Os Três Músicos - Diego Velázquez
©Diego Velázquez
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10 obras para descobrir a música espanhola do século XVII

Um concerto de Magdalena Kozená que tem a originalidade de associar repertório pouco conhecido do barroco espanhol a bailarinos de flamenco é um bom pretexto para investigar os tesouros de um período rico mas muito esquecido

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“Entre o Céu e o Inferno”

A mezzo-soprano checa Magdalena Kozená regressa à Fundação Gulbenkian com o programa “Entre o Céu e o Inferno”, consagrado à música seiscentista espanhola, com compositores como Sebastian Durón, Juan Hidalgo, José Marín, Santiago de Murcia, José Martínez de Arce e Juan Serqueira de Lima, que nasceu em Portugal e foi baptizado como João Cerqueira de Lima, mas passou a maior parte da carreira do outro lado da fronteira.

Neste novo projecto, Kozená tem a cumplicidade dos Private Musicke, um ensemble de cordas dedilhadas (guitarra, alaúde, colascione, tiorba, harpa), liderado pelo guitarrista austríaco Pierre Pitzl, e da companhia de flamenco do bailarino e coreógrafo Antonio El Pipa.

Fundação Gulbenkian, domingo 8, 20.00, 25-50€.

10 obras para descobrir a música espanhola do século XVII

“De Fuego de Amor Herido”, de Joan Pau Pujol

O catalão Pujol (1570-1626) foi menino de coro na catedral de Barcelona e deve ter mostrado qualidades precoces, pois com apenas 23 anos foi nomeado assistente do mestre de capela da dita catedral, lugar que nem teve tempo de aquecer, uma vez que foi tentado por um posto ainda melhor: o de mestre de capela na catedral de Tarragona. Dois anos depois mudou-se para cargo análogo em Zaragoza, onde ficou 17 anos. Em 1612 regressou à catedral de Barcelona como mestre de capela e a maior parte da música que dele sobreviveu data desta última fase da carreira.

“De Fuego de Amor Herido” é um villancico, um género tipicamente ibérico, destinado a ser tocado nas igrejas mas que, em vez dos textos litúrgicos em latim usuais na música sacra, recorre a textos livres em espanhol, que, por vezes, esbatem as fronteiras entre os domínios sacro e profano. Quem leia ou ouça fora de contexto a última estrofe deste villancico poderá tirar conclusões erradas: “E no fim hás-de ser minha/ E hás-de desfrutar da minha casa/ E hás-de sentar-te à minha mesa/ Como esposa regalada”. Porém este casamento é estritamente espiritual: o noivo é Deus, a casa é a Santa Madre Igreja e a esposa é a alma.

[Por La Grande Chapelle, com direcção de Albert Recasens, do CD Música para el Corpus (Lauda)]

“Romerico Florido”, de Mateo Romero

Mateo Romero (c.1575-1647) foi baptizado como Mathieu Rosmarin e nasceu em Liège, no que é hoje a Bélgica mas era então território da Coroa Espanhola. Veio muito novo para Espanha, como menino de coro da capela real, foi ordenado padre em 1609 e chegou a mestre de capela de Filipe II e Filipe III, posto que ocupou até 1634. A sua reputação valeu-lhe a designação de “El Maestro Capitán”. Manteve relações próximas com D. João, Duque de Bragança, que era competente compositor e melómano apaixonado, e em 1638 passou vários meses em Portugal a convite do duque. Após o duque subir ao trono como D. João IV tornou-se seu capelão.

“Romerico Florido” é uma “Folía a 2”, sendo a “folía” uma dança de origem portuguesa que teve grande voga no barroco ibérico e italiano.

[Por La Reverencia, com Paloma Gallego (soprano), do CD De Amores y Locura (Several Records)]

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“A la Sombra Estáis”, de Juan Bautista Comes

O valenciano Joan Baptista Comes (1582-1643) foi menino de coro na catedral da sua cidade e aí recebeu instrução musical. Foi mestre de capela na catedral de Lérida, compôs obras para o Colegio del Patriarca e para a catedral de Valencia e em 1618 foi nomeado maestro assistente da corte de Madrid, onde serviu Filipe III e Filipe IV, sem deixar de compor para a sua cidade natal, onde regressaria em 1632, assumindo o posto de mestre de capela na catedral. Quase toda a sua produção se situa no domínio sacro.

