The Sympathizer
Hopper Stone/SMPSPThe Sympathizer

‘The Sympathizer’. As duas faces de um agente duplo

A série de Park Chan-wook para a HBO Max conta a história de um comunista que, no final da guerra do Vietname, se infiltra nas hostes americanas. Robert Downey Jr. interpreta quatro personagens.

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★★★☆☆

Depois da excelente A Rapariga do Tambor, adaptação do livro de John Le Carré, o sul-coreano Park Chan-wook volta às séries de televisão com The Sympathizer (HBO Max), em que, tal como naquela, o protagonista é um agente duplo, um infiltrado no campo inimigo e que goza da total confiança dos seus superiores, agora no final da guerra do Vietname, em 1975, pouco antes da queda de Saigão e do triunfo dos comunistas do Norte. Criada em colaboração com o realizador e actor Don McKellar, The Sympathizer adapta o livro homónimo do escritor vietnamita-americano Viet Thanh Nguyen, que ganhou um Prémio Pulitzer em 2015. E tem a particularidade inédita de a história ser contada do ponto de vista de um vietnamita educado nos EUA e que é capitão da Polícia Secreta do Vietname do Sul, mas que na realidade espia para o Norte comunista e cujo nome nunca sabemos. 

Todo o enredo, toda a envolvência dramática, todo o miolo emocional e toda a tensão de The Sympathizer (e também o humor que aqui e ali se manifesta) advém dessa duplicidade do capitão (muito bem interpretado por Hoa Xuande, actor australiano de ascendência vietnamita) e da maneira como ele tem que reagir quando é assaltado por dúvidas, ou posto perante as mais variadas situações em que, para não revelar a sua verdadeira identidade, tem de se comportar e de reagir como quem aparenta ser e não como quem é na realidade. O que dá origem a momentos paradoxais ou caricatos, como aquele em que, já instalado nos EUA após a fuga de Saigão, o capitão é entrevistado por um estudante esquerdista do jornal da universidade onde estudou, e tem que responder com sarcasmo e hostilidade (fingidos) às perguntas daquele.

A acção da série, contada num enorme flashback e incluindo constantes recuos e avanços no tempo, transita do Vietname do Sul para os EUA, já que os seus superiores comunistas ordenam ao capitão que ele acompanhe o general sob cujas ordens serviu, no exílio, para continuar a informá-los sobre a sua actividade, bem como sobre a comunidade vietnamita ali exilada; e regressa ao Vietname quando o capitão acaba, por sua vez, por ser preso, enviado para um campo de reeducação comunista e implacavelmente interrogado. É aqui que o vamos encontrar no início dos sete episódios de The Sympathizer. Mas como foi ele lá parar?

No muito atarefado enredo, Chan-wook explora ainda os ressentimentos do capitão por ser mestiço (filho de mãe vietnamita e pai francês incógnito), que poderão ter pesado na decisão de espiar para os comunistas; a sua relação com os dois grandes amigos de infância que estão em campos políticos opostos; as relações problemáticas entre os americanos e os sul-vietnamitas (o mentor americano do capitão, Claude, um agente da CIA, é interpretado por Robert Downey Jr., que faz ainda mais três papéis, uma má ideia porque cabotina descaradamente em todos eles), ou a difícil integração daqueles na sociedade americana e a sua nostalgia pela pátria que foram obrigados a deixar. 

The Sympathizer tem, inevitavelmente, alguma palha e gordura de prolixidade. É o caso do subenredo sobre Lana, a filha rebelde do general, ou da rodagem do filme de guerra pacifista do megalómano actor e realizador Niko Damianos (uma das quatro personagens vividas por Downey Jr.), que preenche, desnecessariamente, um episódio inteiro e podia ter sido abreviado. E tende a ser caricaturalmente esquemático para com as personagens americanas, enquanto as vietnamitas são mais verosímeis e complexas. 

A série está no seu melhor quando se ocupa da duplicidade do capitão, das consequências desse estatuto secreto na sua vida quotidiana, e da forma como o vai afectando e apoquentando interiormente, e fazendo aparecer dúvidas e interrogações. Porque ele não é um mero fanático ideológico, mas sim um homem com princípios, consciência e vulnerabilidades. E quanto mais The Sympathizer as referencia e se ocupa delas, mais nos consegue interessar.

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