Música, Jazz, Guitarrista, André Fernandes
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Seis guitarristas de jazz portugueses que precisa de ouvir

A guitarra fez um longo caminho no jazz, de discreta auxiliar rítmica até à disputa do primeiro plano com saxofones e trompetes

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Os primórdios da história da guitarra jazz foram necessariamente discretos, pois até o instrumento começar a ser amplificado tinha dificuldade em fazer-se ouvir entre os sopros e a bateria. Devido ao seu fraco volume sonoro, nas big bands ficava remetida a um papel rítmico e só nos pequenos combos começou a assumir um papel solista.

No período entre as duas guerras mundiais teve três notáveis pioneiros em Eddie Lang (1902-1933), Django Reinhardt (1910-1953) e Charlie Christian (1916-1942). Com o instrumento já electrificado, surgiram figuras como Kenny Burrell, Herb Ellis, Barney Kessel e Grant Green, mas todos ele seriam ofuscados, em termos de sucesso comercial, por Wes Montgomey (1923-1968).

Nenhum destes pioneiros poderia adivinhar os papéis que o instrumento seria capaz de desempenhar quando associado a pedais de efeitos e outra parafernália electrónica. De todos os instrumentos usados no jazz, a guitarra foi o que mais sofreu as influências do rock, contribuindo para enriquecer a linguagem do jazz – os três primeiros guitarristas portugueses desta lista são exemplo dessa frutuosa permeabilidade entre géneros musicais.

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Seis guitarristas de jazz portugueses que precisa de ouvir

Mário Delgado

Mário Delgado (n. 1962) divide-se por numerosos grupos, nem todos na área do jazz, mas se se quiser seleccionar os seus dois projectos mais representativos terão de nomear-se os trios Lokomotiv, com Carlos Barreto (contrabaixo) e José Salgueiro (bateria), e TGB (Tuba-Guitarra-Bateria), com Sérgio Carolino (tuba) e Alexandre Frazão (bateria).

As suas múltiplas facetas vão da direcção musical do grupo de Janita Salomé aos Led On, um grupo de tributo aos Led Zeppelin, passando pelo quinteto Filactera, inspirado pelo universo da banda desenhada, e pelo projecto Taifas, um cruzamento de música mediterrânica e jazz com José Peixoto e José Salgueiro, e por colaborações com Maria João, Mário Laginha e Carlos Bica e, fora do jazz, com Anamar, Filipa Pais, Mafalda Veiga e Vitorino.

[“Pipabaquígrafo”, pelo trio TGB, ao vivo no Gravíssimo!, Alcobaça, 2017]

Luís Lopes

O site de Luís Lopes apresenta-o como “avesso a qualquer linearidade” e a sua carreira é, com efeito, tudo menos linear. Poderá até haver quem não descortine nalguns projectos de Lopes os elementos usualmente reconhecidos como jazz. Os tradicionalistas poderão preferir arrumar Lopes na música improvisada ou experimental, mas não poderão ignorar alguém com uma actividade intensíssima, que se divide pelos projectos Humanization 4tet, Lisbon Berlin Trio, Big Bold Back Bone, Golden Strobes, Isotope Ensemble, Lisbon Freedom Unit, Lisbon Connection, Afterfall e Guillotine e mantém um trio com Adam Lane e Igal Foni e outro com Bruno Parrinha e Ricardo Jacinto, e duos com Jean-Luc Guionnet, Julien Desprez e Noël Akchoté – a que se soma ainda a performance a solo.

Só em 2017 Lopes editou quatro discos: um com os Big Bold Back Bone (In Search of the Emerging Species), outro em quarteto com Ernesto Rodrigues, Yedo Gibson e Miguel Mira (Nephentes Hybrida), outro em quarteto com Albert Cirera, Hernâni Faustino e Vasco Furtado (Temple of Doom) e outro em trio com Ilia Belukorov e Konstantin Samolovov.

2019 foi menos intenso: saíram “apenas” três discos: Love Song: Post Ruins (a solo), Radium (com o Istope Ensemble) e o álbum homónimo dos Guillotine.

[“Dehumanization Blues”, pelo Humanization 4tet, com Rodrigo Amado (saxofone), Aaron Gonzalez (contrabaixo) e Stefan Gonzalez (bateria), ao vivo no The Wherehouse, Filadélfia, 02.07.11]

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André Fernandes

Após ter estudado no Hot Clube e no Berklee College of Music, André Fernandes (n. 1976) tem vindo a desdobrar-se pelos projectos Box, Motor, sPILL e Supertrouper (alguns deles contaminados por rock e drum’n’bass). É um dos mais activos e internacionais jazzmen portugueses e a sua discografia inclui os títulos Motor, Imaginário, Cubo, Timbuktu, Howler, O Osso, Wonder Wheel e Dream Keeper.

