Críticas de cinema

Os filmes que estão ou estiveram em cartaz, avaliados pelas críticas de cinema da Time Out

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Críticas de cinema - 5 Estrelas

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Há duas figuras tutelares que presidem a A Mão de Deus (Netflix), o novo – e profunda e melancolicamente autobiográfico – filme de Paolo Sorrentino. Uma é Diego Armando Maradona, que em 1984 foi jogar para o Nápoles, concretizou uma espécie de milagre profano, deu à equipa napolitana os seus primeiros dois títulos e instalou na cidade um culto com o seu nome que dura até hoje. E foi, indirectamente, o responsável por Fabietto Schisa (Filippo Scotti, o alter ego de Sorrentino no filme) não ter tido o mesmo trágico destino dos pais, já que nesse dia o Nápoles jogava em casa e Fabietto não os acompanhou para a casa de campo onde morreram intoxicados por uma fuga de dióxido de carbono.

A outra é Federico Fellini, de quem os filmes de Paolo Sorrentino sempre mostraram influências, sobretudo no gosto pelo grotesco e pela excentricidade humana. Influências essas nunca mais fortes e presentes do que em A Mão de Deus, onde o mestre vai até Nápoles em busca de figurantes para a sua próxima realização e Marchino, o irmão mais velho de Fabietto, que quer ser actor, vai ao casting. Fabietto acompanha-o e fica na sala de espera, rodeado de candidatos, cada um mais bizarro do que o outro. E ao recordar a sua juventude napolitana neste filme, onde as boas recordações se combinam com uma dor imensa e inapagável, Sorrentino faz com que A Mão de Deus esteja para si como Amarcord está para Fellini – e termina a fita com um aceno a Os Inúteis.

Só a crónica familiar retroactiva e a evocação sorridente e lânguida da Nápoles dos anos 80 bastariam para fazer de A Mão de Deus um grande filme. Há as tias gordíssimas e faladoras, os tios extravagantes, a parente desbocada que até em dias de calor assassino não tira o casaco de peles que o filho lhe deu, a escultural e sensual tia Patrizia (Luiza Ranieri), a quem São Januário apareceu para a fazer fértil e lhe apalpou o rabo, o amigo piloto de lanchas que contrabandeia tabaco, a baronesa vizinha do andar de cima que acha tudo “uma piroseira”, Maria (Teresa Saponangelo), a mãe de Fabietto, que faz malabarismo com laranjas e gosta de pregar partidas, o pai Saverio (o indispensável Toni Servillo), bancário, que se recusa veementemente a comprar um comando para a televisão (“Sou comunista!”, justifica) e comunica com a mulher com um assobio cúmplice, a irmã Daniella que está sempre metida na casa de banho e só vemos mesmo no final do filme. E os planos aéreos da baía de Nápoles a brilhar ao sol, os barulhentos almoços estivais da família, a luz macia do fim de tarde a atravessar as oliveiras, os banhos de mar colectivos, a euforia compartilhada das vitórias do Nápoles.

Mas há ainda o solitário e insatisfeito Fabietto, ainda mais após o desaparecimento dos pais. Fabietto que só viu dois ou três filmes na vida mas decide ser cineasta e ir para Roma, para fugir a Nápoles, à solidão e a essa realidade que “não presta” e que o cinema ajuda a enganar, como o irmão Marchino ouviu Fellini dizer, e que se intrometeu da forma mais brutal possível na sua vida, partindo o coração e a espinha dorsal à família para sempre. Fabietto que terá uma iniciação sexual tão inesperada quanto carinhosa, e será cerradamente criticado nas suas intenções, mas também encorajado, por um dos mais destacados realizadores napolitanos, Antonio Capuano (Ciro Capano), o mentor de Paolo Sorrentino na vida real, que o ajudou a talhar o seu futuro. A homenagem aos pais que é A Mão de Deus desdobra-se, no segundo tempo do filme, em entrega a uma arte (o cinema) que servirá também como bálsamo da incomensurável dor sentida.

Serenamente afectuoso e pungente, pessoalíssimo e por isso sentido por Paolo Sorrentino como nenhum dos que fez antes, A Mão de Deus é um dos seus melhores filmes, juntamente com A Grande Beleza, e um dos grandes filmes deste ano. É um pecado que em Portugal não possa ser visto no cinema e esteja apenas acessível em streaming.

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  • 5/5 estrelas
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Desviando-se de uma fórmula tão bem engomada quanto os smokings de James Bond, Sem Tempo para Morrer despede-se de Daniel Craig com tantas surpresas que é difícil saber por onde começar. Existem decisões narrativas sem precedentes e de grande magnitude; 007 relaciona-se não com uma, mas com várias mulheres como suas iguais; e, a certa altura, até faz panquecas para uma criança.

A melhor surpresa de todas, porém, é o quão bom este filme é. Muito atrasado, sobretudo devido a uma troca na cadeira do realizador (saiu Danny Boyle saiu pata entrar Cary Fukunaga), chega finalmente aos cinemas para nos lembrar do poder que o grande ecrã exerce sobre blockbusters bem urdidos. É também o Bond mais engraçado de sempre, com uma escrita vibrante (muito possivelmente devido às contribuições de Phoebe Waller-Bridge), concretizada com desenvoltura por Craig e companhia.

A reintrodução de James Bond na abertura do filme – que envolve a praça de uma cidade, o seu Aston Martin DB5 e metade de Spectre, enquanto Bond é puxado de um devaneio romântico com Madeleine Swann (Léa Seydoux) – é uma cena icónica que limpa as teias de aranha do franchise em dez minutos esmagadores. De elegante e enamorado, Craig rapidamente está de volta à forma como o conhecemos e amamos: ferido e maltratado, a ceder ao canto da sereia do dever, enquanto a CIA e o MI6 lutam por uma nano-arma perdida.

Fukunaga e o seu director de arte, Linus Sandgren (La La Land), encontram notas de elegância visual em todo o lado. Uma sequência numa quinta de Havana pode ser a coisa menos convencional de se ver num franchise que, não nos esqueçamos, já nos deu um submarino-crocodilo e Christopher Walken. Lá, Bond e Ana de Armas deambulam pelo que parece ser um sonho de David Lynch repleto de queijo, à procura de um cientista com acesso àquele MacGuffin todo-ameaçador da humanidade.

A reforçar o elenco de personagens femininas está Nomi, a agente 00 de Lashana Lynch, que partilha uma boa anti-química com Bond, no que parece um passo significativo para as duas personagens.

E o vilão? O Safin de Rami Malek puxa os seus cordelinhos quase sempre fora de cena, mas lá consegue o seu momento num terceiro acto que vai emocionar qualquer um que anseie pelos cenários massivos da era de Ken Adam e os sonhos megalómanos de Dr No.

Se uma duração de quase três horas faz soar alarmes, este Bond é um banquete surpreendentemente light. Ele voa de um local habilmente escolhido para outro (é favor adicionar Matera, no Sul da Itália, à sua bucket list), mas as cenas mais lentas e de desenvolvimento de personagens – o calcanhar de Aquiles de alguns dos Bonds mais recentes – vêem-se muito bem também.

Só a Moneypenny de Naomie Harris é que parece errada. Depois de uma introdução dinâmica como agente de campo em Skyfall, o franchise parece não saber o que fazer com ela, com a Nomi de Lynch a ocupar a lacuna que Harris poderia ter preenchido. Até mesmo o meme residente do MI6, Tanner (Rory Kinnear), parece ter tido mais com que trabalhar.

Outros resmungos centram-se numa batalha climática que permanece mais do que devia, e uma ou duas cenas de violência desnecessariamente chocantes. Mas por quaisquer métricas usadas para medir um filme de James Bond – trama rígida, vilões nojentos, sinceridade emocional – a apresentação final de Daniel Craig é um sucesso estrondoso. #CraigNotBond parece uma realidade muito distante, em todos os sentidos.

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  • 5/5 estrelas
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A corrupção é um tema recorrente no cinema romeno recente (recorde-se O Exame, de Cristian Mungiu), e em Colectiv–Um Caso de Corrupção, de Alexander Nanau, é o documentário a tratar dela, através da crónica da investigação feita pelo maior diário desportivo do país. Após um incêndio numa discoteca de Bucareste em 2015, a Colectiv do título, que causou muitos mortos e feridos, uma equipa de jornalistas da Gazeta Sporturilor foi procurar a razão da morte, nos meses seguintes, de vários dos feridos que estavam internados, descobrindo uma fraude com os desinfectantes usados nos hospitais do país, que por sua vez revelou uma sinistra rede de corrupção envolvendo médicos, enfermeiros, políticos, professores e mafiosos, e levou à queda do governo. Colectiv–Um Caso de Corrupção é um filme sobre o papel fundamental de uma comunicação social livre, independente e corajosa nas nossas sociedades.

  • Filmes
  • Documentários
  • 5/5 estrelas
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A francesa Alice Guy-Blaché (1873-1968) não foi apenas a primeira mulher a realizar um filme, em 1896 (A Fada das Couves). Foi também a primeira a ser directora de produção de um estúdio (a Gaumont, em Paris), e a fundar e liderar uma produtora cinematográfica (a Solax, em Nova Jérsia, nos EUA, em 1910, juntamente com o marido, Herbert Blaché, e um sócio, George A. Magie, quando nem sequer se sonhava com cinema em Hollywood e a região de Nova Iorque era o coração da indústria das imagens em movimento na América).

Em França, Blaché foi secretária de Léon Gaumont, conheceu os irmãos Lumière e Georges Méliès, trabalhou com Louis Feuillade, realizou uma das primeiras superproduções, A Vida de Cristo, em 1906, e foi uma das pioneiras no uso do som sincronizado com a imagem no cinema. Nos EUA, à frente da Solax, o maior estúdio de cinema pré-Hollywood, dirigiu a actriz Lois Weber, que se tornaria na primeira realizadora americana (e que lhe “roubaria” o marido), assinou o primeiro filme com um elenco todo composto por actores negros (A Fool and his Money, 1912) e rodou com nomes como Ethel e Lionel Barrymore ou Alla Nazimova.

Entre aqueles que viram os seus filmes, a elogiaram e citaram como influência, constam Sergei Eisenstein e Alfred Hitchcock. Até fechar os seus estúdios e abandonar a realização, em 1920, Alice Guy-Blaché manivelou mais de mil filmes mudos, 22 dos quais de longa-metragem. Sobrevivem hoje cerca de 150. Durante algumas décadas, Blaché esteve esquecida, em especial em França, o seu país natal. Não era referida nos livros de cinema e os seus filmes eram atribuídos a outros. Até mesmo Henri Langlois, o lendário director da Cinemateca Francesa, parecia não ter conhecimento da sua existência e importância.

Blaché escreveu a autobiografia nos anos 40, mas ninguém a quis publicar, o que só aconteceu após a sua morte, em 1976. Ao longo da vida, sempre procurou corrigir a sua ausência dos livros de cinema e dos registos da indústria, e os erros sobre os seus dados biográficos e a atribuição da autoria dos filmes, bem como listá-los, saber onde se encontravam e chamar a si os direitos. Graças à filha e à nora, a alguns jornalistas e historiadores de cinema e ao trabalho das cinematecas, Alice Guy-Blaché não foi completamente esquecida. Muitos dos seus filmes foram conservados, encontrados e recuperados (vários deles podem agora ser vistos no YouTube). Fizeram-se documentários e livros sobre ela e o nome da realizadora acabou por ser reposto onde devia e merecia estar nos registos da história do cinema.

É num desses livros, Alice Guy-Blaché: Lost Visionary of the Cinema (2002), da investigadora Alison MacMahan, que Pamela B. Green se apoiou para fazer o documentário Be Natural – A História Nunca Contada de Alice Guy-Blaché, narrado por Jodie Foster. Recorrendo a entrevistas, depoimentos, documentos e imagens de arquivo, e também a recriações digitais, a autora não se limita a contar, com o maior detalhe e o máximo de informação, e de forma visualmente atractiva, entusiasmada e dinâmica, a história da vida cheiíssima e da impressionante carreira no cinema de Alice Guy-Blaché, e a destacar-lhe a personalidade, o pioneirismo e o talento – bem como a modéstia.

Além dos familiares, e dos jornalistas, historiadores e investigadores que sempre se interessaram por Blaché e pela sua obra, Pamela B. Green mostra ainda em Be Natural – A História Nunca Contada de Alice Guy-Blaché a importância dos coleccionadores, cinematecas e arquivos de cinema de todo o mundo, na preservação, busca e restauro dos seus filmes. É um verdadeiro trabalho detectivesco e genealógico, que a leva a vários países e a põe no encalço de parentes e descendentes de pessoas que conheceram a realizadora e trabalharam com ela na Gaumont ou na Solax, ou que se interessaram por ela e pela sua obra, e mesmo à detecção e identificação de filmes de Blaché.

Paralelamente, Green ainda arranja tempo para referir outras contemporâneas de Blaché que foram também pioneiras e nomes relevantes nos primórdios da Sétima Arte, recordar o peso e a presença das mulheres na indústria cinematográfica desse tempo, e os obstáculos que encontraram e enfrentaram, e mostrar como muitas delas caíram no quase total esquecimento. No título deste completíssimo, empolgado e empolgante documentário, está a frase “Be natural”. Ela constava numa placa que Alice Guy-Blaché mandou pôr bem visível nos estúdios Solax em Nova Jérsia, e que era um conselho aos actores dos seus filmes: sejam naturais e não artificiais ou afectados. E pelos filmes que chegaram até nós, podemos ver que foi seguido à letra.

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  • 5/5 estrelas
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No dia 2 de Junho de 1962, na cidade industrial de Novocherkassk, na URSS, agentes do KGB dispararam sobre os operários que tinham entrado em greve e se manifestavam contra a falta de comida, a subida dos preços e os cortes nos salários, deixando mais de 25 pessoas mortas e quase 90 feridas. Andrei Konchalovsky reconstitui os acontecimentos de forma avassaladora, e do ponto de vista de Lyuda (Julia Vysotskaya, mulher do realizador), uma fiel militante e quadro do partido, cuja filha se manifestava e desapareceu na confusão, mostrando o colapso das suas convicções perante as implacáveis e brutais evidências do totalitarismo comunista. Em Caros Camaradas!, o instinto maternal triunfa sobre a convicção ideológica.

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  • 5/5 estrelas
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O ciclo Joseph Losey, Cineasta Essencial acolhe, em cópia digital restaurada, esta adaptação sumptuosa e pastoral do livro de L.P. Hartley feita por Harold Pinter, que valeu a Losey a Palma de Ouro do Festival de Cannes de 1971. Alan Bates, Julie Christie, Edward Fox e Dominic Guard interpretam uma história de amor secreta entre um homem e uma mulher de classes sociais diferentes na Inglaterra rural de 1900, e mediada por um rapazinho que serve de correio entre ambos.

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  • 5/5 estrelas
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Reposição, em cópia digital restaurada, no ciclo Rever Joseph Losey, Cineasta Essencial, deste filme de 1968, um drama psicológico mórbido com contornos de policial, e uma das realizações menos vistas de Losey. Elizabeth Taylor personifica uma prostituta de meia-idade que vive em Londres e um dia acolhe em sua casa uma desamparada rapariga órfã (Mia Farrow) que se parece com a filha que perdeu há muitos anos. Tudo parece correr bem entre as duas mulheres, até ao aparecimento do ameaçador padrasto da rapariga (Robert Mitchum), que vai perturbar a harmonia existente.

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
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As discussões sobre se Citizen Kane – O Mundo a Seus Pés é o melhor filme alguma vez feito vão durar para sempre. Mas o melhor filme sobre Citizen Kane – O Mundo a Seus Pés (e provavelmente sobre qualquer outro filme) é este. Definitivamente. O 11.º filme de David Fincher é uma pródiga carta de amor à velha Hollywood em toda a sua glória, cinismo e extravagância. É trabalhado com o tipo de elegância monocromática que implora para ser absorvida no grande ecrã – embora a televisão sirva perfeitamente por enquanto.

“Mank” é Herman J. Mankiewicz (Gary Oldman), o dramaturgo irreverente, encharcado em álcool e viciado no jogo a que Orson Welles (Tom Burke) recorre para o ajudar a escrever o guião de Citizen Kane – O Mundo a Seus Pés. Trata-se de um dos melhores escritores de Hollywood, um talentoso dramaturgo da Broadway aliciado pela promessa de muito dinheiro e pela possibilidade de desempenhar o papel de bobo sagrado numa corte de magnatas movidos pelo ego. Mas, para pormos as coisas educadamente, Mank é uma pedra no sapato de Tinseltown, e Oldman tira todo o partido de cada aparte espertalhão, de cada tirada arrogante e grandiloquente, num argumento que é rico em ambos.

Esse argumento é a conquista póstuma do pai de Fincher, Jack, cuja história estava a aguardar financiamento desde 1997. Ou talvez estivesse apenas à espera que aparecesse a Netflix, porque quando Welles se gaba a Mankiewicz de conseguir sempre a “edição final, tudo final” para Citizen Kane – O Mundo a Seus Pés, esse pedaço de diálogo conta a dobrar para Mank. Este opus de época, feito a preto e branco, sobre um argumentista relativamente desconhecido não é exactamente o que chamaríamos de uma proposta mainstream, e Fincher tem carta branca para usar todos os brinquedos e técnicas à sua disposição. Mas não é preciso ser um cinéfilo empedernido para o ver. Nem por sombras.

Mank apresenta o seu protagonista em 1940, a caminho da ruína: um acidente de carro deixa-o acamado, e Welles assegura-se de que a cama em questão esteja num remoto rancho da Califórnia, onde uma secretária britânica, Rita Alexander (Lily Collins, Emily in Paris), e uma fisioterapeuta alemã (Monika Gossmann) conseguem mantê-lo longe da bebida por tempo suficiente para cumprir o seu exigente prazo.

Um flashback faz-nos então retroceder uma década. Dá-nos a ver uma versão de Mank em plena actividade, alinhavando com os seus colegas novas ideias para filmes, no escritório do patrão da Paramount, David O Selznick, antes de passar para a órbita do fanfarrão Louis B Mayer, o manda-chuva da MGM (Arliss Howard interpreta-o carregando na malícia e na intimidação). Esta fase do filme é um quem-é-quem das mais altas figuras de Tinseltown que nunca cai na caricatura, uma enfermidade de que padecem outros filmes sobre a indústria do cinema. As estrelas surgem de forma tão densa e rápida que nem se sente particularmente a ausência de uma Joan Crawford aqui ou um Charlie Chaplin ali.

Mank está completamente comprometido com o seu estilo wellesiano, com fades teatrais no fim das cenas, eco nas misturas de som, uma banda sonora de Trent Reznor e Atticus Ross a pedir meças a Bernard Herrmann, e uma grande profundidade de campo. O director de fotografia, Erik Messerschmidt, emula o seu homólogo de Kane, Gregg Toland, capturando cada troca de olhar conspirativa e desdenhosa nos planos de fundo das cenas de festa sumptuosamente encenadas. Messerschmidt baseia-se na autenticidade da cinematografia daquele período, certificando-se de que o seu trabalho nunca se transforma num pastiche.

Há poucas coincidências quando está em causa Fincher, e o número de britânicos no elenco não será uma delas. O realizador persegue deliberadamente um estilo de época no que diz respeito à interpretação, e encontra-o em Collins, toda Vivien Leigh e Deborah Kerr. As cenas delicadas com Oldman são pontos altos e podem mesmo merecer-lhe o reconhecimento da Academia nos Óscares. A contenção também lá está, com a interpretação que Charles Dance faz de William Randolph Hearst, o magnata da imprensa que inspirou a personagem Charles Foster Kane. O “Cidadão Hearst” é uma besta completamente diferente do magnata ficcional: uma presença taciturna e vampiresca nas festas em que é ele próprio o anfitrião, num castelo semelhante a Xanadu. É numa dessas festas que Mank finalmente – e fatalmente – vai para fora de pé.

Nada falha. Burke é maravilhoso, como sempre, apesar de um nariz protético que, de perfil, o faz parecer tanto Sam, a Águia (dos Marretas) quanto Orson Welles. Tuppence Middleton é demasiado jovem para interpretar a mulher de Mankiewicz, Sara (um casal que na vida real é da mesma idade). Mas a actriz faz um excelente trabalho em diálogos que decorrem sobretudo por telefone, enquanto a vida do marido se transforma num furibundo caos. Amanda Seyfried está na melhor forma de sempre como Marion Davies, a amante de Hearst, alguém muito mais inteligente do que a personagem que terá inspirado em Citizen Kane – O Mundo a Seus Pés, Susan Alexander.

Inevitavelmente satisfatório é o show de Oldman. Seja em cenas que o têm preso à cama, seja rezingando espirituosamente com os anfitriões de mais um sarau decadente, ou distanciando-se das corrosivas alianças políticas de Hollywood, Oldman é magnético. Interpreta Mank como um patife adorável, com uma língua que o põe em apuros e uma caneta que o salva deles. A última vez que Oldman deu corpo a um alcoólico na década de 1940, ganhou um Óscar por isso. Não será surpreendente se isso voltar a acontecer.

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
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Para assinalar os 40 anos da estreia de Apocalypse Now, que ganhou então a Palma de Ouro do Festival de Cannes, Francis Ford Coppola apresenta uma nova versão do filme, que rapa 20 minutos à versão Redux, estreada em 2001 e que é a mais longa das existentes. Apocalypse Now: Final Cut foi restaurada do negativo original em 4K ec Dolby Atmos. Coppola pode esticar e encolher o filme à vontade. O filme será sempre uma experiência cinematográfica única e avassaladora sobre a guerra do Vietname, traduzida em termos de uma viagem irreal e alegórica ao mais fundo das forças primitivas que podem apoderar-se dos homens. E onde a selva é uma personagem tão fundamental como Willard, Kilgore ou Kurtz.

Por Eurico de Barros

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  • 5/5 estrelas
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A segunda longa-metragem da Ovelha Choné e de todos os seus comparsas da quinta Mossy Bottom é parte paródia genial ao cinema de ficção científica pós-Guerra das Estrelas, parte comédia burlesca esfuziante, combinando a tradicional animação de volumes fotograma a fotograma que é marca criativa dos estúdios Aardman e efeitos digitais, sem que fique uma suspeita de costura a ver-se. Um simpático e jovem extraterrestre aterra o seu disco voador junto da quinta e Choné e companhia vão ajjudá-lo a voltar para casa e evitar que seja capturado pelo governo. É o filme de animação do ano, a comédia do ano, a aventura de ficção científica do ano e a produção de temática rural do ano. Simplesmente méééééééravilhoso.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

O novo filme de Martin Scorsese, que em Portugal pode ser visto apenas na Netflix, é a longa despedida do realizador a uma geração extinta de mafiosos, e ao próprio género de gangsters tal como ele o definiu e celebrizou. Robert De Niro interpreta Frank Sheeran, o irlandês do título, que serviu a Máfia ao longo de várias décadas, foi muito próximo do desaparecido líder sindical Jimmy Hoffa, e já velho e doente, tendo sobrevivido a toda a gente, recorda esses tempos.

Em O Irlandês, o Scorsese de Tudo Bons Rapazes e Casino encontra o Scorsese de A Última Tentação de Cristo e Silêncio. A sobreexcitação visual e a violência espectacular são substituídos pela calma, pela compostura, pela melancolia, pelo peso do tempo, pela agonia moral e pelo sentimento de culpa. Também com Al Pacino num Hoffa espalha-brasas e Joe Pesci surpreendente num chefe mafioso todo ele ponderação, bom senso e discrição. Até quando manda matar alguém, é de forma reservada.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

O sul-coreano Bong Joon-ho ganhou este ano o Festival de Cannes com este filme parte drama familiar de fundo social, parte comédia negra satírica, parte filme de terror "político", que põe em cena as tensões, idiossincrasias, desigualdades e fantasmas colectivos da Coreia do Sul. Uma família pobre que vive de pequenos trabalhos e esquemas consegue infiltrar-se na luxuosa casa de uma família rica e frívola, e tudo corre bem até a história dar uma reviravolta quebra-costas. Joon-hoo dá a esta história local uma ressonância universal, e passa em Parasitas uma visão pessimista da natureza humana.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Hollywood, 1969. Leonardo DiCaprio é Rick Dalton, uma antiga vedeta da televisão que não consegue singrar no cinema, e Brad Pitt é Cliff Booth, o seu “duplo”, melhor amigo e fiel assistente, neste formidável novo filme de Quentin Tarantino. O realizador de Pulp Fiction e Jackie Brown conta uma história de amizade masculina sólida como betão, ao mesmo tempo que recria ao milímetro a Los Angeles de há 50 anos, onde viveu desde muito novo, exprime o seu amor pelo cinema, pela música pop, pela cultura consumista e pelos automóveis , e propõe um fim diferente para uma tragédia ocorrida em Agosto desse fatídico ano de 1969. Imperdível.

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  • Acção e aventura
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Akira Kurosawa realizou em 1985 esta fita histórica, que adapta Rei Lear, de Shakespeare, para o Japão do tempo dos samurais. e que regressa agora aos cinemas em cópia restaurada em 4K. "Ran" significa, em japonês, caos, confusão, revolta. É precisamente isso que Kurosawa filma, com uma turbulência épica e uma superior mestria visual. Tal como já havia feito em 1957 em Trono de Sangue (inspirado por Macbeth), o autor de Os Sete Samurais volta aqui a combinar o teatro Nõ, a tragédia ocidental de matriz shakespeareana e a espectacularidade bélica do filme de samurais (ou Jidaigeki), que ele cultivou como nenhum outro. É a reposição do ano.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 5/5 estrelas
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Realizado em estreia por Josh Cooley e escrito pelo grande Andrew Stanton, Toy Story 4 é o melhor filme da série da Pixar sobre os brinquedos vivos liderados pelo cowboy Woody,  e aquele em que é atingida uma intensidade emocional e uma vibração existencial que envergonham o cinema de imagem real. Interessamo-nos, preocupamo-nos, sofremos e vibramos por um conjunto de brinquedos criados por computador como se fossem pessoas verdadeiras. A nova personagem mais importante desta parte 4 é Garfy, um garfo de plástico descartável transformado em brinquedo pela pequena Bonnie, e a intriga, que decorre durante uma viagem de férias da família desta, casa superiormente drama e comédia, até um final tão surpreendente como comovente. A qualidade da animação é assombrosa e as interpretações vocais fabulosas. Um dos melhores filmes do ano.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 5/5 estrelas
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Antonioni e Patricia Highsmith são dois dos nomes que podem vir à baila a propósito de Em Chamas, do sul-coreano Lee Chang-Dong, que se inspira num conto de Haruki Murakami, por sua vez inspirado por um outro de William Faulkner. É um filme enigmático, difuso e sinuoso que assenta num trio de personagens, uma das quais desaparece a certa altura, e que pode ser visto como um thriller movediço e ambíguo, com tempero de mal-estar existencial e de disfunções emocionais, mas também como uma história por onde passam vários dos problemas da Coreia do Sul de hoje e de uma nova geração de coreanos. E que bem filma Chang-dong, como se pode ver pela sequência em que a personagem feminina dança seminua ao ar livre, ao som de Miles Davis, enquanto a luz do dia vai desaparecendo. É um grande momento de cinema puro, que levamos connosco, tal como o final magnificamente desvairado, quando há, enfim, chamas. E muito sangue.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Mais uma delicadíssima, sumptuosa e divertida longa-metragem animada do japonês Mamoru Hosoda, que combina animação tradicional e efeitos digitais sem que se veja uma costura. Esta história de Kun, um menino de quatro anos que fica cheio de ciúmes e de raiva da irmã recém-nascida, anda para a frente e para trás no tempo, e ensina ao pequeno protagonista o significado e a importância que têm a memória e a continuidade familiar.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
A Pereira Brava
A Pereira Brava

O turco Nuri Bilge Ceylan filma uma história de frustração pessoal e de conflito entre um pai e um filho, numa vila da Anatólia, com o seu notável talento visual. A Pereira Brava é mais verboso do que o habitual em Ceylan, mas isso não afecta absolutamente nada este admirável filme, que tem mais de três horas mas nunca exaspera nem pesa no espectador.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Clint Eastwood realiza e interpreta Correio de Droga, baseado numa história real que deu uma grande reportagem no The New York Times: a de Earl Stone, um veterano da II Guerra Mundial que aos 90 anos se tornou no mais valioso correio de droga de um cartel mexicano. Eastwood transforma o enredo em mais uma das suas meditações sobre a velhice e a perplexidade perante o mundo contemporâneo. Vendo o seu negócio de cultivo de orquídeas falido por causa da internet e despejado de sua casa, Earl começa a transportar droga na sua carrinha para poder ter dinheiro e tentar reconciliar-se com a família, que cortou com ele por causa da sua dedicação obsessiva às flores, até perceber a enormidade daquilo em que se meteu e ter um rebate de consciência. É um filme moral mas não moralista. A realização é notavelmente fluida, prática e eloquente, e sem o menor elemento supérfluo, e no papel de Stone, Clint Eastwood tira todo o partido da sua cara enrugada e da sua voz de gravilha para transmitir simpatia e afabilidade, indignação e desprezo, mas também arrependimento. A cena que tem com Dianne Wiest, que interpreta a sua ex-mulher, no leito de morte desta, está entre as mais comoventes de todos os filmes que fez.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
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Robert Redford encerra a sua carreira de actor no cinema em grande estilo, com uma última e inesquecível interpretação. Neste filme de David Lowery baseado em factos reais e passado no início dos anos 80, ele é Forrest Tucker, um assaltante de bancos septuagenário e cavalheiresco. Redford interpreta-o usando toda a memória do seu passado cinematográfico, e com a economia
de gestos, palavras, expressões, comportamentos e emoções de um actor que já não tem nada a aprender, exibir ou provar. Todo
o filme, e todo o restante elenco, uma feliz e homogénea mistura de veteranos como Redford (Sissy Spacek, Danny Glover, Tom Waits, Keith Carradine) e de gente mais nova (Casey Affleck,
Tika Sumpter, Elizabeth Moss), partilham dessa parcimónia eloquente e dessa atitude pausada, sem pressas, de Tucker. Não há neste filme o mais leve vestígio da lufa-lufa que afecta o cinema americano de hoje. O Cavalheiro com Arma é o imenso adeus de uma das últimas lendas vivas do cinema.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Justin Benson e Aaron Moorhead realizam e interpretam este filme indie de terror cósmico com fumos de ficção científica (Benson também assina o argumento) feito sob a sombra tutelar de Lovecraft. É a história de dois irmãos que regressam à seita ufológica e milenarista a que pertenceram quando eram jovens, depois de receberem uma estranha mensagem. Os autores não têm orçamento para grandes efeitos especiais, por isso tudo depende aqui (e muito bem) da sugestão, da alusão, dos sinais inquietantes ou insólitos ou do jogo com a nossa percepção do real, para a criação de um clima de terror crescente e de catástrofe iminente com origens sobrenaturais. O Interminável tem tudo para se tornar num filme de culto e é uma das grandes surpresas deste ano cinematográfico.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Com mais de cinco horas de duração, e estreado em partes, este filme do japonês Ryusuke Hamaguchi é um monumento de naturalismo e de verismo emocional e psicológico. Delicado e esmagador.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Vencedor do Prémio de Realização do Festival de Cannes, o polaco Pawel Pawlikowski (Ida, Óscar de Melhor Filme Estrangeiro), conta aqui uma história de
amor agitada, acidentada e ziguezaguante entre um homem e uma mulher (a fabulosa Joanna Kulig e Tomasz Kot), vivida do pós-guerra aos anos 60, entre o Leste totalitário e a Europa livre. Inspirando-se na história dos seus próprios país, Pawlikowski filma esta tragédia de um amor ardente em tempos de rigorosa invernia ideológica em apenas 88 minutos, recorrendo a uma banda sonora mesclada de música folclórica polaca, jazz e rock dos inícios, e com uma economia narrativa que só realça ainda mais a alta temperatura das emoções em jogo. Um dos melhores filmes do ano.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 5/5 estrelas
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The Incredibles 2 - Os Super-Heróis
The Incredibles 2 - Os Super-Heróis

No segundo filme animado da superfamília Parr, de novo realizado por Brad Bird, há novidades sobre os papéis domésticos do Sr. Incrível e da Mulher-Elástica, bem como sobre os superpoderes do bebé Jack-Jack, de que o realizador aproveita para tirar o máximo rendimento cómico. Em tudo o resto, e felizmente, Bird mantém as qualidades técnicas, estéticas, visuais, narrativas e humorísticas que fizeram do original (datado de 2004) uma das expressões mais altas da animação por computador da Pixar, evitando ainda 
a tentação de emular, ao seu nível e neste universo específico, os detestáveis filmes de super-heróis da Marvel e da DC. Que, e a propósito, The Incredibles 2: Os Super-Heróis bate em toda a linha.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Armando Iannucci, criador de séries de sátira política como The Thick of It e Veep, flagela de riso (muito, muito negro) o horror totalitário em A Morte de Estaline. Baseado numa BD francesa. Com Michael Palin, Steve Buscemi e Simon Russell Beale.

Por Eurico de Barros

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  • Terror
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Um grande, grande filme de terror sobrenatural do sul-coreano Na Hong-jin, e o primeiro dos três deste realizador a estrear-se em Portugal. O Lamento vai ficar para a posteridade como a resposta asiática a O Exorcista, de William Friedkin. É uma história de possessão demoníaca – não de uma pessoa, mas de vários habitantes de uma vila do interior da Coreia do Sul –, investigada por um polícia trapalhão cuja filha foi atingida, e em que Hong-jin afeiçoa o horror às características culturais e religiosas da sociedade em que vive.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
15:17 Destino Paris
15:17 Destino Paris

Aos elaboradíssimos filmes de super-heróis, Clint Eastwood responde com um filme simplex até mais não, sobre heróis inesperados e arrancados ao quotidiano banal: os três amigos americanos, dois deles militares de licença, que estavam de férias na Europa e no dia 21 de Agosto de 2015 impediram um atentado terrorista no comboio Thalys de alta velocidade que ligava Amesterdão a Paris. Eastwood põe os três a interpretarem-se a eles próprios, reconstrói as suas vidas desde a infância, quando
se conheceram na escola, e
filma no limite do minimalismo eloquente e da síntese expressiva, dando uma lição de cinema à maneira dos clássicos.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Um filme brilhante sobre perfeccionismo obsessivo, amor perseverante e luta pelo poder num microcosmo familiar, comercial e criativo (uma casa de moda de luxo na Londres dos anos 50), rodado por Paul Thomas Anderson com uma elegância, um rigor e um saber cinematográfico clássicos. Daniel Day-Lewis tem aqui o seu derradeiro papel, o excêntrico, mimado, exigente e genial costureiro Reynolds Woodcock, interpretado com a mesma fixação pela excelência no seu ofício que move a personagem que incarna. Vicky Krieps faz a sua nova e determinada amante, modelo e empregada, e Lesley Manville é Cyril, a austera irmã solteirona daquele.

Por Eurico de Barros

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  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Thierry Frémaux, Delegado-Geral do Festival de Cannes e director do Instituy Lumière de Lyon, compilou e comentou aqui 108 filmezinhos de Louis e Auguste Lumière, e dos operadores da sua invenção, o cinematógrafo, feitos em França e em várias paragens do globo, de 1895 a 1905. Entre a realidade captada espontaneamente ou encenada, e os filmes humorísticos ou feitos em família, Lumière! é um testemunho preciosíssimo, tocante, variado e divertido de uma era desaparecida, e de como o cinema abriu os olhos para o mundo e começou de imediato a registá-lo em toda a sua multiplicidade.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
Paterson
Paterson

Uma comédia de Jim Jarmusch finamente encantadora e poética, quotidiana e excêntrica, o triunfo do espírito keep it simple. Paterson, com Adam Driver e Golshifteh Farahani, pode muito bem ser o melhor filme de sempre sobre condutores de autocarros de New Jersey que escrevem poesia, casados com iranianas que adoram pintar círculos em tudo e querem ser cantoras de country & western. Para já, é um dos melhores filmes do ano.

Por Eurico de Barros

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  • 5/5 estrelas
  • Recomendado

Entre a fé e o esforço, 11 mulheres vêm em peregrinação a pé de Vinhais, em Trás-os-Montes, até Fátima (400 duros quilómetros),
no novo filme de João Canijo. O realizador está menos interessado em questionar o fenómeno de Fátima e as suas circunstâncias, do que em mostrar os efeitos físicos, emocionais e psicológicos que uma jornada deste tipo tem sobre um grupo de mulheres que se conhecem bem, vêm do mesmo sítio e têm as mesmas origens sociais. E Canijo consegue-o com um sentido de encenação do real único no cinema português.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
Mulheres do Século XX
Mulheres do Século XX
Cruzamento de cinco pessoas numa nesga de tempo em que tentam aprender a navegar num oceano existencial que parece demasiado vasto. Uma nesga de um tempo analógico, com punk, feminismo, humor e um presidente decente (Jimmy Carter). Nada começa nem acaba no que aqui se vê, entregue por um elenco exemplar. Uma obra extraordinária, luminosa, para ver em loop.

Por Jorge Lopes
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  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
O novo filme de Mel Gibson é a história, verdadeira, de um objector de consciência que se recusou a pegar em armas na II Guerra Mundial e mesmo assim foi um dos seus heróis. É também, até ver, o melhor filme de 2016.

