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"É ok não estar ok": o Festival Mental volta a ser incómodo com os assuntos da mente

O Festival Mental está bem de saúde e dá-lhe que fazer (e pensar) que fazer nos próximos dias

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Ninguém é 100% saudável. Ninguém sabe bem o que nos passa pela cabeça ou o que pode vir a passar. Não há emoções más, há simplesmente emoções, e é preciso olhar para elas e encará-las de frente – tratá-las se necessário. Sem medo, sem vergonha, até porque “é ok não estar ok”, confessa Ana Pinto Coelho, terapeuta e directora do Festival Mental. O festival que toca na ferida que muitos não gostam de ver aberta nem de falar sobre ela. Mas mais do que nunca é preciso normalizar a saúde mental. 

Já vai na quarta edição e não perde de vista o objectivo de sempre: quebrar os estigmas e a falta de informação sobre a temática da saúde mental. Estreia-se este ano no Cinema São Jorge, e alarga a programação ao Espaço Atmosfera M Lisboa e à Fábrica Braço de Prata,  de 30 de Setembro a 9 de Outubro. 

Do que estava a ser planeado pré-pandemia para a edição deste ano, pouca coisa mudou além das lotações das salas. “Em momento nenhum quisemos entrar em stress, em paranóia sobre se faríamos ou não o festival. O segredo foi mesmo manter a calma no meio de um ambiente de instabilidade e insegurança”, explica Ana. “Quisemos ser uma espécie de bálsamo neste contexto”. 

E esse bálsamo é, em grande parte, dar às pessoas uma ferramenta para se agarrarem ao mesmo tempo que pensam nas emoções, nos sentimentos e no seu estado mental. É uma ferramenta chamada cultura. “A cultura é a chave e a base para quebrar o estigma da saúde mental. Não há caras conhecidas que sejam um chamariz, não há um falso esforço de tornar isto comercial, porque todos nós somos a cara do Festival Mental, todos queremos ter saúde mental”, afirma.

O distanciamento do ser humano da Natureza e as consecutivas e inúmeras dependências que cria – álcool, Internet, medicamentos, drogas, consumismo – alimentam cada vez mais uma sociedade que “teima em não perceber que está doente e alienada”, diz. “As pessoas enchem as suas vidas com o trabalho e com outras coisas a que são obrigadas, estamos em piloto automático e a viver para a extinção porque desligamos tudo o que é realmente importante – nós não temos sequer tempo para pensar”.

Para a terapeuta e directora do festival, o confinamento só veio trazer à tona problemas que muita gente tinha enterrados. Surge a necessidade de pensar nas causas de um problema que é esta pandemia, e não só nas consequências – é preciso o ser humano abrandar, é preciso a economia mudar, é preciso humanizar as pessoas. 

“Os temas que vamos abordar nas M-Talks, a ansiedade e ecoansiedade, a toxicodependências e o stress pós-traumático já estavam pensados antes, mas com a pandemia continuam a fazer sentido”, explica. “A ecoansiedade, que sentem muitos jovens que estão a tentar fazer mudanças no que comem, no que compram e como vivem, é um problema grave pelo sentimento de impotência que resulta da resistência das outras gerações”.

A par das conversas, o Festival Mental tem também uma mostra de curtas-metragens, a M-Cinema, que toca em vários temas sensíveis da saúde mental como o transtorno por défice de natureza ou a imagem pré-concebida de que o homem não chora. “O ser humano entra num ciclo vicioso desde que nasce até que morre em que o sentido da vida é estudar, ter emprego, ser bem sucedido. Ninguém pergunta quem é que tu és, perguntam o que é tu fazes”, refere. “Estamos no declínio da saúde mental, estamos divorciados de nós próprios”.

O Festival Mental começou a actuar sobre o público ainda em Março, e desde o início do confinamento  foi partilhando conversas com figuras da equipa e outras mais conhecidas do grande público para partilharem sugestões culturais – o que estavam a ler, ver e ouvir na quarentena – que ajudassem a manter o equilíbrio da saúde mental de cada um. As conversas, que vão ter continuidade ao vivo no festival, estão disponíveis no canal de YouTube. 

