Crítica: “Last Christmas”
De Paul Feig, 103 minutos
★★★☆☆
Se Helen Fielding refizesse o Cântico de Natal substituindo Bridget Jones por Ebenezer Scrooge, talvez se parecesse algo como esta bem-intencionada mas levezinha comédia romântica sobre uma jovem de vinte-e-tal anos encontrar a salvação num jeitoso estranho. Se fecharmos os olhos a uma reviravolta no terceiro acto, que apesar de ser feita com seriedade é tonta, e que o trailer do filme revelou há meses, e à falta de química entre Emilia Clarke e Henry Golding, Last Christmas é um agradável acrescento ao cânone festivo. Foi criado propositadamente para quem viu O Amor Não Tira Férias talvez umas seis vezes a mais.
Clarke interpreta Kate, uma aspirante a cantora com uma paixão assolapada por George Michael, que é forçada a vestir-se de forma humilhante como um elfo para a proprietária da loja de Natal do Covent Garden (Michelle Yeoh). “Não sou um elfo de carreira”, diz ela, apesar de suspeitarmos que, dada a sua abordagem demolidora à vida, talvez fosse processada pelos outros elfos. É aí que entra o misterioso estranho interpretado por Golding, Tom, que trabalha num serviço de entregas e se revela um óptimo ouvinte, começando a reintroduzir alguma esperança à vida de Kate. Mas quem é ele? E porque é que ele parece ter apenas um casaco e nenhum telefone?
Musicado de uma ponta à outra por temas dos Wham! e de George Michael (com várias versões da canção que dá título ao filme), o florescente romance acontece nas paisagens de postal de Londres. Com exceção de um momento notavelmente sombrio a meio, o realizador norte-americano Paul Feig (A Melhor Despedida de Solteira) lida com tudo de forma rápida. No espírito de todos os bons filmes de Natal, a história é indiferente à geografia ou ao realismo (dois estranhos a conversar num autocarro a sério). E embora haja uma tentativa genuína de se envolver com o problema dos sem-abrigo na cidade – há uma narrativa secundária a decorrer num abrigo –, e se faça um aceno à questão dos migrantes, isso é feito superficialmente, de tal forma que faz Richard Curtis parecer Ken Loach.
Por vezes, os diálogos são contundentes (“Um pássaro acabou de me cagar nos olhos”, resmunga Kate), mas quando a graça desaparece o charme do elenco geralmente leva o filme a bom porto. Clarke é cativante como Kate, cínica mas não demasiado amarga, que imigrou para Londres, da antiga Jugoslávia, quando ainda era uma criança. Emma Thompson (que co-escreveu o argumento com Bryony Kimmings) tem piada como a sua mãe alfa, que mantém vivas as memórias do velho país cantando canções folclóricas para a filha. Até a severidade de Yeoh adquire uma dimensão cómica quando tem por trás um cenário de uma tonelada de kitsch de Natal.
Se Last Christmas não é totalmente irresistível nas cenas emotivas, e se os seus momentos pirosos são na fronteira da indigestão, a sua efervescência torna-o divertido o suficiente para ver. Pelo menos, vai fazê-lo cair de amores pelo outro protagonista do filme: Londres. Phil de Semlyen