Por Nuno Henrique Luz
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  • 5/5 estrelas
  • Recomendado
O filme de João Pedro Rodrigues é a história de Fernando (Paul Hamy), um estudioso de pássaros, que depois de um acidente de barco no Douro se perde no mato e vive uma aventura excêntrica. O Ornitólogo mostra que se um realizador é capaz de pensar e depois sabe rodear-se das pessoas certas encontrará sempre as imagens para fazer passar o que quer dizer, e em grande estilo.

Por Nuno Henrique Luz

Críticas de cinema - 4 Estrelas

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  • 4/5 estrelas
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Basta olharmos para Rahim (Amir Jadidi), o protagonista de Um Herói, do iraniano Asghar Farhadi (Uma Separação, O Passado), para percebermos que é um pobre diabo, de ar cabisbaixo, modos reticentes e sorriso simpático mas a sugerir fraqueza. Ele vive na cidade de Shiraz e acabou de sair da cadeia com autorização para estar ausente por dois dias. Calígrafo e pintor de letreiros, tentou abrir um negócio do ramo com um sócio, que depois fugiu com todo o dinheiro. Falido, Rahim, que está divorciado da mulher e tem um filho com problemas de fala que vive com a irmã dele e o cunhado, pediu dinheiro emprestado ao irmão da ex-mulher para montar o negócio. E como não lhe conseguiu pagar, este fez queixa dele e o desgraçado foi parar à cadeia, onde é um preso modelar.

Rahim tem uma namorada, Farkhondeh (Sahar Goldust), a terapeuta da fala do filho. Esta achou na rua uma mala de senhora com moedas em ouro, que deu a Rahim para ele vender e angariar dinheiro para pagar parte da dívida. Mas a cotação do ouro está em baixa e Rahim decide procurar a dona da mala e devolver-lhe o ouro, fazendo de conta que foi ele que a encontrou, e não Farkhondeh, porque não quer que ninguém saiba da relação, nem sequer os familiares mais próximos.

Só que este acto de honestidade resignada, de probidade hipócrita, vai chegar aos ouvidos dos directores da cadeia. E em pouco tempo Rahim vê-se entrevistado pela televisão e com a fotografia nos jornais, apresentado à sociedade como um modelo de honestidade e decência (“Prisioneiro devolve mala com ouro”, lê-se numa manchete), aplaudido pelos vizinhos e pelos outros presos, e objecto de uma recolha de fundos por parte de uma associação que ajuda prisioneiros e condenados à morte, resgatando-os com dinheiro às autoridades. Da noite para o dia, passa de presidiário anónimo e carregado de dívidas a herói dos media e das redes sociais, e o seu credor a vilão de piquete.

Contar o resto da história é estragar o filme a quem o irá ver. Mas podemos dizer que, em Um Herói, Asghar Farhadi volta ao seu tema favorito: os pequenos erros cometidos por pessoas comuns, que vão desencadear e adensar o drama, selar o destino do protagonista e lançar estilhaços sobre todos aqueles que o rodeiam, quer lhe queiram bem, quer lhe queiram mal. E em Um Herói Rahim não pára de cometer pequenos erros, o que não convém nada a um herói popular. Sobretudo na era do Twitter, do Facebook e dos vídeos virais, e por mais que ele procure justificar-se, salvar a face, manter um mínimo de dignidade e evitar que o próprio filho seja precipitado na espiral de passos em falso, manipulação em série, falsas aparências e dilemas morais que se criou.

Paralelamente à história do protagonista, Farhadi vai-nos mostrando relances da vida e das particularidades da sociedade iraniana contemporânea, onde as pessoas podem ir para a cadeia por dívidas, como na Inglaterra vitoriana, mas toda a gente tem iPhones e televisores de plasma como nos países ocidentais. Além de nos alertar para a crónica imperfeição do ser humano e do mundo, que longe de ser a preto e branco é feito de matizes de cinzento (veja-se como o realizador vai, progressivamente, mudando a imagem que fizemos à primeira vista do credor), Farhadi diz-nos ainda que Rahim não está sozinho nos seus erros.

Porque os directores da prisão também querem, através dele, dar uma boa imagem da gestão do estabelecimento, e escamotear os suicídios que ali acontecem; a associação da ajuda aos presos, fazer exibicionismo do seu trabalho; e os cidadãos comuns sentir-se virtuosos ao comoverem-se com o belo gesto do preso e contribuir com dinheiro para aliviar a sua dívida e tirá-lo da cadeia, enquanto vertem gordas lágrimas perante o menino que consegue elogiar o pai e apelar em seu favor, apesar da sua gaguez.

Vencedor do Grande Prémio em Cannes e candidato ao Óscar de Melhor Filme Internacional, Um Herói é filmado por Asghar Farhadi com um enorme sentido da vida tal como ela é vivida, um naturalismo nunca árido e tão atento aos pequenos pormenores humanos como do quotidiano, e um controlo narrativo que não admite o mais pequeno deslize de verosimilhança, ritmo ou sentimental. E os resultados dos longos e detalhados ensaios a que se dedica com os intérpretes antes de começar a filmar, são bem visíveis num elenco em que, dos actores principais aos papéis mais secundários e às crianças, todos sabem perfeitamente o que fazer e formam parte integrante e fundamental desse grande e minucioso verismo aturadamente procurado pelo realizador.

No final, apenas resta a Rahim o amor da namorada e do filho. E apesar de Farhadi o fazer pagar as consequências das suas más escolhas, também nos diz que é preciso dar- -lhe algum desconto. Porque um mundo onde não há lugar para a compreensão dos erros alheios, é um mundo cada vez mais cruel e falho de humanidade.

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  • 4/5 estrelas
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Hiroo Onoda, um tenente dos serviços secretos do exército nipónico, foi o penúltimo soldado japonês da II Guerra Mundial a render-se, 29 anos após o fim do conflito, tendo passado todo esse tempo escondido nas selvas da ilha filipina de Lubang, convencido de que o conflito ainda continuava. O francês Arthur Harari recria aqui a história deste homem que, longe de ser um louco ou traumatizado pela guerra, surge como um militar que assume, inflexivelmente e até às últimas consequências, o seu dever de continuar vivo e a lutar pelo seu país e pelo imperador. Começando como um filme de guerra convencional, Onoda, 10.000 Noites na Selva, vai assumindo pouco a pouco uma dimensão fantasmagórica e de absurdo beckettiano, sublinhada pela atmosfera da selva cerrada. Sem fazer juízos de valor, Harari transmite-nos as razões do comportamento de Onoda (interpretado na juventude por Yuya Endo e na idade adulta por Kanji Tsuda), os seus valores e a sua psicologia, sem pedir que adiramos a elas, mas pedindo que procuremos entendê-las.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Quem for ver Belfast, de Kenneth Branagh, pensando que trata da violência sectária entre católicos e protestantes na Irlanda do Norte nos anos 60 e 70, mais vale pedir o dinheiro do bilhete de volta. Passado em 1969 na cidade do título, em que Branagh nasceu e viveu parte da infância, o filme é feito de recordações do realizador e a contextualização político-social é só a estritamente necessária para nos situar. Belfast é um filme sobre a família e a sua força e importância, em tempos de paz como de conflito. No caso, a família do pequeno Buddy (Jude Hill), protestante e em minoria no bairro católico em que vive, e que antes do eclodir da violência é pintado por Branagh como um modelo de boa convivência.

Buddy vive com o irmão mais velho, Will (Lewis McAskie), a mãe (Caitriona Balfe) e o pai (Jamie Dornan), operário que passa grande parte do tempo a trabalhar em Inglaterra. Há ainda o avô (Ciaran Hinds) e a avó (Judi Dench), dos quais é muito próximo, e os tios e a prima, que moram mesmo ao lado. A família tem problemas de dinheiro, deve grandes somas ao fisco e o pai joga nos cavalos de vez em quando. O filme é rodado a preto e branco (cliché da representação cinematográfica das recordações do passado, que Kenneth Branagh atenua sempre que eles vão ao cinema, mostrando os filmes a cores) e visto do ponto de vista de Buddy, todo filtrado pela percepção do menino, o que, naturalmente, condiciona o impacto dos acontecimentos e a sua importância numa escala maior.

O que importa aqui é que, para Buddy, o início dos conflitos entre católicos e protestantes, e a intervenção dos militares ingleses, significa o fim da harmonia que reinava no modesto bairro, pode pôr o seu pai, um homem de bom senso, moderado e avesso à violência, numa posição delicada perante os protestantes mais fanáticos, e, pior que tudo, obrigar a família a mudar-se para Inglaterra. E assim fazê-lo deixar para trás o seu pequeno mundo: a casa, a rua, o bairro, a escola, a colega de turma de longos cabelos loiros de quem gosta, o avô e a avó, os tios e a prima mais velha, a qual ajuda um dia a roubar chocolates de uma mercearia, acabando por ficar com um pacote de Delícias Turcas de que ninguém gosta (por falar em roubos, numa das melhores sequências do filme, a mãe de Buddy obriga-o a ir repor o pacote de detergente para a roupa que ele tirou durante o saque do supermercado católico do bairro, enquanto este ainda está a decorrer!).

Apesar de todas as coisas complicadas, violentas e tristes que acontecem a Buddy e à sua volta, bem como aos familiares, Belfast mantém-se, do princípio ao fim, um filme de uma enorme doçura, que por vezes ameaça perigosamente caramelizar no mais descarado sentimentalismo, com uma ajudinha da banda sonora de Van Morrison. Uma armadilha que Branagh consegue evitar graças ao impressionismo telegráfico da realização (menos os planos gerais feitos a partir de drones, que agora parecem obrigatórios...), à sinceridade emocional que atravessa o filme, a um elenco em que cada personagem é interpretada exactamente pelo actor que ela pedia (o cinema não teve nos últimos tempos um avô e uma avó tão carismaticamente singelos e afectuosos como os de Ciarán Hinds e Judi Dench), à naturalidade e espontaneidade de Jude Hill, e ao subtil sentido da época na evocação do microcosmo do bairro, e que abrange mesmo os brinquedos de Buddy (ver a farda completa de membro dos Thunderbirds que ele recebe no Natal).

Branagh embute ainda no filme, através do destino da família de Buddy, um elogio da capacidade de resistência e superação dos compatriotas irlandeses, o que lhe confere um optimismo cada vez mais raro no cinema nos dias que correm. Com Belfast, Kenneth Branagh consegue limpar-se – se bem que não totalmente – de alguns dos horrores que assinou recentemente, como é o caso de Jack Ryan: Agente Sombra, Artemis Fowl e em especial do hediondo Morte no Nilo, em que atenta miseravelmente contra a memória de Agatha Christie e a integridade de Hercule Poirot. Que os seus próximos filmes sejam mais como Belfast, e não como estes, são os meus mais sinceros e fervorosos desejos.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Assentar na vida. É tudo o que quer Julie, prestes a entrar na casa dos 30, e heroína de A Pior Pessoa do Mundo. Este é o último filme da chamada Trilogia de Oslo, do norueguês Joachim Trier, escrito com Eskil Vogt, seu habitual colaborador e velho amigo – e à qual pertencem também Reprise, de 2006 (dois jovens amigos, ambos escritores, tentam perceber o que o futuro lhes reserva, ao mesmo tempo que começam a levar encontrões da vida), e Oslo, 31 de Agosto, de 2011, baseado em Le Feu Follet, de Drieu La Rochelle (um toxicodependente em tratamento aproveita um dia livre para reencontrar amigos em Oslo, percebe que o futuro não lhe reserva nada e decide matar-se).

Ao que parece, Trier só se deu conta de que estes filmes formavam uma trilogia, pelos temas, personagens e por se passarem todos em Oslo, quando um dos actores lhe chamou a atenção para o facto após ler o argumento de A Pior Pessoa do Mundo. Pouco importa se isto é verdade e se houve intenção consciente de fazer um trio de filmes interligados. Mas parece inegável que em todos eles Joachim Trier dá voz, rostos e representação à geração dos chamados millennials, às suas ambições, dúvidas, ansiedades e desejos de estabilidade social, sentimental e profissional, num mundo em que a pressão e os estímulos para o fazerem não pára de aumentar, e onde a sensação de que o tempo está a correr contra eles é cada vez mais intensa (como disse recentemente um economista: “Já não são os fortes que comem os fracos, são os rápidos que comem os lentos”).

A Pior Pessoa do Mundo é um retrato em 12 tempos, e ao longo de quatro anos, de Julie (Renate Reinsve, Prémio de Interpretação Feminina em Cannes), uma verdadeira salta-pocinhas em termos de vocações, empregos, projectos de vida e amores, e cada vez mais angustiada por ir passar a barreira dos 30 anos sem ter arrumado a vidinha e acalmado os sentimentos, conseguido um trabalho de que gosta minimamente, arranjado (ou não) um namorado ou um marido, e tido (ou não) filhos. E apesar de viver numa época em que, como mulher, tem uma liberdade e uma disponibilidade como nenhuma outra da sua família teve (há uma altura do filme em que Julie passa em revista-relâmpago o destino das mulheres da família pelo menos até ao século XIX, através das fotografias que a mãe tem em casa), ela só tem falsas partidas. Mesmo no amor, já que depois de se juntar com Aksel, um autor de comics underground quarentão (Anders Danielsen Lie, cara habitual nas fitas de Trier), acaba por o deixar pelo mais jovem e sedutor Eivind (Herbert Nordrum).

Tudo isto considerado, A Pior Pessoa do Mundo é uma comédia romântica com feitio indie, na qual Joachim Trier consegue, ao mesmo tempo, manejar temas, convenções, personagens e dispositivos consagrados deste formato, e virá-los do avesso ou pô-los em perfeita sintonia com os tempos (ver o gráfico do artigo sobre sexo oral que Julie escreve, publica e é amplamente debatido nas redes sociais, ou a sequência em que Aksel tem um ácido debate na rádio com uma feminista da era #MeToo e descobre que os seus aclamados e subversivos comics afinal são sexistas, ofensivos e misóginos).

Trier fá-lo lançando mão de um estilo visual tão dinâmico e inquieto como a própria personagem, que nos presenteia com um par de achados (a cena em que Julie corre através de uma Oslo congelada para ir ao encontro de Eivind – e a única no filme em que o tempo está do seu lado, ao parar para a deixar fazer o que deseja); e com tracção a cargo de Renate Reinsve, senhora de uma capacidade e uma versatilidade de expressão emocional a perder de vista, e que consegue que continuemos a interessar-nos por Julie até ao final. Até nas alturas em que, se ela existisse na vida e a conhecêssemos, nos apetece pregar-lhe um par de estalos e dar-lhe um berro para que pare de andar feita barata tonta e atine de uma vez por todas. (Mas era mesmo preciso que o já tão castigado Aksel acabasse como acaba?)

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Muitos ainda se recordam de quando andavam na escola e havia aquelas aulas em que o tempo parecia não passar, ou então passava muito devagar, e quanto mais olhávamos para o relógio, mais essa sensação se acentuava. Ela reaparece, a espaços, no documentário O Professor Bachmann e a Sua Turma, da alemã Maria Speth, que se prolonga por três horas e meia, e no qual a realizadora segue, ao longo de seis meses, o trabalho do professor Dieter Bachmann do título, que tem 64 anos, está à beira da reforma e é amigo pessoal de Speth. O tempo é aqui muito importante, para a forma, para o discurso e para as intenções do filme, mas é natural que seja sentido de forma diferente por quem o vê, e O Professor Bachmann e a Sua Turma teria beneficiado com uma tesourada de 20 ou 30 minutos.

Bachmann não é um docente igual a muitos outros: dá aulas numa escola na cidade industrial de Stadtallendorf, a crianças entre os 12 e os 14 anos, que têm a particularidade de serem filhos de imigrantes de mais de dez países, nomeadamente da Turquia, mas também da Rússia, da Bulgária ou de Marrocos, e quase todos eles muçulmanos. Dominam a língua alemã, embora parte deles com dificuldade. Alguns foram para a Alemanha ainda muito novos e outros já nasceram lá. Mas, quando Bachmann lhes pergunta se se sentem alemães, os que levantam o braço para responder dizem que não, que são do país de onde vieram, ou do dos pais.

O desafio posto a Bachmann, bem como aos outros professores da escola, através da educação e do convívio, é tentar atenuar as várias barreiras de identidade, culturais, étnicas e religiosas que os diferenciam, e integrá-los no país que os recebeu, para que se sintam, acima de tudo, cidadãos alemães. Uma tarefa que o filme sugere ser complicada, e de sucesso difícil em boa parte. À medida que o ano lectivo progride, surgem as naturais afinidades e tensões entre os alunos, forma-se a pouco e pouco um espírito de turma e desenvolvem-se laços afectivos entre o professor e os discentes.

Os métodos de Bachmann não são convencionais, tal como a sua apresentação (tende a usar uma irritante sweatshirt dos AC/ DC e não larga o seu gorro de lã), mas apesar do seu aspecto e dos métodos cool, de ensino e relacionamento, não admite confusões nem faltas de disciplina e insiste em que falem sempre alemão. E há uma cena em que desabafa a um colega que talvez os miúdos estivessem melhor, e lhes fosse mais útil, se houvesse mais insistência no ensino de disciplinas tradicionais como a Matemática, a História ou o Inglês.

Maria Speth filma num estilo que evoca o do mestre Frederick Wiseman, assente na observação imersiva, não-interventiva e isenta de opiniões, sermões e manipulação sentimental, ideológica ou outra em relação ao meio, grupo ou tipo de estabelecimento escolhido para documentar. E vai assim fazendo o espectador sentir-se uma testemunha invisível, gradualmente mais integrada e bem informada sobre a região, o meio, as pessoas, as relações entre elas e as suas personalidades, os objectivos da instituição. E o tempo passado com eles e entre eles revela e amplifica a dimensão pedagógica, social, emocional e humana de O Professor Bachmann e a Sua Turma (ganhou o Urso de Prata no Festival de Berlim).

Isto quer sejamos cépticos e pessimistas ou tenhamos esperança na experiência que o documentário nos revela e no que poderá resultar dela para os seus jovens protagonistas e o país que os acolheu; ou sintamos mais ou menos simpatia pela figura de Dieter Bachmann. Maria Speth diz ter sido ele a principal razão para ter feito este documentário, apesar de ficarmos a saber apenas meia dúzia de pormenores sobre a sua vida, a sua família e o que o terá levado ao ensino – já tardiamente, ao que parece. O que fica claro no final destes 220 minutos é que algo dele deverá ter ficado nalguns dos alunos daquela que foi a sua última turma em quase 20 anos como professor.

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  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O novo filme de Paul Thomas Anderson está tão solida e convictamente instalado nos anos 70, que parece que veio de lá numa máquina do tempo. Passado quase todo na zona do Vale de San Fernando, em Los Angeles, Licorice Pizza é uma sucessão de episódios na vida de Gary Valentine (Cooper Hoffman, filho de Philip Seymour Hoffman), um finalista do secundário, jovem actor e fura-vidas, e de Alana Kane (Alana Haim), uns anos mais velha do que ele e pela qual está apaixonado. Enquanto Gary tenta convencer Alana a ser mais do que uma grande amiga e a tornar-se na sua namorada, e ela lhe resiste, vivem ambos uma série de peripécias descosidas, insólitas e hilariantes, desde vender colchões de água pelo telefone até terem um encontro surreal com o exaltado e engatatão ex-cabeleireiro, produtor e namorado de Barbra Streisand, Jon Peters (Bradley Cooper), em plena crise do petróleo e da falta de combustível. Filmado por Anderson em alegre ritmo de mata-cavalos e interpretado com piada e despretensão por Hoffman e Haim (do grupo com o mesmo nome, as duas irmãs dela na vida real fazem o mesmo papel aqui, tal como o pai e a mãe), Licorice Pizza é uma história de amor assolapado e relutante (ficarão Gary e Alana juntos?), e de agitação juvenil benigna (em que mais andanças disparatadas eles se irão meter?), tão aleatória e desconcertante como afável e folgazona.

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  • Acção e aventura
  • 4/5 estrelas
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O Homem-Aranha interpretado por Tom Holland não só tem que enfrentar vilões provenientes de linhas temporais alternativas, neste novo filme, como o espera uma enorme surpresa em termos da sua própria identidade. O que o vai levar a pedir ajuda ao Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch), embora o contacto não corra lá muito bem. Mesmo contemplando os temas estandardizados, as situações feitas e o gigantismo habituais das fitas de super-heróis, Homem-Aranha: Sem Regresso a Casa consegue manter a bonomia simpática, a ausência de peneiras e um sentido de humor que têm marcado quase todos os títulos desta série, o que o destaca do ramerrame da pomposa, elefantina e estereotipada oferta deste género.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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A crítica de cinema do The New York Times Manohla Dargis chamou “talkathons” (“maratonas de conversa”) aos filmes do japonês Ryusuke Hamaguchi. Fala-se muito nas fitas do autor de Happy Hour: Hora Feliz (mais de cinco horas de palheta) e Asako I & II (duas horas de dar à língua). Hamaguchi é um daqueles realizadores cujas personagens se definem, relacionam e revelam pelo verbo. A palavra é o veículo privilegiado das suas vidas íntimas e sentimentais e dos seus comportamentos, o grande revelador de si mesmas.

Os filmes do realizador, de um realismo discreto e de um profundo sentido do tecido, dos matizes e dos ritmos do quotidiano, são filmes de acção verbal, da qual a câmara, a banda sonora e a montagem funcionam como recatadas serviçais, onde os diálogos fluem com tanta naturalidade e à-vontade como a narrativa visual, e se evitam os sobressaltos melodramáticos. Embora expressem a maneira particular japonesa de ser, estar, sentir e perceber o mundo, não é por isso que não deixam de ter uma reverberação universal. Embora inferior em estrutura de enredo e em complexidade emocional e psicológica aos citados Happy Hour: Hora Feliz e Asako I & II, Roda da Fortuna e da Fantasia (Grande Prémio do Júri no Festival de Berlim) não desiludirá os admiradores do cinema de Ryusuke Hamaguchi. O filme é composto por três histórias. Na primeira, Gumi, uma rapariga, modelo fotográfico, conta à amiga, Meiko, que conheceu um rapaz fascinante, que entre outras coisas lhe contou o desgosto que teve quando a namorada rompeu com ele. Gumi não faz a menor ideia que Meiko era essa namorada, que a seguir vai confrontar o ex-namorado no seu escritório. Na segunda, uma estudante universitária casada que tem como amante um colega mais novo, é enviada por este para seduzir um professor que o humilhou, e o chantagear a seguir, mas a iniciativa vai ter um resultado muito diferente do pretendido. E na terceira, uma mulher, que veio a uma reunião de antigas alunas do liceu, encontra uma outra na estação de comboios, gerando-se uma situação equívoca. Julgam conhecer-se, o que afinal não acontece, mas estas duas estranhas acabam por confessar coisas das suas vidas uma à outra como se fossem amigas de longa data.

Não há qualquer relação entre as personagens do trio de histórias, nem ligações ou pontes formais entre estas. Além da ressonância emocional das várias situações humanas que Ryusuke Hamaguchi põe em cena em cada uma delas, este tríptico de ficções tem em comum a importância fulcral, activa, da palavra (as conversas entre o trio amoroso da primeira, a leitura sensual do livro premiado do professor pela aluna na segunda, os diálogos confessionais entre as duas mulheres do terceiro), o recurso narrativo à coincidência, ao mal-entendido, ao acaso e ao lapso, e ainda uma serenidade no contar, e uma discreta elegância e delicadeza visual, sob as quais o realizador orienta o abundante trânsito de sentimentos, recriminações, desejos, dúvidas e frustrações que animam as várias personagens e as atraem, unem, repelem ou identificam. E tudo passado sempre num enquadramento do mais banal e reconhecível dia-a-dia: táxis, cafés, gabinetes, autocarros, salas de estar, no meio da rua.

Aguardamos agora com expectativa a estreia do segundo filme que Ryusuke Hamaguchi realizou em 2021, Conduz o Meu Carro, Prémio do Melhor Argumento no Festival de Cannes. Mais três horas de prosa densa, envolvente, significativa e emotiva como apenas ele a sabe escrever, dar aos actores a dizer e filmar no cinema japonês contemporâneo.

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  • 4/5 estrelas
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Em vez de fazerem mais um documentário convencional sobre os predadores sexuais na internet, os documentaristas checos Barbora Chalupová e Vit Klusák seleccionaram três jovens actrizes com ar de terem 12 ou 13 anos, construíram três cenários de quartos em estúdio e criaram outros tantos perfis falsos na net. Em poucas horas, dezenas e dezenas de homens entraram em contacto com elas, parte deles expondo-se de imediato, solicitando fotos ou vídeos de nudez, propondo encontros e enviando imagens pornográficas. À Solta na Internet é um arrepiante mergulho no mundo do aliciamento e abuso de menores online, onde cruzamos exibicionistas, pedófilos e perversos de todo o tipo, e partilhamos as reacções das três actrizes (escolhidas também por terem experiência de situações semelhantes quando eram mais novas, e sempre apoiadas por sexólogos, psiquiatras e advogados). O filme nunca ganha contornos voyeuristas ou de exploração com alibi “sociológico”, e deixa bem claro que não é por os pais avisarem e acautelarem os filhos sobre o lado negro do mundo online que eles não vão lá aventurar-se. Um dos momentos inesperados de À Solta na Internet dá-se quando uma das actrizes, após ser contactada por um rapaz com namorada, que só quer mesmo falar e a avisa sobre os perigos da net, chora comovida por ter encontrado alguém normal e decente no meio de tanto lixo humano.

  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Há um super-herói que rouba a cena em Víuva Negra – e não é a Viúva Negra. Pelo menos, não é essa Viúva Negra (já que há muitas ‘Viúvas Negras’ neste 24.º filme do Universo Cinematográfico da Marvel). Depois de uma eternidade à espera do filme a solo da Vingadora de Scarlett Johansson – sem Tony, Steve e companhia –, eis que vem Florence Pugh e lhe rouba o protagonismo. A actriz interpreta a irmã mais nova de Natasha Romanoff (Johansson), Yelena Belova, também ela membro do programa das Viúvas Negras, e fá-lo com o brilho e naturalidade de quem está nestas andanças do “Marvelverse” desde o primeiro dia.

A mistura feliz de músculos e emoção lembra, em pelo menos metade do tempo, o franchise Jason Bourne. As cenas de luta têm um vigor de abalar os ossos. Um confronto violento entre Romanoff e Belova, numa casa-segura que de segura tem pouco (vamos arquivar a relação destas irmãs na categoria “é complicado”), resulta na interpretação mais arrepiante de Johansson desde Marriage Story. Viúva Negra inclina-se em influências de filmes de espionagem, com referências claras ao mundo dos espiões (parabéns a quem pensou no nome ‘Fanny Longbottom’ para o passaporte falso de Romanoff) até nos locais onde a acção se desenrola, como Budapeste, Marrocos e Noruega. E quando Romanoff se senta para beber uma cerveja, enquanto cita 007 – Aventura no Espaço, parece ser a forma de este Viúva Negra reconhecer uma dívida ao filme de James Bond, pela escolha de um vilão com semelhanças a Hugo Drax (Michael Lonsdale).

Embora a história aconteça no rescaldo da discórdia entre os Vingadores, em Capitão América: Guerra Civil, o prelúdio leva-nos de volta ao Ohio de 1995, onde uma Natasha Romanoff adolescente, de cabelos azuis, acomodada e feliz, de repente é levada, juntamente com a irmã mais nova (Violet McGraw), pela mãe (Rachel Weisz) e pelo pai cientista (David Harbor). Acontece que esta família é nuclear apenas no sentido em que trabalham para pessoas com posse de muitas armas nucleares: são uma célula soviética adormecida, em busca de informações secretas dos EUA, e tão americanos quanto uma ressaca de Stoli – o pai é na verdade um super-herói soviético e corpulento chamado Red Guardian.

Os créditos iniciais que se seguem dão continuidade à história ao estilo de docudrama: Natasha e a irmã são deixadas ao cuidado de um malvado general soviético, Dreykov (Ray Winston, com um terrível e inconsistente sotaque russo), numa academia para treino de assassinas chamada Red Room. Romanoff está à procura de vingança, com a irmã ao lado para a ajudar – e para fazer pouco das suas poses de luta. “Duvido que o deus vindo do Espaço tenha de tomar um ibuprofeno depois de cada luta”, goza a irmã. Para complicar as coisas, Dreykov tem um executor na máquina implacável, com cara de caveira, chamado Taskmaster (imagine o filho ilegítimo do Exterminador Implacável com o Skeletor).

Depois da trama complicada dos últimos filmes do Universo da Marvel, a falta de Pedras do Infinito nos bolsos deste filme é revigorante. E embora Viúva Negra não seja totalmente livre de um MacGuffin – há um dispositivo de controlo da mente para desarmar e um vilão para desmascarar – Cate Shortland (Somersault, Lore) tem aqui muito espaço para aprofundar as lutas de identidade de Romanoff e trazer ao de cima uma velha culpa sobre uma missão que correu terrivelmente mal. E também há muitas risadas para contrabalançar os temas mais pesados. A velocidade com que os quatro membros desta falsa família regridem a arrufos e picardias quando finalmente se reencontram é uma das muitas pequenas alegrias deste filme. Tal como quando Harbor se diverte no papel do pomposo Red Guardian, a tentar espremer-se para caber novamente no fato de super-herói enquanto imagina, em voz alta, uma rivalidade com o Capitão América.

Algumas falhas deixam Viúva Negra um degrau ou dois abaixo dos melhores filmes da Marvel, incluindo um acto final lento, alguma vilania genérica e ainda o longo tempo de duração da fita – vá lá, duas horas são mais do que suficientes – mas se procura um grande blockbuster, habilmente elaborado e autoconsciente, a Marvel, como sempre, dá conta do recado.

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  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

“David, não corras!”. Esta frase é ouvida ao longo de Minari, o filme semi-autobiográfico de Lee Isaac Chung sobre uma família coreana-americana, os Yi, que se muda de uma grande cidade para o interior do Arkansas nos anos 80, onde Jacob Yi, o pai (Steven Yeuen) quer concretizar a sua ideia do Sonho Americano: ter uma quinta e viver da terra, cultivando vegetais para vender aos mercados e restaurantes de outros coreanos. David (o irresistível mas nunca demasiadamente cute Alan S. Kim) é o filho mais novo, de seis anos. E a razão pela qual o pai, a mãe, Monica (Yeri Han), e Anne, a irmã mais velha (Noel Kate Cho), lhe estão sempre a dizer para não correr é porque tem um sopro no coração e não se pode cansar. Mas como impedir uma criança de dar asas aos pés na imensidão do Arkansas rural?

O filme vai buscar o seu título a uma erva aromática coreana de uso culinário e medicinal, que é trazida para a quinta pela avó materna de David e Anne, Soonja (estupenda Yuh-Jung Soon, merecidíssima vencedora do Óscar de Melhor Actriz Secundária). E, como se não bastasse ao pequeno David estar impedido de correr à vontade, ter que morar numa casa improvisada sobre pneus e blocos longe da vila e de outras crianças da idade dele, Soonja não é uma avó convencional. Ao contrário das outras, não sabe ler nem fazer bolos e biscoitos, pragueja, joga à batota, usa cuecas de homem e gosta de ver luta-livre na televisão. “Ela cheira a Coreia!”, queixa-se o menino a certa altura.

A avó põe-se a plantar minari perto de um regato, esperando que a erva cresça em solo estranho e prospere. É claro que a erva funciona como uma metáfora da adaptação da família às novas e amplas paragens e ao novo e difícil modo de vida, e como um correlativo da esperança do prático e persistente Jacob em vingar como agricultor, ajudado por Paul (Will Patton), o seu prestável e excentricamente religioso empregado, e veterano da Guerra da Coreia. Entretanto, David e a avó protagonizam vários momentos cómicos, como aquele em que o miúdo se vinga a preceito, após ela o ter gozado por ele ainda não conseguir controlar a bexiga quando está a dormir na cama à noite.

Também escrito pelo realizador, e rodado em 25 dias ao custo de uns magros dois milhões de dólares, Minari é um filme subtilmente evocativo, terno e impressionista, reservado nas palavras e poupado nos rasgos dramáticos, em que uma família enfrenta, em terra estranha, a meteorologia (o tornado do início), o isolamento, a natureza (a escassez de água no terreno), o escasso convívio comunitário (não se sentem à vontade nem com os locais, nem com os outros sul-coreanos que vivem e trabalham na região) e as tensões que aparecem no seu interior. No final, a corda já muito esticada por Jacob ameaça partir-se pelo lado da mulher, farta de viver em condições precárias, de não ver a quinta dar resultados e de perceber que o marido está a pôr o trabalho à frente da família.

Lee Isaac Chung não recorre a sentimentalismos pegajosos, a ameaças racistas ou manifestações de xenofobia, ou a personagens tipificadas, para dar enchimento narrativo ou relevo emocional a Minari, nem a soluções forçadamente reconfortantes para resolver os problemas dos Yi e a ameaça da sua separação. Um incêndio intempestivo, seguido da descoberta de um novo veio de água, bastarão. Entretanto, David conseguirá finalmente correr, e mesmo na altura certa. E nem me perguntem se a minari irá ou não medrar tão longe de casa.

  • Filmes
  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Thomas Vinterberg recebeu o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro com este filme que escreveu com Tobias Lindholm. Quatro professores de um liceu dinamarquês decidem, às escondidas de toda a gente, fazer uma experiência em que consomem uma determinada dose de bebidas alcoólicas diariamente, verificando depois o seu efeito a nível profissional, social e familiar. Mas, um dia, perdem o controlo e as suas vidas derrapam. O imponente e brilhante Mads Mikkelsen lidera esta comédia dramática sobre os prazeres e os perigos da bebida, que não é facilmente moralista ou banalmente irresponsável.

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  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

E se comunicassem à vossa namorada que queriam acabar com a relação e ela respondesse: “Então tenho que te matar.” Das duas, uma: ou ela é uma psicopata, ou então uma ninfa aquática da mitologia popular, uma ondina. É que, perante a infidelidade do seu companheiro, as ninfas perdem a sua alma humana e estão condenadas a morrer, se não o matarem antes, após o que têm que regressar à água. É o que se passa logo na abertura de Undine, o novo filme do alemão Christian Petzold. Johannes, o namorado de Undine Wibeau (a magnífica Paula Beer), uma historiadora que trabalha no departamento de desenvolvimento urbano da Câmara de Berlim, diz-lhe que quer terminar com a relação e que a engana com outra mulher. E ela logo: “Então tenho que te matar.”

Passa-se que, muito longe de ser uma psicopata, Undine é uma ninfa do rio Spree, que atravessa Berlim. E que logo a seguir a ser rejeitada pelo namorado, conhece Christoph (Franz Rogowski), um simpático, carinhoso e algo desajeitado mergulhador industrial, que anda a fazer verificações nos pilares das pontes do Spree. Apaixonam-se e começam até a mergulhar juntos, e tudo leva a crer que Undine não irá infligir a Johannes a morte que fatalmente o esperava, porque encontrou de novo o amor, e desta vez, muito mais verdadeiro e sólido do que o anterior. Só que, certo dia, Christoph tem um acidente durante um dos seus mergulhos, fica 12 minutos sem oxigénio e é internado, em situação de morte cerebral. O destino da ninfa está traçado.

Depois do embaraçoso passo em falso que foi Em Trânsito, Christian Petzold volta a apresentar-se, em Undine, na boa forma dos dois filmes anteriores àquele, Barbara e Phoenix, regressando às protagonistas femininas e a uma narrativa enquadrada pela história recente da Alemanha (neste caso, particularizada na história de Berlim e no seu desenvolvimento urbano), acrescentando-lhe uma modalidade de romantismo fatalista de sabor bem germânico. Undine é um filme fantástico que dispensa o espectáculo de efeitos digitais e que cultiva o maravilhoso ancestral com roupagens contemporâneas, singeleza e um lirismo discreto, na escrita, na câmara e na interacção das personagens.

Alguns dos melhores momentos da fita passam-se, naturalmente, no elemento líquido: a cena nocturna na piscina da vivenda de Johannes; Undine cavalgando, para espanto de Christoph, o enorme e célebre peixe-gato que nada no Spree; a mão alva da ninfa saindo de súbito da arcada do pilar da ponte para acariciar a de Christoph; ou o silencioso e fantasmagórico encontro final entre os dois amantes, à noite e debaixo de água. Pura poesia aquática com mediação cinematográfica.

E embora Christian Petzold pareça transgredir em Undine as regras das narrativas populares relativas a ninfas e outras criaturas do elemento líquido, a verdade é que as cumpre escrupulosamente, e com amarga ironia. Christoph não tem o mesmo destino que Johannes, porque tecnicamente, já esteve morto numa cama de hospital, razão também pela qual a sua amada teve que regressar ao seu habitat natural. Em resumo, o ano não podia abrir melhor do que com um filme como Undine.

  • Filmes
  • Terror
  • 4/5 estrelas
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Se andam à procura do filme do confinamento por excelência, não precisam de ir mais longe. Chama-se Host, foi realizado por Rob Savage e está na Amazon Prime. E é de terror, rodado para a Shudder, a plataforma de streaming especializada, filiando-se no novo subgénero baptizado “laptop horror”. Nele, os assassinos em série e as forças sobrenaturais utilizam as novas tecnologias – em especial os computadores portáteis – e as redes sociais para se infiltrarem entre nós e nas nossas casas, e espalharem a morte e o pânico, e tem como exemplos recentes títulos como Open Windows, de Nacho Vigalondo (2014), Unfriended, de Leo Gabriadze (2014), ou The Call, de Lee Chung-Yun (2020).