E se o problema existe, ele também pode ser prevenido. Ana defende que a prevenção começa nas crianças, daí o festival incluir também uma vertente dedicada aos mais novos, o Mental Júnior. “Temos de apostar na prevenção da saúde mental, é preciso que as crianças percebam que ter emoções é ok. Não tem problema chorar mesmo sendo um rapazinho, que são ideias completamente erradas que se incutem aos miúdos”, explica. “Significa assim que ‘chorar que nem uma menina’ é um insulto completo, não podemos dizer isso a ninguém, é preciso normalizar as emoções”.

“No dia em que encararmos a saúde mental como encaramos a saúde física está tudo resolvido. Até lá, peçam ajuda”.

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O que não pode perder no Festival Mental

Dia 30

O festival arranca esta quarta, 30, com a perfomance de terapia expressiva Dança Movimento Terapia “Acontece” (20.30), que será um momento entre duas mulheres em processo de reabilitação que improvisam em palco. O programa segue com o debate (21.00) “Pandemia: do Real ao Digital”, com Fátima Caçador, João Gata, Susana Marvão e Tiago Sigorelho, num evento de sala aberta e que convida às questões do público presente. Ambas as iniciativas decorrem no Cinema São Jorge e são de entrada livre. 

Dia 1

Na quinta-feira, 1 de Outubro, o Festival Mental dedica-se aos jovens com o Mental Jovem e uma peça de teatro (19.30; 4€) do Grupo de Teatro da Unidade W+ da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Baile de Máscaras é apresentado no São Jorge e remete para questões de personalidade e identidade.

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Dia 2

De volta nesta edição está também o M-Cinema (5€ dia/13€ três sessões), a Mostra Internacional de Curtas Metragens, que estará dividida por três sessões (dia 2, 3 e 4; 18.00) e apresenta um conjunto de 19 filmes de 13 nacionalidades selecionados através da Open Call 2020, e que se unem pela temática da saúde mental. A primeira sessão acontece sexta, 2, no São Jorge. Nesse dia, às 21.00, decorre também a primeira M-Talk (8€ dia/21€ três dias), os painéis temáticos sobre um assunto relacionado com a saúde mental e que são sempre acompanhados de uma projeção de uma longa-metragem. Este será sobre ansiedade e o filme escolhido é Guia para um Final Feliz de David O.Russell.

Dia 3

A segunda sessão do M-Cinema acontece sábado, dia 3, no São Jorge às 18.30, e por lá continua a programação com a M-Talk sobre Toxicodependências (21.00) e o respectivo filme (22.00) O Ben Está de Volta, de Peter Hedges.

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Dia 4

Sem sair do São Jorge, as curtas-metragens continuam no dia 4 (18.00), e às 21.00 volta a debater-se mais um tema nas M-Talks, desta vez será stress pós-traumático, uma conversa seguida do filme Nunca Estiveste Aqui, de Lynne Ramsay. Aliando-se a esta programação acontece também o Mental Júnior, porque falar da saúde mental é também para os mais pequenos. Neste dia, há sessões de cinema temáticas (14.45; 2€-5€) onde serão projectadas a curta-metragem Um Seguidor Inabalável e o filme de animação O Amigo Gigante.

Dia 8

A 8 de Outubro dá-se o lançamento do livro (18.30) “Cartas do Confinamento de 23 de Março a 1 de Maio”, de Tiago Salazar e Frederico Duarte Carvalho, no Espaço Atmosfera M Lisboa. O livro mostra a correspondência entre os dois escritores durante os primeiros 40 dias de confinamento. 

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Dia 9

A encerrar o Festival Mental, a Fábrica Braço de Prata recebe o espectáculo My Story My Song, com Surma e Katia Guerreiro (21.00; 8€). Esta iniciativa junta as duas artistas em palco para contarem episódios menos bons da saúde mental e o que é que ouviam e tocavam na altura – tudo isto envolto num momento musical.

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