À intensa actividade como líder soma-se a participação no trio Northern Wind, com o contrabaixista Anders Jormin e o baterista Markku Ounaskari, e numerosas colaborações em discos de músicos nacionais (Marta Hugon, Nelson Cascais, Orquestra de Jazz de Matosinhos, Susana Santos Silva, Demian Cabaud ou, bem fora dos limites convencionais do jazz, o DJ Rocky Marsiano) e internacionais (Alexi Tuomarila, Perico Sambeat e o veterano Lee Konitz).

Fundou em 2002 a (entretanto extinta) editora Tone Of A Pitch, onde acumulava funções de produtor e engenheiro de som.

[“Inhale”, pelo André Fernandes Quarteto, com José Pedro Coelho (saxofone) Demian Cabaud (contrabaixo) e Marcos Cavaleiro (bateria), ao vivo no Porta-Jazz, Porto, 2016]

André Matos

André Matos estudou na Berklee Music School de Boston e desde 2008 que fixou residência em Nova Iorque, onde é professor na NY Jazz Academy, mas continua a visitar Portugal regularmente. Lançou seis discos em nome próprio – Small Worlds (2005), Rosa-Shock (2008), Quare (2010), Lagarto (2012), Múquina (2016) e Nome de Guerra (2018), os dois últimos em guitarra solo – e mais dois em parceria com a voz de Sara Serpa, Primavera (2014) e All the Dreams (2016).

[“O meu mundo”, pelo trio de André Matos, com Masa Kamaguchi (contrabaixo) e Devin Gray (bateria), ao vivo no Hot Clube, Lisboa, 26.08.17]

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Afonso Pais

Afonso Pais (n. 1979) fez também a sua formação nos EUA, mas é em Portugal que tem desenvolvido a sua actividade, lançando os discos Terranova (2004), Subsequências (2008), Fluxorama (2010) e Terra Concreta (2014), que tem a particularidade de ter sido gravado ao ar livre, em várias áreas protegidas de Portugal.

Os discos de Pais têm dado espaço às vozes de cantores convidados – Edu Lobo em Fluxorama, Rita Maria, Joana Espadinha, Luísa Sobral e Beatriz Nunes em Terra Concreta – uma colaboração que se tornou mais estreita nos discos Onde Mora o Mundo (2011), em parceria com JP Simões, e em Míope e o Arco-Íris (2013) e Além das Horas (2016), ambos com Rita Maria.

[O trio de Afonso Pais, com António Quintino (contrabaixo) e Luís Candeias (bateria), e o convidado Mário Delgado (guitarra), ao vivo no Hot Clube, Lisboa, 12.12.15]

Nuno Costa

Costa (n. 1980) faz parte dos trios RP3 Loft e NoA e tem composto bandas sonoras para filmes e documentários – o que não será alheio às qualidades cinemáticas da música do seu quinteto. A sua produção como líder vai em três discos: dois em quinteto – [...] (2009) e All Must Go (2012) – e outro em sexteto – Detox (2015). O seu disco mais recente, em nome do projecto Saga Cega, é À Deriva (2017), uma aproximação à pop em colaboração com a voz de Rita Maria. Em paralelo mantém uma parceria com o pianista Óscar Graça, que providencia bandas sonoras originais para clássicos do cinema mudo.

[“Desespero do Embalo”, do álbum Detox, registado em Janeiro de 2014 nos Timbuktu Studios, Lisboa, com João Moreira (trompete), João Guimarães (saxofone alto), Óscar Graça (piano), Bernardo Moreira (contrabaixo) e André Sousa Machado (bateria)]

Os nomes portugueses do jazz

  • Música

Começou por ter um papel apagado e discreto, percebeu-se que poderia ser mais do que um mero marcador de ritmo com Jimmy Blanton, emancipou-se com Charles Mingus e Scott LaFaro. Hoje é consensual que o contrabaixo não só não é um “instrumento menor” como pode assumir protagonismo equivalente ao do saxofone ou do piano e não é por acaso que alguns dos mais excitantes projectos do jazz português são liderados por contrabaixistas.  

  • Música
  • Jazz

Em contraste com a música clássica, em que a percussão costuma desempenhar um papel menor e há obras em que o percussionista passa meia hora imóvel e apenas intervém no “tcham-tcham” final, o jazz confiou, desde os seus primórdios um papel importante à bateria. Na era do swing, virtuosos como Gene Krupa e Buddy Rich deram à bateria um novo protagonismo e quando, na viragem das décadas de 1940-50, o bebop fez explodir a linguagem do jazz, havia bateristas como Max Roach e Art Blakey a liderar a revolução. Alguns dos mais excitantes grupos do nosso tempo têm bateristas à frente – e Portugal não é excepção. 

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