J.K. Rowling continua a expandir o universo de Harry Potter, aliás, o seu passado, em Monstros Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald, com realização de David Yates. E Jude Law é um jovem Albus Dumbledore no novo filme. Aproveitámos e falámos da magia de encarnar um personagem que faz parte do imaginário dos seus filhos.
Actor em filmes de cineastas como Gregg Araki, Olivier Assayas ou Lars von Trier, o americano Brady Corbet estreou-se a realizar em 2015 com A Infância de um Líder. E assina agora Vox Lux, a história de uma pop star (Natalie Portman) ao longo de 20 anos, tendo em fundo acontecimentos com o 11 de Setembro, os massacres nos liceus dos EUA e o advento do terrorismo global. A Time Out falou com ele.
Vox Lux tem como subtítulo “um retrato do século XXI”. Lida com temas como o terrorismo, os tiroteios em massa, a perda da privacidade. E é ao mesmo tempo a história de uma rapariga que sobrevive a um massacre, sai do anonimato e torna-se numa pop star planetária. É uma fábula realista, para os nossos tempos?
Sim, é uma fábula. Claro que se refere a acontecimentos que têm até agora moldado este século. E a ideia de não fazer um docudrama e antes um filme que evoca a realidade mas existe na sua própria esfera, deve-se a eu querer lembrar às pessoas quão peculiar e absurda é esta era em que vivemos. Assim, ao fazer uma versão maximalista, expressionista, exagerada daquilo que estamos a viver, estou a dar-
-lhes um outro tipo de acesso, de ponto de vista, sobre ela.
E não é também uma ópera pop?
Foi concebido como isso, é um filme melodramático e garrido. E tem momentos profundamente sinceros e sérios. Seria muito fácil e cínico ser apenas negativo. Há esperança aqui, mesmo que muito ténue.
Formalmente, Vox Lux lembrou-me certos filmes dos anos 80, de realizadores que não se preocupavam em ter um estilo muito definido, nem um tipo de narrativa muito arrumada e homogénea. Foi este tipo de fita que tentou fazer?
Estava interessado em fazer algo que fosse muito livre do ponto de vista formal. Adoro o Nicolas Roeg e o Leos Carax. Gosto de realizadores que andam à procura de coisas novas e acho isso fascinante. Também gosto de filmes feitos com uma espécie de precisão matemática, e há sequências neste filme que foram feitas assim. Mas decidimos que ele também precisava de alguma transgressão, e que a tensão entre ambas criaria um efeito estranho: formalismo misturado com alguma anarquia. É importante fazermos filmes em que não estejamos muito preocupados se as pessoas vão gostar deles.
Celeste, a personagem de Natalie Portman, não é nem um estereótipo, nem uma caricatura. E muito do que diz faz sentido. Foi assim que a quis?
Exacto. Eu gosto muito dela. É incrivelmente maníaca e emblemática destes tempos que vivemos, mas tem sentido de humor e momentos de lucidez em que sabe exactamente o que diz.
E ela é, apesar de tudo, e dos aspectos mais antipáticos da sua personalidade, uma sobrevivente, uma lutadora.
Precisamente. Para quem a acha grotesca ou difícil, o comportamento dela é perfeitamente compreensível, dado tudo aquilo por que passou. Penso sobre a Celeste aquilo que penso sobre os EUA. Envergonha-me um pouco o comportamento dela, tal como o dos
nossos representantes políticos em geral. Mas também vejo e percebo como ela, e o meu país, chegaram onde chegaram.
É verdade que Rooney Mara foi a primeira escolha para interpretar Celeste, e não Natalie Portman?
A Rooney esteve ligada ao filme logo no início, mas o projecto nunca mais se concretizava e ela acabou por não o poder fazer. Durante todo esse tempo, a Natalie estava grávida e não trabalhou durante uns dois anos. E calhou ela ficar disponível exactamente no momento em que eu estava a conseguir encaminhar o filme, e tornou-se insubstituível. Sinto-me com muita sorte por a ter tido no papel de Celeste. A Natalie é fabulosa, a interpretação dela é supercorajosa, excêntrica e louca. E o papel pedia tudo isso. Confesso que estava apreensivo porque pensava que tinha escrito um papel impossível de interpretar, mas sinto-me muito afortunado que a Celeste tenha acabado em mãos tão boas.
Voltou a trabalhar com Scott Walker, que já tinha composto a música do seu filme anterior. E quanto à Sia? Como conseguiu a colaboração dela para as canções?
O Scott e eu voltámos a trabalhar aqui na parte orquestral da banda sonora. Quanto à Sia, eu não a conhecia, mas não há assim tantos cantores pop que escrevam as suas próprias canções, e ela compõe para a Beyoncé, entre outros. Por isso, achei que era perfeita para escrever as canções da Celeste, e também porque não se mostra muito. Gostei da ideia de ser ela a compor para uma pop star ficcional. E a Sia, estilisticamente, também é um bocado camaleónica. Fiquei-lhe muito grato, e às pessoas com quem ela trabalha, porque normalmente, os filmes indie como o Vox Lux não têm dinheiro suficiente para fazer certas coisas como elas devem ser feitas. Como é o caso das bandas sonoras.