Savage fez o filme sem ter qualquer contacto físico com o seu (pequeno) elenco, integrando a situação do confinamento na história e dirigindo os actores à distância, transformando-os não só nos operadores de câmara como também em técnicos de efeitos especiais, tirando assim o máximo partido narrativo e cinematográfico do isolamento a que temos estado todos submetidos. Tudo se passa nos ecrãs dos computadores das personagens, ora vistos em simultâneo, ora individualmente, e Host reflecte ainda a capacidade de síntese do realizador, já que dura apenas 56 minutos, sem vestígios de palha ou de ganga.

Seis amigos, cinco raparigas e um rapaz, fechados nas suas casas e aborrecidos de morte com o confinamento a que a pandemia obriga, resolvem fazer uma sessão espírita via Zoom, servindo-se de uma médium para a orientar. Só que uma delas leva a coisa para a brincadeira e acaba por invocar um espírito demoníaco, que aproveita a ligação simultânea em que o grupo se encontra, primeiro para pregar alguns sustos, passando depois para coisas muito piores. A entidade nem sequer se esquece de lhes cortar a comunicação com a médium, impedindo-a assim de as ajudar.

Impotentes para se socorrerem umas às outras, as participantes na sessão vão vendo nos seus computadores, aterrorizadas, o que o espírito vai fazendo a cada uma delas e aos seus familiares, envolvendo a manipulação de objectos do quotidiano que têm em casa, como mesas, cadeiras, utensílios de cozinha, isqueiros, caixas de música, fantoches, etc. A Polaroid de uma das personagens é também muito bem usada por Rob Savage para dar gás ao efeito de terror, e a entidade maligna nunca é mostrada.

Vemos apenas os efeitos devastadores da sua maléfica presença (o rapaz, que vive na luxuosa moradia da sua namorada rica, certamente terá lamentado a existência de uma piscina no jardim) e, a certa altura, as suas pegadas na farinha que está espalhada no chão da dispensa e no corredor da casa de uma das personagens, o que é infinitamente mais aterrador e eficaz do que dar-lhe forma. O realizador até aproveita a ficha técnica final para uns arrepios de despedida. Quando um dia, no futuro próximo, se fizer a história do cinema produzido durante o confinamento do coronavírus, Host será de menção obrigatória e estará lá no topo da lista dos melhores, mais inventivos e mais genuínos filmes destes estranhos e deprimentes tempos de isolamento forçado.

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  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Não é a primeira vez que o clássico infantil Pinóquio, de Carlo Collodi, é filmado com actores de carne e osso. Antes desta nova versão de Matteo Garrone, o realizador de Gomorra, O Conto dos Contos e Dogman, houve outras, sendo a mais recente a de 2002, de e com Roberto Benigni, que aqui interpreta Gepeto. Mas esta adaptação à tela de Pinóquio é decerto uma das mais próximas do livro de Collodi, no tom e nos ambientes, do espírito e das atmosferas dos contos de fadas que ele adaptou no citado O Conto dos Contos, e ainda das ilustrações originais de Enrico Mazzanti.

Neste Pinóquio, Matteo Garrone cultiva aquilo a poderíamos chamar de neo-realismo fantástico, ao situar a história na Itália rural de há 200 ou 300 anos, uma Itália de quintas, pequenos ofícios, estalagens, gente que trabalha duramente e vivia com pouco, pequenos circos remendões e espectáculos ambulantes pobrezinhos. Mas no meio da qual se manifesta uma plêiade de animais antropormorfizados, falantes e vestidos como humanos, fantoches de madeira com vida própria e uma fada com poderes mágicos, que tanto é uma menina como uma mulher de meia idade, e vive numa quinta, sendo servida por um enorme caracol feminino que se mexe e fala muito devagar, entre outros.

O naturalismo dos ambientes do filme convive sem choques nem rupturas com episódios grotescos que constam no livro (o teatro das marionetas, onde Pinóquio, personificado pelo pequeno Federico Ielapi, é recebido como um igual pelos bonecos, vivos como ele, e o confronto com Mangiafuoco, o seu assustador dono, que afinal tem um coração mole); e de terror e crueldade, como aquele em que Pinóquio é atacado de noite pelo Gato e pela Raposa disfarçados de assassinos para o roubar, e que o enforcam numa árvore, deixando-o lá pendurado até raiar o dia, enquanto discorrem se ele já terá ou não morrido. E tal como também sucede no livro, o Grilo Falante só aparece duas ou três vezes, sendo sempre insultado e tratado com violência por Pinóquio. Walt Disney está muito, muito longe daqui.

Matteo Garrone recorre a um mínimo de efeitos digitais, preferindo quase sempre confiar nas maquilhagens sofisticadas (a “madeira” que cobre o Pinóquio de Ielapi obrigava o actor a ser submetido a três horas diárias de aplicação de maquilhagem), nos cenários tradicionais, na animação e noutras trucagens, algumas delas artesanais. Por aqui passam referências a A Parada dos Monstros, de Tod Browning, a filmes de Terry Gilliam como A Fantástica Aventura do Barão, e mesmo ao cinema de Fellini, no caso, pelo mesmo gosto do artifício assumido (ver as sequências com Gepeto e Pinóquio no interior do monstro marinho). E tudo isto sem que o filme perca de vista ou subverta a lição de vida do livro: só sendo bom, obediente e cumpridor Pinóquio poderá tornar-se num menino de carne e osso.

Este Pinóquio bem equilibrado entre o realista e o mágico de Matteo Garrone entra directamente para o topo das adaptações ao cinema da obra de Carlo Collodi, e sem ser preciso bater na madeira.

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  • 4/5 estrelas
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Os americanos têm o buddy movie, os franceses têm o film de copains. Vai tudo dar ao mesmo, o filme de amigos dos quatro costados. Foi já um subgénero muito cultivado em França, mas que não se vê nas telas com a regularidade – e a qualidade – com que se via nas décadas de 70 e 80, mais porque têm vindo a desaparecer os argumentistas, dialoguistas, realizadores e actores que o faziam bem, do que por uma mudança no público e nos seus gostos.

O duo de argumentistas Alexandre de La Patellière e Matthieu Delaporte estreou-se na realização em 2012 com uma muito divertida comédia, O Nome da Discórdia, dando ao cantor e actor Patrick Bruel o papel principal. Sete anos depois, de La Patellière e Delaporte escreveram e realizaram aquele que é um dos melhores films de copains dos últimos anos: O Melhor Ainda Está para Vir, de novo com Bruel, agora emparelhado com Fabrice Luchini.

Arthur (Luchini) e César (Bruel) estão ambos na casa dos 50 e são amigos desde que se conheceram num colégio interno, eram ainda miúdos. São diferentes como o ovo e o espeto, mas une-os uma amizade em betão armado. Arthur, divorciado e com uma filha adolescente, é médico e investigador no Instituto Pasteur, um coca-bichinhos crónico e um cidadão exasperante de tão exemplar. César nunca teve um emprego certo, é um estoira-vergas que colecciona amantes e é adepto da filosofia chapa ganha, chapa gasta. De tal forma, que o filme abre com a penhora de tudo o que tem.

Devido a um equívoco, Arthur descobre que César tem um cancro e poucos meses de vida, enquanto que este pensa que é o amigo que está canceroso. Arthur não tem coragem de dizer a verdade a César, que entretanto se mudou para casa deste porque a ex-namorada o expulsou da sua, e os amigos combinam ir viver a vida em pleno, concretizando cada qual, alternadamente, um desejo de longa data. E enquanto que entre os sonhos de Arthur estão ganhar o Nobel da Medicina ou visitar a campa de Albert Schweitzer, os de César são mais simples: paródia, jantaradas, casinos e mulheres.

Aqui chegados, e ao contrário do pudéssemos pensar, O Melhor Ainda Está para Vir não resvala nem para a farsa grosseira e bagunçada, nem para o melodrama fungado e rameloso. Graças a uma escrita rigorosamente equilibrada, com todas as palavras, situações e emoções certas nas alturas certas; a uma gestão de relojoeiro suíço da comédia e da gravidade, da espirituosidade e do drama, da ligeireza e da melancolia; e às interpretações arrebatadoras de Luchini e Bruel, verdadeiras e vivas na efervescência do riso como na punção do drama, Alexandre de La Patellière e Matthieu Delaporte arrancam um filme na boa cepa tradicional francesa sobre o significado mais corpóreo, mais real, mais efusivo e mais pungente da amizade entre dois homens que, à partida, tudo daria a entender que nunca poderiam ser amigos. Como diria o imenso argumentista e dialoguista Michel Audiard, “Ça, c’est des copains!”.

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  • 4/5 estrelas
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Diga-se logo a abrir que este ‘Bora Lá não está ao nível de animações mais recentes da Pixar, como Coco, The Incredibles 2: Os Super-Heróis ou Toy Story 4. Mas tal como um grande clube de futebol não é capaz de ganhar todos os jogos que disputa, ou um campeão de Fórmula 1 não consegue triunfar em todos os grandes prémios em que corre, também um estúdio com os pergaminhos da Pixar não está obrigado a produzir uma obra-prima em cada filme.

E não sendo uma dessas, ‘Bora Lá é, mesmo assim, uma fita bastante agradável, técnica e narrativamente superior à maior parte da concorrência e com várias coisas que se recomendam.

Uma delas, e a principal, é ter uma história que remete para uma época em que os jogos de vídeo ainda não estavam tão vulgarizados nem eram tão numerosos e sofisticados como hoje, e um dos jogos mais populares do mundo, com um tema de fantasia, era jogado não num computador, mas sim num tabuleiro: o Dungeons & Dragons.

‘Bora Lá passa-se num mundo em muitas coisas semelhante ao nosso, só que habitado por criaturas dos universos da mitologia, da fantasia e da espada e feitiçaria. Esse mundo onde outrora a magia e as grandes demandas aventurosas eram a norma, começou a ser invadido pela inovação tecnológica.

Em pouco tempo, a magia foi esquecida e a aventura posta de parte ou desvirtuada e comercializada, dando lugar aos electrodomésticos, aos telemóveis, aos aviões, aos carros e à fast food. Basta dizer, e como exemplo significativo, que os centauros deixaram de cavalgar e passaram a andar de automóvel.

Ian Lightfoot e Barley, o seu irmão mais velho, são dois elfos que vivem nos subúrbios de uma grande cidade. Perderam o pai quando eram pequenos e vivem com a mãe. Ian vai fazer 16 anos e tem as preocupações típicas dos adolescentes dessa idade. Barley, por seu lado, adora tudo o que tenha a ver com o mundo de magia e aventura do passado, é um fã de jogos de tabuleiro e de cartas do género e mete-se em sarilhos de vez em quando, por querer salvar da destruição património desse tempo glorioso.

Acontece que o pai deixou a Ian um presente muito especial, para ser aberto no dia dos seus 16 anos. Um presente que vai lançar a família numa demanda como as que fazem vibrar Barley, onde Ian nunca pensou que se ia ver metido e na qual o pai também está presente – embora não na totalidade.

Dan Scanlon, o realizador e um dos argumentistas de ’Bora Lá, perdeu o pai quando tinha apenas um ano, tal como Ian. Por isso, o filme tem uma carga de importância e de emoção pessoal pouco vulgar neste género.

Ao tema da ausência do pai vem juntar-se o do amor e da cumplicidade faternais, que juntamente com as peripécias típicas de uma demanda tradicional, bastante e bom humor (ver as fadinhas bikers) e a costumeira qualidade da animação digital do estúdio, são suficientes para que ‘Bora Lá satisfaça os fãs de cinema animado, bem como os indefectíveis da Pixar.

  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
O Paraíso, Provavelmente
O Paraíso, Provavelmente

Há 20 anos, desde O Tempo que Resta, que Elia Suleiman não realizava uma longa-metragem (em 2012, participou com um segmento no filme colectivo 7 Dias em Havana). E quando vamos ver O Paraíso, Provavelmente, parece que O Tempo que Resta foi feito ontem. Suleiman continua com a mesma cara de ovo cozido com óculos e barba; continua a apresentar a mesma impassibilidade muda a 99% (só diz quatro palavras em O Paraíso, Provavelmente); a sofrer interiormente pela Palestina; a cultivar o mesmo tipo de comédia “branca”, autobiográfica e melancólica, entre a farsa e o nonsense, entre Buster Keaton e Jacques Tati, e a usá-la para meditar sobre a situação e a identidade do seu povo, a sua alienação cultural, a ausência de um lugar a que possa chamar pátria e a sua condição de árabe de Israel, sujeito a todo o tipo de pressões e indignidades. Em O Paraíso, Provavelmente, Suleiman decide ir mais longe do que nos seus filmes anteriores e correr mundo, visitar a França e os EUA em busca de financiamento para o seu novo filme (que, numa brincadeira meta-cinematográfica é precisamente este O Paraíso, Provavelmente) e participar numa iniciativa pró-palestiniana. O olhar que o realizador e actor lança sobre os sítios que visita é exactamente o mesmo de quando está em casa, agudo de observação e atento à comédia do quotidiano e aos seus insólitos e absurdos, e Suleiman esmera-se em planos tirados a regra e esquadro, que aproveitam a beleza, a variedade e as particularidades da paisagem urbana de

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Na França de finais do século XVIII, ainda antes da revolução, Marianne, uma pintora (Noémie Merlant) e Héloise (Adèle Haenel) uma jovem aristocrata e sua relutante modelo, tornam-se amantes durante a execução do retrato desta, que vai ser enviado para Itália, para o homem com quem vai casar a conhecer. Com duas formodáveis actrizes, recatadamente sensual, inteligente e sensível, reflectindo sobre a condição da mulher (e da mulher artista na época) sem se transformar numa arenga feminista ou num panfleto gay, e nunca se submetendo a qualquer dirigismo formal da pintura, Retrato da Rapariga em Chamas ganhou o Prémio de Argumento no Festival de Cannes e é o melhor filme de Céline Sciamma.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Werner Herzog rodou no Japão esta ficção tão contígua da realidade, que se pode confundir com esta, na qual convenceu o dono e director da empresa do título (que aluga actores para interpretarem, em diversos contextos sociais ou profissionais, parentes, amigos ou pessoas próximas dos clientes) a interpretar-se a si próprio numa sucessão de sketches encenados. Na sua componente mais complexamente ficcionada, onde o empresário finge ser o pai de uma adolescente, que ela nunca conheceu por ser ainda bebé quando ele abandonou a mãe, Herzog questiona as implicações éticas e morais deste insólito negócio e dá ao filme dimensão dramático, peso emocional e vibração humana.

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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
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Entre 2011 e 2016, Waad al-Kateab, uma estudante universitária síria, filmou com a sua câmara digital o início dos protestos contra o Presidente Assad e a divisão e o cerco da cidade de Alepo, o seu casamento com o médico e activista Hamza Al-Kataeb e o nascimento de Sama, a sua filha, a quem é dedicado este documentário feito do ponto de vista dos civis que sofrem os efeitos de uma guerra. Para Sama é cru e lancinante ao ponto do insuportável, mas também caloroso e esperançoso. Só lhe falta um enquadramento global e explicativo do conflito e seus vários actores.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Depois de Carvão Negro, Gelo Fino, Urso de Ouro e Urso de Prata do Melhor Actor no Festival de Berlim de 2014, o chinês Diao Yinan traz-nos este fulgurante O Lago dos Gansos Selvagens, a narrativa vertiginosa e intensa de uma dupla caça ao homem na cidade de Wuhan, onde um gangster que matou um polícia inadvertidamente e tem a cabeça a prémio, é perseguido pelos outros marginais e pelos homens da lei. Yinan faz a transcrição, para a China contemporânea, de um daqueles policiais de acção de série B que os americanos rodavam nos anos 40 e 50, filmando com uma câmara agilíssima e nervosa, um sentido consumado da tensão e da acção visual e uma exímia utilização expressiva e dramática dos ambientes, revelando-nos ao mesmo tempo uma China marginal, feia, pobre e kitsch que coexiste com a China próspera e futurista dos telejornais e da propaganda.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Primeira longa-metragem de Ladj Ly, Os Miseráveis teve o Prémio do Júri do Festival de Cannes, foi rodado no bairro de Montfermeil, nos subúrbios de Madrid, onde o realizador cresceu. É um retrato frontal, equlibrado e muito inquietante da realidade nas cités parisienses, onde se acumulam os imigrantes, o Estado parece ter abdicado de exercer a sua jurisdição, os bandos de delinquentes e os fundamentalistas islãmicos disputam os favores dos habitantes, e em especial a atenção e a lealdade dos mais jovens, e onde apenas a Brigada Anticrime da polícia consegue entrar e manter contactos. O filme começa num tom de euforia nacional, e termina noutro, radicalmente diferente, de fragmentação total e caos geral anunciado.

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  • 4/5 estrelas
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Esta realização de Jan Komasa concorre pela Polónia ao Óscar de Melhor Filme Internacional e tem um notável jovem actor chamado Bartosz Bielenia no papel de Daniel, um rapaz que sai de um centro de detenção juvenil para ir trabalhar numa serração no campo, mas acaba a fingir que é padre e a envolver-se profundamente na vida de uma pequena comunidade (Daniel tem vocação para o sacerdócio, mas o facto de ser cadastrado impede-o de ir para um seminário). Inspirado por um facto real, Corpus Christi-A Redenção é um sério, intenso e belíssimo filme sobre os paradoxais atalhos da fé, a forma como Deus escreve direito por linhas tortas e a dificuldade do perdão e da redenção pessoal, onde Komasa nunca recorre a expedientes fáceis, simplistas ou confortáveis. Como se prova pela brutal conclusão. A não perder.

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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À sétima versão para cinema do livro clássico de Louisa May Alcott, Greta Gerwig desarrumou-lhe a cronologia, começando o filme lá para o meio, quando Jo (uma fulgurante Saoirse Ronan) já está em Nova Iorque a tentar viver da escrita. Mas a imortal história das quatro irmãs March resiste a tudo, e Gerwig faz todo o jus emocional, cinematográfico e evocativo à obra de Alcott sobre a vida entre irmãs, o fim da infância e a queda na maturidade, o porto seguro da família e sobretudo a vontade da arrapazada, inquieta, imaginativa e impetuosa Jo ser independente, escritora reconhecida, feliz nos termos que deseja. Com a esplêndida Florence Pugh em Amy, Emma Watson e Eliza Scanlon em Meg e Beth, e Laura Dern e Meryl Streep perfeitas como Marmee e a tia March.

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  • 4/5 estrelas
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J'accuse - O Oficial e o Espião
J'accuse - O Oficial e o Espião

Roman Polanski adapta o livro de Robert Harris sobre o Caso Dreyfus, que abalou e dividiu a França em finais do século XIX, adoptando o ponto de vista do coronel Georges Picquart, que descobriu o verdadeiro espião e tudo fez para que Dreyfus fosse inocentado e reintegrado no Exército, arriscando a sua própria carreira, segurança e liberdade. No seu assumido academismo formal e narrativo, o filme é uma robusta recriação de um processo judicial e político escandaloso, tendo como força motriz a portentosa interpretação de Jean Dujardin no corajoso e íntegro Picquart, e Polanski parece aproveitar esta história real de um falso culpado para fazer paralelos com a sua situação pessoal de acusado de crimes sexuais, de que diz estar inocente.

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João Moreira e Pedro Santo, os criadores de Bruno Aleixo, tiveram o bom senso de não se porem a fazer "cinema" neste filme em que a personagem é solicitada a fazer um filme sobre a sua vida por uma produtora, e convoca a sua bizarra pandilha (Homem do Bussaco, Busto, Monstro da Lagoa Negra chamado Renato Alexandre) para o ajudar com a história. O Filme do Bruno Aleixo porta-se como se fosse um episódio melhorado e com um bocadinho mais de orçamento da série, e esse é logo um dos seus principais méritos. Vários actores e convidados especiais - Adriano Luz, Rogério Samora, João Lagarto, Manuel Mozos, Fernando Alvim etc. - dobram aqueles (ou são personificados e dobrados por eles) ou interpretam outras personagens, e o universo de nonsense estanque e circular da série mantém-se intacto, havendo até espaço para uma publicidade da Mister Cimba. Melhor gag: a esfregona assassina.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 4/5 estrelas
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Corneliu Porumboiu, um dos principais nomes do novo cinema da Roménia, pega em situações feitas, personagens tipo e estereótipos do cinema policial e acrescenta-lhes o excêntrico elemento de uma ancestral linguagem assobiada de uma ilha das Canárias, para fazer um filme que é ao mesmo tempo um pastiche e uma glosa aplicada, com todos os eles e erres, deste género clássico. A que não falta o tradicional comentário sobre a corrupção institucional no seu país. Tudo feito com a economia visual e expressiva, circunspecção dramática e toques de humor nonsense habituais do realizador. A Ilha dos Silvos é um filme de três assobios.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Clint Eastwood recorda neste filme uma história vergonhosa ocorrida nos Jogos Olímpicos de Atlanta de 1996. Richard Jewell, um segurança, detectou uma bomba num parque da cidade durante um concerto e ajudou a evacuar o recinto. Poucos dias depois, passou de herói nacional a suspeito de terrorismo, porque o FBI, pressuonado pela organização dos jogos e pelo governo, precisava de apresentar um culpado, e os media foram atrás da história, crucificando Jewell perante a lopinião pública. O Caso de Richard Jewell é um alerta contra os abusos e as arbitrariedades do Estado e do Quarto Poder, filmado por Eastwood com concisão brilhante e sem flores moralistas, e um elenco inatacável - a começar pelo atá aqui "secundário" Paul Walter Hauser no papel principal. O primeiro filme solida e certeiramente político de 2020.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

François Ozon filma o escândalo que ainda está actual em França e que se deu na diocese de Lyon, envolvendo um padre que abusou de rapazes ao longo de décadas sem que a hierarquia agisse, e que foi denunciado e levado à justiça por um grupo de paroquianos que foram molestados pelo sacerdote quando eram jovens. Ozon não quer fazer tiro ao alvo, praticar o sensacionalismo indignado ou o anti-clericalismo fácil, e sem deixar de expor o silêncio, a negação, o atabalhoamento e as hesitações da igreja perante o caso, põe em cena a complexidade e a diversidade das emoções e das reacções de um trio de homens que sofreram os avanços do padre (vividos por Melvil Poupaud, Denis Ménochet e Swann Arlaud).

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

No seu pior, Ken Loach é demagógico, tendencioso e simplista. No seu melhor, como é o caso de Passámos por Cá, é frontal, justo e justificadamente indignado e maneja o realismo social como mais nenhum realizador. Escrito como sempre por Paul Laverty, o filme é o aflitivo e inglório espectáculo de uma família de Newcastle enredada em dívidas e ameaçada de desintegração, e que quanto mais se esforça para se livre delas, mais acumula. Sobretudo o pai, que arranja um emprego como franquiado de uma empresa de entrega de encomendas, que se revela uma forma moderna de escravatura laboral sob a capa de trabalho independente.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

A continuação do descomunal sucesso da Disney, que se transformou no filme animado mais lucrativo de sempre, é uma história de "origens" em que Elsa, Anna, Olaf, Kristoff e Sven têm que fazer uma viagem a uma floresta encantada para encontrarem respostas sobre o passado das duas irmãs e os poderes da rainha, e salvarem Erendalle da destruição. A história é mais complexa que a do filme original, a banda sonora não tem uma canção à altura de Let it Go (embora tente com Into the Unknow) e a animação é estupenda, na linha clássica da Disney. E os realizadores "repetentes" Chris Buck e Jennifer Lee não resistem a dar aqui a Elsa um polimento de super-heroína da Marvel.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 4/5 estrelas
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James Mangold realiza esta fita que recria o célebre duelo travado entre a Ford e a Ferrari nos anos 60, pela supremacia nas pistas de corrida americanas e europeias, e muito em especial pela vitória nas 24 Horas de Le Mans. É uma celebração da velocidade, da competição e da excelência técnica e humana, com Christian Bale muito bem no castiço piloto ingles Ken Miles, um sobredotado da mecânica e da condução, e o mortiço e deslavado Matt Damon a fazer de Carroll Shelby, o antigo piloto e construtor independente a quem a Ford confiou o aperfeiçoamento do lendário GT40, que em 1966 alcançaria os três primeiros lugares em Le Mans.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Há quase dez anos que Woody Allen não filmava na sua querida Manhattan, e o regresso não podia ter sido mais auspicioso. Requintadamente fotografada pelo mestre Vittorio Storaro, faça sol ou chova torrencialmente, Um Dia de Chuva em Nova Iorque é uma elegante, nevrótica, satírica e refrescante comédia romântico-sentimental que tem o ADN do realizador por toda a parte. Timothée Chalamet e uma hilariante Elle Fanning lideram um elenco onde ninguém dá um passo em falso e Allen celebra mais uma vez a sua cidade adorada, simultaneamente idealizada e real, entusiasmante e melancólica, onde as suas personagens tanto se podem apaixonar, andar num virote cómico ou receber uma grande lição de vida.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Marco Bellocchio dá uma contribuição maior para o acervo de filmes, séries e telefilmes italianos sobre a Mafia, com esta obra sobre Tommaso Buscetta, um dos primeiros "arrependidos" da Cosa Nostra, a Mafia da Sicília, interpretado com magnífica sobriedade por Pierfrancesco Favino. Bellocchio mostra que, para Buscetta, o traidor não era ele, que se via como um mafioso honrado e homem de palavra, "à antiga", mas sim Totò Riina, o cruel líder da Cosa Nostra, que quebrou todos os códigos de comportamento da organização com os seus métodos sádicos e arbitrários, e recria o ambiente das prisões, dos julgamentos colectivos e das vendettas desses anos intensos de combate ao crime organizado em Itália.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Asako I & II
Asako I & II

Ryusuke Hamaguchi, o realizador de Happy Hour: Hora Feliz, apoia-se aqjui num romance da sua compatriota Tomoka Shibasaki para assinar um filme sensibilíssimo, delicadamente elíptico e de grande decoro emocional sobre o confronto entre a idealização romântica e a realidade concreta e quotidiana da paixão e das relações sentimentais, e sobre os acasos, os inesperados, as ilusões e a componente racional do amor. E por Asako I & II paira, mesmo qua suavemente, a sombra de Vertigo.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
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Varda by Agnès
Varda by Agnès

Podia chamar-se, em alternativa, Varda Explica e Decifra Varda, este último filme da realizadora, que morreu aos 90 anos em Março. Varda passa em revista e comenta a sua obra cinematográfica, fotográfica e as instalações, com uma enorme carga emocional, afectiva e íntima, trazida pelas riquíssimas memórias e recordações, profissionais, pessoais e familiares que lhe estão associadas. No discreto final, Agnès Varda desaparece na bruma de uma das suas queridas praias. Custa pensar que nos deixou, e não voltaremos a ver filmes seus.

Por Eurico de Barros

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  • Terror
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Depois do soturno, invernoso e sobrenatural Hereditário, Ari Aster assina aqui um filme de terror pagão passado no pino do Verão e todo à luz do dia. Um grupo de estudantes universitários americanos vai para a Suécia, assistir, numa comunidade rural, às celebrações do Solstício de Verão, mas aquilo que parecia ser umas férias idílicas transforma-se num pesadelo que brota do passado remoto e tradicional. Em Midsommar-O Ritual, o horror é lenta e pacientemente construído por Aster, num gradual mas seguro crescendo de inquietação e desconforto, sem sustos falsos nem sobressaltos gratuitos. Com a excelente Florence Pugh e Jack Reynor.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Pedro Lino investiga neste documentário a movimentada vida do realizador italiano Rino Lupo, que percorreu toda a Europa a filmar e esteve em Portugal nos anos 20, ainda no tempo do mudo. Aqui, Lupo rodou filmes relevantes, como Mulheres da Beira ou Os Lobos, e abriu uma escola de actores que Manoel de Oliveira chegou a frequentar. Um filme rigoroso e visualmente inventivo, em que Lino consegue desvendar lo mistério da morte de Rino Lupo, que tinha desaparecido misteriosamente na década de 30, algures na Europa que palmilhou de lés a lés a fazer cinema.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
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Tiago Guedes filma em A Herdade uma história familiar robustamente romanesca, de amplo fôlego dramático e com músculo cinematográfico, bem ancorada na história portuguesa recente, apanhando o fim do antigo regime, a loucura revolucionária pós-25 de Abril e a acalmia democrática. Ela é dominada por João Fernandes, uma personagem forte, carismática e trágica, um poderoso proprietário rural do Ribatejo. A sorte da herdade está ligada à de João Fernandes e da família, e se ele sabe como lidar com o mundo exterior para proteger e fazer prosperar o seu pequeno império, o mesmo já não acontece dentro de portas. A sua incapacidade de expressar sentimentos e dispensar afectos, irá fazer implodir tudo em seu redor e espalhar a infelicidade nos que lhe são mais próximos, ou afugentá-los. Albano Jerónimo, Sandra Faleiro e Miguel Borges, todos soberbos, encabeçam um elenco bem escolhido e dirigido, irrepreensível e homogéneo, dos papéis principais aos mais pequenos.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Quase 50 anos depois de ter sido rodado, eis finalmente o filme da gravação ao vivo numa igreja de Los Angeles, em 1972, de Amazing Grace, o lendário álbum de gospel de Aretha Franklin. Sydney Pollack na altura não conseguiu sincronizar o som com a imagem e Amazing Grace ficou arrumado no arquivo da Warner Bros., até o produtor Alan Elliott ter resgatado as imagens em 2007, e conseguido uma cópia síncrona graças às tecnologias digitais. Só que Aretha proibiu a exibição pública da fita, o que apenas sucedeu após a morte da cantora, em 2018. É um concerto de ir às lágrimas de êxtase. O Senhor estava com Aretha Franklin, e abençoou-lhe a voz à nascença.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Um filme semi-autobiográfico, de enorme gravidade introspectiva e rememorativa, onde Antonio Banderas personifica Salvador Mallo, alter ego de Pedro Almodóvar, um realizador à beira dos 70 anos, afligido por uma série de dores físicas e existenciais, que julga ter deixado para trás os seus dias de glória e não tem mais disposição para escrever ou filmar. Banderas tem uma interpretação de grande reserva emocional e em meia-luz anímica nesta fita sobre a velhice e o agridoce passar em revista das memórias familiares, amorosas e profissionais, cheia de melancolia mas também de afectuosidade e ternura, e limpa de narcisismo e condescendência.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

A irlandesa Nora Twomey assina esta longa-metragem de animação passada em Cabul, sob o regime talibã. Com o pai na cadeia, Parvana, uma menina de 11 anos, arrisca a vida fingindo que é um rapaz para poder sustentar a mãe e os irmãos. Saído dos estúdios que já nos deram The Secret of Kells e A Canção do Mar, A Ganha-Pão é uma história de coragem, sacrifício e desafio a um poder arbitrário, obscurantista e violento. Twomey enriquece o filme estilistica e esteticamente com a história que Parvana conta ao irmão mais pequeno, e que espelha a sua ao nível fantástico.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

João Maia estreia-se a realizar com esta biografia de António Variações, onde se concentra no “antes” da fama do compositor e cantor, que morreu faz agora 35 anos. O enredo decorre quase todo entre 1977 e 1981, quando Variações, então ainda António Ribeiro, era um barbeiro e uma figura excêntrica e vistosa de Lisboa e da noite que aspirava ser cantor, e procurava por todos os meios dar-se a conhecer no pequeno e pouco receptivo meio da música. Alicerçado na soberba interpretação de Sérgio Praia, que se transmuta em António Variações, da voz ao modo de ser e estar (não há aqui qualquer playback, vocal ou instrumental), recriando a época de forma credível e fugindo a lugares comuns e tiques pop na forma e no discurso, Maia assina aqui um dos melhores filmes portugueses deste novo século.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Mel Gibson e Vince Vaughn interpretam, neste filme de S. Craig Zahler (Bone Tomahawk, Rixa no Bloco 99), dois polícias suspensos sem vencimento por terem alegadamente usado de excesso de força durante a prisão de um traficante de droga. Necessitados de dinheiro com urgência para prover aos seus, os polícias decidem assaltar um traficante de droga, mas este reuniu um bando para roubar um banco e eles surpreendem-no com a mão na massa. Importante para a história é também um pequeno delinquente negro (Tory Kittles) que está no bando do traficante para conseguir dinheiro para a família, com tanta urgência como o duo de polícias. As sombras de Sam Peckinpah, Don Siegel e Robert Aldrich passam por Na Sombra da Lei, um policial de acção soturno, duríssimo, seco e fatalista, como Hollywood os fazia nos anos 70 e 80. Absolutamente a não perder por quem tinha saudades deles.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Esta continuação da longa-metragem animada de 2016 consegue ser-lhe superior. Os realizadores Chris Renaud e Jonathan del Val contam duas histórias em paralelo, uma envolvendo o cãozinho Max, o seu amigo Duke e a nova família da sua dona, Katie, durante uma visita ao campo; e a outra metendo ao barulho o frenético coelho Snowball, a cadelinha Gidget, Daisy, outra cadela, e um desvairado exército de gatos, que, na cidade, vão salvar uma cria de tigre presa num circo itinerante, e atam jubilatoriamente estes dois enredos no final da fita. A animação continua a ser subtilmente estilizada. as personagens permanecem pandegamente variadas e bem caracterizadas, e os gags são distribuídos com abundância e qualidade. Esta parte 2 até tem Harrison Ford a fazer a voz de um cão, o imponente e imperturbável Rooster.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O realizador e encenador russo Kiril Serebrennikov evoca e celebra a sua geração neste filme ora melancólico, ora enérgico, passado na Leninegrado do início dos anos 90, quando dois grupos pop/rock de culto, os Zoopark de Mike Naumenko, e os Kino de Viktor Tsoi, faziam entrar alguma luz de alegria, agitação, revolta e esperança no quotidiano dos jovens. Verão é um filme político, mas não de forma estridente e óbvia, recriando, sem revanchismo e com delicadeza de toque e de sentimentos, esse tempo de declínio da URSS e do seu regime de cinzentismo totalitário, em que quem ouvia, tocava e respirava rock, mesmo sob todos os constrangimentos e todas as repressões, procurava ser minimamente feliz através dele. E tanto fazia que fosse Marc Bolan ou Bob Dylan, os Doors ou os Blondie, Mott the Hopple ou Kraftwerk.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O quarto filme rodado por Jafar Panahi à revelia das autoridades iranianas tem, de novo,o próprio realizador como protagonista. Panahi e a famosa actriz iraniana Behnaz Jafari metem-se num jipe e rumam à montanhosa região da fronteira com o Azerbaijão, para investigarem da veracidade de um vídeo que receberam, em que uma adolescente dali parece suicidar-se, ante a recusa da família em a deixar ser actriz. Com meios mínimos e baralhando mais uma vez a fronteira entre realidade e ficção, Panahi assina uma fita admirável sobre três gerações de actrizes iranianas, sobre os absurdos da situação da mulher no Irão e sobre as carências, os contrastes e os paradoxos de um país onde as pessoas são hospitaleiras e generosas, mas também apegadas a costumes rígidos que podem muitas vezes ser implacáveis e arruinar as vidas de quem não os quer seguir.

Por Eurico Barros

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  • Animação
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Chris Butler, o realizador de ParaNorman (2012) assina esta homenagem (e paródia) aos filmes de aventuras sobre explorações a lugares remotos ou míticos, que envolve Sir Lionel Frost, um aventureiro vitoriano, e o Pé-Grande, que se revela um monstro amigável e jovial. A animação é deliciosamente expressiva e o humor vai do nonsense à espirituosidade seca e ao slapstick.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Família e crianças
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Nesta versão em imagem real e efeitos especiais, Tim Burton manteve-se fiel ao essencial do clássico de 1941. O realizador evita uma aproximação verista à história, que poderia comprometer a credibilidade do elefantezinho voador e, através de uma leve estlização, transforma Dumbo numa fantasia de rosto “realista”.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O francês Julien Faraut foi resgatar dos arquivos um documentário didáctico em 16mm sobre John McEnroe feito nos anos 80, em Roland Garros, por Gil de Kermadec, então director técnico nacional do ténis francês, bem como imagens inéditas do mesmo, e construiu este filme sobre o irascível prodígio do ténis, ajudado por opiniões de Jean-Luc Godard e do crítico de cinema Serge Daney, ambos ferrenhos da modalidade.

