Noah Lennox, vulgo Panda Bear, é um dos mais influentes músicos independentes deste século. A viver em Lisboa há mais de uma década, foi responsável por discos seminais como Person Pitch, de 2007, ou Merriweather Post Pavillion (2009), dos Animal Collective, mas isso não lhe subiu à cabeça. Falámos sobre o novo álbum, Buoys.
Luís Severo é um dos mais inspirados escritores de canções portugueses da sua geração. Lançou em Maio o álbum O Sol Voltou – um dos melhores da colheita nacional de 2019 – e tem andado a apresentá-lo pelo país. Mas os próximos concertos em Lisboa, entre quarta-feira e domingo no Art Room, no Príncipe Real, vão ser diferentes. Vamos lá perceber porquê.
No Natal de 2017 lançaste aquele disco ao vivo, o Pianinho. E agora estes concertos em Lisboa têm como título “Guitarrinha”. Quer dizer que vais lançar mais um disco ao vivo no Natal?
Pá, não me apetecia confirmar isso, mas não é uma dedução assim tão rebuscada. Tem a sua lógica e, sendo cinco datas, ainda mais se pode questionar se não terá essa utilidade.
Não conheço aquele Art Room onde vais tocar. É uma sala grande?
Cabem 65 pessoas por concerto. Tem uma lotação muito intimista, até para poder tocar completamente a cappella. Vou ter alguns microfones pela sala, mas que são só para a captação de som. Para ter a coisa gravada. Na sala vou estar completamente acústico. É algo que nunca fiz e tinha vontade de experimentar.
Voltando um bocado atrás: o que te levou a dar aqueles concertos que estiveram na origem do Pianinho?
Em primeiro lugar, foi uma questão financeira. Nem sempre havia disponibilidade das venues e das pessoas que me contratavam para levar uma banda. E eu ia a solo. Eventualmente, quis refinar o conceito de solo e ter um espectáculo um pouco mais enriquecido, que não fosse apenas uma consequência de não ter a banda comigo, e experimentei esse formato de piano e voz. Gostei tanto do resultado que decidi lançar um disco ao vivo. Até porque algumas pessoas gostavam mais quando tocava as músicas [do disco homónimo de 2017] assim.
Sou uma dessas pessoas.
A sério? Fixe. Foi para pessoas como tu que fiz o disco [riso]. Mas também porque achei que era um momento importante, e que fazia sentido captá-lo. Até porque hoje não há muito o hábito de fazer discos ao vivo, a não ser por músicos que já estão num outro campeonato.
E o que te levou agora a dar esta série de concertos à “Guitarrinha”? No último disco, O Sol Voltou, já tocavas sozinho e num registo próximo do que eu presumo que seja o do concerto.
A grande diferença é que eu não só ensaiei mais a guitarra, como o instrumento abre mais espaço ao canto. Enquanto ao piano estou preocupado com a posição das mãos e dos dedos, com a guitarra o canto flui com mais naturalidade. Mesmo quando toco partes mais complicadas. Portanto, o que importa aqui não é só a guitarrinha. O nome até podia ser mais “vozinha”, porque estes concertos vão ser muito focados no canto.
Lançaste O Sol Voltou em Maio. Como tem sido recebido o álbum?
Muito bem. Há mais gente a ver-me ao vivo e tive feedback de pessoas a quem o disco tinha tocado de forma muito pessoal. Acho que alavancou a minha existência musical. Também houve um fenómeno interessante que foi sentir que este disco puxou pelo anterior e que algumas coisas voltaram a ser ouvidas. Isso também é bom. É sinal de que as canções não ficaram perdidas.
É a primeira vez que gravas um disco sem outros músicos. O que te levou a fazer tudo sozinho pela primeira vez?
Foi um bocado um desafio a mim próprio. E um bocado uma consolidação do trabalho desenvolvido nestes anos todos em que toquei com outras pessoas. Senti que finalmente tinha a capacidade de fazer um disco todo sozinho, porque nos últimos 11 anos tive a oportunidade de tocar com muitas pessoas diferentes e de aprender com todas elas.
Parece-me um disco mais bucólico do que os anteriores, que eram mais urbanos. Sentes o mesmo?
Acho que sim. É um disco mais de campo. Mas não só. Reflecte um período em que toquei muito fora e por isso não passei muito tempo em casa. Tento juntar os ambientes todos em que estive. Mas na verdade vem tudo da ideia de eu querer fazer um disco mais folk. E inevitavelmente um disco mais folk leva para isso, para esse som mais do campo.
Outra coisa que noto, em algumas canções, é uma maior influência da música tradicional portuguesa. Foi algo que ouviste muito?
Não sei. Ouvi muita música popular, mas acho que isso tem sobretudo a ver com o facto de ter ido para os instrumentos acústicos. Isso fez com que viesse logo alguma música mais tradicional ao de cima. Mas não foi nada forçado. Se tivesse feito arranjos como os do segundo disco teria sido diferente.
Chamas "segundo disco" ao homónimo de 2017? Mas editaste tantas coisas antes...
Chamo, porque o Cara d’Anjo é um recomeço. É um novo nível zero, assino com um novo nome. Se bem que o nome é mais uma consequência, porque acho que houve de facto uma alteração tanto no método como nos objectivos, como na execução do trabalho.
Estás a falar de objectivos financeiros?
Não. Falo apenas de sentir que estes discos mais recentes são coisas acabadas e não tanto experiências. De compor mais com o objectivo de produzir um objecto e de isso não ser apenas uma consequência de um tempo passado a experimentar coisas.
Mas já consegues viver da música, presumo.
Sim. Vivo. Mas também não tenho propriamente uma vida… Mantive o mesmo estilo de vida que tinha, que sempre tive. Só que já não penso todos os meses o que é que eu vou inventar para conseguir chegar ao fim do mês.