R.E.M.
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Um ramalhete de canções pop sobre flores

Primavera: as flores desabrocham por todo o lado e os cantores consultam os boletins polínicos com apreensão. Alguns, porém, fazem canções sobre essa efémera maravilha que são os órgãos reprodutivos das Angiospérmicas

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A Primavera e as flores têm inspirado cantores de todo o planeta. A playlist mais florida já de seguida.   

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Um ramalhete de canções pop sobre flores

“Flowers Never Bend with the Rainfall”, de Simon & Garfunkel

Ano: 1966

A época do Flower Power não teve álbum mais perfumado do que o terceiro do duo Simon & Garfunkel: em Parsley, Sage, Rosemary & Thyme há salsa, sálvia, alecrim e tomilho. E também esta canção, que começou por fazer parte do primeiro álbum a solo de Simon, o pouco conhecido The Paul Simon Songbook (1965), e que o músico recuperou para o disco em duo do ano seguinte.

“Flowers Never Bend with the Rainfall” é das canções menos conhecidas de Parsley, Sage, Rosemary & Thyme, mas é uma das mais belas do duo e é também um modelo de concisão – dura pouco mais de dois minutos.

A persona que canta tem dificuldade em distinguir a realidade da fantasia, não sabe se a imagem que o espelho reflecte é a sua e vê a alegria e o pesar separados por uma linha ténue – e, assim, decide escolher a ilusão: “Continuarei a fazer de conta/ Que a minha vida nunca acabará/ E que as flores nunca se vergam/ Sob a chuva”.

“Wild Mountain Thyme”, de The Byrds

Ano: 1966

“Wild Mountain Thyme” não é dos Byrds, é uma canção tradicional escocesa – também conhecida como “Purple Heather” ou “Will Ye Go, Lassie, Go?” – e já tinha sido adoptada por dois nomes graúdos da folk americana, Judy Collins (em 1961) e Joan Baez (em 1965). É uma das mais conhecidas do terceiro álbum da banda, Fifth Dimension e as malhas cintilantes das guitarras Rickenbacker de 12 cordas conferem-lhe um ambiente mais encantatório do que nas versões anteriores.

“O Verão está a chegar/ E as folhas agitam-se docemente/ E o alecrim da montanha desabrocha/ Entre a urze”.

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“San Francisco (Be Sure To Wear Flowers in Your Hair)”, de Scott McKenzie

Ano: 1967

Não há canção mais emblemática do Flower Power e do Summer of Love de 1967 que esta canção composta por John Phillips, dos The Mamas & the Pappas, e cantada por  Scott McKenzie. Foi lançada como single em Maio de 1967, subindo de imediato aos tops dos EUA, Canadá e Grã-Bretanha, e seria também ela a abrir o álbum de estreia de McKenzie, The Voice of Scott McKenzie, surgido alguns meses depois. O cantor não voltaria a averbar nenhum sucesso comparável a “San Francisco” e só gravaria mais um álbum, em 1970, antes de se retirar da actividade musical.

A canção está impregnada do espírito hippie e da contra-cultura da juventude norte-americana de então, que tinha então na Califórnia – e em particular na área de São Francisco – um dos seus baluartes: “Se fores a São Francisco/ Não te esqueças de colocar flores no cabelo/ Se fores a São Francisco/ Vais lá encontrar pessoas bem amáveis”. O refrão traça o cenário empolgante de um país que desperta para uma nova realidade: “Por toda a nação/ Sente-se uma estranha vibração/ Pessoas em movimento/ Há toda uma geração/ Com uma nova explicação”. Claro que o vaticínio não se cumpriu: muitas das “flower children” queimaram os neurónios com os cocktails psicotrópicos em voga na época e boa parte das restantes acabaram por descartar as flores, perder o cabelo, ganhar barriga e render-se ao estilo de vida “burguês” que tanto execravam. Algumas até terão votado em Trump nas últimas eleições.

“The Flowers of Guatemala”, dos REM

Ano: 1986

A canção faz parte do quarto álbum do REM, Lifes Rich Pageant, e as flores no título e na letra ocultam algo bem mais sinistro: os túmulos das vítimas do golpe de estado de 1954 na Guatemala, que foi fomentado pelo Governo norte-americano. A introdução de um salário mínimo e a implementação de uma reforma agrária pelo governo do presidente Jacobo Árbenz foram vistas como ameaças pela toda-poderosa United Fruit Company, cujo principal negócio no país era a produção de bananas – um negócio que valia quase o dobro do orçamento de Estado guatemalteco. Alarmada, a United Fruit fez pressão em Washington, convencendo o Governo de Eisenhower de que a Guatemala estava a derrapar para o comunismo. O golpe de estado, com mão da CIA, colocou no poder o militar direitista Carlos Castillo Armas, o primeiro de uma série de ditadores apoiados pelos EUA e que converteu o país numa dócil “república das bananas”, subserviente aos interesses da United Fruit Company.

Mas Michael Stipe tem um pendor irresistível por letras crípticas, pelo que misturadas com as flores “que cobrem tudo” há constantes referências a Amanita (“Amanita is the name/ They cover everything”), um género de cogumelos venenosos, que, de modo algum pode ser classificado como “flor”.

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“White Lily”, de Laurie Anderson

Ano: 1986

A canção dura pouco mais de um minuto e envolve recursos mínimos, mas é um dos momentos mais mágicos da história da música (ainda que muitos possam contestar que se trata de música). Surgiu no filme Home of the Brave, que documenta um concerto de Anderson em 1985 (e no álbum homónimo com excertos da respectiva banda sonora).

