António Zambujo é um dos mais populares músicos portugueses da actualidade. Poucos têm tantos fãs e enchem salas com a mesma facilidade, mas o sucesso não lhe parece ter subido à cabeça. Continua a ser fácil falar com ele, parece humilde, exprime-se com calma e ouve o que lhe dizem com atenção. A conversa começou pelo novo disco, Do Avesso, mas não tardou em descarrilar.
António Zambujo é um dos mais populares músicos portugueses da actualidade. Poucos têm tantos fãs e enchem salas com a mesma facilidade, mas o sucesso não lhe parece ter subido à cabeça. Continua a ser fácil falar com ele, parece humilde, exprime-se com calma e ouve o que lhe dizem com atenção. A conversa começou pelo novo disco, Do Avesso, mas não tardou em descarrilar.
Rodeaste-te de pessoas novas neste disco: o Filipe Melo, o Nuno Rafael e o João Moreira. Como é que correu?
Foi bastante diferente. Até porque os meus discos anteriores tinham sido todos feitos da mesma forma, com a mesma equipa, com o Ricardo Cruz a produzir. Era uma coisa que estava bem oleada, não havia grandes surpresas. Desta vez tivemos de começar de novo. Apesar de os conhecer há algum tempo, e de o João Moreira já trabalhar comigo há uns anos, estar com as pessoas no estúdio é diferente. Teve de haver uma adaptação aos novos métodos de trabalho. Mas foi fantástico. Temos todos mentes abertas.
Porque é que decidiste mudar tanto e tantas coisas?
Não sei. Apeteceu-me mudar. Os discos têm um bocado a ver com aquilo que nós vivemos entre eles. São o reflexo disso. Neste caso, aquilo que vivi entre o do Chico Buarque, Até Pensei Que Fosse Minha, e este. Houve uma série de coisas que me levaram à escolha dos produtores e a toda esta envolvência de músicos. Muitos discos escutados, muita partilha de ideias...
Que discos é que ouviram?
Tantos. Ouvimos muito o Tom Waits, o Cavalo do Rodrigo Amarante, sei lá... Muita coisa dos Beatles, o Sgt. Pepper’s [Lonely Hearts Club Band], o White Album. Os Beach Boys.
Pois, nota-se. Este disco parece menos ligado às nossas músicas tradicionais e ao Brasil. É mais anglo-saxónico.
Completamente. Lá está, o disco é o reflexo daquilo que ouvimos. De todas essas influências.
O fado, por exemplo, parece-me completamente ausente do álbum. Ainda encontras algo do fado na tua música?
Ainda encontro algumas coisas na minha forma de cantar, na minha interpretação, que vêm do fado. A parte da dicção, o cuidado com as palavras e isso tudo. Foram coisas que aprendi no meio do fado.
Mas em termos musicais...
Nada.
E a tua relação com o Brasil como é que está?
Neste momento é uma relação de surpresa. Achava que já conhecia alguma coisa e de repente… Sabes quando estás a andar na rua e há um tipo qualquer que te empurra pelas costas e tu não dás por isso e cais? Isso deixa-te surpreso, porque é estranho e inesperado. Aconteceu-me mais ou menos o mesmo com o Brasil.
Estás a falar do Bolsonaro.
Óbvio.
Não estavas à espera?
A determinada altura percebi que a situação era mais grave do que inicialmente as pessoas pensavam. Aconteceu mais ou menos o mesmo com o Trump. Primeiro é motivo de risota e toda a gente diz que é impossível aquilo acontecer. E à medida que te vais aproximando da hora da decisão vais percebendo que aquilo afinal, infelizmente, tem uma dimensão maior. Obviamente que na altura da eleição já previa que ele ganhasse, mas há sempre uma pequena esperança de que as sondagens sejam uma treta.
Não eram.
Pois não. Mas eu acho que a culpa não é só dele. A culpa é das pessoas que estão do lado certo, ou que têm as políticas certas, e da sua falta de competência. Isso leva a população a uma situação de desespero. Não acredito que toda a gente que votou no Bolsonaro seja de extrema-direita. Muitas pessoas votaram sobretudo contra o PT e aquilo que o PT fez nos últimos anos.
Claro. Estas coisas acontecem quando os partidos tradicionais não dão às pessoas aquilo que elas querem.
E aqui em Portugal vai acontecer a mesma coisa.
Achas mesmo?
Tenho a certeza. Isto vai estender-se. As pessoas estão cansadas desta incompetência e da falta de soluções. Acho que em Portugal ainda está longe, mas não está tão longe como imaginamos.
Não concordo. Apesar de todos os problemas que o país continua a ter, não estás numa situação tão extrema e propícia a esse tipo de discurso como estavas em 2011, por exemplo.
Não estás. Mas de um momento para o outro podes passar a estar. São coisas que não estão garantidas. É claro que espero que isso não aconteça, mas...