“A la Sombra Estáis” é um villancico, género que se tornou muito popular na música da Ibéria e do Novo Mundo, em parte pelo facto de, sendo cantado na língua das gentes comuns, ser mais compreensível do que as obras em latim, e também por algumas das execuções serem sob forma semi-encenada (o que atraiu acusações de se estar a converter a igreja num teatro).

[Por Al Ayre Español, dirigido por Eduardo López Banzo, do CD A Batallar Estrellas (Harmonia Mundi)]

“In Devotione”, de Carlos Patiño

Carlos Patiño (1600-1675) foi aluno, na catedral de Sevilha, de Alonso Lobo, um dos grandes mestres do Renascimento. Em 1628 tornou-se mestre de capela do Real Monasterio de la Encarnación, em Madrid, subindo em 1634 a mestre da capela real. As doenças foram minando a sua capacidade de trabalho, mas os seus pedidos para que lhe fosse permitido reformar-se foram-lhe negados; em vez disso, foram contratados dois assistentes, de forma a aliviá-lo de algumas responsabilidades, mas o agravamento dos seus achaques fez com que cessasse de compor em 1668.

Os seus infortúnios não terminaram com a morte: os principais repositórios da sua vasta obra sacra (13 missas, meia centena de motetos, uma trintena de villancicos, uma vintena de salmos) foram o arquivo do Real Alcázar de Madrid, que foi destruído por um incêndio em 1734, e a biblioteca de música de D. João IV (que era seu admirador e com quem se correspondeu assiduamente), que se perdeu no terramoto de Lisboa de 1755.

[Por Al Ayre Español, dirigido por Eduardo López Banzo, do CD A Batallar Estrellas (Harmonia Mundi)]

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“Esperar, Sentir, Morir”, de Juan Hidalgo

O harpista Juan Hidalgo de Polanco (1614-1685) nasceu e morreu em Madrid e serviu as cortes de Filipe V e Carlos II. Este último tinha a sua música em tanta estima que fez com que todas as suas composições fossem guardadas nos arquivos musicais da corte – o que levou a que boa parte da sua obra se perdesse quando o Real Alcázar de Madrid foi devastado no incêndio acima mencionado.

Hidalgo foi pioneiro da ópera em Espanha, com Celos Aun del Aire Matan (1660), com libreto de Calderón de la Barca, e compôs numerosos “tonos humanos”, designação dada na Espanha seiscentista a composições profanas para uma ou duas vozes solistas e acompanhamento instrumental (um equivalente aproximado da cantata profana italiana).

Um desses tonos humanos é “Esperar, Sentir, Morir”, em que o apaixonado diz que as queixas de amor que saem dos seus lábios provêm “das chamas que dentro do peito ardem”. As queixas dos amantes não-correspondidos são tema recorrente dos “tonos humanos”.

[Por Monika Mauch (soprano), Josep Cabré (barítono) e o ensemble Private Musicke, dirigido por Pierre Pitzl, do CD Tonos Humanos (Accent)]

“Que Dulcemente Suena”, de José Marín

José Marín (1619-1699) foi cantor da capela real de Filipe V entre 1644 e 1649, viajou até a Roma (onde foi ordenado padre) e às Américas, regressando a Espanha em 1654 para se envolver, nos três anos seguintes, em casos de roubo e homicídio que acabaram por resultar na sua prisão e condenação a 10 anos de desterro. Consta que se arrependeu sinceramente desta vida pecaminosa e terá pautado o resto da vida por uma conduta exemplar. Deixou apreciável quantidade de “tonos humanos”, tendo meia centena deles sido coligidos no manuscrito Cancionero de Marín (1690).