O resultado é um documentário inteligente, elegante e incisivo, que explica o talento sobre-humano de McEnroe e a sua fome de perfeição, analisa a sua psicologia profunda, demonstra que o seu lendário mau feitio fazia parte da sua identidade de jogador e como ele se alimentava do clima hostil e de riso que se criava em seu redor nos jogos. E Faraut contraria ainda os habituais estereótipos e lugares comuns preguiçosos sobre o campeão americano dos courts.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Passado entre 2001 e a actualidade, o filme documenta o efeito da acelerada e violenta transformação da China numa superpotência. Jia Zhangke desenvolve a história num quadro narrativo que comunga do policial e do melodrama tradicional, pondo em cena um mafioso (Fan Liao) de uma cidade do interior e a sua devotada namorada (Tao Zhao, mulher do realizador e sua actriz favorita), cujas vidas são radicalmente sacudidas por poderosas forças políticas, económicas e sociais que os rodeiam. Mas a grande história do país nunca se sobrepõe à das personagens.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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O oscarizado realizador iraniano Asghar Farhadi, autor de Uma Separação e O Vendedor, foi a Espanha filmar, com Penélope Cruz, Javier Bardem e Ricardo Darín à frente de um óptimo elenco, esta história que parecer ser, à superfície, um thriller sobre o rapto de uma adolescente numa vila castelhana. Mas este é, na realidade, o cabide narrativo onde Farhadi pendura o seu gosto pela observação e desmontagem meticulosa do desconcertante e imprevisível mecanismo de funcionamento das relações e dos conflitos humanos. A fita podia ser um pouco mais curta e por vezes, menos demonstrativa, mas a enorme qualidade da escrita, as interpretações e a inflexível tensão dramática que o realizador instala e não deixa afrouxar, compensam plenamente estas pequenas arestas.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Baseando-se em situações reais, Yorgos Lanthimos filma aqui
a história da feroz rivalidade entre duas mulheres que também eram parentes, Sarah Churchill, duquesa de Malborough (Rachel Weisz), e a sua prima afastada e arruinada, a baronesa Abigail Masham (Emma Stone), que disputaram o exclusivo dos favores, da intimidade, da confiança e dos privilégios da Rainha Ana de Inglaterra (Olivia Colman), no início do século XVIII, e terão tido relações lésbicas com a monarca. A Favorita, filme candidato a 10 Óscares, comunga das produções históricas de prestígio da BBC, de filmes como Tom Jones, de Tony Richardson, e Barry Lyndon, de Stanley Kubrick, mas também do humor de um Black Adder. Weisz, Stone e Colman sugam os seus papéis até ao tutano, fazendo com que a fita pertença plenamente a este majestoso trio de actrizes.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

A pergunta é simples e a resposta ainda mais singela. “O que é que você pinta?”, pergunta o internado num asilo ao debilitado, física e mentalmente, Vincent van Gogh, que responde: “A luz do Sol.” O que é uma excelente descrição para a pintura e o caminho escolhido por Julian Schnabel para traçar o retrato pungente e atormentado dos últimos dias do pintor holandês em À Porta da Eternidade.

Para aqui chegar, a este caminho pelo interior do cérebro de um génio, o realizador nova-iorquino contou como uma interpretação de Willem Dafoe que não só coloca o actor no caminho dos Globos de Ouro e dos Óscares, como ainda mostra aos mais distraídos a capacidade do actor em transformar-se na personagem, com ela vivendo as dores, o isolamento, mas também a visão de quem procurava a luz perfeita como quem busca o seu Graal.

Por Rui Monteiro

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  • Suspense
  • 4/5 estrelas
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Um polícia, um telefone, um computador, uma chamada de emergência. É tudo o que o dinamarquês Gustav Moller precisa, no seu filme de estreia, para nos manter pendurados em suspense durante hora e meia. Escorado numa soberba interpretação de Jakob Cedergren, o realizador tira o máximo efeito emocional, dramático e psicológico do mínimo de elementos neste filme controladíssimo e tensíssimo, que faz lembrar o inglês Locke, de Steven Knight. O Culpado é um dos candidatos ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro e o remake americano já está a caminho.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Alfonso Cuarón ganhou o Festival de Veneza (e quer também ganhar Óscares) com este filme produzido pela Netflix em que evoca a sua infância num bairro burguês da Cidade do México no início dos anos 70 e homenageia Cleo, a dedicadíssima de carinhosa criada indígena que o ajudou a criar, e aos irmãos. Cleo (Yalitza Aparicio) que é o pivô narrativo e emocional de Roma, filmado em digital de grande formato, com incomensurável brilho visual e apuro técnico, e onde Cuarón vai do íntimo ao geral, do pessoal ao colectivo, com um espantoso sentido do real. O elenco, soberbo, é praticamente todo composto por gente sem qualquer experiência de representação.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 4/5 estrelas
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Dizia o poeta a propósito de um refrigerante: primeiro estranha-se, depois entranha-se. E assim é com o filme de 1965 em que Godard, através da singela história de amor entre Ferdinand (Jean-Paul Belmondo) e Marianne (Anna Karina) monta um enredo onde a paixão convive com perseguição e violência. À primeira vista é um filme de gangsters em que, depois de um crime, o casal rouba um carro, instala-se numa ilha deserta em modo Robinson Crusoé, e depois resolve pôr-se ainda mais ao fresco e, se necessário, enfrentar as consequências. O que parece simples, não fora o tom, digamos antes, a textura em camadas que é preciso decifrar, antes de concluir que, provavelmente, como na vida, nada aqui faz sentido.

Por Rui Monteiro

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Ainda no horizonte se desenhavam os contornos do cinema francês engendrado pela Nova Vaga, em 1960, quando Jean-Luc Godard e o argumentista (embora já tivesse dirigido 400 Golpes) François Truffaut meteram mãos a esta homenagem ao cinema americano. O realizador chamou-lhe um documentário sobre Jean Seberg e Jean-Paul Belmondo, mas O Acossado está longe
 do cinema documental na
 sua desembestada narrativa das aventuras do bandido 
de meia tijela e sangue na guelra, Michel Poicard, fugindo para Paris depois
 de matar um polícia e aproveitando para cobrar uma dívida quando choca de frente com Patricia... E a sua vida – como o cinema – nunca mais foi como era.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O japonês Horokazu Kore-era continua a explorar o tema da família em todas as suas possibilidades dramáticas. Neste novo filme, Palma de Ouro em Cannes, o realizador de Ninguém Sabe e Tal Pai, Tal Filho interroga-se sobre o que é uma família, e se será preciso haver laços de sangue entre aqueles que a compõem para a considerarmos como tal, centrando-se num agregado que vive ao monte numa pequena casa dos subúrbios de Tóquio, subsistindo essencialmente do produto de pequenos furtos em lojas e mercados locais. Sem sentimentalismo, sem agitar bandeiras de causa, sem querer fazer proselitismo e dirigindo um magnífico e coeso grupo de actores de um amplo espectro etário, Kore-eda mostra como uma família "falsa", em manta de retalhos, pode escrever direito por linhas tortas. E que é um cineasta com uma profunda compreensão da natureza humana, das suas singularidades e dos seus paradoxos.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Para criar o que é, em anos, o seu melhor filme, Michael Moore não abdicou da ideologia nem dos seus alvos preferenciais. Todavia, pelo menos desta vez, também ele percebeu que era preciso parar para pensar. Reflectir, pesar os prós e os contras do passado, compreender como afinal foi um sistema político fechado sobre si e sobre os seus interesses egoístas que deixou de fora tantos americanos e tantos americanos levou a votarem no capitalista de cabelo esquisito que fazia uma figuraça na televisão. E é isso que nos mostra este documentário.

Por Rui Monteiro

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  • Terror
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Esqueçam os nove filmes que foram feitos desde que em 1978 John Carpenter rodou o seminal Halloween – O Regresso do Mal. Este novo Halloween de David Gordon Green quer fazer tábua rasa de tudo
o que aconteceu nestes últimos 40 anos, e ser a única e verdadeira continuação da fita-mãe. Laurie Strode (Jamie Lee Curtis, também produtora executiva, com Carpenter) está mais velha e azeda, mas
com espírito de sobrevivência, e toda artilhada na sua casa-fortaleza, à espera de Michael Myers. Que se evade na noite de Halloween e regressa a Haddonfield para o confronto final. David Gordon Green glosa
muito bem John Carpenter e mantém tudo a funcionar sobre rodas, transportado pela banda sonora composta pelo mestre.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Em 1956, na RDA, os alunos
de uma turma de finalistas
de liceu fizeram um minuto
de silêncio pelas vítimas da repressão soviética na Hungria. O incidente foi tratado como
se se tratasse de um acto deliberadamente subversivo,
os rapazes e raparigas tratados como contra-revolucionários, instados à delação e finalmente expulsos. Lars Kraume evoca este episódio real num filme que evita o preto e branco ideológico e os maniqueísmos, ilustra os muitos dramas vividos pelos alemães no pós-II Guerra Mundial, aquando da divisão do país ao meio e da separação de amigos, famílias
e amantes, e homenageia a coragem e a dignidade dos alunos rebeldes, interpretados por um elenco juvenil de uma qualidade uniforme.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Ian Bonhôte e Peter Ettedgui assinam este documentário sobre o malogrado designer de moda inglês Alexander McQueen, que se suicidou em 2010 com 40 anos, e que se distinguiu como um outsider e um talentoso iconoclasta no mundo a que dedicou a sua vida. E que revolucionou (e por vezes chocou) com a concepção e criação das roupas, os sítios díspares a que ia buscar inspiração (incluindo a sua vida pessoal e familiar), e os elaboradíssimos e surpreendentes desfiles em que apresentava as colecções. A maior qualidade de McQueen é não ser um filme corporativo, feito apenas para o meio da moda, a que o biografado nunca se restringiu e ao qual jamais se acomodou.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Depois de Na Praia de Chesil, Ian McEwan volta a assinar aqui o argumento de um filme baseado num livro de sua autoria. Emma Thompson brilha no papel de Fiona Maye uma juíza que tem em mãos
o caso de um adolescente com leucemia que, por ser Testemunha de Jeová, recusa a transfusão de sangue que lhe poderá mudar a vida.
 Mas o verdadeiro tema da
 fita é a repressão emocional 
e a desumanização íntima
 de Maye, que se deixou monopolizar pelo trabalho, secou a sua vida conjugal
e pessoal e impediu de ter filhos. Também com Stanley Tucci, Fionn Whitehead e Jason Watkins no fiel e zeloso assessor da juíza.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Uma comédia romântica como deve ser, baseada no livro de Nick Hornby e realizada por Jesse Peretz, que tocou na banda indie The Lemonheads e já realizou um ramalhete de bons filmes cómicos. Ethan Hawke, Rose Byrne e Chris O’Dowd, todos excelentes, formam o triângulo amoroso desta
fita deliciosa, amena e muito bem escrita, que mexe com música, com cromos da música, com conhecimento enciclopédico da dita e com personagens paradas na vida e acomodadas nas suas relações sentimentais, que têm que tomar decisões que podem novo ânimo às suas existências. A comédia é gozona sem ser ofensiva ou cruel e o drama é tangível sem precisar de ser extremado, as personagens nunca são reduzidas a clichés, e Peretz farta-se de tirar dividendo risonhos dos nerds da cultura pop (no caso vertente, os maluquinhos do indie rock).

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Peyton Reed é repetente na realização desta nova aventura do Homem-
Formiga, ainda melhor que o primeiro filme homónimo, de 2015. Paul Rudd volta a interpretar este super-herói da Marvel, agora emparceirando com a Vespa (Valentine Lilly) numa vertiginosa e jubilatória aventura que envolve que envolve combates com vilões normais
 e uma super-vilã fantasmática, um mergulho em profundidade no mundo quântico e perseguições com automóveis de vários tamanhos, tudo numa jigajoga entre o micro e o macro, o muito pequeno e muito grande, a miniaturização e a amplificação de pessoas, animais e objectos, nomeadamente o prédio do laboratório do genial Dr. Pym (Michael Douglas). Homem-Formiga e a Vespa é o melhor, mais bem esgalhado, mais divertido e mais dinâmico filme de super-heróis do Verão, e deste ano. Também com Michelle Pfeiffer, Laurence Fishburne e Michael Peña.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Sicário - Guerra de Cartéis
Sicário - Guerra de Cartéis

O italiano Stefano Solima (SuburraGomorra) substituiu Denis Villeneuve a realizar esta continuação de Sicário-Infiltrado, e a personagem de Emily Blunt foi descartada. Mas tudo o resto continua no lugar, incluindo a visão desapiedada do argumentista Taylor Sheridan sobre a sangrenta e amoral guerra fronteiriça entre os cartéis da droga mexicanos, agora a traficar imigrantes clandestinos em vez de cocaína, e sobretudo as personagens de Josh Brolin e Benicio del Toro, os homens frios e duros das operações clandestinas, que desta vez revelam mais alguma humanidade e sentido de honra do que seria de esperar.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Western
Western

Um grupo de operários alemães vai erguer uma central hidroeléctrica numa zona remota da Bulgária, que confina com a Grécia. Em vez de desenvolver um enredo à base de lugares-comuns sentimentais, de confrontação ou de estereotipação nacional e política, bem como de metáforas prontas-a-usar sobre a Europa de hoje, a realizadora Valeska Grisebach faz um filme sobre o esforço - nem sempre fácil, espontâneo ou correspondido - de entendimento, comunicação e convívio entre seres humanos. O elenco é quase todo composto por amadores, muitos deles recrutados no local em que Western foi rodado, com destaque para o ex-feirante Meinhard Neumann) no principal papel masculino.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Apesar da assombrosa qualidade dos efeitos especiais que ressuscitam os dinossauros do início dos tempos, este segundo filme da nova trilogia que sucede à iniciada há 25 anos por Parque Jurássico, de Steven Spielberg, e que dá continuidade a Mundo Jurássico (2015), soçobra devido a um enredo crescentemente absurdo, a uma absoluta falta de originalidade e de frescura da história (um cabide para se pendurarem as tropelias dos dinossauros e em que o Indoraptor, um híbrido feito em laboratório, rouba o estrelato ao T-Rex) e à irritante tendência do realizador J.A. Bayona para se pôr a impingir sermões sobre temas tão variados como a manipulação genética ou a exploração dos animais para fins criminosos ou militares. O 3D volta a não servir para nada e o terceiro filme fica preparado com um final muito aberto.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Vencedor do Festival de Cannes em 2008 com A Turma, sobre um professor e os seus alunos de um liceu difícil de Paris, o francês Laurent Cantet, a escrever de novo com Robin Campillo, volta a juntar aqui um adulto e jovens que estão a tactear o seu caminho no mundo (uma escritora de policiais que faz um workshop de escrita com adolescentes de La Ciotat, em Marselha), usando-os para expor as divisões, medos e tensões da França contemporânea. Um filme muito bem escrito, que finta simplificações de caracterização e situação, e foge a julgamentos apressados e moralismos reconfortantes.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Um dos melhores filmes de François Ozon, sobre um livro pacifista de Maurice Rostand depois levado ao palco e adaptado para o cinema em 1932 por Ernst Lubitsch (O Homem que Eu Matei). O realizador francês acrescenta uma segunda parte à história original, alterando ainda o ponto de vista da personagem principal, um francês, para a alemã. Frantz é um drama sobre o perdão e a mentira, e sobre o peso da dor pelos mortos queridos, passado logo após a I Guerra Mundial, entre a Alemanha e a França. Nos papéis principais, Pierre Niney e Paula Beer são formidavelmente tocantes. Ozon mantém à distância qualquer manifestação melodramática e filma com parcimónia de intimidades, num preto e branco austero com assomos de cor para enfatizar picos emocionais do enredo.

Por Eurico de Barros

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  • Terror
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

A Terra é invadida e devastada por monstros alienígenas cegos mas hipersensíveis ao ruído, e para sobreviver, os humanos têm que se habituar a existir no mais absoluto silêncio, como a família liderada por John Krasinski (que também realiza), numa quinta no interior dos EUA. Partindo desta premissa, Krasinski e os seus co-argumentistas, Bryan Woods e Scott Beck, alinham uma série de situações de suspense esfrangalha-nervos, em que um simples prego saliente numa escada ou uma inundação numa cave podem ser fatais. Com Emily Blunt, que é mulher de Krasinski, na mãe, e a óptima Millicent Simmonds, que é surda-muda, na filha com a mesma deficiência.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O director de fotografia belga Philippe Van Leeuw filma um grupo de civis trancados num apartamento de Damasco enquanto os perigos da guerra rondam lá fora e ameaçam entrar. A ideia do realizador é dar o ponto de vista dos civis anónimos num conflito, e o filme é vago o suficiente para esta situação poder ser extrapolada para outras guerras noutros países e não se confinar à Síria. Por isso, longe de ser virtuosamente político, propagandista ou engajado, Na Síria é um filme de terror de alta tensão claustrofóbica e de medo sempre à flor da pele, com a soberba Hiam Abass no papel
da mãe de família que mantém o grupo preso em casa unido e protegido.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
A Idade da Pedra
A Idade da Pedra

Nick Park, criador de Wallace
 e Gromit e um dos fundadores dos estúdios Aardman, revela, na primeira longa-metragem de animação de volumes que assina sozinho, que o futebol foi inventado na Idade da Pedra. Pondo em confronto no relvado uma equipa de trogloditas e outra da Idade do Bronze, A Idade da Pedra está povoado por uma vasta galeria de personagens hilariantes e é uma cornucópia de gags em jacto contínuo, onde o humor absurdo anda de braço dado com o slapstick clássico. A animação tem, aqui e ali, uma ajudinha do computador, mas no essencial, Park permanece fiel à tradição artesanal que faz a diferença e a fama da Aardman.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

À beira de fazer 90 anos e a perder a vista, Agnès Varda pegou em si, juntou-se ao fotógrafo e artista plástico JR, meio século mais novo que ela, e foram ambos, na carrinha deste, que também funciona como estúdio fotográfico ambulante, atravessar a França, fotografando pessoas a eito e depois colando esses retratos, em tamanho gigante, nas paredes das suas vilas, casas, quintas ou locais de trabalho. Apesar da presença de JR e das suas fotos descomunais, Olhares Lugares é um documentário todo ele de Varda. Melancólico e bem-disposto, peripatético, poético e artesanal, partindo dela para os outros, sempre em busca de histórias curiosas, coincidências, acasos e pequenos insólitos, sempre atraída pelas pessoas comuns e pelas suas vidas e interesses, e encontrando ao longo do caminho, coisas, objectos e gente que consegue relacionar com a sua própria existência, com os seus hábitos e gostos ou com o cinema: o seu, o dos outros ou o da sua geração. Precisamente, Olhares Lugares tem um final relacionado com cinema e com velhas amizades, passado na Suíça, e do qual Jean-Luc Godard não sai nada bem, dando a quem nunca simpatizou com a figura ainda mais razões para reforçar essa antipatia. Para Varda, tudo, tudo; para Godard, nada, nada.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O aspecto nunca foi grande coisa. Aquele chapéu de feltro à banda, o ar engordurado. E do temperamento, das companhias... É melhor nem falar. Mas não se deve julgar pelas aparências, que estas iludem, e, no caso de Joseph Beuys, escondiam um artista, mais de 30 anos depois de morrer, ainda capaz de causar uma boa controvérsia. Andres Veiel passou muito para lá da capa enxovalhada e escavou a história do fundador do grupo Fluxus que explorou o happening, a performance e a instalação, com tempo ainda para desenvolver um trabalho de teórico e de pedagogo assinalável. Mestre
de uma arte que não descurava o debate social nem a intervenção; incapaz de impedir que essas tensões se reflectissem na sua obra, Beuys foi um visionário.
De certo modo continua a ser, pois mesmo através da inúmera documentação recolhida, o retrato traçado por Veiel abre mais caminhos à discussão
sobre o papel da arte no mundo contemporâneo do que apresenta qualquer conclusão – como se o artista permanecesse um mistério.

Por Rui Monteiro

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Loveless - Sem Amor
Loveless - Sem Amor

Farto de ouvir os pais, que
se vão divorciar, discutirem azedamente um com o outro, e de ser ignorado por eles, como se fosse invisível, Alyosha, de 
12 anos, desaparece de casa. Andrei Zvyagintsev, autor
de Elena e Leviatã e opositor
 de Vladimir Putin, filma esta história de desamor, egoísmo, desintegração social e aridez emocional e moral como um óbvio correlativo da situação colectiva da Rússia dos nossos dias, e com uma frigidez visual que não deixa dúvidas sobre o pessimismo que o cineasta nutre sobre o estado do seu país.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Gatos, gatos, gatos por toda a parte: nas ruas e nas varandas, nos muros e nas caixas de ar condicionado, nas esplanadas e nas lojas. Os gatos fazem parte da paisagem de Istambul, da sua identidade e da essência da cidade, como diz a turca Haroon Adalat no seu documentário Gatos, que se centra em sete das centenas de milhares de felinos que
ali vivem, ouvindo ainda
os seus donos, vizinhos ou quem cuida deles. O que falta a Gatos em enquadramento histórico-cultural, sobra em esplendor felino.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Frances McDormand ganhou 
o Globo de Ouro de Melhor Actriz Dramática com a sua interpretação arrasadora de uma mãe indignada com a ineficácia da justiça na sua cidadezinha do Missouri. O dramaturgo, argumentista e realizador ango-irlandês Martin McDonagh (Em Bruges) assina este filme de escrita densa, onde a tragédia pesada e o humor negro e sarcástico convivem. Também com Woody Harrelson e Sam Rockwell numa nódoa de agente da polícia.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Neste filme sobre o convívio crescentemente inquietante entre uma autora de best-sellers na mó de baixo (Emmanuelle Seigner) e uma sedutora e possessiva ghostwriter (Eva Green), Roman Polanski recupera, embora em registo menos intenso, as atmosferas psicóticas, assombradas e asfixiantes de filmes anteriores como Repulsa, What? ou O Inquilino. Adaptado do romance homónimo de Delphine de Vigan pelo próprio Polanski e por Olivier Assayas.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O chileno Sebastián Lelio (Glória) volta a lançar mão
 do melodrama no feminino nesta fita sobre Marina, uma mulher transgénero, que tem que enfrentar a família do falecido amante, um homem mais velho que deixou tudo por ela. Lelio não transforma
a fita num comício pelos direitos LGBT e a transgénero Daniela Vega, chama a si o filme e torna-o indissociável dela, em corpo, coração, personalidade e voz, investindo também na personagem as suas experiências pessoais e os dotes de cantora de ópera.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Roda Gigante
Roda Gigante

Pensem no reverso do espelho de Os Dias da Rádio e têm
Roda Gigante, o novo Woody Allen, passado em Coney 
Island nos anos 50. É um
 drama de adultério e ciúme, crescentemente azedo, que
se resolve tragicamente, com Kate Winslet brilhante no papel de uma prima emocional e espiritual de Blanche DuBois. Allen e o director de fotografia Vittorio Storaro deram à
 fita a rica personalidade 
visual dos melodramas em Technicolor da altura. Roda Gigante pode parecer forçado 
e superficialmente “teatral”, mas é elaborada e intensamente cinematográfico.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Um filme invernoso e soturno, trespassado de amargura e assombrado pelo remorso, com fogachos de comédia entre os momentos mais carregados, por onde passam fantasmas e traumas da guerra do Vietname mas também dos conflitos mais recentes em que os EUA se envolveram. Interpretando três antigos soldados, Steve Carell, Bryan Cranston e 
Larry Fishburne nunca são menos que magníficos nesta fita de Richard Linklater
 onde a conversa continua a ser central para a narrativa, como em quase toda a sua filmografia.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Em vez de fazer um documentário mais convencional sobre o narcotráfico no México, Everardo González filmou exclusivamente, em A Liberdade do Diabo, vítimas e perpetradores dessa violência. As primeiras falam do que elas ou familiares seus sofreram, os segundos (provindos dos dois lados da lei), do sofrimento que causaram. Todos eles usam o mesmo tipo de máscara, que só deixa ver os olhos, o nariz e a boca, e que, ao mesmo tempo que protege a identidade dos participantes, sugere que estamos perante pessoas vítimas de queimaduras ou disformidades graves, e uma atmosfera de filme de terror, complementando de forma incómoda e inquietante os discursos dos participantes. O realizador consegue assim apresentar-nos o amplo e sinistro quadro de uma cultura de morte omnipresente e de uma violência crónica, brutalíssima, sem a menor compaixão, que atinge até as crianças, criada pelo narcotráfico, o grande flagelo do México dos nossos dias. E que tudo indica não ter solução à vista.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O actor John Carroll Lynch estreou-se a realizar dirigindo Harry Dean Stanton naquele que seria o filme de despedida deste,que interpreta uma versão ficcionada de si mesmo, o Lucky do título, habitante de uma vilória do Arizona. Uma serena, límpida e eloquente celebração de um dos maiores, mais duradouros e mais queridos actores característicos americanos, aqui rodeado por colegas como Ed Begley, Jr, Beth Grant ou Tom Skerritt, e emperceirando com o seu velho amigo David Lynch, este no papel do dono de um cágado em fuga.

Por Eduardo de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
O Quadrado
O Quadrado

Uma sátira negra, desassombrada e levemente absurda do sueco Ruben Östlund (Força Maior) às utopias artístico-humanitárias, aos embustes da arte contemporânea e ao politicamente correcto, através da história de Christian (Claes Bang), o curador de um museu de Estocolmo precipitado numa espiral de situações embaraçosas e dramáticas, que expõem a distância entre o seu discurso público idealista e o seu comportamento pessoal. Palma de Ouro no Festival de Cannes deste ano.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Animação
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Coco
Coco

Em boa hora a Pixar foi ao México inspirar-se nos costumes e nas tradições populares deste país, nomeadamente na celebração do Dia dos Mortos. Graças a elas, Lee Unkrich e Adrian Molina realizaram
 esta feérica e divertidíssima animação musical e fantástica passada
 no mundo dos mortos mexicano, que promove os valores da família e consegue ser mais imaginativa, mais original e ter mais vida do que a maior parte dos filmes sobre gente viva e com actores de carne e osso.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Max (Jean-Pierre Bacri), um empresário de festas, tenta que tudo corra bem num importante casamento num castelo do século XVII, mas 
do noivo cretino aos seus bem-intencionados mas incompetentes empregados, todos os que o rodeiam parecem querer o contrário. Olivier Nakache e Eric Toledano, autores de Amigos Improváveis, voltam a mostrar em O Espírito da Festa que a comédia popular de qualidade não é um género em extinção no comédia francês.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

João Monteiro, um dos directores do MOTELX, faz justiça neste documentário ao realizador António de Macedo, falecido há um
mês. Por ter optado por
fazer cinema de género, e sobretudo filmes fantásticos, uma quase heresia em Portugal, Macedo foi ostracizado pelo meio cinematográfico e pelos poderes que distribuem os apoios financeiros, acabando por ter que deixar de filmar nos anos 90, após assinar Chá Forte com Limão (1993).

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O inglês Hugh Welchman e a polaca Dorota Kobiela demoraram sete anos – dois de produção e mais cinco de rodagem – para realizarem esta longa-metragem de animação onde abraçam a tese, lançada numa biografia publicada em 2011, segundo a qual Vincent van Gogh não se suicidou mas poderá ter sido assassinado, e expondo-a através dos quadros e do estilo do próprio artista. A Paixão de Van Gogh é o primeiro filme da história do cinema todo pintado à mão,
 a óleo e em tela, e minuciosamente: foram 125 os artistas que trabalharam nos seus 65 mil fotogramas.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Ficção científica
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Blade Runner 2049
Blade Runner 2049

Denis Villeneuve realiza Blade Runner 2049 com aquela calma controlada que se lhe conhece dos seus trabalhos anteriores, como Sicário ou Primeiro Contacto, assinando um filme intrinsecamente ligado ao original de Ridley Scott do ponto de vista visionário, visual, narrativo, dramático
e especulativo, mas também percorrendo novos caminhos num universo familiar: um futuro ainda mais negro, devastado e cheio de gente, e cada vez mais desenvolvido tecnologicamente. Desde O Padrinho: Parte II, de Francis Ford Coppola (1972) que uma continuação não desmerecia do original.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 4/5 estrelas
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Good Time
Good Time

O encontro entre os irmãos nova-iorquinos Josh e Ben Safdie proporciona a Robert Pattinson o primeiro papel com sustância a sério e consistência dramática palpável, desde que deixou o juvenil e meloso mundo dos vampiros e lobisomens da saga Twilight. Passado numa única noite, numa Nova Iorque periférica, este thriller urbano áspero, berrante e fatalista é também o melhor filme dos irmãos Safdie. Além de co-realizar, Ben interpreta também o irmão da personagem de Pattinson.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Um escritor alemão vai a Nova Iorque promover o seu novo livro, reencontra a mulher com que teve um caso intenso 17 anos antes, e tenta recuperá-la. Eis o melhor filme de Volker Schlöndorff em muitos anos (sobre um livro autobiográfico de Max Frisch), escrito a meias com o irlandês Colm Tóibín. É um melodrama sem a menor ilusão romântica, uma elogia outonal pela quimera de um amor irrecuperável, uma história de fantasmas da paixão. Stellan Skarsgard e Nina Hoss são estupendos nos protagonistas.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
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Stop Making Sense
Stop Making Sense

Começa tudo com uma sombra. A sombra da cabeça de uma guitarra. Só depois se vêem os pés, caminhando, até pararem e uma mão pousar um leitor de cassetes portátil no chão. A câmara sobe, então, e mostra David Byrne dedilhando os primeiros acordes de “Psycho Killer”. Ele, o leitor de cassetes e uma canção num palco despido. O ano é 1984. O local: Los Angeles. A canção acaba e, primeiro, surge Tina Weymouth, acrescentando a espessura do som do seu baixo a “Heaven”. Mais tarde, enquanto na 
sombra do palco se vislumbra o movimento dos que carregam amplificadores e monitores, cabos, o praticável onde está montada a bateria, é a vez de Chris Frantz aparecer para acompanhar “Thank You for Sending Me”, e depois será a vez de Jerry Harrison. Os Talking Heads estão em palco. Os jogos podem começar. E que jogos, estes filmados por Jonathan Demme, em regime de quase neutralidade, fazendo o seu filme viver do espectáculo, das canções e das acções e das intenções da banda mais ousada dos anos 80.

Por Rui Monteiro

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  • 4/5 estrelas
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Christophe Honoré pegou em dois clássicos da Condessa de Ségur, Os Desastres de Sofia e As Meninas Exemplares, e realizou este belíssimo filme infantil, que nem cheira a mofo, nem se põe a fazer releituras, e onde o autor de As Canções de Amor dá um ar da sua graça (animais animados, momentos musicais pop a cargo de Alex Beaupain) sem cair no anacronismo ou no sentimentalismo. Caroline Grant, de cinco anos, interpreta Sofia com naturalidade, espontaneidade e energia. Ideal para toda a família.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Quando se estreou Os Chapéus de Chuva de Cherburgo, em 1964, o cinema musical estava, a bem dizer, morto. Mas o filme de Jacques Demy, agora em versão digital restaurada, não era um musical de Hollywood, e, embora uma fantasia amorosa cantada e bailada em cores saturadas, a sua origem radicava num cinema mais realista e, de certo modo, mais maduro na sua abordagem social. O trunfo do filme, descontando a extraordinária visão artística de Demy, que de uma história de cordel criou um encantamento verosímil, é a banda sonora de Michel Legrand. É através dela que os amores adolescentes de um mecânico (Nino Castelnuovo) e da sua namorada (Catherine Deneuve) explodem em exaltantes canções de amor, apesar de apoquentados pela família, seguindo o seu caminho até serem tomados pela frustração, a resignação e os compromissos da vida adulta.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Clash
Clash

Neste filme passado no Cairo, em 2013, durante os tremendos confrontos que se seguiram à deposição do presidente Mohammed Morsi, ligado 
à Irmandade Muçulmana, pelos militares, o realizador Mohamed Diab consegue expôr a situação política, religiosa 
e social do Egipto a partir do interior de um carro celular onde foram presos manifestantes pró e anti-Morsi.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Bertrand Tavernier leva-nos numa soberba viagem à bolina por meio século de cinema francês,
ao sabor das suas preferências e escolhas (muito Becker e quase nenhum Bresson, por exemplo), carregada de histórias e anedotas. Muitas delas testemunhadas pelo próprio Tavernier, que foi cinéfilo, crítico, assistente de realização e agente de imprensa de um grande produtor, antes de se ter tornado cineasta. Um dos documentários do ano.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
2 Mulheres, um Encontro
2 Mulheres, um Encontro

Um frente-a-frente Catherine Deneuve-Catherine Provost nesta comédia dramática no feminino. Deneuve faz uma aventureira e sedutora irresponsável que não tem cheta nem onde cair morta, e antiga amante do pai da personagem de Frot, uma parteira profissionalíssima e altruísta, mas com uma vida social e afectiva árida, e que, por compaixão, dá guarida àquela. Martim Provost escreve, filma e dirige na melhor tradição do cinema francês de qualidade.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

A nova realização de Michel Gondry remete para os filmes de adolescentes dos anos 60 e 70 e para a BD clássica. Dois amigos e colegas de liceu, ambos outsiders, improvisam uma casa motorizada e sair à aventura no Verão, sem os pais saberem. Os miúdos (Ange Dargent e Théophile Baquet) são formidáveis de naturalidade e descontracção e Gondry realiza com uma enorme empatia por eles e uma graça e uma alegria irresistivelmente contagiosas.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O filme de Raoul Peck (O Jovem Karl Marx) foi nomeado para o Óscar de melhor documentário. Para além do fundamental aspecto político, e da sua importância na conservação e avivamento e divulgação da memória, Peck acrescenta uma eloquente e dolorosa relação com a actualidade, digamos, um ponto de situação nada animador.

Por Rui Monteiro

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  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Brazil: O Outro Lado do Sonho
Brazil: O Outro Lado do Sonho

Antes de alguém pensar que o “Brazil” do título tem alguma coisa a ver com o Brasil, avisa-se já que o baptismo do filme de Terry Gilliam, agora disponível em versão restaurada digitalmente, vem de uma canção muito popular nos anos de 30. E, já agora, a alegria da música serve como contraponto simbólico ao cinzento universo retro-pós-industrialista e à sensação permanente de opressão imposta pela cenografia. Na época, aliás, o realizador foi acusado de usar o trabalho de Roger Pratt para cobrir as insuficiências do argumento. A verdade, porém, é que o entrecho criado pelo dramaturgo Tom Stoppard, com a colaboração de Charles McKeown, embora simples, é um modelo de exemplaridade narrativa, carregado de humor negro, descrevendo os meandros de uma sociedade totalitária pronta para tudo para se defender e assim permanecer o oásis de uns poucos com a verosimilhança necessária. E mais verdade ainda é que Gilliam, habitualmente um pouco desleixado nos acabamentos, se esmerou nesta película, fazendo das várias partes um todo coerente e eficaz. Daí esta obra ter sobrevivido à crítica da sua época e, ao longo do tempo, ter crescido entre os cinéfilos até ser comercialmente vantajoso o seu restauro e regresso às salas.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Se Nick Willing não fosse filho de Paula Rego, este documentário nunca teria sido feito. E se ele não tivesse convencido a mãe a falar sobre a sua vida e a sua arte, talvez não tivesse sabido ou entendido melhor coisas sobre ela, o pai, a família, as pinturas dela e a sua própria juventude. É que em Paula Rego, Histórias & Segredos, não é só o espectador que é surpreendido pela franqueza da artista, pelo que ela revela sobre a sua intimidade e conta sobre a a dimensão pessoal, biográfica e catártica dos seus quadros: é também o seu filho e realizador do filme. Willing mostra como arte e vida são indissociáveis para a mãe. Os quadros de Paula Rego, pintora narrativa por excelência, começam por contar histórias, depois transfiguradas pelas histórias pessoais e os “segredos” da artista. Estes podem ser tão dolorosos, que as obras ficam inéditas, como sucedeu com a série sobre a depressão da pintora, só recentemente exposta em Londres. Paula Rego fala ainda sobre o seu casamento com o também artista Victor Willing, os casos extraconjugais de ambos, os abortos, os altos e baixos da sua existência familiar e criativa e o papel da pintura na sua vida, permitindo-nos ainda vê-la trabalhar no atelier. Este filme é também um gesto de amor de um filho para uma mãe que acontece ser uma das maiores e mais singulares artistas do nosso tempo.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Vale do Amor
Vale do Amor

Juntos pela primeira vez desde Loulou, de Maurice Pialat (1990), Gérard Depardieu e Isabelle Huppert interpretam um casal divorciado que uma misteriosa carta deixada pelo filho, que se suicidou seis meses antes, junta no Vale da Morte, nos EUA. Guillaume Nicloux prossegue aqui as experiências de metacinema e de jogo entre realidade e ficção, actores e personagens, de O Rapto de Michel Houellebeq. Um filme deliberadamente ambíguo, inquietante, comovente e espectral.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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A Criada
A Criada

Serpenteante, maquiavélico e perversamente erótico, o novo filme do realizador de Oldboy transpõe para a Coreia ocupada pelo Japão dos anos 30 do século XX o livro Fingersmith, da britânica Sarah Walters, passado na Inglaterra do século XIX, uma história de recorte policial e sensualidade lânguida, envolvendo falsas criadas, falsos nobres, uma herdeira milionária e uma série de reviravoltas, onde os enganadores também podem acabar por ser enganados. A fita multiplica-se em ingredientes, situações e personagens-tipo da literatura popular vitoriana de que o livro de Walters é um consumado pastiche, acrescentando-lhes um erotismo requintadamente asiático. Os actores – em especial Kim Tae-ri na criada e Cho Jin-woong na sua aparentemente ingénua ama – são óptimos, e Park Chan-wook respeita com meticulosidade todas as exigências do género, divertindo-se imenso a fazê-lo.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
O Amigo Americano
O Amigo Americano

Jonathan (Bruno Ganz), um emoldurador, é diagnosticado com leucemia e contempla a possibilidade de deixar a família na miséria. É o correio que Ripley (Dennis Hopper) precisava para deslocar as falsificações que negoceia através da Europa, e que, neste filme, agora restaurado, Wenders transforma em metáfora sobre as relações entre Hollywood e a cultura alemã do pós-guerra. Há mais, claro, nesta libérrima versão do romance de Patricia Highsmith, pois o realizador, em pormenores e subtilezas do enredo, em certos planos e sequências, em certas falas e movimentos subjectivos, desafia a uma nova visão do policial. Uma visão que parece privilegiar equilibradamente entrecho e atmosfera. Para, depois, como quem não quer a coisa, favorecer a segunda e mergulhar numa abordagem narrativa que tem tanto de cinefilia como de herança do expressionismo alemão, afinal, uma recusa do realismo que atira as personagens para longe, bem longe dos limites do comportamento humanista, envolvidos por uma espécie de neblina existencial onde a ética não penetra.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
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O Fundador
O Fundador

A história de Ray Kroc, o vendedor ambulante de máquinas de fazer batidos que nos anos 50 passou a perna aos verdadeiros criadores da McDonald’s, os irmãos Rick e Mac McDonald, e ergueu o maior império de fast food do mundo, com tantos clientes como anticorpos. John Lee Hancock ilustra aqui duas concepções de negócio, de ética e de dinâmica capitalista antitéticas, e o hiperactivo Michael Keaton, no papel de Kroc, leva o filme a reboque.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

No Portugal intervencionado pela troika, Jorge (Nuno Lopes), um pugilista endividado vai trabalhar para uma firma de cobranças e ganhar dinheiro para tentar manter em Portugal o filho e a mulher, uma imigrante brasileira que ameaça voltar ao seu país com a criança. Marco Martins faz da crise o motor da história, sem se pôr a fazer comício, e evoca os climas visuais e anímicos do policial de boxe americano e do melhor cinema social europeu clássico. Nuno Lopes dá-se de corpo e alma a Jorge, uma bisarma de bom coração que acredita até ao fim que pode pôr a adversidade KO.