A “música” resume-se a um borbulhar electrónico e à declamação destas palavras: “Qual é o filme de Fassbinder? O homem maneta entra numa florista e diz ‘Que flor expressa o passar dos dias, o seu incessante deslizar, que nos empurra para o futuro, dias que passam incessantemente, empurrando-os para o futuro. E a florista responde: ‘Lírio branco’”.

A simbologia atribuída às flores varia consoante a cultura, a época e o autor, mas o lírio branco tem sido associado a pureza e castidade.

O filme de Rainer Werner Fassbinder a que Anderson alude é a mini-série Berlin Alexanderplatz (1980), embora nesta a resposta da florista seja “cravos brancos” (o que deixa o cliente desconcertado).

[Excerto de Berlin Alexanderplatz correspondente à cena evocada por Laurie Anderson]

“Lillies Dying”, dos Curve

Ano: 1992

O duo Toni Halliday (voz) e Dean Garcia (todos os instrumentos) fez sensação no início dos anos 90 com uma original e adstringente combinação de shoegaze e electrónica, onde coexistem camadas de guitarras saturadas de efeitos e grooves dançáveis. Apesar de haver ingredientes dream pop, as atmosferas são tão espessas, obsidiantes e claustrofóbicas que acaba por ser mais apropriado falar em “nightmare pop” – não é por acaso que um dos singles de Doppelgänger, o álbum de estreia da banda, tem por título “Horror Head”.

Não é também inesperado que, havendo flores numa canção dos Curve, estas estejam a fenecer: a letra obscura parece dar conta de um breakup amoroso em curso e certamente que nenhum dos elementos do casal tem cabeça e disposição para regar plantas, pelo que há “lilies dying in the front room”.

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“Flowers and Silence”, dos Sneaker Pimps

Ano: 1999

O trip-hop sempre favoreceu ambientes sombrios, mas o ambiente desta canção vai mais longe: a sua cadência arrastada é de uma marcha fúnebre e a letra fala de uma vida reduzida a “pele e dentes”, cuja despedida será coroada por flores e silêncio – pois é, as flores nem sempre simbolizam a Primavera...

A canção faz parte do segundo álbum da banda, Splinter, com Chris Corner a assumir o papel de cantor, no lugar de Kelli Dayton.

“Sunflower”, dos Low

Ano: 2001

A canção faz parte de Things We Lost in the Fire, o quarto álbum dos Low, e a menção a “girassóis” é impenetrável: percebe-se que alguém usou o dinheiro de um resgate para comprar “doces, doces, doces, doces girassóis e entregá-los à noite”.

A indecifrabilidade não belisca a beleza da canção.

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“Wild Roses”, de Hope Sandoval & The Warm Inventions

Ano: 2009

Nas intermitências da existência dos Mazzy Star, a cantora Hope Sandoval criou, com Colm Ó Cíosóig, baterista dos My Bloody Valentine, o projecto The Warm Inventions. Estas “rosas bravas” provêm do seu segundo álbum, Through the Devil Softly, e não se afastam muito da faceta mais folk dos Mazzy Star.

“Language of Flowers”, dos Pelican Fanclub

Ano: 2017

Os Pelican Fanclub têm o seu centro de gravidade numa dream pop enérgica com guitarras atmosféricas, mas acabam por cobrir um largo espectro estético que vai do shoegaze de “Night Diver” ao nu-metal adstringente de “Description”, sem nunca perderem identidade ou cair em estereótipos. “Language of Flowers”, incluída no seu primeiro álbum de longa duração, Home Electronics (2017), revela ainda outra faceta desta banda japonesa: a pop electrónica rendilhada.

[Versão ao vivo em estúdio, para as YouTube Music Sessions, 2017]

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O compositor Richard Rodgers e o letrista Oscar Hammerstein II compuseram dezenas de musicais para a Broadway – alguns dos quais foram adaptados ao cinema – mas apenas compuseram uma banda sonora directamente para o grande ecrã: State Fair (1945), realizado por Walter Lang. O filme começa numa quinta numa zona rural do Iowa, com a família Frake a preparar-se para o grande evento anual que é a Iowa State Fair, em Des Moines, com expectativas bem diversas: enquanto o pai, Abel, sonha obter um primeiro prémio com o seu porco Blue Boy e a mãe, Melissa, se afadiga com o prato que submeterá ao concurso de culinária, a filha, Margy, entediada com a modorrenta vida na quinta, vê a feira como uma bem-vinda quebra na rotina. É nesse estado de excitação e expectativa que Margy Frake canta “It Might As Well Be Spring”. A letra (uma das mais conseguidas de Hammerstein) transmite o desassossego sem causa nem forma definida que formiga em Margy e que, como o desenrolar do filme revelará, resulta em parte do enfado com o seu baço e provinciano namorado, Harry – na feira irá conhecer Pat, repórter de um jornal de Des Moines e homem viajado e cosmopolita, que rapidamente expulsará do seu coração o campónio Harry (que ficara na sua quinta a tratar das vacas). [Excerto de State Fair em que Jeanne Crain, no papel de Margy Frake, “canta” “It Might As Well Be Spring” (dobrada por Louanne Hogan)] O que deixa Margy desinquieta não é a “febre da Primavera” –
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