[Por Monika Mauch (soprano), Josep Cabré (barítono) e o ensemble Private Musicke, dirigido por Pierre Pitzl, do CD Tonos Humanos (Accent)]

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“Canarios”, de Gaspar Sanz

O guitarrista Francisco Bartolomé Sanz Celma (1640-1710), que adoptou o nome de Gaspar Sanz, estudou música e teologia na universidade de Salamanca e prosseguiu os estudos musicais em Roma e Nápoles, tendo sido organista do vice-rei de Nápoles (então sob domínio espanhol). De regresso a Espanha, tornou-se professor de guitarra de D. João de Áustria (filho bastardo de Filipe IV), mas pouco mais se sabe da sua vida. Há quem sugira que terá viajado até ao Novo Mundo, pois o Códice Saldivar n.º 4, um manuscrito de tablatura de guitarra compilado no México por volta de 1732, é preenchido por peças de sua autoria.

Sanz escreveu três tratados, ilustrados com exemplos práticos, com o título Instrucción de Música sobre la Guitarra Espanõla, surgidos em 1674, 1675 e 1697. Entre eles incluem-se vários “Canarios”, uma dança muito popular em Espanha entre os séculos XVI e XVIII – a sua origem é obscura e as tentativas de a aproximar ao folclore das Ilhas Canárias produziram escasso resultado (até porque a primeira menção à dança surge em Veneza em 1581).

[Pelo ensemble Private Musicke, com Pierre Pitzl e Bernhard Moshammer (guitarra barroca), Daniel Pitzl (alaúde baixo) e David Mayoral (percussão), do CD Cifras Selectas de Guitarra (Accent), preenchido maioritariamente com peças de Santiago de Murcia]

“Para Deshacer del Mundo”, de Joseph Ruiz Samaniego

Samaniego foi mestre de capela na catedral de Tarazona (Aragão), até 1661, e, depois, na Basílica de Nossa Senhora do Pilar, em Zaragoza, e esteve activo entre 1653 e 1670. Pouco mais se sabe da sua vida e legou-nos apenas obras sacras, entre os quais se conta este “villancico a la Expectación y a la Navidad” (muitos villancicos tinham temática natalícia).

[Por Los Músicos de Su Alteza, com direcção de Luis Antonio González, do CD La Vida Es Sueño, preenchido com obras de Samaniego (Alpha)]

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“Sosieguen, Sosieguen”, de Sebastián Durón

Sebastián Durón (1660-1716) foi organista nas catedrais de Sevilha, Cuenca e Plasencia e, entre 1691 e 1700 serviu Carlos II como mestre da Capela Real de Madrid. A morte de Carlos II sem deixar herdeiros acabou por conduzir à Guerra da Sucessão Espanhola (1702-15), durante a qual Durón cometeu a imprudência de mostrar-se favorável ao Arquiduque Carlos de Áustria, que tinha o apoio da Casa de Aragão, da Inglaterra, da Áustria e da Holanda. Acontece que quem acabou por prevalecer foi Filipe de Anjou, apoiado pela casa real espanhola e por França e que acabaria por subir ao trono como Filipe V, o que levou a que em 1706 Durón fosse dispensado e passasse o resto da vida exilado em França.

O manuscrito de “Sosieguen, Sosieguen” está conservado na Biblioteca Nacional, em Lisboa.

[Por Raquel Andueza (soprano) e Manuel Vilas Rodríguez (harpa), do CD Tonadas, de Durón (Naxos)]

“Sé que me Muero de Amor”, de Jean-Baptiste Lully

Jean-Baptiste Lully (1632-1687) não era espanhol – na verdade também não era 100% francês, pois nasceu em Florença, instalando-se em França a partir dos 14 anos – mas como “Sé Que Me Muero de Amor” tem texto espanhol, denota influências espanholas e faz parte do programa do concerto de Magdalena Kozená, justifica-se a sua inclusão nesta lista. A peça faz parte da comédie-ballet Le Bourgeois Gentilhomme, uma peça de teatro (com texto de Molière) que se articula com números cantados e dançados e estreou em 1670 perante a corte de Luís XIV. A inclusão de números musicais em espanhol foi uma homenagem à mãe e à esposa do rei, já que a primeira, Ana de Áustria, era filha de Filipe III de Espanha e nascera em Valladolid, e a segunda, Maria Teresa de Áustria, era filha de Filipe IV de Espanha e nascera em Madrid.