Por Eurico de Barros

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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

Bem se pode dizer que Philip Winter (Rüdiger Vogler), um escritor com um sério bloqueio criativo, acabado de percorrer a América com o pretexto de pesquisar material para novo livro, foi enganado pela mãe de Alice (Yella Rottländer). Aquilo do vou ali já venho, faz favor toma-me conta da menina, foi conversa pré- -desaparecimento. Conversa que leva um homem feito e uma criança de oito anos a regressar à Europa e, nela, a percorrer cidade atrás de cidade em busca da avó da petiza, que com a mãe já ninguém conta, no processo criando uma amizade quase pueril e particularmente estimulante para aquele homem cansado. Filme de estrada, Alice nas Cidades, agora disponível em versão restaurada, inicia um dos períodos mais criativos da carreira do realizador como observador e relator da nova realidade política, social e cultural da Alemanha e da Europa.

Por Rui Monteiro

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  • Terror
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

O primeiro filme nos EUA do norueguês André Ovredal (O Caçador de Trolls) é uma inteligente e arrepiante peça de câmara, toda passada numa morgue, ao longo de uma noite, só com três personagens, uma das quais está morta (a Jane Doe do título). Uma masterclass de construção de terror cinematográfico mesmo até à última imagem.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado

No seu segundo filme com Kristen Stewart após As Nuvens de Sils Maria (2014), Olivier Assayas usa elementos do thriller e do cinema de terror para construir uma fantasmagoria realista, situada firme e audaciosamente entre o filme de género e o filme cinéfilo, e mantendo um registo ambíguo até ao fim. Stewart é magnífica no papel principal, o de uma personal shopper de uma top model, assombrada pela possibilidade da existência de uma vida para lá desta.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
O filme-fenómeno de Maren Ade é uma convencional comédia dramática sobre a recuperação dos afectos entre um pai e uma filha separados geográfica e emocionalmente, mas com um embrulho formal, uma apresentação narrativa e um registo de cinema de “autor”. Com os excelentes Peter Simonischek no pai professor de música reformado e fã de pregar partidas, e Sandra Hüller na filha super-executiva.

Por Eurico de Barros
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  • 4/5 estrelas
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Paris, Texas
Paris, Texas
Um homem caminha no deserto. Só, arrastando-se como um penitente, à beira da exaustão. Um ponto em movimento na imensidão árida da natureza. É uma imagem tão atraente quão misteriosa. Nada se sabe; porém, de pronto se entende que as cores carregadas de luz escondem, ofuscam uma tragédia neste filme em que Wim Wenders, com argumento de Sam Shepard, regista a perda, o desespero, a redenção e o sacrifício. A história de Travis (Harry Dean Stanton) é, de certo modo, simples, até comum, e a narrativa do seu desaustino bastante linear, como se o realizador pretendesse realçar na vulgaridade da acção o tumulto interior, a raiva deste ser perdido que transpira do texto e vai estender-se por diálogos e monólogos de uma lucidez crua. Um homem perde-se por uma mulher que o abandona, vagueia sem saber por onde, reencontra o filho e parte, outra vez, agora com uma missão: reunir a criança e a mãe antes de a sua jornada terminar. O reencontro com Jane (Nastassja Kinski) é um grande momento de cinema, um dos mais cativantes na obra do cineasta alemão, na sua representação da inquietude e do desejo e do ciúme, mas principalmente da frustração que vem junto com a verdade, com a desilusão de um casal que não foi feito para o ser, levado pelas circunstâncias como quem se deixa arrastar pela corrente de um rio até um fim que não desejou, contudo é inevitável.

Por Rui Monteiro
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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
As sombras de Wang Bing e Werner Herzog pairam sobre este soturno documentário que Salomé Lamas foi rodar à remota localidade de La Rinconada, nos Andes peruanos. Um “El Dorado” dura, miserável e cruelmente real, onde se procura ouro e outros minerais menos preciosos em condições climatéricas, de vida e trabalho no limite do suportável.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Edgar Pêra filma o Carnaval de Torres Vedras em 3D e mete-lhe lá dentro um punhado de actores a fingir que são repórteres de vários canais de televisão fictícios. Pêra documenta o delírio do “Carnaval mais português de Portugal” e goza com a cobertura entre o redundante, o enche-chouriços e o imbecil que as televisões fazem destes acontecimentos. Foi o último filme de Nuno Melo.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Vencedor de um Globo de Ouro (Melhor Filme Dramático) e candidato a oito Óscares, este filme indie de Barry Jenkins sobre três fases da vida desgraçada de um jovem negro de Miami, interpretado por três actores diferentes, não pode nem deve ser reduzido a um nicho étnico ou de causa gay. Seria minimizar o seu amplo alcance humano, o seu sólido músculo dramático e o seu profundo significado emocional.

Por Eurico de Barros
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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
The New York Review of Books (NYRB) surgiu em 1963 durante uma greve à impressão de diários como The New York Times, e nestes 54 anos usou a crítica literária como um fim em si e como rastilho para reflexões sobre política e cultura, sem esquecer a poesia e a reportagem. O lastro de pensamento mais ou menos polémico e o notável rol de colaboradores legitimam em absoluto a existência de Uma Discussão com 50 Anos. Na direcção da NYRB, em 1963 como hoje, está Robert B. Silvers, função que partilhou com Barbara Epstein até à sua morte, em 2006. Silvers é a âncora visual e argumentativa de um filme que avança pela história do jornal ao sabor da associação de ideias, entre imagens da redacção na actualidade, um mundo silencioso forrado a papel (o filme foi rodado em 2013 e lançado originalmente no ano seguinte, a pretexto do cinquentenário da publicação), testemunhos de colaboradores e imagens de arquivo. Dentre os 50 anos de discussões sobressaem Susan Sontag e o fascismo, Yasmine El Rashidi e a Praça Tahrir, Michael Greenberg e a ocupação de Zuccotti Park, Timothy Garton Ash e a queda do comunismo em Praga. Sem esquecer a pega mais vistosa, a pretexto do feminismo, entre Gore Vidal, que transbordou para o palco do Dick Cavett Show em 1971. Um documentário luminoso feito por evidentes entusiastas, um director octogenário que, diz, não dá ordens a quem escreve. Tudo o que faz é “pedir e esperar”.

Por Jorge Lopes
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  • 4/5 estrelas
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Ama-San
Ama-San
A realizadora portuguesa Cláudia Varejão foi ao Japão filmar as “Ama-San” (“mulheres do mar”), que há mais de dois mil anos mergulham no mar em busca de pérolas e fauna marinha comestível, e continuam a não usar equipamento moderno para respirar debaixo de água. Um magnífico e completo documento sobre um grupo de mulheres que perpetua uma tradição ancestral.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Silêncio
Silêncio
Martin Scorsese levou mais de 25 anos a concretizar este projecto, a adaptação do livro do escritor católico japonês Shusaku Endo, passado no Japão do século XVII, quando os missionários jesuítas portugueses e os cristãos locais eram perseguidos e supliciados. E nunca se viu um filme sobre o martírio, a tortura física e da alma e a agonia da dúvida tão bonito como este.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Manchester by the Sea
Manchester by the Sea
O cinema americano está tão inflacionado de super-heróis, que só podemos acolher de braços abertos este filme de Kenneth Lonergan com o seu naturalismo bisonho, a história de infelicidade vivida e dirimida em família, as suas personagens reconhecível e falivelmente humanas e a sua negação dos clichés positivos de Hollywood. Grandes interpretações de Casey Affleck e do jovem Lucas Hedges.

Por Eurico de Barros
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  • Ficção científica
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Rogue One: Uma História de Star Wars
Rogue One: Uma História de Star Wars
Primeiro filme de uma nova série autónoma, Rogue One é uma espécie de Missão: Impossível no universo de ficção científica criado por George Lucas (trata-se de roubar os planos da Estrela da Morte – a acção decorre antes da do Guerra das Estrelas original). (Quase) sem a presença da Força, Rogue One põe mais ênfase no “Guerra” do que no “Estrelas” e é uma lufada de ar e uma transfusão de sangue fresco numa saga que bem precisava disso. Felicity Jones e Diego Luna encabeçam o elenco e Darth Vader pica o ponto.

Por Eurico de Barros
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  • Suspense
  • 4/5 estrelas
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Custe o que Custar
Custe o que Custar
Taylor Sheridan (Sicario- Infiltrado) escreveu – e muito bem – este western contemporâneo desencantado e irónico, passado num Texas devastado pela crise, e realizado com limpeza e músculo pelo escocês David Mackenzie, como se fosse uma fita dos anos 70. Jeff Bridges, Chris Pine e Ben Foster, impecáveis, fazem as despesas da interpretação.

Por Eurico de Barros
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  • Documentários
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Hitchcock/Truffaut
Hitchcock/Truffaut
Uma lição estupenda, um pequeno mas instrutivo ensaio sobre Hitchcock, uma porta de entrada que nos tenta a explorarmos a fundo um dos catálogos mais peculiares, e ainda hoje surpreendentemente universal, da arte do século XX. Isto é, para saber mais sobre o homem que sabia demais sobre nós, não haverá disponível síntese melhor do que Hitchcock/Truffaut.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
O filme de Ken Loach é a história de um carpinteiro viúvo (Dave Johns) que vive por princípios morais de senso comum até que um ataque de coração o atira para a via sacra da burocracia do estado social inglês. Visualmente, Eu, Daniel Blake é discreto e elegante, e Johns dá uma energia espontânea a Blake que é um dos encantos do trabalho de Loach com os actores.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Animação
  • 4/5 estrelas
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Vaiana
Vaiana
A nova longa-metragem animada digital e em 3D da Disney (mas com toques de animação tradicional) é uma deslumbrante e mexida aventura passada nos Mares do Sul há dois mil anos. Vaiana, a filha do chefe de uma tribo polinésia, alia-se ao semi-deus Maui  para salvar o seu povo de uma força maléfica. A lendária dupla John Musker/Ron Clements (A Pequena Sereia) realiza.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Ela
Ela
Isabelle Huppert é simplesmente imperial nesta comédia macabra cruzada de thriller e de farsa familiar, onde Paul Verhoeven reduz a pó o estereótipo da mulher vítima indefesa e passiva, e sem iniciativa sexual nem pulsões desviantes.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • Drama
  • 4/5 estrelas
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Dheepan
Dheepan

Eis um filme sobre refugiados que não regista nos radares dos media, das redes sociais e dos indignados profissionais: os da guerra civil no Sri Lanka entre guerrilheiros nacionalistas e separatistas tamil e o governo. Realizado por Jacques Audiard, Dheepan ganhou a Palma de Ouro em Cannes no ano passado. O principal intérprete, Jesuthasan Anthonythasan, combateu com os Tigres Tamil antes de se refugiar em França, tal como a personagem que interpreta, o Dheepan do título. Usando a identidade de um morto, ele foge da guerra e para isso finge ter uma família, já que nem sequer conhece a mulher que o acompanha, Yalini, a sua falsa esposa, e a “filha” do casal, Illayall, é uma órfã arrebanhada num campo de refugiados.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 4/5 estrelas
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O Exame
O Exame
Mais um grande filme que sai da Roménia. Cristian Mungiu tira uma radiografia moral aos seus compatriotas com esta história passada numa sociedade que funciona à custa da cunha, do pedido, do empenho, do amigo ou do parente que dão um jeitinho.

Por Eurico de Barros
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  • Ficção científica
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
O Primeiro Encontro
O Primeiro Encontro
Denis Villeneuve adaptou um premiado conto longo do escritor de ficção científica Ted Chiang, Story of Your Life, e o resultado é este filme sobre um “primeiro encontro” entre humanos e extraterrestres, onde a procura da comunicação é mais importante do que a acção. Com Amy Adams.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Pouco depois do fim da II Guerra Mundial, na Polónia, uma médica francesa ateia e comunista é chamada a um convento onde várias freiras que foram violadas por soldados soviéticos ficaram grávidas. Anne Fontaine filma o encontro de dois mundos opostos sem melodramas nem maniqueísmos.

Por Eurico de Barros
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  • 4/5 estrelas
  • Recomendado
Um pai de família romeno e um vizinho procuram um tesouro enterrado no jardim do bisavô deste. Corneliu Porumboiu assina um filme de um humor impassível, sobre a ganância humana e o estado da sociedade na Roménia.

Por Eurico de Barros
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  • Comédia
  • 4/5 estrelas
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Café Society
Café Society
Bobby (Jesse Eisenberg) está farto de Nova Iorque e vai para Los Angeles, onde conhece Vonnie (Kristen Stewart), a secretária de um agente (Steve Carell) que é também tio de Bobby. Um filme aparentemente igual a tantos outros de Woody Allen mas em que ele acerta na mistura exacta de história, imagem, duração, escala, tom, música, actores, diálogos e período histórico.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
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Fogo no Mar
Fogo no Mar
O documentarista italiano Gianfranco Rosi visita a ilha de Lampedusa para filmar os refugiados e migrantes económicos que lá aportam, o trabalho de quem os recolhe e trata e o quotidiano de um menino local.

Por Eurico de Barros
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  • 4/5 estrelas
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O Cinema, Manoel de Oliveira e Eu
O Cinema, Manoel de Oliveira e Eu
O filme tem imenso material de Oliveira, incluindo uma história inédita. Esse material vale cinco estrelas. Descontamos uma porque, neste documentário como no seu título, está um “Eu” a mais. O de João Botelho, realizador. Neste filme, o que é bom não é de Botelho, e o que é de Botelho não é bom.

Por Nuno Henrique Luz
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  • 4/5 estrelas
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Boi Neon
Boi Neon
Iremar (Juliano Cazarré), um vaqueiro que trabalha num rodeo e vive num camião, quer ser desenhador de vestidos extravagantes. Gabriel Mascaro, o realizador, ilustra a ideia de que nós somos um corpo, e é com ele que sonhamos.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Comédia

O novo filme de Paul Thomas Anderson está tão solida e convictamente instalado nos anos 70, que parece que veio de lá numa máquina do tempo. Passado quase todo na zona do Vale de San Fernando, em Los Angeles, Licorice Pizza é uma sucessão de episódios na vida de Gary Valentine (Cooper Hoffman, filho de Philip Seymour Hoffman), um finalista do secundário, jovem actor e fura-vidas, e de Alana Kane (Alana Haim), uns anos mais velha do que ele e pela qual está apaixonado. Enquanto Gary tenta convencer Alana a ser mais do que uma grande amiga e a tornar-se na sua namorada, e ela lhe resiste, vivem ambos uma série de peripécias descosidas, insólitas e hilariantes, desde vender colchões de água pelo telefone até terem um encontro surreal com o exaltado e engatatão ex-cabeleireiro, produtor e namorado de Barbra Streisand, Jon Peters (Bradley Cooper), em plena crise do petróleo e da falta de combustível. Filmado por Anderson em alegre ritmo de mata-cavalos e interpretado com piada e despretensão por Hoffman e Haim (do grupo com o mesmo nome, as duas irmãs dela na vida real fazem o mesmo papel aqui, tal como o pai e a mãe), Licorice Pizza é uma história de amor assolapado e relutante (ficarão Gary e Alana juntos?), e de agitação juvenil benigna (em que mais andanças disparatadas eles se irão meter?), tão aleatória e desconcertante como afável e folgazona.

Críticas de cinema - 3 Estrelas

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  • 3/5 estrelas
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O novo documentário de Jia Zhang-Ke forma um trio com Dong (2006), dedicado ao pintor Liu Xiaodong, e Useless (2008), sobre a estilista Ma Ka, e foi filmado em 2019, durante um festival literário em Shanxi, a cidade natal do realizador. Dividido em 18 capítulos, como se fosse um livro, o filme dá voz a um punhado de importantes escritores chineses nascidos nas décadas de 50, 60 e 70, que falam sobre as suas vidas e como chegaram à escrita (um deles ia ser dentista mas percebeu que não suportava “passar os dias a olhar para dentro da boca das pessoas”). Através das suas histórias, e de pequenos interlúdios, Zhang-Ke mostra como a China e os chineses mudaram nas últimas décadas, das privações do pós-guerra e dos horrores da Revolução Cultural, até à recente explosão económica. Só falta a ... até tocar o azul do mar mais informação sobre os romancistas e poetas que o realizador escolheu para ouvir, famosos na China e conhecidos por quem estiver por dentro da literatura chinesa contemporânea, mas estranhos à maioria dos espectadores e dos apreciadores do autor de Plataforma e O Mundo.

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
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O Homem que Matou Dom Quixote
O Homem que Matou Dom Quixote

Quando, em 1989, Terry Gilliam leu Dom Quixote de La Mancha, de Cervantes, e começou logo a trabalhar num filme baseado no livro, não fazia a menor ideia de que o projecto, O Homem que Matou Dom Quixote, ia demorar quase 30 anos a ser concretizado, que a produção ia sofrer todo o tipo de desastres e problemas possíveis, desde uma inundação em Espanha, no ano 2000, que destruiu parte do set, até vicissitudes financeiras e legais (Gilliam, aliás, continua em litígio com Paulo Branco, um dos últimos produtores associados ao filme, em parte rodado em Portugal), e a morte de dois dos actores principais: Jean Rochefort, a primeira escolha do realizador para Dom Quixote, na versão em que Johnny Depp o iria coadjuvar, e de John Hurt, que em 2014 substituiu Robert Duvall como Quixote.

Além daqueles, entre os muitos actores associados ao filme ao longo dos anos, estiveram ainda John Cleese, Michael Palin (ambos companheiros de Gilliam nos Monty Python), Nigel Hawthorne, Danny DeVito, Miranda Richardson, Gérard Depardieu e Ewan McGregor. No mundo do cinema, O Homem que Matou Dom Quixote tornou-se um sinónimo de filme perdido naquilo a que em Hollywood se chama de “development hell”, e sobre ele foram rodados dois documentários, ambos da dupla Keith Fulton e Louis Pepe: Lost in La Mancha (2002) e He Dreams of Giants (2019).

“Eu estava possuído pelo espírito de Dom Quixote. Cada vez que ele tenta fazer alguma coisa difícil, falha e cai. Mas levanta-se sempre. O problema era esse. Quando não conseguia retomar o filme, ia fazer outra coisa, voltava, e lá estava o Quixote a dizer-me: ‘Olá! Então, como é?’”, contou Terry Gilliam à Time Out em Lisboa, onde esteve há dias a promover o filme. “Consegui finalmente rodá-lo porque tinha o Adam Driver. Não foi por causa do Jonathan Pryce ou de mim. Foi porque o Adam era o actor na berra. Temos que ser muito pragmáticos. Os realizadores são tratados como se sabe e os meus últimos filmes não fizeram dinheiro, por isso, pelo meu lado, não ia entrar nada. Tinha o Jonathan, que tinha sido nomeado para um Óscar, o que melhorava um bocadinho as hipóteses de arranjar financiamento. E depois apareceu o Adam. Por o ter é que o filme foi feito.”

É inequívoca a dimensão quixotesca que rodeia O Homem que Matou Dom Quixote, onde Adam Driver interpreta Toby Grummett, um outrora promissor cineasta que escolheu o muito mais lucrativo e confortável mundo da publicidade. Toby está de volta à vila espanhola onde dez anos antes fez o seu primeiro filme como estudante de cinema, sobre Dom Quixote, agora para rodar um anúncio. Num intervalo das filmagens, descobre que o velho sapateiro (Jonathan Pryce) que interpretou Dom Quixote no seu filme de estudante ficou possuído pela personagem e julga mesmo ser o Cavaleiro da Triste Figura criado por Cervantes. Vendo em Toby o seu Sancho Pança, ele arrasta-o para uma aventura demencial que vai envolver ainda o inescrupuloso dono da agência de publicidade (Stellan Skarsgard) para a qual aquele trabalha, a sua mulher ninfomaníaca (Olga Kurylenko), e a rapariga da vila que interpretou Dulcineia dez anos antes (Joana Ribeiro) e é agora a amante de um rico mafioso russo, que vai dar uma grande festa de temática medieval num castelo que alugou.

O Homem que Matou Dom Quixote, que Gilliam escreveu com o seu colaborador Tony Grisoni, não tem o rasgo imaginativo nem a opulência fantasista de outros títulos do realizador, como Os Ladrões do Tempo, Brazil: O Outro Lado do Sonho ou A Fantástica Aventura do Barão, e é, aliás, um dos seus filmes mais realistas, bem como menos exuberantes em termos estilísticos. Mas permite a Gilliam explorar, através das personagens opostas de Quixote e de Toby, temas que lhe são queridos desde sempre, como o conflito entre o sonho e a realidade, o pragmatismo e a imaginação; e pôr em cena personagens que desafiam os limites da realidade, seja por vontade própria, seja pela auto-ilusão ou pela loucura, arrastando outros com eles. Como diz o realizador: “É por isso que eu adoro o Quixote e o Sancho, eles representam os dois lados do ser humano. Precisamos de ser imaginativos mas também práticos. E eu sou ambas as coisas porque faço filmes, e os filmes são coisas complicadas e caras de fazer. Tenho um lado prático e um lado artesanal. E depois tenho o lado maluco e estes sonhos que quero concretizar.”

Como se poderia esperar de Terry Gilliam, e apesar do seu título, O Homem que Matou Dom Quixote não é uma desconstrução nem um questionamento crítico da personagem de Cervantes, como agora está na moda fazer aos clássicos da literatura ou às suas figuras mais célebres. Tudo pelo contrário, já que no final, Toby, depois de ter sido punido por ter vendido o seu talento à publicidade (que Gilliam detesta fazer, aproveitando aqui também para fustigar este meio), dá continuidade a Dom Quixote e ao seu mito, agora acompanhado por um Sancho Pança no mínimo original, proporcionando ao realizador rematar a fita num registo fantástico tipicamente gilliamesco. “O Quixote nunca morre. Porque ele é um espírito, uma ideia, que continua sempre, que é sempre renovada. Vai sempre haver um novo Quixote por aí, algures”, explica Terry Gilliam. Para fechar a conversa, o realizador acrescenta ainda: “Ao contrário do Orson Welles, que nunca conseguiu concluir o seu Dom Quixote, eu acabei o meu. Ao menos, consegui fazer algo em que ele falhou.”

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  • 3/5 estrelas
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Tal como nos filmes anteriores, documentários e ficções, os libaneses Joana Hadjithomas e Khalil Joreige evocam, em Caixa de Memórias, a guerra civil dos anos 80 no seu Líbano natal e os efeitos que esta ainda continua a ter nos compatriotas e no país. Alex, uma adolescente, vive em Montreal com a mãe e a avó, que deixaram o Líbano durante o conflito, após terem perdido vários entes queridos. Um dia, no Natal, chega de Beirute uma caixa cheia de objectos do passado, diários, cadernos, fotos e cassetes áudio (alguns pertencentes à própria Hadjithomas, que inseriu elementos autobiográficos no enredo), que muito perturbam a mãe de Alex e cujo significado ela não quer partilhar com a filha. Esta vai investigar sem o consentimento da mãe, e descobre a tragédia que atingiu a sua família e está associada à tragédia maior do ainda hoje martirizado Líbano. Saltitando entre passado e presente, lançando mão de filmes de 8 e 16 mm, de velhas fotos e da animação digital com justeza formal, pertinência no contar e eficácia emocional, e pondo em cena um bom e coeso conjunto de actrizes, Hadjithomas e Joreige rodaram um drama intergeracional dorido e comovedor, melancolicamente patriótico e intensamente sentido, mas nunca choramingas ou ideológico. Caixa de Memórias lembra-nos também que o Líbano e os libaneses estão muito longe de voltar aos anos de paz e prosperidade pré-guerra civil.

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
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Dos muitos artistas excêntricos ingleses, Louis Wain (1860-1939) foi um dos mais excêntricos de todos. Pintor e ilustrador sobredotado (conseguia desenhar com as duas mãos ao mesmo tempo), e obcecado pelo fenómeno da electricidade, Wain era o sustento das muitas irmãs e da mãe, tendo casado com a governanta daquelas, Emily Richardson, aos 24 anos. Quando a mulher adoeceu com cancro, para a distrair, Wain começou a pintar o gato do casal, Peter, em atitudes cómicas. No Natal de 1886, a prestigiada revista Illustrated London News, em que Wade colaborava e de cujo director, Sir William Ingram, era amigo, encomendou-lhe uma ilustração de duas páginas sobre uma festa de Natal de gatos para a edição da quadra.

Em poucos dias, Louis Wain fez um desenho em que apareciam 150 felinos, cada qual com a sua expressão e atitude, o que o tornou instantaneamente famoso. Emily morreria pouco depois da publicação da revista. A partir daí, Wain não parou mais de fazer ilustrações de gatos, criando um enorme, pormenorizadíssimo, cómico e multicolorido mundo de gatos antropomorfizados, que contribuiu muito para que a Inglaterra vitoriana passasse a encarar estes animais de forma diferente, e contando entre os seus admiradores nomes como H.G. Wells e o líder do Partido Conservador e primeiro-ministro Stanley Baldwin.

Infelizmente, o jeito de Louis Wain para o negócio e a sua dedicação à causa da protecção dos animais, com os gatos à cabeça, não estavam à altura do seu imenso talento, e ele nunca tratou de garantir os direitos das suas imagens, reproduzidas em série não só em jornais e revistas como também em postais, baralhos de cartas e louça vária. Por isso, e apesar da ajuda de amigos como Sir William Ingram e de muitos admiradores, viveu sempre com dificuldades financeiras e endividado. Crescentemente afligido por problemas mentais, esteve internado numa série de clínicas a partir de 1924, morrendo numa delas, em 1939. Mas nunca deixou de pintar e, nesses anos de internamento, assinou alguns dos seus trabalhos mais originais e mesmo experimentais, caso dos célebres “Gatos Caleidoscópios”.

O filme A Vida Extraordinária de Louis Wain, de Will Sharpe, perde quase uma hora a descrever a vida familiar de Wain (interpretado na perfeição por Benedict Cumberbatch, também co-produtor) e as suas manias e excentricidades, em especial as teorias sobre a electricidade (que mais tarde aplicaria aos gatos, dizendo que, com o tempo, os tornaria a todos azuis e lhes daria o dom da fala). Mas quando finalmente Sharpe se concentra no essencial, a forma como Louis Wain construiu o seu original, delicioso e fascinante mundo artístico onde os gatos eram reis e senhores, A Vida Extraordinária de Louis Wain faz pleno jus ao talento, à personalidade, às singularidades do protagonista e à sua percepção do universo dos felinos, e regista os principais acontecimentos da sua vida, os mais felizes como os mais dolorosos.

Dir-me-ão que A Vida Extraordinária de Louis Wain é um filme biográfico perfeitamente convencional. É verdade. Mas é também verdade que, mesmo nesse registo competentemente padronizado, consegue captar e transmitir-nos a profunda, pessoalíssima, saborosíssima e desconcertante englishness de Louis Wain, cujo talento só encontrava igual na sua imensa bondade e no seu total desprendimento (a roçar o irresponsável...) das preocupações e necessidades materiais. Bem como a peculiaridade fecunda, multiforme e feliz do seu universo pictórico em que quem manda é a gataria, e é actualmente objecto de uma grande exposição em Londres, até ao próximo mês de Abril.

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  • Terror
  • 3/5 estrelas
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O quinto filme da série criada por Wes Craven e pelo argumentista Kevin Williamson em 1986, realizado por Matt Betinelli-Olpin e Tyler Gillett, é, de certeza, o mais auto-referencial da história do cinema, que deixará completamente à nora quem não é fã. A acção continua a passar-se em Woodsboro, 25 anos depois dos acontecimentos da fita original, e Ghostface está de volta, a matar à facada uma nova geração de adolescentes (alguns deles descendentes de personagens do primeiro Gritos), e muito indignado por eles gostarem mais de filmes de terror “significativos”, como A Bruxa ou O Senhor Babadook, do que dos slashers da série Stab (leia-se: Gritos). Gritos é tão “meta” sobre si mesmo e a série a que pertence, como sobre o cinema de terror e os seus códigos, convenções e estereótipos. David Arquette, Courteney Cox e Neve Campbell estão de volta às suas personagens e trazem com elas toda a sabedoria acumulada sobre os antecedentes dos acontecimentos, o funcionamento interno do género e os seus tropos, o que acrescenta alguma comédia (negra) ao suspense e ao terror (veja-se a cena com Cox, Campbell e a jovem que sai aos berros de casa dizendo ter sido atacada por Ghostface). E a ideia de os culpados serem, desta vez, fãs psicopatas, obsessivamente coca-bichinhos e viciados nas redes sociais, em vez dos habituais serial killers, é muito boa. O filme é dedicado a Wes Craven, que morreu em 2015 e teria de certeza gostado deste Gritos.

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  • 3/5 estrelas
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Quase meio sécuro depois do seu primeiro filme, La Tête en Ruine (1975), Tony Gatlif, franco-argelino e cabila de etnia cigana, assina, aos 73 anos, a sua despedida do cinema com Tom Medina. E o autor de Latcho Drom, Vengo e O Estrangeiro Louco põe um ponto final na sua obra com uma fita muito autobiográfica, que remete para os seus tempos de juventude através da personagem que lhe dá o nome. Tom Medina é uma conclusão que faz a ligação ao início de tudo.

Na década de 60, o então jovem delinquente Gatlif andava de casa de correcção em casa de correcção, até ser enviado por um juiz do tribunal de menores para uma quinta da região francesa da Camarga onde foi posto nos eixos pelo seu proprietário, que o ensinou a tratar de cavalos e a correr toiros bravos na companhia do equivalente local dos nossos campinos. Poucos anos depois, faria teatro, e nos anos 70, chegaria finalmente ao cinema e à realização.

O protagonista homónimo de Tom Medina, interpretado com vigor anárquico e recorte cartoonesco por David Murgia, é também ele um jovem delinquente, inadaptado e revoltado mas de bom coração, que sonha ser toureiro. Tom é enviado pelo tribunal para a quinta de Ulysse (Slimane Dazi), que cria cavalos e touros, e recebe rapazes para reeducação e reintegração na sociedade. Apesar de só aceitar menores, Ulysse abre uma excepção para o esquivo e despassarado Tom, que veio a pé e à boleia por nem sequer ter reparado que havia um bilhete de comboio no envelope que lhe foi dado pelo funcionário do tribunal.

Todo rodado na belíssima região da Camarga, terra de cavalos e cavaleiros, touros e paisagens pantanosas com ressonâncias místicas, Tom Medina é um misto de western contemporâneo e de filme de “integração social”, em que Ulysse e Tom andam em constante cabo de guerra. Aquele cheio de paciência, a fazer o possível para que Tom acalme e entre no bom caminho, e este ora a esforçar-se para colaborar, ora a resistir e a seguir a sua natureza intranquila e inconformada, até que, perto do final, um momento de confissão fará luz sobre a sua personalidade e o seu comportamento (tem tudo a ver com questões de identidade, uma tragédia familiar e a falta de um sentimento de pertença, mas Tony Gatlif evita quer o sentimentalismo pegajoso, quer a pose “sociológica”).

Ora jovial, ora crispada, ora calma e lírica com interlúdios oníricos (as visões de touros fantasmagóricos que assaltam Tom), ora inquieta e angustiada, a fita anda ao sabor dos impulsos, das guinadas de atitude e dos estados de alma da personagem principal, acompanhada pela música tocada pela filha de Ulysse, Stella (Karoline Rose Sun), à qual, e à falta de melhor classificação, podemos chamar metal cigano (a cena em que Tom vai ouvir Stella ao cantinho onde ela compõe e toca é impagável).

No final, fica tudo em aberto para Tom, que não parece mesmo ser feito para levar uma vida convencional e se mete estrada fora, seguindo o seu coração e a jovem Suzanne, uma errante como ele, afinal fiel à vocação nómada do cinema e das personagens de Tony Gatlif. Tom Medina é um adeus aos filmes tão adequado como sentido.

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  • 3/5 estrelas
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Desde os anos 80 que Steven Spielberg queria fazer um musical e teve um projecto original e semi-autobiográfico chamado Reel to Reel – a história de um jovem realizador que chega a Hollywood em plena crise dos grandes estúdios clássicos – mas acabou por o abandonar. Em 2014, Spielberg decidiu-se a rodar uma nova versão de West Side Story – Amor Sem Barreiras, e em grande parte por questões afectivas. O disco da produção original da Broadway, assinada por Stephen Sondheim, Leonard Bernstein, Jerome Robbins e Arthur Laurents foi o primeiro do género a ser ouvido em casa da família Spielberg nos anos 50, e deixou-lhe uma recordação inesquecível.

Este novo West Side Story, com argumento de Tony Kushner, não é nem uma nova versão reverencialmente fiel ao filme de 1961 de Robert Wise e Jerome Robbins, nem uma releitura ou uma actualização deste para os nossos tempos. É, sim, segundo o próprio Spielberg, um filme que se refere directamente ao musical da Broadway original, estreado em 1957, conservando intactos todos os números musicais, com uma partitura adaptada por David Newman da original de Leonard Bernstein e uma coreografia de Justin Peck muito inspirada na de Robbins.

Estrutural e narrativamente muito semelhante ao musical e ao filme de Wise e Robbins, e passado na mesma na Nova Iorque popular das décadas de 50/60, o West Side Story de Steven Spielberg apresenta, no entanto, algumas diferenças. Do ponto de vista visual, é um filme mais “duro”, mais carregado, mais grunge, sem o deslumbramento do Technicolor de West Side Story – Amor Sem Barreiras. E Spielberg enfatiza também o lado do realismo social e da mensagem política, ao acentuar a rivalidade entre o gangue branco dos Jets e o gangue porto-riquenho dos Sharks, e sublinhar o ambiente de intolerância, violência e tensão racial intensa. O filme pode continuar ambientado na Nova Iorque de há 60 anos, mas é dos EUA de agora que o realizador está a falar.

Ao contrário do que sucede no filme de Wise e Robbins, todas as personagens latinas são aqui interpretadas por actores e actrizes latinos. Alguns números musicais foram mexidos em termos de localização, caso de Gee, Officer Krupke, que agora decorre na cadeia e sem a presença do sargento Krupke; e Somewhere é cantado não por Consuelo mas sim pela personagem de Rita Moreno, que interpretou Anita no original e agora surge na versão feminina de Doc, o dono da drugstore do bairro. O que é um erro crasso, já que Spielberg põe uma idosa que já viveu a sua vida, e não pode aspirar por mais nada, a entoar uma canção de esperança originalmente cantada por uma jovem com a vida toda à sua frente.

Ansel Elgort será muito bem parecido, mas o seu Tony é um peso morto, com défice de carisma e pouca chama e profundidade emocional. Bem melhor, em presença, sensualidade à flor da pele e arrebatamento sentimental, é a Maria de Rachel Zegler, que tem também uma bela voz (recorde-se que Natalie Wood foi dobrada na fita original por Marni Nixon, a mais célebre cantora fantasma de Hollywood); e Mike Faist, num riff a soar inquietação, insolência e perigo, quase que leva o filme debaixo do braço para casa.

Visualmente, este West Side Story acaba por ser contaminado por esse peso social, pelo endurecimento da hostilidade e da violência entre os dois gangues e pelo ponto de vista pessimista do argumento de Kushner e da percepção de Steven Spielberg. Está inegavelmente muito bem filmado, embora seja esteticamente menos polido e menos apelativo do que a versão de Wise e as coreografias de Justin Peck, com uma ou outra excepção (caso do vibrante e multicolorido America), não tenham a graça aérea, o vigor elegante nem a alegria contagiante das de Jerome Robbins.

