La Cenerentola, de Rossini
Ano e local de estreia: 1817, Teatro Valle, Roma
Compositor: Gioacchino Rossini (1792-1868)
Libretista: Jacopo Ferretti
Fonte: O libreto de Cendrillon de Charles-Guillaume Étienne (musicado por Nicolas Isouard em 1810) e o seu derivado Agatina, o la Virtù Premiata de Francesco Fiorini (musicado por Stefano Pavesi em 1814), ambos inspirados no conto Cendrillon, de Charles Perrault
Quem esteja familiarizado com as versões de A Gata Borralheira (Cendrillon) de Perrault (ou com a versão dos Irmãos Grimm), encontrará diferenças substanciais na ópera de Rossini, que resultam de o seu libretista não ter recorrido aos contos de Perrault e Grimm, mas sim a libretos de outras óperas. Desta abordagem resultou a eliminação dos elementos mágicos e alguns melhoramentos em termos da dramaturgia operática. Assim, a intervenção da fada-madrinha é substituída pela do preceptor do príncipe (é ele quem fornece a carruagem e o vestido de baile), o sapatinho de cristal é trocado por uma bracelete e é introduzido um delicioso equívoco por o príncipe trocar de roupas e papel com o seu criado de quarto. O final mantém-se, essencialmente, inalterado: Cinderela (ou melhor, Angelina) casa com o príncipe, para ilimitado desgosto e fúria das irmãs e do padrasto – mas a bondosa Angelina pede ao príncipe que perdoe os malvados (vale a pena recordar que o título completo é La Cenerentola, ossi la Bontà in Trionfo).
O recurso a libretos já existentes permitiu a Ferretti redigir o seu libreto numa só noite – ou, pelo menos, assim reza a lenda. Rossini também foi lesto: aviou a partitura de La Cenerentola em apenas três semanas e se é certo que ele completou outras óperas em prazo idêntico, nem todas exibem inspiração tão pródiga como esta. A rapidez da escrita parece ter contaminado as personagens, que debitam notas e sílabas a uma velocidade vertiginosa – em Mille et un Opéras, Piotr Kaminsky observa que só a ária “Sia Qualunque delle Figlie”, cantada por Don Magnifico (o padrasto de Cinderela), debita tanto texto como todo um acto de uma ópera de Donizetti.
[“Sia Qualunque delle Figlie”, por Paolo Montarsolo (Don Magnifico) e Orquestra do Teatro alla Scala, direcção de Claudio Abbado]