[Por Raquel Andueza (soprano) e o ensemble La Galanía, com Jesús Fernández Baena (tiorba) e Pierre Pitzl (guitarra barroca), do CD Yo Soy la Locura (Anima e Corpo)]

Mais banda sonora

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Georg Philipp Telemann nasceu a 14 de Março de 1681 em Magdeburg, na Alemanha, e revelou cedo um enorme talento musical que a família se esforçou por contrariar – acabou por ter apenas instrução musical sumária, que compensou com um autodidactismo empenhado. Em 1710, submetendo-se à vontade da mãe, matriculou-se na universidade de Leipzig para estudar Direito, mas o apelo da música foi mais forte. Após ocupar postos em Leipzig, Sorau, Eisenach e Frankfurt, Telemann obteve o prestigiado cargo de director musical da cidade de Hamburgo, que desempenharia durante 46 anos, acumulando-o com a direcção da ópera local e vários outros compromissos e encomendas. Esta azáfama resultou numa obra vastíssima que cobre todos os géneros musicais e inclui 1700 cantatas (chegaram aos nossos dias 1.043), mais de 40 Paixões (sobreviveram 22), mais de 50 óperas (apenas sobreviveram 9 completas) e centenas de peças orquestrais e de música de câmara. Faleceu em Hamburgo há 250 anos. O programa do concerto da Orquestra Metropolitana de Lisboa, com direcção de Nicholas Kramer, junta três compositores barrocos alemães cujos destinos se cruzaram: Georg Philipp Telemann (1681-1767), Georg Friedrich Handel (1685-1759) e Johann Sebastian Bach (1685-1750), bem como o segundo filho de Bach, Carl Philipp Emanuel (1714-88), que faz a transição do barroco para o período clássico e teve Telemann por padrinho e sucedeu a este, após a sua morte, como director musical de Hamburgo.De Telemann ouvir-se-á a Suíte TW

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Independentemente do que se pense do que aconteceu em Fátima em 1917 (embuste, milagre, aparição, visão interior), da atitude em relação à fé católica ou a qualquer crença em divindades (adesão, rejeição, indiferença) e da expectativa em relação à visita papal (fervor extático, indiferença, saturação), uma coisa é certa e está para lá de qualquer subjectividade: a música sacra que irá ouvir-se nas cerimónias de Fátima nos próximos dias será de pífia qualidade e mediocremente executada. Se a solidez da Igreja Católica e Apostólica Romana fosse aferida exclusivamente pela excelência da música que acompanha os seus rituais, concluir-se-ia que, do século XVIII até hoje a instituição passou por um vertiginoso declínio, pois embora continuem, esporadicamente, a compor-se obras dignas, estas muito raramente são executadas. A selecção exclui, naturalmente, os compositores da Europa protestante, onde o culto mariano tem sido secundarizado e até dissuadido, e exclui Stabat Maters e Magnificats, para se concentrar em obras cujo cerne é o louvor de Maria.

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O Triplo Concerto de Beethoven não será dos mais apropriados a solistas com egos muito dilatados: não só têm de partilhar a ribalta com mais dois solistas como a relação entre eles é mais de cooperação do que de despique, pelo que é recomendável que os solistas tenham experiência alargada como intérpretes de música de câmara. Como se isto não bastasse, a orquestra não se limita a proporcionar um pano de fundo para a exibição dos solistas e é também um interveniente activo – a ponto de haver quem considere o Triplo Concerto como uma “sinfonia concertante”. Beethoven não distribuiu por igual o trabalho entre os solistas, o que indicia que os intérpretes para quem concebeu a obra teriam diferentes níveis de aptidão. A parte mais elaborada destina-se ao violoncelo, que neste concerto no CCB caberá ao bielo-russo Kyril Zlotnikov, que nasceu em Minsk e completou os estudos em Israel. Aí estabeleceu as conexões e amizades que o levaram a ser co-fundador do Jerusalem String Quartet, que tem vindo a gravar regularmente para a Harmonia Mundi desde 2002 e faz parte da elite dos quartetos de corda mundiais.     [Triplo Concerto por Daniel Barenboim (piano e direcção), Itzhak Perlman (violino), Yo Yo Ma (violoncelo) e Orquestra Filarmónica de Berlim]   Neste concerto de música clássica, o violino solista será confiado a Pedro Meireles, que já passou pela Royal Philharmonic Orchestra e pela New London Orchestra e agora é 2.º concertino na Orquestra Gulbenkian. A parte menos

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