Quando avançou para este projecto, Steven Spielberg disse que a sua intenção não era fazer um musical modernaço, mas sim um musical “conservador, daqueles à moda antiga”. O seu West Side Story é a concretização possível deste desejo, num tempo em que, no cinema, o musical é um género para todos os efeitos extinto. Ficamos, assim, com um West Side Spielberg.

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  • 3/5 estrelas
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Uma jovem yazidi é raptada por combatentes do Estado Islâmico e vendida como escrava. Consegue fugir e junta-se a uma brigada internacional de mulheres que lutam com a resistência curda. A francesa Caroline Fourest assina este filme de guerra no feminino que dá primazia à acção (as sequências de combate são muito boas, em especial a que se passa a céu aberto, envolvendo jipes e um velho blindado) e ao romanesco sobre o aspecto documental. Irmãs de Armas peca só por um certo pendor melodramático, mais óbvio no final, e um uso excessivo e injustificado da câmara lenta.

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  • 3/5 estrelas
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Paul Schrader volta a glosar os temas recorrentes na sua filmografia do pecado, da culpa, expiação e vingança neste filme em que Oscar Isaac interpreta William Tell, um militar que cumpriu pena por ter torturado presos no Iraque, foi libertado e tornou-se jogador profissional, e vê-se tentado pelo filho de um antigo camarada de armas a vingar-se de um homem que ambos têm boas razões para odiar. É déjá vu de Schrader e já vimos mais bem feito em títulos anteriores, como Perigo Incerto (1992) ou Confrontação (1997), mas poucos realizadores filmam a solidão atormentada, o peso da culpa e o negrume existencial como ele. Mesmo que em Card Counter: O Jogador estejam corporizadas por um actor menor e indiferente como é Oscar Isaac.

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
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O novo filme de Wes Anderson passa-se em França, nos anos 50 e 60, na redacção de uma revista americana instalada numa cidade francesa fictícia, onde se prepara o último número antes do fecho definitivo, após a morte do seu carismático editor, Arthur Howitzer Jr., e de acordo com os seus desejos. Na realidade, Crónicas de França do Liberty, Kansas Evening Sun são três mini-filmes dentro de um maior, uma empreitada de uma concepção global, uma complexidade formal e referencial e uma minúcia visual estarrecedoras, onde Anderson recorre à banda desenhada, à animação, ao teatro e ao grafismo jornalístico, levando ao limite o seu talento de miniaturista fanático do detalhe, para homenagear publicações como a The New Yorker e a Paris Review, bem como a própria França, em registo retro e de comédia paródica amável. É um tour de force cinematográfico atarefadíssimo, minuciosíssimo, espirituoso e estonteante, embora no final fiquemos com a sensação que aquilo que o filme tem para dar e vender em fantasia, estilo, destreza e humor, falta-lhe em substância e em calor humano.

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  • Ficção científica
  • 3/5 estrelas
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Editado em 1965, após ter sido pré-publicado em partes em vários números da revista Analog entre 1963 e 1965, Duna, de Frank Herbert, primeiro livro de uma saga de seis, é um daqueles clássicos absolutos da ficção científica ao qual, pela sua densidade narrativa e pormenorização na construção de um mundo futuro uno e internamente coerente, nenhum filme conseguirá alguma vez fazer inteira justiça. David Lynch conseguiu uma aproximação na sua adaptação barroca e brutalista de 1984, comercialmente falhada mas que tem muitos defensores acérrimos (nos quais se inclui o autor destas linhas).

Duna está repleto de influências e referências, desde a figura de T.E. Lawrence e do filme Lawrence da Arábia de David Lean até à cultura árabe, à religião islâmica e ao budismo, da matéria arturiana à história do feudalismo ocidental, ao declínio dos impérios e ao mito do herói dotado de poderes superiores, a que se juntam as preocupações ecológicas do seu autor (a especiaria captada no planeta Arrakis é uma metáfora para o petróleo, um recurso finito e o tema da escassez de água é constante na saga), que Frank Herbert conseguiu aglomerar, moldar e articular numa narrativa épica interplanetária.

Esta segunda versão para cinema de Duna realizada por Denis Villeneuve, que também escreveu o argumento com Eric Roth e Jon Spaihts, está dividida em dois filmes (o primeiro só abrange o primeiro terço da obra), e tal como a de David Lynch, procura sintetizar de forma legível o intrincado enredo do livro. Villeneuve marca pontos na visualização do mundo futuro e dos planetas em que a acção decorre, sobretudo no desértico Arrakis em que a valiosa especiaria, que permite também as viagens espaciais, é recolhida, bem como da sua tecnologia (os magníficos ornitópteros com as hélices que imitam o bater das asas dos insectos “roubam” o filme neste departamento). E ao contrário do que fez Lynch, os Fremen de Arrakis são apresentados como um povo de características árabes (Herbert inspirou-se nos beduínos do deserto para os criar).

Compreende-se que o realizador tenha sempre resistido, durante a pandemia, a apresentar o filme numa plataforma de streaming. Duna foi feito com uma ideia de cinema de vistas largas e grande fôlego visual a orientá-lo, e é numa sala de cinema com condições técnicas óptimas que deve ser visto. Mas na inevitável comparação com a fita de David Lynch, o Duna de Villeneuve fica a perder. Primeiro, porque o vigor e o dinamismo que aquele injectou na sua imponente versão dão lugar, nesta, também ela inegavelmente grandiosa, a um tom ponderoso e a uma solenidade que prejudicam o fluir do enredo. E não é por falta de dedo de Villeneuve para a acção, como fica provado em várias sequências, sejam de batalha aberta, sejam de combates envolvendo menor número de intervenientes ou de perseguição.

Depois, o elenco deste Duna não chega aos pés do da adaptação de Lynch, e tem vários papéis mal entregues, a começar logo pelo do herói, o jovem Paul Atreides. Onde, no Duna de David Lynch, Kyle McLachlan escamoteava o facto de ser bastante mais velho do que a personagem com uma interpretação plena de convicção e de entusiasmo, que nos fazia acreditar que ele era mesmo o Eleito dos Fremen, o Muad’Dib ou Kwisatz Haderach, possuidor de poderes mentais únicos, nesta nova versão ele é personificado pelo baço e linfático canastrãozinho Timothée Chalamet, que nem por um momento consegue transmitir a nobreza intrínseca à personagem, os seus dilemas interiores ou a imanência da sua condição heróica.

A apagada Chani de Zendaya nem por um momento faz esquecer a de Sean Young no filme de 1984, e apenas Rebecca Ferguson, em Lady Jessica, Charlotte Rampling, na Reverenda Mãe das Bene Gesserit, e Stellan Skarsgard, num Barão Harkonnen onde a gordura é tanta como a crueldade, se apresentam à altura das suas personagens. Denis Villeneuve também se abstém de fazer um prólogo explicativo pela boca da Princesa Irulan (uma resplandecente Virginia Madsen, na versão de David Lynch) e adia para o segundo filme o aparecimento da bruxinha Alia, a devotada irmã mais nova de Paul. E conseguirá o realizador arranjar um Feyd Rautha com tanto impacto como o de Sting no Duna de Lynch?

É uma pergunta que fica para a continuação. A qual já tem pré-produção anunciada, com a ajuda das receitas de bilheteira internacionais deste novo Duna ainda antes da estreia nos EUA (e deverá haver também uma série de televisão, Dune: The Sisterhood). Veremos se tem menos areia na engrenagem do que esta moderadamente impressionante primeira parte.

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  • 3/5 estrelas
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Intelectual Nova-Iorquino neurótico, hipocondríaco e em crise criativa? Confere. Casais com os matrimónios periclitantes? Confere. Elogio do cinema clássico europeu e depreciação do cinema contemporâneo? Confere. Meditações angustiadas sobre o sentido da vida, a ausência de Deus, a arte e a morte? Confere. Referências em rajada a filmes de grandes mestres do cinema? Confere. Rifkin’s Festival, rodado em San Sebastián durante o festival de cinema desta cidade basca, é um filme de Woody Allen tão chapadamente familiar que quase se diria um pastiche aplicadíssimo feito por um admirador fanático do realizador, o equivalente em cinema daquelas bandas de homenagem que tocam sem falhar uma só nota as músicas do grupo que veneram.

A personagem do título, Mort Rifkin (Wallace Shawn), é o proverbial alter ego de Woody Allen, um académico, cinéfilo e romancista frustrado que, relutantemente, acompanha a mulher, Sue (Gina Gershon), que trabalha como relações públicas do meio do cinema, ao Festival de San Sebastián, e está a assessorar um jovem realizador francês na moda, Philippe (Louis Garrel), a coqueluche do certame. Rifkin desconfia que a mulher e Philippe andam enrolados, fica ansioso e com formigueiros num braço, e marca uma consulta com uma médica local, Jo Rojas (Elena Anaya, muito pouco à vontade no papel e a falar inglês), mulher culta e sedutora, que viveu em Nova Iorque e está casada com um pintor copofónico, teatral e adúltero em série (Sergi López). É claro que Rifkin fica caidinho por ela.

Pertencente àquela série de filmes que Woody Allen roda em cidades europeias que o convidam (a que alguns se referem, maldosamente, como os “filmes turísticos” do realizador), Rifkin’s Festival seria uma fita em que Allen estaria apenas a rever a matéria dada, a reiterar muito literalmente, e de forma algo preguiçosa, os temas que lhe são mais queridos, não fossem as sequências oníricas e os devaneios acordados de Rifkin, que tomam a forma de paródias a sequências canónicas de clássicos do cinema, recriadas com enorme rigor visual pelo director de fotografia Vittorio Storaro.

As melhores são as de O Mundo a Seus Pés em versão judaica nova-iorquina na infância de Rifkin (o trenó chama-se Rose Budnick), a de A Máscara, de Ingmar Bergman, com Gershon e Anaya a comentarem em sueco os defeitos do protagonista, e a de O Sétimo Selo, de Bergman, na qual, em plena Praia da Concha de San Sebastián, Rifkin joga xadrez com a morte (interpretada por Christoph Waltz), que lhe dá conselhos existenciais e de boa nutrição, e que, quando ele lhe pergunta quando a voltará a ver, responde: “Depende. Fumas?” E há ainda, a espaços, gags da melhor colheita allenesca, como aquele em que um realizador libidinoso diz a uma starlet escassamente vestida que faria uma excelente Hannah Arendt no filme sobre o julgamento de Eichmann que ele se prepara para rodar.

No seu próximo projecto, Woody Allen vai regressar a Paris (cidade, aliás, vasta e elogiosamente referida ao longo de Rifkin’s Festival pelas personagens principais, bem mais do que a própria San Sebastián, mostrada apenas superficialmente), onde filmou Meia-Noite em Paris (2011). Espera-se que esteja bem mais inspirado do que nesta visita ao País Basco.

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  • 3/5 estrelas
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Era uma vez um grupo de idosos que se reunia nos jardins do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, a antiga sede do governo, para cantarem velhas e conhecidas canções. Foram eles que Sérgio Tréfaut resolveu filmar neste documentário, no seu regresso ao Brasil, onde nasceu e onde não ia há mais de quatro décadas. Entretanto, eclodiu a pandemia, e quando o realizador quis reencontrá-los para os filmar de novo, pelo menos dois deles tinham morrido de Covid e o contacto com os outros tinha-se perdido. Paraíso é o comovente mas também alegre registo deste convívio musical, e de uma tradição do Rio e um tempo que se deverão ter perdido para sempre.

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  • 3/5 estrelas
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Ao contrário dos ingleses, os franceses não têm uma grande tradição de nonsense. Mas há sempre excepções, e uma delas é representada no cinema por Quentin Dupieux, que conta entre os seus filmes com títulos como Nonfilm (2002), em que um actor acorda e está no meio da rodagem de uma fita que desconhece e ninguém o estranha; 100% Camurça (2019), onde Jean Dujardin interpreta um homem obcecado por um casaco de camurça que encontrou; e acima de todos, Rubber-Pneu (2010), rodado nos EUA, uma inenarrável paródia aos filmes de terror série Z, sobre um pneu com vida própria e vocação de assassino em série.
Mandíbulas, o mais recente filme de Dupieux (que o produziu, escreveu, realizou, fotografou e montou), competiu no Festival de Veneza de 2020 e é uma comédia serenamente chanfrada (ou loufoque, como se diz em França), que se recomenda em particular aos apreciadores mais hardcore de humor absurdo com rosto impassível. Manu (Grégoire Ludig) e Jean-Gab (David Marsais) são dois idiotas chapados que não têm onde cair mortos (no caso de Manu, literalmente: foi expulso de casa por não pagar a renda e dorme ao relento numa praia). Um dia, um amigo pede-lhe para entregar uma mala numa vivenda sem fazer perguntas, serviço pelo qual lhe pagará 500 euros.

Manu rouba um carro, um velho Mercedes todo rebentado, para fazer o serviço e decide convidar o seu amigo Jean-Gab, que trabalha na estação de serviço da mãe, para o acompanhar. Pelo caminho, começam a ouvir um estranho barulho no porta-bagagens do carro (Jean-Gab sugere poder ser um secador de cabelo que ficou ligado). Param o carro à beira da estrada, abrem o porta-bagagens e lá descobrem uma mosca gigante. E em vez de ficarem espantados ou aterrorizados, começam a pensar em como ganhar dinheiro com o enorme insecto. Jean-Gab tem então uma ideia: treiná-la como se fosse um cão – ou um drone vivo – para lhes trazer comida e em especial roubar dinheiro dos bancos. E dá-lhe um nome: Dominique.

Partindo desta premissa estapafúrdia, a narrativa vai-se tornando cada vez mais delirante, embora Quentin Dupieux mantenha sempre um tom de filme “normal” que está a contar uma história perfeitamente vulgar e racional, com protagonistas que têm QI medianos e não a roçar o zero, como Manu e Jean-Gab. Do princípio ao fim, Mandíbulas cultiva um absurdo de cara o mais séria possível, apesar de ter personagens como Agnès (Adèle Exarchopoulos), uma rapariga que ficou com um problema vocal depois de um acidente de esqui e só fala aos gritos; da mosca Dominique revelar a certa altura uma preferência inesperada por cães pequeninos; ou de haver um ricaço que encomendou a dois dentistas gémeos uma dentadura postiça incrustada de diamantes.

Se me pedissem para definir Mandíbulas sinteticamente, eu diria que parece o cruzamento de um pastiche francês e encardido de um filme dos irmãos Coen com uma versão gozona e no budget de A Mosca. E já agora, a gigante Dominique é mais um defeito do que um efeito especial. Mas o filme é tão descontraído, consistente e assumidamente disparatado, que não faz a menor diferença.

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  • 3/5 estrelas
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A certa altura de Céus do Líbano, Alice (Alba Rohrwacher) – uma jovem suíça que se instalou nos anos 50 em Beirute, no Líbano, como ama de uma família local –, tem uma violenta discussão ao telefone com os pais, que querem que ela volte para casa e não continue nesse distante país estrangeiro. A protagonista desta primeira longa-metragem de Chloé Mazlo desliga então o aparelho e corta, literalmente, com as suas raízes. Porque a realizadora filma-a, em animação fotograma a fotograma, a dar uma tesourada nas longas raízes que lhe saem dos pés.

Esta sequência define a aproximação de Chloé Mazlo à história que conta em Céus do Líbano: artesanal, naïf, com quase nada de naturalista e muito próxima do universo da animação de onde provém (a sua curta-metragem de estreia, Deyrouth, de 2010, tem bastantes pontos de contacto com esta fita). A realizadora foi inspirar-se na sua família para rodar Céus do Líbano, muito particularmente na história da sua avó Alice, que há mais de meio século deixou a Suíça para se instalar em Beirute, onde trabalhou e constituiu família.

Chloé Mazlo nunca se desvia da linha estética que escolheu para rodar o filme, quer esteja a recordar a activa e calorosa vida familiar e social de Alice, do marido, Joseph Kamar (Wajdi Mouawad), e da sua filha, com parentes e amigos, quer esteja a recriar as horas mais difíceis da guerra civil que eclodiu no Líbano em 1975, conduzindo o país à trágica situação em que se encontra hoje, devastando Beirute, outrora conhecida como “a Paris do Médio Oriente” e acabando com a existência plácida e feliz de Alice, da sua família e dos seus próximos, muitos dos quais foram obrigados a deixar o Líbano e ir para o estrangeiro.

Há alturas de Céus do Líbano, sobretudo a partir do momento em que a guerra se instala, em que sentimos que esta predilecção não-realista de Chloé Mazlo, composta por sequências animadas, cenários pintados, fundos projectados, um registo fantasioso, muito simbolismo óbvio (a rapariga vestida de cedro, que é a árvore e o símbolo nacional do Líbano, os políticos que usam máscaras de animais diversos) e uma personalidade visual de fotografia a cores dos anos 60 e 70 tirada do álbum familiar para mostrar às visitas, parece ligeira e frívola demais para a gravidade do assunto que o filme está a evocar e dramatizar.

No entanto, Mazlo consegue manter a homogeneidade formal e de tom do filme, que está muito centrado nos efeitos do conflito em Alice, nos familiares e na vida dos amigos (boa parte de Céus do Líbano passa-se no interior do espaçoso apartamento dos Kamar, sempre de portas abertas para parentes e amigos, primeiro nos bons momentos e depois nos maus, e que recebe também as visitas indesejáveis das milícias rivais que combatem nas ruas da capital) e não inclui grandes e dispendiosas recriações dos acontecimentos que evoca. E cuja identidade, mesmo nas horas mais melancólicas e sombrias, tem as cores da nostalgia, que se mantêm vivas até ao fim. Mesmo quando Alice tem que deixar Beirute por Paris, e se vê obrigada a cortar com as suas segundas e mais recentes raízes, à luz das estrelas do seu país adoptivo.

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  • 3/5 estrelas
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Podemos sempre contar com o inesperado no cinema de Miguel Gomes, e Diários de Otsoga não é excepção. Escrito e realizado com Maureen Fazendeiro, sua companheira (Mariana Ricardo também colaborou no argumento), o filme foi rodado em 22 dias, em Agosto de 2020, numa quinta perto da Praia do Magoito, com os realizadores, actores e equipa técnica a simularem a experiência de confinamento a que a pandemia os havia obrigado pouco antes, e levado a suspender os seus projectos correntes (no caso de Miguel Gomes, Selvajaria, no Brasil, uma recriação da Guerra de Canudos, no final do século XIX). Pormenor fundamental: Diários de Otsoga é contado em cronologia inversa. Não por mera boutade ou por capricho formalista, mas sim por ser a maneira que os seus autores encontraram de figurar a perturbação na percepção do tempo e no decorrer do quotidiano causada pelo confinamento da Covid 19. É a pertinência vivencial e narrativa deste dispositivo, e a clareza com que foi posto em prática, que livram a fita de ser apenas um mero, presunçoso e irritante exercício de “desconstrução” e de metacinema entre amigos.

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  • 3/5 estrelas
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Com 14 horas de duração, A Flor, do argentino Mariano Llinás, é o terceiro filme mais longo de sempre, composto por seis histórias independentes umas das outras, quatro delas de formato narrativo tradicional mas que terminam de maneira abrupta, e todas interpretadas pelo mesmo quarteto de actrizes. Apresentado num prólogo pelo realizador, que explica o título (a flor é a forma assumida pelo diagrama das seis histórias), A Flor é como que um filme de filmes, uns de género e convencionais, outros experimentais e meta-narrativos, que vão do pastiche de série B de terror a um drama sentimental e musical e um remake mudo de Passeio ao Campo, de Jean Renoir, onde além de muitas referências cinéfilas, há ecos dos universos literários de Borges, Cortázar e Roberto Bolaño. Ora intrigante e engenhoso, ora maçador e exasperante, A Flor é também uma experiência sobre as muitas formas de contar histórias, o manejar do tempo fílmico e os limites da duração em cinema. Cabe ao espectador aceitar o desafio e aventurar-se pelos meandros deste invulgar e ousado trabalho de Mariano Llinás. Estreia dia 29 de Julho no Trindade (Porto) e dia 5 de Agosto no Nimas (Lisboa).

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  • 3/5 estrelas
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Caroline Vignal assina esta comédia estival, inspirando-se vagamente no livro de Robert Louis Stevenson Travels With a Donkey in the Cevennes. Antoinette (Laure Calamy), uma professora que anda metida com o pai de uma aluna, vê gorados os planos de férias feitos com o amante, porque ele tem que ir numa caminhada com a família no Parque Nacional das Cevénnes. Antoinette decide fazer-lhe uma surpresa, aluga um burro chamado Patrick e segue-o. O animal torna-se na testemunha paciente dos acidentes e das humilhações de jornada de Antoinette. Com o seu confidente mudo, a professora acaba por cair em si no final do caminho, e O Meu Burro, o Meu Amante e Eu transforma-se num filme sobre uma viagem de revelação pessoal, sem riso grosseiro nem popularucho.

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  • 3/5 estrelas
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Pedro Almodóvar pegou na peça/monólogo de Jean Cocteau, chamou Tilda Swinton para interpretar a mulher deixada pelo amante e que espera desesperadamente por um telefonema dele, e “almodóvarizou” tudo de cima a baixo nesta curta-metragem: encenação, ambientes, cores, atmosfera emocional e estado de espírito e guarda-roupa da personagem, que passa de mulher submissa e ansiosa a angustiada e furiosa, tal como todas as dos filmes do realizador. No final, Almodóvar acaba por dinamitar o texto original, com a mulher a pôr fogo à casa onde viveu com o amante e a partir para outra levando o cão dele consigo.

Em complemento, há uma entrevista com Almodóvar e Swinton feita pelo crítico inglês Mark Kermode. Uma miniatura para saborear enquanto não chega Madres Paralelas, a nova longa-metragem do realizador.

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  • 3/5 estrelas
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Em 1979, quando as Doce foram “inventadas” por Tozé Brito e Cláudio Condé na Polygram, Portugal ainda não tinha televisão a cores mas ainda tinha o Conselho da Revolução, Manoel de Oliveira estreava Amor de Perdição, o primeiro-ministro era uma mulher, Maria de Lourdes Pintasilgo, Manuela Bravo ganhava o Festival da Canção com “Sobe, Sobe, Balão Sobe”, o Correio da Manhã estreava-se nas bancas, os Jogos sem Fronteiras realizavam-se cá pela primeira vez e Eusébio retirava-se do futebol.

Este era o Portugal em que Laura Diogo, Lena Coelho, Fátima Padinha e Teresa Miguel (estas duas últimas vindas dos extintos Gemini de Tozé Brito e Mike Sergeant) se lançavam como a segunda banda feminina portuguesa (a primeira foram as Cocktail, às quais Lena Coelho tinha pertencido), e uma das primeiras na Europa. Um país que, graças ao dinheiro de Bruxelas, haveria de mudar muito na década de 80, que estava ali mesmo a chegar, e que, farto das canções de protesto dos tempos do PREC, e já a mexer muito graças ao disco que se dançava nas discotecas, testemunharia uma revolução na música ligeira e pop/rock.

As Doce contribuíram para ela, com as suas canções muito trauteáveis e dançáveis, e sensualmente sugestivas, as suas coreografias endiabradas, e uma imagem – do grupo, e de cada uma das quatro cantoras – ao mesmo tempo desenvolta, sofisticada e erótica, construída com a colaboração do costureiro José Carlos. E que, juntamente com uma intensa campanha de marketing, as imporiam como uma marca, coisa raríssima na indústria musical portuguesa.

É a história das Doce, entre 1979 e 1982, quando, à terceira vez e finalmente, ganharam o Festival da Canção com “Bem Bom”, que Patrícia Sequeira (a autora de Snu) conta no filme com o nome desta canção, ao mesmo tempo que procura mostrar como era o Portugal em que elas irromperam. Bem Bom é mais feliz no primeiro aspecto do que neste, em que chega a tender para a pontificação estereotipada, na sequência do soez boato que correu em 1981 sobre Laura Diogo e Reinaldo, jogador negro do Benfica. A fita sofre também de uma falta de meios que compromete as sequências musicais, que parecem ter sido rodadas quase sempre no mesmo sítio, sejam as dos Festivais da Canção (não havia imagens de arquivo da RTP disponíveis para usar?), sejam as dos espectáculos e digressões do grupo.

Onde Bem Bom funciona, na caracterização de Laura, Lena, Fátima e Teresa, e na recriação da formação, consolidação e evolução do grupo, das relações entre elas, desde as tensões iniciais até à união posterior, e da colaboração e das fricções com Tozé Brito, Mike Sergeant e Cláudio Condé, deve-o em muito grande parte às quatro actrizes. Municiadas com papéis bem definidos e diálogos desempoeirados, Bárbara Branco (Fátima), Lia Carvalho (Teresa Miguel), Ana Marta Ferreira (Laura Diogo) e Carolina Carvalho (Lena Coelho) metem-se de imediato, bem e com desembaraço, nas personagens, e transmitem-nos com garra, graça e vivacidade os seus diferentes modos de ser, reagir e viver a música e o grupo, os percalços e os sucessos, e o preço cobrado pelas exigências do trabalho e do êxito nas suas vidas privadas.

É pena que Bem Bom refira apenas de raspão que as Doce foram na altura atacadas pelas feministas portuguesas (uma delas chegou a dizer que estavam “abaixo das mulheres do Cais do Sodré” – ou seja, abaixo de prostitutas – após terem aparecido como odaliscas a cantar “Ali Babá” no Festival da Canção de 1981) e escarnecidas por alguns críticos e por uma certa intelectualidade de esquerda, que insistia que os ouvidos dos portugueses deviam sofrer uma dieta permanente de música revolucionária e suas adjacências (aliás, a certa altura do filme ouve-se num café, em fundo, a insuportável gaivota que “voava, voava”, de “Somos Livres”, na voz de Ermelinda Duarte).

E convém recordar que, ao contrário do que a secretária “patinho feio” da editora sugere no discurso em que apela às Doce para não acabarem e se lhes refere como uma espécie de “guarda avançada” da emancipação feminina entre nós, nem todas as mulheres portuguesas eram como ela, nem precisaram das Doce para se afirmarem individual e socialmente. Mas que elas ajudaram, pelas canções de colagem instantânea no ouvido e convidativas à dança, pela presença inovadora e pela feminilidade estuante e provocante, a fazer da década de 80 em Portugal a mais musicalmente variada, animada e audaciosa do pós-25 de Abril, lá isso é inegável.

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Quando se deu o boom do vídeo, nos anos 80, os videoclubes portugueses encheram-se de telefilmes americanos, que eram um dos recursos das pequenas editoras sem acesso aos catálogos dos grandes estúdios. Entre esses telefilmes encontravam-se muitos sobre famílias afligidas por filhos ou filhas toxicodependentes (estávamos na época do auge da cocaína nos EUA), e vários deles punham em cena uma terapia muito divulgada nessa altura, o chamado “tough love” (ou “amor duro”), segundo a qual os pais, por muito que lhes custasse, não deviam ceder um milímetro aos filhos durante o tratamento, por maior que fosse o seu sofrimento e por mais que eles implorassem.

Tal como alguns destes telefilmes, Quatro Dias a Teu Lado, de Rodrigo García (Mães e Filhas), assenta num facto real que envolveu uma mulher divorciada e a sua filha, respectivamente, Amanda Wendler e Libby Alexander, e o argumento foi tirado de um artigo do Washington Post da autoria do jornalista Eli Saslow, que também escreveu o guião com o realizador. No filme, Deb (Glenn Close), uma mãe divorciada, procura ajudar uma das suas duas filhas, Molly (Mila Kunis), viciada em heroína, ao longo dos quatro dias em que ela tem que esperar até começar um novo tratamento para se desintoxicar.

Quando Molly lhe aparece à porta de casa totalmente devastada, depois de lhe ter roubado e vendido muitas coisas de estima e valor para alimentar o vício, de ter tentado largá-lo por várias vezes e não ter conseguido, de ter perdido a sua confiança e desaparecido durante muito tempo, Deb recusa-se a ajudá-la. Nem sequer lhe dá entrada em casa e Molly é reduzida a dormir no relvado da frente. E quando Quatro Dias a Teu Lado parece ir transformar-se num filme melodramático de tough love actualizado para a era da crise dos opióides nos EUA (Molly viciou-se na heroína depois de ter ficado dependente de Oxycontin, quando se lesionou a fazer desporto), a mãe decide dar-lhe uma última oportunidade.

A fita de Rodrigo García junta-se a títulos recentes como Beautiful Boy, de Felix van Groeningen, ou O Ben Está de Volta, de Peter Hedges, ambos rodados em 2018. Neles, um pai ou uma mãe procuram, apesar de todas as dúvidas e temores que os assaltam, e chegando a correr riscos pessoais (veja-se o mergulho no submundo do tráfico no subúrbio em que vive, dado pela personagem de Julia Roberts em O Ben Está de Volta), tirar os filhos da droga e do mundo de sordidez e degradação em que se tinham precipitado, e orientá-los para a recuperação e uma superação definitiva da dependência.

Apesar de também seguir esta matriz narrativa reconhecível e previsível, Quatro Dias a Teu Lado fá-lo com um pouco mais de realismo, veracidade e sobriedade na encenação dramática e na extracção de dividendos emocionais do que os filmes acima citados. Rodrigo Garcia contorna os estereótipos do confronto histerizante e da redenção pronta-a-usar, mantendo sempre a plausibilidade, quer no compreensível misto de esperança e de dúvida que Deb sente perante a capacidade de Molly não fraquejar, quer no comportamento incerto desta durante o punhado de dias em que tem que aguardar pelo início do tratamento – até não conseguir resistir mais, mentir à mãe e ir tomar uma última dose.

Close e Kunis têm interpretações correctas. A primeira sem forçar a nota do desespero da mãe dividida entre o desejo que a filha se cure e o terror de a ver soçobrar mais uma vez (que poderá ser a última); a segunda sem carregar no exibicionismo do sofrimento da junkie que bateu no fundo e se debate para sair de lá. E se há uma coisa que Quatro Dias a Teu Lado podia muito bem dispensar, é aquele piano omnipresente na banda sonora, que vem apenas sublinhar o óbvio que decorre das imagens e das interpretações, e introduzir no filme uma teimosa e irritante nota lamechas.

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O “filme de doença terminal” é um subgénero do melodrama que continua a aparecer com regularidade nas telas. Supernova, de Harry Macqueen, é mais um destes filmes, com a única novidade de ser protagonizado por um casal gay e não por heterossexuais (namorados, amantes, marido e mulher) ou familiares próximos. Tusker (Stanley Tucci) é um escritor americano que vive em Inglaterra há 20 anos com Sam (Colin Firth), um pianista, e foi diagnosticado com demência. São também astrónomos amadores e vão ambos numas últimas férias pelo campo inglês fora, na sua autocaravana, reencontrando família e amigos e visitando lugares do passado. Tusker quer suicidar-se para poupar dor e trabalho a Sam, mas Sam nem quer ouvir falar nisso. Harry Mcqueen mantém a temperatura emocional do filme sob controle, e Tucci e Firth fazem o resto, com interpretações comedidamente expressivas.

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Terá a Pixar perdido o brilho? O despejo directo da sua mais recente animação no pacote básico do Disney+ (ou seja, nem sequer se estreou como conteúdo premium, pelos quais a plataforma de streaming exige um pagamento extra assinatura, quanto mais nas salas de cinemas) parece indiciar que a Pixar caiu do altar. Afinal, este é o estúdio que lançou Ratatui, Wall-E, Up – Altamente e Toy Story 3 no espaço de quatro – QUATRO – anos, ganhando o Óscar para Melhor Filme de Animação com todos eles. Comparando com essa corrida ao ouro, esta proposta ambientada em Itália e os filmes que a precederam, Bora Lá e Soul – Uma Aventura com Alma, compõem um trio um pouco decepcionante.

Se a estratégia de lançamento de Luca sugere falta de fé dos patrões da Disney, é com tristeza que dizemos que provavelmente se justifica. Encantador mas levezinho, Luca não é definitivamente a Pixar no pico das suas capacidades. A imagem de marca do estúdio, a ousadia, os gags acutilantes, as grandes ideias, tudo isso falta a este filme coming-of-age, uma história duvidosa com algumas arestas por limar.

Há pontos favoráveis. A animação cintila, como sempre, captando a luz do sol no Mediterrâneo e a espuma das ondas na praia com belos detalhes. O cenário da Riviera italiana traz o frescor do céu azul e do mar a esta primeira incursão da Pixar pela Europa desde Brave – Indomável, em 2012. As personagens revelam-se muito simpáticas (todas com cabelos impecáveis), e a sua história simples – de amizade, grandes sonhos e recomeços – irradia calor. E mais: abundam os pratos de massa de aparência deliciosa.

Acima de tudo, há scooters por toda a parte – Vespas, em particular – e elas assumem um papel inesperadamente central. Como Férias em Roma (atenção ao cartaz do filme de William Wyler, de 1953, é um dos clássicos Easter eggs da Pixar), Luca mostra-se realmente maravilhado com este ícone do estilo italiano.

O enredo segue Luca, um jovem monstro marinho de cor púrpura (a voz é de Jacob Tremblay), que descobre as alegrias da Vespa depois de conhecer Alberto (Jack Dylan Grazer), uma criatura do mar que é fanática por scooters. Vivem ambos nas águas de Portorosso, uma vila de gente que odeia monstros marinhos. Depois, para grande consternação dos seus ansiosos pais (Maya Rudolph e Jim Gaffigan), Luca aprende que assim que puser os pés em terra firme se transformará em humano. E tudo o que precisa para regressar à sua forma original é um salpico de água. O perigo espreita nos pingos de cada torneira.

Não tarda, Luca e Alberto estão em Portorosso: um a sonhar com a escola, o outro com uma aventura ao volante de uma Vespa (sério, é difícil exagerar no número de referências a Vespas que o filme tem). E é então que entra Giulia (Emma Berman), uma rapariga ruiva e ansiosa por encontrar ajuda para vencer a prova anual de triatlo, a Taça Portorosso (natação, massa, bicicleta – é sádico), contra um bully local (que... conduz uma scooter).

A italianidade do filme é sincera, incluindo o cartão de abertura (“Pixar presenta”) e a banda sonora com Rita Pavone, Edoardo Bennato e Puccini. Numa sequência que faz a câmara subir através das nuvens para vermos Roma de cima, o realizador Enrico Casaros homenageia o aeroplano de Da Vinci e o Pinóquio de Collodi. E, juntamente com A Pequena Sereia de Hans Christian Andersen, Pinóquio é uma referência óbvia, nomeadamente na vontade de Luca de ir à escola como um menino de verdade. As pinceladas são mais amplas noutras cenas, num filme que põe personagens a dizer coisas como: “Mamma mia! Por favor, não aceleres mais!”, ou “Assim, sim!”, entre colheradas de gelado.

Casaros também realizou La Luna, uma adorável curta-metragem da Pixar, e recupera aqui a sua gentil caracterização dos humanos. Os monstros marinhos não são tão apelativos, embora o mais feio de todos eles, o grotesco peixe-pescador que é tio de Luca, seja indiscutivelmente a personagem de destaque em todo o filme. Acabamos com vontade de ter visto mais esse velhaco translúcido, morador das profundezas e com cabeça de lanterna.

Mas o que mais claramente falta em Luca é a habitual propensão da Pixar para criar um filme em que pessoas de todas as idades se possam rever. Desde o franchise de Carros que há menos material para adultos nos filmes do estúdio, que está a concentrar-se nos espectadores mais jovens. Luca é adequado para quem anda à procura de algo pouco exigente para os filhos verem. Com a Pixar, no entanto, espera-se sempre mais.

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Este filme, o único da portuguesa Manuela Serra, teve uma produção complicada, que se prolongou de 1979 a 1985. Passou num par de festivais e na Cinemateca, e em sessões fora do circuito comercial, e estreia-se agora numa cópia digital restaurada, com um plano final que não constava da montagem original e foi introduzido pela realizadora. O Movimento das Coisas foi rodado na aldeia nortenha de Lanheses, seguindo o quotidiano de três famílias locais, e por ser filho único e pouco visto, ganhou foros de filme de culto e obra singular da cinematografia nacional. Mas está longe de poder ser comparado às fitas de António Reis e Margarida Cordeiro, em cuja linha se filia. É um curioso e significativo documento sobre a vida no Portugal rural nos anos pós-25 de Abril, ainda o interior do país não tinha sido profundamente modificado pelas alterações socio-económicas e de costumes causadas pela revolução.

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Este filme de espionagem “realista” do inglês Dominic Cooke (Na Praia de Chesil) leva-nos a um período de enorme tensão da Guerra Fria, entre a construção do Muro de Berlim e a crise dos mísseis de Cuba, através de uma história verdadeira. Benedict Cumberbatch é Greville Wynne, um engenheiro e vendedor de maquinaria industrial, enviado a Moscovo pelo MI6 e pela CIA para contactar Oleg Penkovsky (o georgiano Merab Ninidze), um membro dos serviços secretos militares da URSS que quer passar para o Ocidente informações sobre as capacidades nucleares do seu país. O Espião Inglês tem uma óptima atmosfera de época e Cumberbatch e Ninidze são muito bons nos dois homens de mundos muito diferentes, mas que se identificam pela coragem e pelo desejo de paz, que os une numa fortíssima amizade.

