morto. Afasta-o, sem lhe dar muita atenção. Nos dias seguintes, centenas de ratos morrem por toda a cidade. A população em quarentena, afectada pelas pulgas destes animais, é acometida por inchaços nos gânglios linfáticos, febre alta e loucura. Mas também por grandes actos de compaixão. Uma obra publicada no final da II Guerra Mundial, que se revela uma alegoria à ocupação de Paris pelo regime nazi.

Só em Londres, em 1665, durante o último grande surto de peste bubónica em Inglaterra, morreram cerca de 70 mil pessoas. Daniel Defoe, conhecido pelo seu mais famoso livro Robinson Crusoé, testemunhou o acontecimento, na altura com cinco anos. A obra, onde o rigor descritivo é apontado como uma das mais importantes características, revela uma cidade superpovoada – especialmente nas zonas mais pobres, onde não existia qualquer tipo de saneamento básico –, com as condições ideais para a disseminação de uma doença. Pelo retrato fiel dos acontecimentos, pensa-se que o livro terá sido baseado nos diários de Henry Foe, tio do autor.

Dono de uma narrativa portentosa e de uma escrita inconfundível, este romance do Prémio Nobel português é um relato da condição humana, um reflexo do que ela tem de melhor e pior perante o caos. Saramago transpõe para este livro a ilimitada capacidade de amar do ser humano, mas também o seu estado mais obscuro e selvagem perante a fome, o medo e a doença. Um livro que espelha o sofrimento das personagens, contaminadas por uma cegueira que se alastra a todos como uma epidemia.