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  • 3/5 estrelas
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As Andorinhas de Cabul
As Andorinhas de Cabul

A actriz e realizadora francesa Zabou Breitman e Élea Gobbé-Mévellec optaram pela animação em aguarela para adaptarem ao cinema o livro de Yasmina Khadra sobre um casal de jovens apaixonados que vivem em Cabul sob o regime dos talibãs, e que acaba por ser vítima da sua ditadura fanática e desumana. As Andorinhas de Cabul segue a linha de filmes de animação de tema político e dirigidos a adultos como Persépolis, de Marjane Satrapi, A Valsa com Bashir, de Ari Folman, ou Mais Um Dia de Vida, de Raúl de La Fuente e Damian Nenow, e a crueza atroz da história contrasta com o estilo de animação escolhido para a contar.

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Catorze horas de duração, cerca de mil excertos de filmes rodados ao longo de 13 décadas nos cinco continentes, 183 realizadoras referidas e 40 capítulos. São os números deste documentário de enorme fôlego assinado por Mark Cousins (A História do Cinema: Uma Odisseia, Os Olhos de Orson Welles), uma viagem pela história do cinema feito por mulheres, abraçando desde realizadoras célebres até às menos conhecidas e às obscuras, e narrada por nomes como Jane Fonda, Tilda Swinton ou Debra Winger. Cousins peca por vezes por excesso de entusiasmo e por sobrevalorização de vários dos nomes focados, mas As Mulheres Fazem Cinema é um trabalho importante de mapeamento cinematográfico no feminino, e em larga escala.

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Durante quase toda a década de 70, a jornalista americana Linda Lipnack Kuehl gravou mais de 200 horas de entrevistas com pessoas e artistas que conheceram Billie Holiday e privaram ou tocaram com ela, bem como familiares e psiquiatras. Ia escrever a biografia definitiva da cantora, mas morreu subitamente em 1978, antes de o conseguir. A partir dessas gravações, o realizador James Erskine assinou este documentário sobre a tão genial como infeliz Lady Day, que a mostra como tendo sido vítima de uma infância e juventude duríssimas, do racismo da sociedade americana de então e de muitos homens brutais e exploradores, brancos e negros, entre maridos, agentes, namorados e funcionários do governo (FBI, brigada anti-estupefacientes); mas também da sua dependência das drogas e de se envolver doentia e cronicamente com homens que a maltratavam e espoliavam.

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  • 3/5 estrelas
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Um filme de ficção científica em que um cientista está a desenvolver um projecto secreto de Inteligência Artificial, que oculta a sua tentativa de dar vida à mulher, morta num acidente de automóvel. Gavin Rothery estreia-se a realizar com esta fita claustrofóbica, toda passada num laboratório isolado algures no Japão, em pleno Inverno, que tem robôs ciumentos e sabor cyberpunk, e dá uma senhora cambalhota no final.

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  • 3/5 estrelas
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Em O Pai, de Florian Zeller, Anthony (Anthony Hopkins) é um octogenário que vive sozinho num amplo e confortável apartamento em Londres. Para grande preocupação da filha, Anne (Olivia Colman), Anthony tem o costume de afugentar em pouco tempo as cuidadoras que ela lhe põe em casa para o ajudar nas rotinas diárias, protestando que está muito bem assim e não precisa da ajuda de ninguém. Só que agora Anne vai para Paris com o marido e está em ainda maior cuidado com o pai. Por isso, vai tentar convencê-lo a aceitar uma nova cuidadora, a jovem e afável Laura (Imogen Poots), que Anthony acha muito parecida com a sua outra filha, Lucy, que não vê há muito tempo.

Mas, de repente, Anthony repara que tudo mudou à sua volta. Há um homem, Paul (Mark Gatiss) a viver no seu apartamento, que se apresenta como sendo o marido de Anne. A seguir, Anne é outra pessoa (Olivia Williams), e já não vai para Paris; e Paul, embora também não mude de nome como Anne, passa igualmente a ser um outro (Rufus Sewell). E dizem a Anthony que o apartamento é deles e que ele vive lá já há algum tempo. Pouco depois, a segunda Anne aparecerá na pele de ainda outra personagem. O que se está a passar? Será que os seus familiares estão a tentar confundir Anthony para o poderem internar e ficarem com o apartamento e a herança? Será O Pai um thriller psicológico-conspirativo?

A resposta é mais simples e mais terrivelmente dramática. Aquilo que nos está a mostrar Florian Zeller, autor da peça de teatro em que a fita se baseia, e também do argumento desta, com o seu colega Christopher Hampton, é o interior da cabeça de Anthony. Este sofre de demência e está, pouco a pouco, a perder o pé à realidade, a alienar todos os azimutes que lhe permitem compreender e organizar o mundo, movimentar-se nele, e a despedir-se da percepção da sua própria identidade. E durante todo este aflitivo processo, a câmara de Zeller mantém a mesma impassível compostura. O Pai é um filme de suspense em que o culpado não é uma pessoa mas sim uma doença degenerativa.

Enquanto cinema, O Pai é muito competente teatro filmado, cuja incómoda, angustiante e dolorosa eficácia depende a 99% da interpretação de Anthony Hopkins, que está na mesma faixa etária da sua personagem e é positivamente imperial do princípio ao fim. Quer nos momentos de lucidez em que Anthony enuncia a Anne as razões por que pode perfeitamente ficar sozinho, ou em que liga o interruptor do charme e conta umas balelas para impressionar a jovem Laura, antes de a mandar passear com veemente aspereza; quer nas alturas de desorientação e de desamparo, que culminarão numa sequência devastadora na clínica em que a filha o internou.

O retrato que Hopkins faz da experiência desta doença que todos temem e desejam que nunca lhes bata à porta, e que muitos conhecem por ter atingido pessoas próximas, é arrasadoramente crível e lancinantemente expressivo. E sem que por um momento que seja vejamos o trabalho por trás da interpretação, que o actor sinta a tentação do exibicionismo do seu talento ou que venha mendigar a nossa compaixão para a personagem. Esta não é a primeira vez que o cinema fala sobre esse lento naufrágio da apreensão do mundo e de nós mesmos que é a demência (recordemos Longe Dela, de Sarah Polley, ou O Meu Nome é Alice, de Richard Glatzer e Wash Westmoreland), mas graças a Anthony Hopkins, O Pai torna-se no filme de citação obrigatória.

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“Da Sibéria à Patagónia todo mundo conhece Pelé”, escreveu Vinicius de Moraes. E Luís Fernando Veríssimo: “Pelé é genial mesmo quando ata o laço da chuteira”. Pelé é sem dúvida o jogador de futebol mais elogiado por intelectuais, escritores, artistas e jornalistas. Alguns deles, como Gilberto Gil ou Roberto Muylaert, aparecem neste novo documentário da Netflix, que se centra no percurso de Edson Arantes do Nascimento desde o Mundial de Futebol de 1958, na Suécia, o primeiro que o Brasil ganhou e em que o jovem fenómeno Pelé se revelou, revelando também o Brasil ao mundo; e o de 1970, no México, em que Pelé, já então um mito nacional, se sagrou, e o Brasil com ele, tricampeão mundial, quatro anos após a desastrosa participação no Mundial de Inglaterra (para a qual Portugal contribuiu). Parte do filme é dedicado à relação de Pelé com a política, em especial com o regime militar que mandou no Brasil entre os anos 60 e meados de 80. A intenção não é crucificá-lo pelo seu prudente comportamento durante a ditadura dos generais, e aliás a esmagadora maioria dos entrevistados não o faz e até o compreende e aceita. O partido de Pelé era o futebol, a sua política era marcar golos e ganhar, e a sua missão era afirmar o Brasil através do seu génio em campo, fazer felizes milhões de brasileiros e maravilhar muitos outros milhões de fãs de futebol. Da Sibéria à Patagónia.

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A certa altura de Fake Famous, o documentário rodado pelo jornalista Nick Bilton para a HBO, visitamos uma garagem de uma vivenda em Los Angeles onde está instalado um cenário que reproduz o interior de um jacto particular. É ali que os candidatos a influenciadores do Instagram se dirigem para tirar fotografias em que simulam estar num luxuoso avião particular, a caminho de um qualquer destino de sonho. E como Bilton nos informa, o cenário “está com as reservas esgotadas para as próximas semanas”. Já antes o realizador tinha mostrado, em sua casa, como basta um tampo de sanita novo e uma fotografia do céu para simular a janela de um avião a jacto.

Estas são só duas das revelações sobre o vácuo, superficial, narcisista, hiperconsumista e bastante batoteiro mundo dos influenciadores das redes sociais, feitas em Fake Famous. Mas Nick Bilton, jornalista especializado em tecnologia que colabora com títulos como o The New York Times ou a Vanity Fair, e que se estreia aqui a realizar, quis ir mais longe na exposição da falsidade, da encenação e da fraude aberta que abundam neste meio. E para isso, propôs-se transformar em influenciadores do Instagram, por meios ilegítimos, três jovens anónimos seleccionados num casting, que tinham em comum a faixa etária, o desejo da fama e pouquíssimos seguidores na dita rede social.

São eles Dominique, aspirante a actriz e empregada numa loja de roupa; Wylie, um gay faz-tudo numa imobiliária; e Chris, candidato a designer de moda, todos vindos de vários sítios dos EUA para Los Angeles em busca da celebridade. A descrição da “fabricação” deste trio de influenciadores é acompanhada de depoimentos de vários peritos, desde jornalistas a empresários do Instagram que começaram por ser influenciadores (e também fizeram batota). Bilton mostra como se arranjam seguidores que são na realidade bots, identidades falsas que passam por pessoas reais, “likes” e comentários, comprados ou a hackers que tanto podem estar nos EUA como algures no Egipto ou na Sérvia, ou a bem organizadas e lucrativas empresas especializadas. O negócio da fama artificial no Instagram compensa bastante – e beneficia não só anónimos como também os que já são famosos.

Aprendemos igualmente como é fácil e pouco dispendioso simular, com a ajuda de uma pequena equipa e alguns bons conhecimentos, uma vida de luxo e lazer em mansões (alugadas à hora), piscinas de hotéis de cinco estrelas (encenadas no jardim de casa) e até mesmo vistosos destinos dentro e fora de portas (basta um fundo natural ou urbano convincente). Uma das empresárias do Instagram entrevistadas teve, quando era influenciadora, uma muito seguida e elogiada conta sobre Nova Iorque. Cidade onde nunca pôs os pés, e que fazia na Califórnia, onde vive. É o mundo da encenação, do faz-de-conta, do parecer, da ilusão glamorosa.

A experiência de Nick Bilton acaba por não resultar em pleno, e assim frustrar parcialmente o objectivo do filme, porque dois dos candidatos a influenciadores acabam por desistir. Wylie por medo de um troll que descobre o esquema e o interpela na net, Chris por se sentir desconfortável e querer vingar “por mérito próprio”. Restou Dominique, cujo percurso compensou em parte as desistências dos dois colegas, já que chegou aos 25 mil seguidores (quase todos falsos) e começou a receber produtos de graça para promover no Instagram e um convite com tudo pago para uma viagem a Los Angeles com outras influenciadoras. Ou será melhor chamar-lhes porta-vozes e montras ambulantes e acríticas de marcas?

O documentário termina abruptamente, com a chegada da pandemia da Covid-19, que impede Dominique de ir numas apetecíveis férias oferecidas. Mas que parece não existir para muitos influenciadores do Instagram, que continuam a postar fotos como se as suas vidas, e o mundo, estivessem exactamente na mesma. Nick Bilton introduz, no final, menções ao activismo político-social no mundo online, para fazer o contraste com a futilidade, o hedonismo e o comercialismo da subcultura dos influenciadores, mas resulta forçado, postiço e desnecessário. O ponto de Fake Famous já estava feito, mesmo apesar da experiência que preside ao documentário não ter sido totalmente conseguida.

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  • 3/5 estrelas
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Quando se está a sair de uma estação de serviço, não fica bem dar um toque numa carrinha e ir embora sem comunicar ao proprietário. Sobretudo se o dono da dita carrinha é caçador, tem uma cabeça de alce acabado de caçar a sangrar na caixa e um pastor alemão com ar de muito poucos amigos sentado na cabina. Mas é o que fazem Nadja e David, os protagonistas de Ponto Vermelho, um thriller assinado pelo sueco Alain Darborg, acabado de estrear na Netflix. E está mais do que claro que se vão arrepender amargamente de terem batido e ido embora como se não fosse nada com eles.

David e Nadja vivem na cidade e decidiram ir acampar na neve no interior da Suécia, para animarem o casamento. Uma vez instalados na tenda com o seu cão, tudo parece normal e calmo, até que na primeira noite o casal repara no ponto vermelho da mira laser de uma espingarda que lhes percorre os corpos e o interior da tenda. Primeiro, pensam tratar-se de uma brincadeira de mau gosto por parte de alguns garotos. Mas quando as balas começam a zunir em seu redor, percebem que não é brincadeira nenhuma e que alguém os quer ou matar, ou afugentar e deixar perdidos no meio da neve. Ainda por cima, Nadja ocultou a David que está grávida. E não podia haver pior altura do que esta para o dizer ao marido.

Aí até pouco mais de metade dos seus 80 e poucos minutos de duração, Ponto Vermelho assemelha-se em tudo à versão sueca de uma série B de acção americana, daquelas em que um casal vindo da cidade para o interior, para desfrutar do ar livre e das paisagens de sonho, melindra uns pacóvios quaisquer ou infringe alguma norma local, e começa a ser caçado implacavelmente, tendo que procurar sobreviver no meio de uma natureza que não conhece e onde não se sente à vontade. Só que Alain Darborg tem algumas surpresas na manga, que fazem com que, em Ponto Vermelho, o que julgávamos óbvio e previsível afinal não o seja.

Dar muitos pormenores sobre o que acontece a seguir é estragar o filme para quem o vai ver. Diga-se apenas que Nadja e David partilham um segredo que assombra muito especialmente o marido; que quem os está a perseguir e a aterrorizar pode não ser quem o filme anteriormente sugeriu que eram, mas sim alguém directamente relacionado com esse segredo que o casal oculta; e que, a partir de certa altura, Ponto Vermelho rompe com as convenções, as personagens-tipo e as situações feitas do modelo de série B americana que parecia ir contemplar obediente e competentemente. Para se transformar em algo muito diferente, mais dramático e mais diabólico, rumo a uma resolução completamente inesperada.

Alain Darborg atrapalha-se aqui e ali com a exposição da história, em especial quando os flashbacks começam a cair, e há um par de momentos em que Ponto Vermelho força a plausibilidade e desafia a nossa suspensão da descrença. Mas, se há uma coisa de que não podemos acusar o realizador, é de não ter tentado ser original e surpreender-nos com um formato em que tudo parecia convidar ao respeito confortável pelas normas.

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Este filme inglês, estreado na Netflix, é uma ficção centrada na célebre descoberta, em 1939, em Sutton Hoo, no Suffolk, de um barco anglo-saxónico do século VI que servia de túmulo e continha um precioso tesouro. Ralph Fiennes é Basil Brown, o arqueólogo autodidacta que fez a descoberta, e Carey Mulligan personifica Edith Pretty, a dona do terreno onde o barco estava enterrado. Rodado com aquele sentido único de recriação de época de que os ingleses têm o segredo – nada parece um adereço e tudo tem um ar vivido, usado –, A Grande Escavação revela-se uma boa surpresa, pelo tom melancólico e pela recusa de clichés melodramáticos do argumento de Moira Buffini, e pela maneira como Simon Stone, com recato emocional e de forma subentendida, e aproveitando o clima de apreensão e angústia que se vivia no início da II Guerra Mundial, torna o filme numa fina meditação sobre a fragilidade da vida e a inevitabilidade da morte, e o sentido de continuidade humana conferido por descobertas como esta. Fiennes e Mulligan interpretam em perfeita sintonia de understatement e o elenco de secundários é impecável.

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Dois polícias, um camião blindado cheio de presos que vão ser transferidos através de estradas isoladas, uma noite fria e escura de um Inverno cerrado, um estranho que assalta violentamente o camião, um lago gelado. É com estes poucos ingredientes que o catalão Lluíz Quílez faz a festa do thriller em Abaixo de Zero, a sua segunda realização (após Out of the Dark (2014), um filme de terror rodado na Colômbia com actores anglo-saxónicos), e que pode ser visto na Netflix.

Escrito por Quílez a meias com Fernando Navarro, um argumentista que se tem dividido entre a televisão e os filmes Abaixo de Zero é mais um bom exemplo da robustez, da variedade, da capacidade de produção e de cultivar todo o tipo de géneros, e dos meios financeiros e técnicos à disposição do cinema espanhol. O filme pode perfeitamente, em todos os aspectos, pedir meças a qualquer produção média americana, reiterando ainda a consistência do cinema que se faz na Catalunha, entre outras regiões de Espanha.

Martín (Javier Gutiérrez) é um policia que acaba de mudar de esquadra, e tem como primeira missão conduzir um transporte de reclusos que vai levar presos de uma cadeia para outra. Entre eles encontra-se o perigoso líder de um gang romeno. Estamos no pino do Inverno, faz muito frio e está nevoeiro e a viagem decorrerá de noite, por estradas secundárias que atravessam uma serra desolada. Martín tem como parceiro de viagem Montesinos (Isak Férriz), um veterano ríspido e brusco, e à frente do camião segue um carro de escolta com dois agentes.

A meio da viagem, o carro de escolta é neutralizado e o camião blindado brutalmente atacado. Martín consegue sobreviver e refugiar-se dentro da viatura, enquanto os presos se movimentam para o manietarem e tentarem escapar. Mas o ataque não foi feito por um bando para libertar o mafioso romeno, como chegam a pensar o próprio, o polícia e os outros reclusos. Lá fora está só um homem, que quer deitar a mão a um dos presos. E vai fazer tudo para obrigar o pequeno grupo aglomerado no interior do blindado a entregá-lo. Até matá-los um a um, se necessário.

Abaixo de Zero tem um enredo maneirinho com pinta de série B, personagens sucintamente caracterizados, acção compacta, tensão latejante, atmosfera claustrofóbica, desenvoltura cinematográfica e um mistério no centro. Através do qual o realizador introduz um dado humano que vai fazer a diferença e dar uma volta na história, ao serem reveladas as motivações do assaltante do blindado, Miguel (o veterano Karra Elejalde) e o porquê da sua obsessão por Nano, o jovem delinquente que fica aterrorizado ao saber quem o procura.

Entretanto, o dia começa a raiar e Lluíz Quílez tira o camião blindado, e o filme, do meio da estrada e da escuridão, rumo a um duplo clímax. Primeiro, no meio de um lago gelado, para encenar uma salvação in extremis (e a forçar os limites da credibilidade) e depois numa aldeia deserta, para o necessário confronto final, em que Martín, a certa altura, irá deixar que a sua condição de pai fale mais alto que a de polícia. Abaixo de Zero é o filme certo para ver numa noite fria e agreste, com uma manta pelos joelhos e uma bebida bem quente na mão.

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O húngaro Kornél Mundruczó abre Pieces of a Woman, o seu primeiro filme em língua inglesa, estreado na Netflix, com um rolo compressor de tragédia sofrida, gritada e chorada, para a seguir passar todo o resto da história em surdina emocional. Num longuíssimo, serpenteante e aflitivo plano-sequência de quase meia hora, Mundruczó filma o parto caseiro falhado de Martha Weiss (Vanessa Kirby), perante a impotência do marido e da parteira, que resulta na morte do bebé, uma menina.

Segue-se, na restante hora e meia de filme, em oito dias separados uns dos outros por um mês, o luto calado, contido e interiorizado de Martha; o desmoronar do seu casamento com o desfeito e desesperado Sean (Shia LaBoeuf); as fricções com a mãe, Elizabeth (Ellen Burstyn), uma viúva rica e dominadora; e um processo em tribunal contra a parteira. Apesar de se ambientar nos EUA, Pieces of a Woman é, na sensibilidade que o molda, no naturalismo impenitente, na abordagem formal e na gestão das emoções, um filme europeu, e de Leste. No papel de Martha, Vanessa Kirby, premiada no Festival de Veneza, é formidável e dá o mote dramático ao filme com a sua interpretação reservada, quase anestesiada. Embora por vezes haja reserva, elipses e metáforas a mais, e ansiemos por um repente de visceralidade melodramática.

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  • 3/5 estrelas
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Gal Gadot volta para mostrar que é uma excelente escolha para o papel de Diana Prince, a semideusa amazona da DC. Neste filme, ela desenvolve novos superpoderes da Mulher-Maravilha – incluindo a capacidade de se desenvencilhar de diálogos rendilhados – e dá um novo brilho a um franchise que enfatiza tanto a moralidade da história como as cenas espectaculares. A realizadora Patty Jenkins começa logo por aí: através de uma analepse que mostra uma jovem Diana (Lilly Aspell) a enfrentar adversários mais velhos numa espécie de versão sobredimensionada de Gladiador. Ela faz batota, e a mãe, Hippolyta (Connie Nielsen), ensina-lhe da forma mais dura que “nenhum herói nasce da mentira”. É uma cena de acção tão extraordinária que não nos importamos que o desfecho seja este. Mas a verdadeira batalha ainda está por vir: uma luta que se trava em Washington DC, nos anos 1980, entre a verdade e a mentira. É um mundo de lycras, bolsas à cintura e homens com comportamentos inapropriados. E Mulher-Maravilha 1984 não receia a arena política – afinal, o principal vilão é um empresário falhado feito celebridade televisiva com uma paixão por muros e péssimo corte de cabelo. É interpretado por Pedro Pascal, que corporiza o melhor vilão da DC em muito tempo. Mas não é o único antagonista neste filme (há ainda Barbara Minerva, papel de Kristen Wiig), e mesmo com 151 minutos nota-se uma certa dificuldade em manter o equilíbrio narrativo entre dois vilões, reservando ainda tempo para o romance entre Diana e Steve (Chris Pine). Claro que, para o final, a história torna-se um pouco pateta, e a prometida cena pós-créditos é só para fiéis devotos. Mas num ano em que o cinema tem visto tão pouco os seus espectadores, não podemos criticá-lo por se esticar um bocadinho.

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  • 3/5 estrelas
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Bela (Lúcia Moniz) e Jota (Ruben Garcia) vivem nos arredores de Londres com os três filhos, um dos quais, Lu (Maisie Sly), uma menina surda. Bela faz limpezas e Jota está desempregado. Um dia, na escola de Lu, detectam o que parecem ser marcas de agressões nas suas costas. O casal, que aguarda uma visita da Segurança Social para pedir um apoio, vê entrarem-lhe pela casa dentro um técnico e polícias, que os separam dos filhos, Lu, o rapaz mais crescido e a bebé Jessie. Foram sinalizados como pais violentos e vão viver um calvário, porque ao abrigo do sistema inglês as crianças serão entregues para adopção a famílias pagas para o efeito. Apesar de um ou dois pormenores que forçam a verosimilhança (os médicos que examinam Lu não verem que a menina não foi agredida, e tem sim uma doença de pele), Listen conta esta aflitiva história do estilhaçar de uma família, e mostra a realidade chocante de um sistema que peca por excesso de zelo na protecção das crianças, com muita economia narrativa e dramática, e sem pieguice. Surda mas sempre atenta, a frágil Lu é o pivô emocional do filme.

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  • 3/5 estrelas
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Vale a pena viver uma vida infeliz? O que nos espera para lá da morte? As questões que o último filme da Pixar coloca não são o ponto de partida habitual para uma animação. A história segue Joe (Jamie Foxx), um professor de música que sonha ser um pianista de jazz, até que um acidente lhe separa a alma do corpo. E, a menos que consiga persuadir uma alma perdida e mal-humorada (Tina Fey) de que vale a pena viver, vai deixar passar a sua grande oportunidade. Mesmo quando o artifício narrativo da corrida contra o tempo começa a parecer desgastado, o mundo do filme brilha.

O título tem um inteligente duplo sentido: a ascensão ao reino espiritual e o fervor associado à cultura afro-americana. O dramaturgo Kemp Powers, que assina a realização e o argumento com Pete Docter (Up – Altamente e Divertida-Mente), deixa aqui a sua marca indelével: do brilho da pele negra à textura de uma afro e à autenticidade das conversas na barbearia. Nada disso é forçado, e é testemunho do envolvimento de pessoas que viveram de facto essas experiências. Se há algo a apontar, é que Soul é demasiado ambicioso nesse campo. A magia e a graça estão lá, mas falta a consabida habilidade da Pixar em tornar temas complexos apelativos para os jovens. Misturando coração e angústia existencial, fala mais para gerações mais velhas do que para os mais pequenos. É inteligente e, sim, comovente, mas nunca chega a levantar voo.

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  • 3/5 estrelas
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Condenado por “difusão de propaganda” e impedido de trabalhar pelo governo, que também baniu os seus filmes, o iraniano Mohammad Rasoulf ganhou o Festival de Berlim com esta fita realizada através dos seus assistentes. Estes rodaram quatro curtas-metragens sem referir o nome de Rasoulf, que ele juntou depois num só filme. As histórias são unidas pelo facto de os protagonistas desempenharem ou terem desempenhado tarefas de execução de prisioneiros, dissidentes políticos ou criminosos de direito comum. Alguns não são afectados por isso e vivem vidas normais, outros revoltam-se ou arrependem-se por razões morais, íntimas ou porque alguém os impele a isso. O Mal Não Existe transporta uma mensagem contra a pena de morte e a política de execuções sancionadas pelo Estado iraniano em particular, bem como de possibilidade de resistência ao regime teocrático. As melhores histórias são a primeira e a terceira, e o filme é desigual do ponto de vista de construção e interesse narrativo, impacto dramático e interpretações, e longo demais. Mas há que ter em conta as condições adversas, e arriscadas, em que foi rodado.

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  • 3/5 estrelas
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Primeiro Amor
Primeiro Amor

O japonês Takashi Miike, autor de fitas de culto como Anjo ou Demónio ou Uma Chamada Perdida, filma muito, mesmo muito, e a qualidade nem sempre se compagina com a quantidade. Mas quando Miike acerta é em cheio, como sucede em Primeiro Amor, o seu 103.º filme, uma série B como o cinema americano costumava fazer e cujo modelo parece agora ser mantido vivo em cinematografias asiáticas como a japonesa. Primeiro Amor empurra-nos sem cerimónia para o mundo do crime nipónico, onde os bandos de Yakuzas estão a sofrer a concorrência, no seu próprio terreno, dos gangues chineses, que não respeitam nada, nem a honra. A intriga – frenética, convoluta de dar torcicolos e bem recheada daquela violência gráfica mas criativa que está no ADN do cinema de Miike – mete um jovem pugilista com um tumor no cérebro e pouco tempo de vida, e uma prostituta junkie, no meio de uma teia de traições em cadeia entre Yakuzas, chineses e um polícia corrupto, por causa de um saco cheio de droga. Primeiro Amor é pulp fiction à japonesa, com marca de garantia do realizador. Basta olhar para o Sr. Wang, o bandido chinês sem um braço mas exímio no uso da shotgun.

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Entre 2014 e 2017, a unidade policial de elite iraquiana Nineve foi a única que se manteve a combater continuamente os terroristas do Estado Islâmico (EI) na cidade de Mossul. Esta unidade tinha a característica de ser formada por homens naturais de Mossul que tinham sido feridos pelo EI ou tido membros da família mortos por este. A vingança tornava-se assim na sua principal motivação em combate. É nos restos desta unidade que, em Mossul, escrito e realizado em estreia por Matthew Michael Carnahan (em exibição na Netflix), é espontaneamente integrado Kawa (Adam Bessa), um jovem polícia, após ter sido salvo de ser morto pelos terroristas num tiroteio. Um tio dele foi assassinado pelo EI.

Apesar de ser produzido por americanos (entre eles os irmãos Joe e Anthony Russo, associados à série Vingadores da Marvel), e escrito e realizado por um americano, Mossul é a primeira fita sobre a guerra no Iraque feita do ponto de vista dos iraquianos, quase unicamente interpretado por actores árabes e todo falado em árabe (baseia-se numa reportagem da New Yorker da autoria do jornalista Luke Mogelson sobre a unidade Nineve).

É um filme de guerra de série B puro, duro e desapiedado, directo como uma bala de Kalashnikov, com pouca ou nenhuma contextualização, análise ou homilia geopolítica, que espeta de passagem duas ou três farpas nos EUA (o oficial que lidera a unidade rejeita a dado momento chamar apoio aéreo americano porque “eles destroem e não têm depois de reconstruir”) e deixa sinteticamente, na boca de um dos protagonistas, a atitude do iraquiano médio sobre a situação actual do seu país e o seu futuro: “Não queremos o Saddam, nem os americanos, nem os iranianos, nem o Estado Islâmico!”

Filmado por Carnahan com uma câmara quase constantemente inquieta, como se fosse a de um repórter de imagem que estivesse colado aos combatentes no terreno, Mossul atira-nos para o meio dos confrontos de rua na cidade devastada através de Kawa, que rapidamente tem o seu baptismo de fogo e passa de neófito tenrinho a veterano endurecido. A pouco e pouco, tal como ele, vamos percebendo qual é o estatuto da unidade e por que é que os seus membros se comportam de forma tão irregular, mas só mesmo no final – quando o sentimentalismo faz a sua única intromissão na narrativa – compreendemos qual era a missão.

Pelo caminho, há confrontos sangrentos com o EI que vão reduzindo ainda mais os já escassos efectivos da unidade Nineve; um interlúdio em que os membros desta param para descansar, ver um episódio de uma telenovela kuwaitiana e discutirem as vantagens e desvantagens de se ter uma ou três mulheres; e um encontro tenso com um oficial das Forças Especiais do Irão que comanda um grupo de militares e polícias iranianos e iraquianos.

Matthew Michael Carnahan faz-nos sentir que estes homens estão a combater na sua cidade, por ela e pelos seus, o que é mais um factor de diferenciação de Mossul de todos os outros filmes americanos, ou ocidentais, sobre o mesmo tema. E tem no vulpino actor sudanês Walled Elgadi, que interpreta o coronel Kaveh, um antigo detective da polícia iraquiana e agora oficial da polícia de elite, um líder carismático, lacónico e determinado para a Nineve. Agora que as estreias de cinema são escassas e irrelevantes, as boas surpresas encontram-se no streaming. E Mossul é uma delas.

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Este O Fim do Mundo será talvez o que de mais próximo no cinema português se fará de um hood movie americano, mas sem os clichés sociais, a violência estereotipada e as doses cavalares de rap. Está à medida da realidade em que se passa e que revela. A desesperança, mais do que a raiva ou a revolta, é o sentimento que predomina. Segunda longa-metragem do luso-suíço Basil da Cunha, O Fim do Mundo segue Spira (Michel David Pires Spencer), um rapaz que passou oito anos numa casa de correcção e regressa ao bairro da Reboleira, onde nasceu e cresceu, e à casa da madrasta e dos dois irmãozinhos. As casas do bairro estão a ser demolidas aos poucos, há tensão e agressividade no ar, os seus amigos traficam droga, cometem pequenos delitos e preguiçam, e a rapariga que Sipra quer impressionar tem já um filho pequeno e é malvista pelas mulheres da zona. Não há nada a que ele se possa agarrar e cedo volta ao mesmo, que é quase nada. Trabalhando com os moradores do bairro e actores quase todos não-profissionais, Basil de Cunha assina um filme limitado mas honesto, no retrato, no discurso e no desconsolo.

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  • 3/5 estrelas
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A história de Maria Adelaide Coelho da Cunha, filha de Eduardo Coelho, fundador do Diário de Notícias, co-proprietária do mesmo e mulher do seu director, Alfredo da Cunha, já foi contada várias vezes nos media, num filme, Solo de Violino, de Monique Rutler (1990) e num livro, Doida Não e Não!, de Manuela Gonzaga. Em 1918, aos 48 anos, a culta e rica Maria Adelaide fugiu com Manuel, o motorista da família, pouco mais velho do que o seu filho, causando enorme comoção social. Alfredo da Cunha mandou prender Manuel e internou a mulher num hospital psiquiátrico, sendo diagnosticada como “louca lúcida” por Júlio de Matos, Egas Moniz e Sobral Cid. Ela conseguiu sair em 1920, escreveu um livro sobre o caso e libertou o amante em 1922, com o qual ficou até morrer, em 1954. Em Ordem Moral, e com Maria de Medeiros no papel principal, Mário Barroso revista esta história de uma paixão escandalosa com rigor formal e poder de síntese, embora a intriga tivesse beneficiado de maior voltagem dramática.

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  • 3/5 estrelas
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Perante Verão de 85, os conhecedores da filmografia de François Ozon poderão ficar com a sensação que esta fita está como que deslocada do conjunto. Não andam longe da verdade, porque ela esteve para ser a longa-metragem de estreia do realizador, que aos 17 anos se entusiasmou com o romance Dance on my Grave, do inglês Aidan Chambers, e resolveu que o transformaria no seu primeiro filme. Acabou por não ser assim e só agora Ozon, com mais de 50 anos, concretizou esse desejo de juventude.

Este teen movie pega no velho tema do amor de Verão que marca para o resto da vida e conta-o num contexto homossexual. Estamos em 1985, numa estância balnear da Normandia. Alexis (Félix Lefevbre) vive ali com os pais há dois anos e é um rapaz de 16 sem experiência sexual e sentimental. Um dia, vai velejar, há uma súbita tempestade de Verão e o barco vira-se. Surge então David (Benjamin Voisin), que ajuda o rapaz a voltar ao barco e o reboca até ao porto.

David tem 18 anos, um brinco e uma moto, mais rodagem de vida e de amores que Alex, vive com a mãe e trabalha na loja de artigos de pesca desta. Alex deixa-se fascinar pela espontaneidade, generosidade e energia de David, a mãe deste oferece-lhe um emprego de Verão na loja e, uma noite, depois de uma rixa numa feira, Alex e David passam de amigos a namorados.

Mas enquanto o tenro e ingénuo Alex se deixa arrebatar pela relação, o mesmo já não sucede com o blasé e sexualmente omnívoro David, que um dia se envolve com Kate, uma rapariga inglesa que Alex conheceu na praia. Transtornado de ciúmes, Alex confronta David com a traição e ambos dizem um ao outro daquelas palavras que magoam fundo e que, uma vez ditas, já não podem ser retiradas. Alex sai da loja em lágrimas, furioso, e foge na sua bicicleta; David pega na moto para ir atrás dele e a tragédia acontece. Seguida de um equívoco que levará Alex perante a lei.

Contado em flashback por Alex, Verão de 85 é um filme de primeiro amor adolescente em ambiente estival, que François Ozon leva para longe da habitual ligeireza destas histórias (há um subenredo sobre o interesse que Alex tem pelo tema da morte e pelos rituais do Antigo Egipto que lhe estão associados, e que vai ser importante para a narrativa principal). E embora envolva dois rapazes, podia muito bem passar-se entre um rapaz mais novo e uma rapariga um pouco mais velha, ou o contrário.

O tom do filme nunca é demasiado carregado, como se Ozon nos estivesse a dizer que, apesar de tudo que se passou, não estamos perante o fim do amor ou do mundo, embora pareça que sim a Alex. O realizador dá-nos a época através de pormenores do décor, de objectos, das roupas e das músicas de então, sem forçar qualquer nota nem jogar a cartada da nostalgia, e os dois rapazes são muito bons. Verão de 85 não é um Ozon de primeira linha e, embora tardio na concretização, é perfeitamente coerente em termos da sua filmografia. Talvez tenha até beneficiado com o facto de Ozon só o ter feito aos 50 anos em vez de aos 20, como queria.

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  • 3/5 estrelas
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Ben Affleck interpreta nesta fita de Gavin O'Connor, um homem com um talento especial que ficou com a vida destroçada por uma tragédia familiar, perdeu o norte, começou a beber e alienou os que lhe são mais próximos, e que tem de repente uma oportunidade para se redimir, ao mesmo tempo que ajuda outras pessoas. A história de O Caminho de Volta já foi filmada muitas vezes, mas O'Connor conta-a aqui com uma sobriedade, um domínio da elipse e uma contenção da euforia "inspiradora" que desvia o filme dos estereótipos melodramáticos e das expectativas de resolução confortável. E Affleck parece ter andado a estudar Clint Eastwood para conseguir esta interpretação em soberbo underacting.

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
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Mais de cinquenta anos depois de Um Homem e uma Mulher, e após uma continuação inútil em 1986, Uma Homem e uma Mulher: 20 Anos Depois, Claude Lelouch reencontra Jean-Louis (Jean-Louis Trintignant) e Anne (Anouk Aimée), ele internado numa casa de repouso e a perder a memória, ela dona de uma lojinha, e assina um filme crepuscular mas nunca pesaroso sobre o envelhecimento e a sobrevivência do amor, recorrendo a imagens do original e jogando com a memória, o sonho, o espaço e o tempo. Os quase nonagenários, Trintignant e Aimée são serenamente imperiais.

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  • 3/5 estrelas
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A nova longa-metragem animada da Pixar, realizada por Don Scanlon, não está ao nível de Coco ou Toy Story 4, mas é suficientemente agradável e tecnica e narrativamente superior á maior parte da concorrência. A história de 'Bora Lá passa-se num muito em muito semelhante ao nosso, só que habitado por criaturas do universo da mitologia, da fantasia e da espada e feitiçaria, remete para o universo dos jogos de tabuleiro como o clássico Dungeons & Dragons, celebra a família e o amor e a cumplicidade fraternal, e tem bastante e bom humor.

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  • Suspense
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Desde o seu filme de estreia, Um Mal Nunca Vem Só (1998), que Guy Ritchie não fazia nada tão decente como este The Gentlemen-Os Senhores do Crime, que marca o regresso do realizador ao seu ecossistema, o meio dos gangsters londrinos e toda a sua circunstância, e ao género que o tornou célebre: a comédia de acção policial com sotaque cockney, composição multiétnica, bastante vernáculo e alguns atrevimentos politicamente incorrectos. Com Matthew McConaughey num americano que pôs de pé um milionário negócio de marijuana em Inglaterra, Hugh Grant num jornalista sem pinga de ética, e ainda Michelle Dockery, Charlie Hunnam, Eddie Marsan e Colin Farrell, que usa os fatos de treino mais foleiros deste hemisfério.

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
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Não fossem os actores (entre eles Juliette Binoche, Guillaume Canet e Vincent Macaigne), a qualidade da escrita de Olivier Assayas e a câmara lesta com que filma as suas personagens, e este Vidas Duplas, passado em Paris no mundo da edição e do livro, com incursões pela televisão e pelos media, onde toda a gente fala pelos cotovelos, e quase exclusivamente de temas da actualidade com viés intelectual e cultural, seria uma presunçosa, prolixa e insofrível estopada "à la française". E, claro, andam todos a a pôr os palitos aos respectivos maridos e mulheres com a maior descontracção e sem estados de alma.

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  • 3/5 estrelas
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Candidato a 10 Óscares, este filme de Sam Mendes simula ser rodado num único plano-sequencia. Este dispostivo formal esconde sem dúvida um grande e exaustivo trabalho de direcção artística, técnico e com os actores, e a intenção de Mendes e do director de fotografia, mestre Roger Deakins, não é chamar a atenção para ele nem andar a fazer malabarismos visuais para embasbacar o espectador (embora por vezes seja inevitável que a câmara em falsa continuidade faça sentir a sua presença). Mas está ao serviço de uma história de fórmula - dois soldados incumbidos de uma missão aparentente suicida, e com o tempo contado, na I Guerra Mundial - e após um bom arranque, as peripécias dos protagonistas vão parecendo, pouco a pouco, que se desenrolam nos níveis sucessivos de um jogo de vídeo e menos na realidade suja, horrenda e sangrenta das trincheiras e do campo de batalha.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
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PJ Harvey andou com o fotojornalista Seamus Murphy por sítios tão diversos como o Afeganistão, o Kosovo e os EUA, em busca de informação, inspiração e sons para o seu álbum The Hope Six Demolition Project. Este documentário do próprio Murphy é como que um registo de esboços, impressões, momentos e instantâneos dessas viagens, alternando com imagens da gravação do disco, em Londres.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A matriarca de uma família chinesa está a morrer de cancro e não sabe. Os parentes - como parece que é costume fazer-se na China - decidem ocultar-lhe o facto e apressam o casamento de um neto, para que toda a família possa estar junta com ela uma última vez. A única pessoa que estranha o facto é a neta Billi (Awkwafina), que vive nos EUA com os pais há 30 anos. Baseada num acontecimento da sua própria família, a sino-americana Lulu Wang assina aqui um melodrama contido e afectuoso, com vários momentos de comédia, sobre as diferenças geracionais, culturais e de identidade, e sobre a força da família, que tudo transcende e une.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O último filme da ‘Saga Skywalker’, realizado por J.J. Abrams, é em parte ainda fiel ao espírito da saga iniciada por George Lucas há mais de 40 anos, numa Hollywood muito, muito distante, em parte invadido pelo modelo das fitas de super-heróis que dominam agora a indústria cinematográfica americana. A Força ainda se aguenta neste desigual Episódio IX, mas chegou mesmo ao fim da linha.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Em crise anímica e existencial, o presidente da Câmara de Lyon decide contratar para a sua equipa uma licenciada em Filosofia, para o "ajudar a pensar" e voltar a dar gosto e vontade pela acção política. Este filme de Nicolas Pariser, com Fabrice Luchini e Anaid Demoustier, é uma sátira gentil aom mundo da política na sua declinação autárquica, e ao desatino e à impotência que se abateram sobre a esquerda francesa (o político é um figurão do Partido Socialista), mas também o retrato de duas frustrações que se encontram: a de homem público desencantado e a de uma cidadã anónima insatisfeita. Pariser podia era ter posto mais ritmo no filme e aumentado um bocadinho o volume da comédia.

Por Eurico de Barros

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  • Romance
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Se Last Christmas não é totalmente irresistível nas cenas emotivas, e se os seus momentos pirosos são na fronteira da indigestão, a sua efervescência torna-o divertido o suficiente para ver. Pelo menos, vai fazê-lo cair de amores pelo outro protagonista do filme: Londres.

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
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Inspirado em Dez de Kiarostami, Tempo Comum confirma que é necessária uma aldeia para criar uma criança. Uma comunidade que se aflige, interfere e explica. Susana Nobre filma a chegada a casa de Clarinha, filha da programadora Marta Lança e do cineasta Pedro Castanheira, numa criação de raiz documental em que a realizadora encena e fornece os diálogos, mas que não pretende dissociar-se da realidade. Falta-lhe, no entanto, um lampejo que o leve além da tranquila arrumação narrativa, para além das trocas epistolares de histórias.

Por Hugo Torres

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Eddie Redmayne e Felicity Jones sobem para um balão na Inglaterra vitoriana nesta fita de Tom Harper. Ele é James Glaisher, astrónomo, balonista e pioneiro da meteorologia (que existiu na realidade), ela é Amelia Wren, uma intrépida piloto de balões (que não existiu e é um compósito de várias mulheres balonistas da época). Juntos, vão fazer medições científicas, e enfrentar os elementos e desafios pessoais. Quando está no chão, Os Aeronautas cede ao peso dos lugares comuns. Mas no ar, e graças a uma perfeita conjugação de efeitos digitais e cenas rodadas num balão igual aos da altura, o filme é belíssimo e vertiginoso. E presente panorama de estreias, revela-se uma inesperada, simpática e muito competente excentricidade.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 3/5 estrelas
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Rian Johnson escreveu e realizou Knives Out - Todos São Suspeitos, parte pastiche com todos os efes e erres dos whodunits tradicionais da tendência Agatha Christie, parte versão em imagem real do Cluedo, parte história policial com existência própria e injectada com uma óbvia mensagem anti-Trump. O enredo, envolvendo a morte sangrenta de um velho e riquíssimo escritor de livros policiais, os seus odiosos e gananciosos familiares e a sua dedicada enfermeira, é absorvente, contorcionista e impermeabilizado contra a inconsistência, e os actores (Christopher Plummer, Don Johnson, Jamie Lee Curtis, Don Johnson. Michael Shannon, Toni Collete, Ana de Armas, Chris Evans) estão todos muito bem. Mas é Daniel Craig quem "rouba" o filme, no papel de um colorido detective particular sulista com um sotaque arrevesadíssimo.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
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Costa-Gavras leva ao cinema o livro do ex-ministro das Finanças grego Yannis Varoufakis, que mergulha nos bastidores das negociações do governo do Syriza com a Troika, em 2015, para salvar a Grécia do colapso económico e da saída do Euro. Apesar dos seus defeitos (algum maniqueísmo, estilo de telefilme anónimo, um final grotesco), Comportem-se Como Adultos tem o mérito de mostrar a arrogância, a hipocrisia e a fria brutalidade económico-financeira dos eurocratas não-eleitos e a forma como levaram a melhor sobre a vontade política de um governo legítimo e sobre a soberania nacional grega, denunciando o monstro que foi criado em Bruxelas sob a enganadora capa da "união europeia".

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
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Um retrato da comunidade pesqueira de Ribeira Quente, na ilha açoriana de São Miguel, que o realizador Rodrigo Areias compõe com referências aos livros Os Pescadores e As Ilhas Encantadas, de Raul Brandão, e leves pinceladas ficcionais, numa abordagem em que o documental não exclui o poético. Embora a sensação final é que fica tudo um pouco lasso, faltando a Hálito Azul um ponto de vista mais definido e firme.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
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Jean-François Richet conta, com trepidante eficácia, a forma como um malfeitor, François Vidocq (Vincent Cassel) se transformou no director da polícia em plena França napoleónica. O Imperador de Paris é ao mesmo tempo uma fita de época, uma história biográfica, um policial e uma aventura de capa, espada e espingarda, inscrevendo-se num tipo de cinema cada vez mais raro na produção francesa: o grande filme de indústria com qualidade e apelo popular.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
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Há 20 anos que Edward Norton queria levar à tela o livro homónimo de Jonathan Lethem publicado em 1999. Norton passou a acção dos nosso tempo para os anos 50 e mexeu bastante na história, e interpreta a personagem principal, um detective particular que sofre da síndrome de Tourette. E assinou um policial com fundo "social" (corrupção política, especulação imobiliária que castiga os desfavorecidos, discriminação racial) em que a recriação da época, o desenho dos ambientes e a interpretação de Norton são superiores ao enredo, estereotipado e previsível, e à tipificação de quase todas as personagens.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
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As Raparigas do Sol
As Raparigas do Sol

A francesa Eva Husson compagina o documental e o ficcional neste filme sobre um grupo de mulheres curdas que combatem o Estado Islâmico, acompanhadas por uma repórter de guerra. Husson nem sempre prima pela subtileza (sobretudo no uso da banda sonora) e abusa dos flashbacks, mas o filme cumpre com a sua intenção: retratar o sofrimento, a abnegação e a coragem das curdas que pegaram em armas para defender a sua terra, as suas famílias e a sua dignidade. Com Emmanuelle Bercot e a lindíssima e excelente Golshifeh Farahani  na líder da unidade feminina.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura

A importantíssima batalha da II Guerra Mundial travada em pleno Pacífico entre os EUA e o Japão, já foi recriada por Hollywood em 1976 em Midway, de Jack Smight, um filme carregado de estrelas da altura, de Charlton Heston a Robert Mitchum e Henry Fonda. Esta nova dramatização é assinada por Roland Emmerich, com Dennis Quaid, Woody Harrelson e Patrick Wilson no elenco.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
Missão YETI: Em Busca do Homem das Neves
Missão YETI: Em Busca do Homem das Neves

Nesta animação de longa-metragem produzida no Canadá e passada nos anos 50, um detective particular e uma jovem antropóloga partem numa missão para tentarem provar a existência do Abominável Homem das Neves.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

O cineasta filipino Brillante Mendoza (ServiçoMãe Rosa) assina esta fita passada durante uma operação das forças especiais das Filipinas, para capturarem um dos principais traficantes de droga de Manila.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
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Realizado e interpretado por Casey Affleck, Luz da Minha Vida é uma história pós-apocalíptica, mas anti-espectacular e intimista, passada num mundo onde um vírus desconhecido matou todas as mulheres. Affleck interpreta um pai que atravessa os EUA na companhia da filha adolescente (Anna Pniowsky), que disfarça para parecer um rapaz e a fita é uma parábola sobre o amor paternal e os laços que unem um pai e uma filha numa situação de dificuldade extrema e perigo constante, em vez de normalidade familiar e doméstica. Única falha do argumento: é difícil de acreditar que o pai não andasse armado num cenário destes.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

As redes sociais e os seus efeitos perversos nas relações entre as pessoas são um dos principais alvos satíricos de Agnès Jaoui no seu novo filme, mais uma vez escrito em parceria com Jean-Pierre Bacri, e com ambos desempenhando dois dos papéis principais. Mais ligeiro e previsível e menos bem afinado do que O Gosto dos Outros ou Deixa Chover, Na Praça Pública merece ainda assim uma visita.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Judy
Judy

Baseado na peça de teatro End of the Rainbow, de Peter Quilter, esta fita de Rupert Goold apanha Judy Garland falida, sem casa, separada dos filhos Joey e Lorna e a dar espectáculos em Londres, em 1969, nos últimos meses da sua vida. É a interpretação de Renée Zellweger como Garland que levanta Judy do seu profissionalismo cumpridor. Ela capta e comunica tudo: os caprichosos altos altos e baixos emocionais e anímicos da Judy privada, e a intensidade ora arrebatadora ora comovente da Judy vedeta, o sofrimento e a alegria, o tormento pessoal e o génio artístico. Zellweger está á altura da pessoa, da estrela e do mito que personifica.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Bryon Widner é um supremacista branco numa encruzilhada: depois de participar no espancamento de um jovem negro durante uma manifestação, o brutamontes, venerado entre pares, começa a duvidar do caminho da violência. Skin passa-se no Ohio, em 2009, e é baseado em factos reais. Bryon não é só uma personagem – é alguém que decidiu sair do movimento neonazi, penou para o conseguir (com a ajuda de um activista negro), agiu como denunciante para o FBI, e passou dois anos em dolorosas cirurgias para remover as tatuagens iconográficas do rosto.

Por Hugo Torres

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Conto das Doninhas
O Conto das Doninhas

Uma comédia negra protagonizada por quatro personagens ligadas ao cinema e que vivem juntas os últimos anos das suas vidas num casarão no campo, passando os dias às turras. Autor de O Filho da Noiva e do oscarizado O Segredo dos Seus Olhos, o argentino Juan José Campanella defende a terceira idade e brinca com as convenções e os clichés do cinema neste divertimento venenosamente cómico e amoral, mas inferior àqueles dois filmes.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Os fãs de Downton Abbey decerto que se deleitarão com esta filme, que parece um episódio especial da série sobre a aristocrática família Crawley e todos os que gravitam em seu redor, "puxado" para o grande ecrã. O enredo centra-se numa visita do Rei e da Rainha de Inglaterra à casa senhorial dos Crawley, que põe toda a gente em alvoroço e até tira o mordomo Carson da reforma, e do seu jardim. Maggie Smith, na sibilina Condessa de Grantham, volta a ter as melhores tiradas do argumento de Julian Fellowes, que dá a entender no final que este será o último capítulo da saga Downton Abbey.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Esta adaptação do best-seller de Donna Tartt que ganhou o Pulitzer de Ficção, um livro muito longo (quase 800 páginas), cerradamente romanesco e intrincadamente elaborado é o típico filme "de qualidade", prestígio e produção média que rareia no cinema americano. A história de Theodore Decker (Oakes Fegley na adolescência e Ansel Elgort na idade adulta), a personagem principal, convoluta, atarefada e rica em detalhes, peripécias e personagens, é contada pelo realizador John Crowley com o maior cuidado e a melhor arrumação possível, mas o último acto, em que tudo se explica e resolve, é atabalhoado e confuso.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Este filme-catástrofe norueguês é a continuação de Bolgen-Alerta Tsunami (2015), mantendo os mesmos argumentistas e intérpretes e mudando apenas o realizador. O geólogo Kristian Eikjord descobre desta vez que Oslo vai ser atingida por um enorme terramoto, mas ninguém o quer ouvir. O Terramoto segue todas as convenções deste subgénero, claro, mas fá-lo com limpeza, suspense, mais realismo e mais envolvimento humano do que os seus congéneres de Hollywood, e as sequências do tremor de terra não ficam a dever nada às dos blockbusters americanos.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Nanni Moretti regressa ao documentário para se debruçar sobre o 11 de Setembro de 1973, o golpe militar que instaurou uma ditadura no Chile. Em particular, sobre o papel da diplomacia italiana, que se comportou exemplarmente, resgatando chilenos perseguidos e oferecendo-lhes o estatuto de refugiados e uma vida nova na Europa (ao contrário do que ocorre hoje). Mas o realizador, que conduz várias entrevistas em modo televisivo, inclusive a dois antigos militares, não está à altura dos seus pergaminhos: o filme é morno e destituído de voz própria. Dir-se-ia preguiçoso.

Por Hugo Torres

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Acção militar, um ataque russo a solo europeu, submarinos nucleares em confronto nos mares. Dir-se-ia um filme americano baseado num livro de Tom Clancy, mas Ameaça em Alto Mar é, na realidade, uma produção francesa assinada por Antonin Baudry, que passou da banda desenhada (Quay d’Orsay) para o cinema. Tudo gira aqui em redor de um marinheiro especialista na análise sonora subaquática, e a tensão e o suspense criados por Baudry na longa sequência do jogo do gato e do rato às cegas entre os dois submarinos compensam algumas incongruências do argumento.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Os estreantes Tyler Nicholson e Michael Schwartz assinam este filmezinho indie sobre uma amizade inesperada, entre Zak, um rapaz com Síndrome de Down (tal como o seu intérprete, Zack Gottsagen) e Tyler (Shia LaBoeuf), um mecânico e pescador de caranguejos clandestinos. Zak evadiu-se do asilo de idosos para onde foi despejado, Tyler está a fugir de um pescador com maus fígados a quem queimou as armadilhas para se vingar dele ter insultado a memória do irmão morto, e metem-se numa jangada rumo à Florida. Mesmo com algumas convenções e um certo sentimentalismo reconfortante, O Falcão Manteiga de Amendoim é um filme constantemente sincero, excêntrico, caloroso e sem afectação.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Nunca estreado em Portugal, apesar de ter ganho o Festival de Tróia em 1985, esta fita do russo Elem Klimov chega agora em cópia restaurada. Passada na II Guerra Mundial, na Bielorrússia invadida pelos alemães Vem e Vê tem uma grande primeira parte, em que a guerra surge quase sem inimigo visível, vista pelo jovem protagonista apenas de raspão, à distância ou pela presença de quem já lhe sentiu os efeitos. Mas depois, Klimov resvala para o registo de fita propagandística de "grande guerra patriótica" do tempo do comunismo. Há mais cinema, terror e expressão no plano fugaz em que a rapariga vê os cadáveres dos aldeãos fuzilados, ao monte contra a parede de uma casa, do que em toda a segunda parte do filme, rebuscadamente grotesca e paroxística.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A jovem Grace (Samara Weaving) casa com Alex (Mark O’Brien), pertencente a uma rica e estranha família que fez fortuna com os jogos de tabuleiro de sociedade. Mal sabe ela que vai passar a noite do casamento a jogar aquilo que pode ser descrito como uma versão perversa, virada do avesso e mortífera do popular Cluedo. Esta fita de terror  e humor negro realizada pelo duo Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett é bastante previsível, mas tem um elemento sobrenatural que a eleva acima do já muito visto filme de “caça ao homem” (ou à mulher, neste caso).

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A crítica americana entrou em delírio com esta primeira realização da actriz Olivia Wilde, mas esta história de duas melhore amigas marronas (Kaitlyn Dever e Beanie Feldstein) que decidem tentar divertir-se, na última noite antes da cerimónia de fim de curso, como nunca o fizeram nos quatro anos de liceu, é mais um high school movie cheio de personagens, situações e gags típicos do género, só que agora com molho politicamente correcto. O filme vale pelo festival de comédia dado pela dupla Dever/Feldstein.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 3/5 estrelas
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Brian De Palma rodou este thriller sobre terrorismo islâmico e vingança, em vários países da Europa, com dinheiro dinamarquês e dois actores de A Guerra dos Tronos (Nikolaj Coster-Waldau e Carice van Houten), mas teve problemas de dinheiro que afectaram visivelmente a produção e por vezes a fita parece que está presa por fios. Mesmo assim, até um De Palma pelintra e com fragilidades de estrutura tem algo para deleitar os admiradores indefectíveis do autor de clássicos como CarrieVestida para Matar ou Blow Out-Explosão, e Domino-A Hora da Vingança, além de glosar temas queridos a De Palma (a confusão perigosa entre aparências e realidade, a conspiração oculta e o voyeurismo mórbido), mostra que ele não perdeu a capacidade de contar uma história por meios puramente cinematográficos, confiando apenas na câmara e na música (a banda sonora é do fiel Pino Donnagio), como se vê na sequência final do atentado na tourada com um drone.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O mundo sofre um estranho apagão global que dura 12 segundos e durante o qual Jack Malik (Himesh Patel), um cantor e compositor falhado, é atropelado por um autocarro quando segue na sua bicicleta. Após sair do hospital, Jack repara que foi projectado para um mundo paralelo, em que os Beatles nunca existiram. E como é um fã dos Fab Four, apropria-se das canções deles e transforma-se num fenómeno da música pop e numa vedeta planetária. Escrito por Richard Curtis e realizado por Danny Boyle, Yesterday tem vários bons momentos cómicos e de sátira à indústria musical  e ao culto da fama, mas sucumbe a um final convencionalmente “redentor”, tão sentimentalão como fake.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Os Mortos Não Morrem
Os Mortos Não Morrem

Jim Jarmusch vai de visita ao território dos mortos-vivos nesta comédia negra com um elenco que inclui Bill Murray, Adam Driver, Steve Buscemi, Selena Gomez ou Tom Waits, mas o resultado é menos bom do que quando deu um safanão ao filme de vampiros com Só os Amantes SobrevivemOs Mortos Não Morrem mistura o bom e o falhado, e Jarmusch é, desta vez, de tal forma descontraído e as suas personagens principais tão imperturbáveis perante os acontecimentos insólitos e horrendos que se dão em seu redor, que o filme se torna arbitrário e desleixado. Mas também há momentos muito bem achados e o realizador não recua perante a exibição de zombies infantis, coisa raramente vista nos filmes e nas séries de televisão deste género, e as suas personagens, ao contrário do que costuma acontecer no cinema de terror, mostram que vêem filmes destes, conhecem os monstros e as criaturas que os povoam e sabem como lidar com eles.

Por Eurico de Barro

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Na sua terceira realização, Ralph Fiennes faz um retrato de Rudolf Nureyev (bem interpretado em estreia pelo bailarino ucraniano Oleg Ivenko), centrando-se na sua fuga para o Ocidente, em Paris, em 1961, quando tinha apenas 23 anos e andava em digressão pela Europa com o Ballet Mariinsky, e partindo daí em flashbacks para o seu passado. Embora com meios limitados e de forma sintética, Fiennes, que também consta do elenco, consegue captar a personalidade altiva, individualista e emocional de Nureyev, e sugerir o seu excepcional talento de bailarino.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A etiqueta para a qual Luciano Pavarotti gravou durante a sua vida participou na produção deste documentário biográfico de Ron Howard, pelo que não se espere aqui uma análise muito crítica e objectiva da vida e da carreira do tenor italiano. Mesmo assim, e sempre frisando o imenso carisma, a personalidade solar, a simpatia natural, a natureza generosa, a voz prodigiosa e o sentido de comercialização da mesma do seu biografado, Howard não deixa de se demorar nos aspectos menos edificantes da vida pessoal e familiar de Pavarotti, deixando também bastante informação sobre os anos de aprendizagem dele e o seu trabalho para desenvolver e manter os espantosos dotes vocais de que dispunha.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Por um lado, esta realização de Ciro Guerra (O Abraço da Serpente) e Cristina Gallego é mais umdrug movie sobre o tráfico na Colômbia, passado nos anos 70 e 80, e envolvendo os índios Wayuu, que começaram a negociar marijuana com o exterior. Por outro, Pássaros de Verão é um filme sobre como o modo de vida ancestral, as tradições, lealdades de grupo e costumes dos mesmos Wayuu foram radicalmente afectados pela sua entrada no mercado da droga. Simbolicamente, Guerra e Gallego estão também a falar da própria Colômbia e de como os cartéis da droga trouxeram a violência, a corrupção e o opróbrio ao país.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Nicola tem 15 anos, vive em Nápoles, tem um telemóvel, uma scooter e uma namorada. Mas quer ter muito mais, e por isso junta-se à Camorra, a mafia local, para roubar, traficar e matar para ela, no risco de também ser morto um dia. Este filme de Claudio Giovannesi baseia-se no romance do escritor e jornalista Roberto Saviano, que também colaborou no argumento, mas é menos cru e brutal do que o livro, a personagem de Nicola muito menos amoral e cruel, e Giovannesi prefere glosar os temas da perda da inocência e do trágico desperdício da adolescência dos jovens protagonistas às mãos do crime organizado. Mesmo assim, Piranhas-Os Meninos da Camorra bate duro e fundo.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O irlandês Mark Cousins (A História do Cinema: Uma Odisseia) parte, neste documentário, de uma série de desenhos e pinturas de Orson Welles, para através deles oferecer a sua interpretação dos filmes do realizador (e fá-lo quase sempre com pertinência e de forma convincente) e também da sua personalidade e vida (aqui, já não é tão feliz e faz várias afirmações e tira conclusões forçadas, quando não mesmo arriscadas). O principal interesse de Os Olhos de Orson Welles acaba por ser os desenhos, pinturas, caricaturas e esboços de Orson Welles aqui revelados, muitos dos quais nunca vistos antes, embora esta sua faceta artística não seja de todo desconhecida.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
X-Men: Fénix Negra
X-Men: Fénix Negra

Primeiro, as boas notícias. X-Men: Fénix Negra até se vê bem e é uma adição razoável a uma série cinematográfica que parecia ter sido esticada até ao ponto de ruptura. É visualmente apelativo e nem os cenários nem os actores envergonham. Sem ser tão bom como Logan, é melhor do que o anterior X-Men: Apocalipse. Por outro lado, é uma má recauchutagem de A Saga da Fénix Negra, um dos mais acarinhados arcos narrativos da BD de Chris Claremont e John Byrne. Ainda por cima, uma história que já tinha inspirado o desastroso X-Men: O Confronto Final (Brett Ratner, 2006). Desta feita, com um enredo genérico e diálogos embaraçosos. É difícil não sair do cinema a sentir.

Por Phil Semlyen

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Uma recriação eficaz, tensa e realista do ataque feito por terroristas islâmicos ao tradicional e luxuoso Hotel Taj de Mumbai, que foi um dos muitos alvos de uma série de atentados levados a cabo naquela cidade ao longo de quatro dias de Novembro de 2008. O realizador australiano Anthony Maras centra-se numa série de clientes do hotel e de membros do pessoal que ficaram lá para os ajudar, tendo alguns morrido a defender os seus hóspedes, o que transforma Arjun, o criado sikh interpretado por Dev Patel (também produtor da fita) num dos heróis da história. Armie Hammer e Jason Isaacs também estão no elenco de Hotel Mumbai, baseado num documentário televisivo feito pouco depois dos acontecimentos.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Acontece pouco mas acontece que às vezes está uma mulher, já de certa idade, reformada, no sossego de sua casa, e entram por ali dentro meia dúzia de agentes do MI5 acusando-a de nada mais nada menos do que 27 transgressões da Lei de Segredo de Estado, cometidas vai para um ror de tempo. Um filme de espionagem, portanto. Sim, mas também uma obra sobre a condescendência a que estão sujeitas as mulheres.

Por Rui Monteiro

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Christophe Honoré realiza aqui o filme antípoda do militante 21 Batimentos por Minuto, de Robin Campillo, embora ambos se passem na década de 90, quando a epidemia de sida atingia o auge e a resposta institucional ainda era curta, e no meio gay de Paris (embora Agradar, Amar e Correr Depressa também passe pela Bretanha). Além de ter elementos autobiográficos, a fita de Honoré é intimista, púdica, serena e fatalista, uma breve história de amor entre um escritor parisiense com sida e que sabe já não lhe sobrar muito tempo, e um rapaz mais novo e vindo da província que, mesmo assim, insiste em estar com ele, filmada sem espalhafato piegas ou melodramático.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Lúcia (Alba Rohrwacher) é topógrafa, mãe solteira, vive no interior de Itália e vê-lhe aparecer a Virgem Maria, que lhe ordena que peça a quem de direito para ser construída uma igreja exactamente no local onde vai ser erguido um grande edifício municipal. Esta comédia dramática e sobrenatural de Gianni Zanasi, dobrada de fábula moral (ainda alguém acredita no divino no mundo de hoje?) tem uma boa ideia condutora e uma Nossa Senhora mandona e brusca, que não recua ante puxar os cabelos a Lúcia e fazê-la passar por vergonhas em público, embora o final seja decepcionante.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Produzida na Hungria, a primeira longa-metragem do esloveno Milorad Krstic (que se estreia a realizar aos 66 anos) junta história da pintura, cinema e psicanálise numa animação que se passa num mundo que é um espelho deformado do nosso, onde o realizador se farta de brincar com as perspectivas, as formas geométricas,
a história, os ícones e as convenções da arte, e com a dimensão onírica da psicanálise. Ruben Brandt é um psiquiatra atormentado em sonhos por personagens de 13 quadros famosos, e quatro dos seus pacientes decidem roubá-los e dar-lhos, para tentar curá-lo. O filme acaba por abusar das citações e durar tempo demais, mas tem originalidade, personalidade e imaginação mais do que suficiente para merecer o nosso interesse. E sabe bem variar das fitas da Disney/Pixar, da animação japonesa e dos desenhos animados europeus mais convencionais.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Santa Rita tem uma devota em Eulália. É a ela que esta mulher, 65 anos de costumes conservadores, reza para não
 se deixar levar pelo desgosto. Desgosto pela ausência do filho, desgosto por descobrir ser ele gay, desgosto por sabê-lo uma estrela do porno. Passado o choque inicial, desgosto por ele nunca ter partilhado com ela a sua vida, nem sequer atender o telefone. A culpa é do Facebook. É ali, na página de Fostter Riviera, o nome artístico adoptado pelo filho, que sabe a quantas anda Sydney.

Por Rui Monteiro

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

No primeiro filme do actor Max Minghella como realizador (é filho do falecido Anthony Minghella, autor de O Paciente Inglês), Elle Fanning é Violet, uma adolescente tímida de origem polaca que vive com a mãe na Ilha de Wight, adora música e cantar, e concorre às escondidas daquela a um concurso televisivo, o Teen Spirit do título. Minghella pega neste enredo com barbas e dá-lhe uma aparência nova dentro da sua matriz familiar. O resto é obra da sensacional Elle Fanning, que está numa séria relação com a câmara e representa tão bem como canta, mostrando como a música é o combustível que acende Violet, a tira do seu cantinho e a faz iluminar tudo em seu redor.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Há uma passagem, neste documentário sobre as vítimas do franquismo, particularmente bizarra, e exemplarmente demonstrativa da maneira como é estreita a relação entre a ditadura e o delírio. É quando a busca por material leva os autores ao encontro da teoria de Antonio Vallejo- Nágera, psicólogo que pregava a eugenia para evitar a propagação do “gene vermelho”, acreditava ele, comum em progressistas e partidários da República. Para infelicidade dos que por elas passaram e dos que nelas são obrigados a viver, o carácter das ditaduras pouco tem de anedótico. É mais dado à crueldade, e, como no caso do regime instituído por Francisco Franco após a sangrenta guerra civil que derrubou a República em 1939, também é mais dado à vingança.

Por Rui Monteiro

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  • 3/5 estrelas
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Este é o último filme de uma vaga trilogia do prestigiado Denys Arcand, que inclui O Declínio do Império Americano (1986) e As Invasões Bárbaras (2003). Um ingénuo doutorado em Filosofia, uma prostituta de luxo, um ex-cadastrado e um perito em investimentos e paraísos fiscais, juntam-se para ver o que fazer a dois sacos com muitos milhões de dólares. O enredo é parte policial, parte comédia de costumes, parte denúncia do poder do dinheiro nas sociedades contemporâneas.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Um stalker movie feminino, com Isabelle Huppert na perseguidora Greta (uma solitária e aparentemente simpática e excêntrica viúva francesa) e Chloe Grace Moretz na perseguida Frances (uma rapariga boazinha e prestável que perdeu a mãe há um ano). Neil Jordan realiza e já fez muito melhor que isto, porque o filme começa por ser absorvente, torna-se previsível e a certa altura passa a ser inverosímil. Mas o realizador sabe que está a fazer uma série B e roda-a com bons meios de produção e sem abdicar de algum requinte estilístico, e Isabelle Huppert chama um figo ao papel de Greta, transformando-a numa encarnação contemporânea e urbana das bruxas más dos contos de fadas. Repare-se como lhe basta usar os olhos para transmitir toda a demência e perversidade da personagem.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Apesar de ter alguns dos defeitos comuns a todos os filmes de super-heróis, este Shazam! realizado por David F. Sandberg tem qualidades que faltam a quase todos os outros. Um saboroso sentido de humor, a capacidade de não se levar muito a sério e talento suficiente para brincar bem com o próprio universo super-heróico de que também faz parte (mesmo na ficha técnica final). Sandberg vai buscar o super-herói criado nos anos 30 como Capitão Marvel (o original), que tem a identidade secreta de Billy Batson, um miúdo de 14 anos (Asher Angel) e mete-o no corpo de um adulto com os superpoderes de personagens, deuses e heróis mitológicos, Shazam (Zachary Levi). Só que este continua a comportar-se, enquanto super-herói, como o adolescente que é originalmente. Ou seja, farta-se de fazer disparates com os seus superpoderes, mesmo quando enfrenta o bilioso vilão, Dr. Thaddeus Sivana (Mark Strong).

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O muito irregular Thomas Vinterberg, servindo-se do livro de Robert Moore, A Time to Die, recria nesta co-produção europeia o acidente com o submarino nuclear Kursk, ocorrido em Agosto de 2000, que custou a vida aos
118 membros da tripulação. É
um trabalho competente, com uma recriação pormenorizada
da catástrofe, mas não deixa de haver alguma ironia no facto de um cineasta, outrora ligado ao austero Dogma 95, surgir agora a associar o seu nome a uma fita tão convencional como esta.

Por Eurico de Barros

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  • Terror
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Depois de Foge, Jordan Peele mantém-se fiel ao terror com este filme inspirado num velho episódio da série de culto A Quinta Dimensão, de Rod Serling, intitulado Mirror Image. Uma família de férias na sua casa de campo vê-se aterrorizada pelos seus "duplos" maléficos e vingativos, saídos de uma sociedade subterrânea que é uma cópia tosca e grotesca da sociedade da superfície, e que vestem macacões vermelhos e empunham tesouras. O que parecia ser uma história de invasão doméstica e horror claustrofóbico, salta rapidamente para fora de casa da família e transforma-se numa narrativa apocalíptica, o que não beneficia o filme, já que Peele dispara em várias direcções (há aqui ecos do clássico Invasion of the Body Snatchers, de Don Siegel, mas também uma crítica aos EUA de Donald Trump, representado pelos "duplos"). Nós perde foco e coesão, prolonga-se por tempo a mais e tem uma (previsível) surpresa final à moda de M. Night Shyamalan. Formidável é a dupla interpretação de Lupita Nyong'o na mãe da família e na sua sinistra "sósia".

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Daniel Auteil interpreta aqui um professor catedrático parisiense com o gosto da provocação politicamente incorrecta, que tem que dar aulas de retórica a uma aluna (Camélia Jordana) de ascendência árabe, com a qual teve uma altercação numa aula plenária, e que vai entrar num concurso nacional de eloquência. Yvan Attal recorre aqui à velha história de Pigmalião, actualizando-a para a melindrosa arena contemporânea da agendas político-ideológicas. O Poder da Palavra é uma comédia de costumes convencional, mas sincera e pertinente, que querr deixar uma mensagem a favor da moderação, do entendimento mútuo e do melhoramento pessoal. E dá gosto seguir a esgrima de verbo e de vontades entre o mestre e a aluna, pois Auteuil  Jordana vão tão bem um com o outro que fazem esquecer a tipificação das suas personagens.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

João Salaviza deixou Lisboa e os bairros periféricos onde ambientou todos os seus filmes e passou quase um ano na aldeia dos índios Krahô, no Brasil, onde rodou, com Renée Nader Messora (que já visitava os indígenas desde 2009) este filme, empoleirado na fronteira entre o documentário e a ficção. Evocando (com as devidas distâncias), na forma e no método, o trabalho de um Robert Flaherty, os realizadores fizeram, com verdade, fluência e desafectação, uma fita que regista um dos mais importantes rituais da tribo, o do luto por um dos seus membros, ao mesmo tempo que aliam a esta faceta documental, outra mais ficcional, sobre o jovem filho do morto, que sai da aldeia onde tem mulher e filho, por não conseguir chegar a termos com a perda do pai, o que deixa o espírito deste sem descanso. Por aqui passa ainda a situação dos índios brasileiros, postos entre o apelo da assimilação e a fidelidade possível ao seu modo de vida tradicional.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O Capitão Marvel original surgiu em 1967, como Mar-vell, criado por Stan Lee e Gene Colan, e passou por várias versões ao longo dos anos, tendo a primeira feminina sido Monica Rambeau, em 1982. A do filme Capitão Marvel é Carol Danvers, antes conhecida como Ms. Marvel, e que assumiu funções em 2012.

Brie Larson (Quarto) interpreta a super-heroína, acompanhada por Samuel L. Jackson, Jude Law, Ben Mendelsohn, Annette Bening, Djimon Hounsou e Gemma Chan. O enredo segue a transformação de Carol Danvers, uma ex-piloto da Força Aérea dos EUA, numa das mais poderosas super-heroínas do universo, que se vê no meio de um conflito intergaláctico.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Suspense
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Ali Abbassi, cineasta iraniano radicado na Dinamarca, assina aqui um filme genuina e incomodamente diferente, que se baseia nas lendas e mitos nórdicos e nas suas criaturas, para contar uma história fantástica em ambiente realista e quotidiano, que quer ter ressonâncias na actualidade (os temas do "outro" e da "diferença") e explorar ideias como a fronteira entre homem e animal, os conceitos de belo e de feio, a humanidade dos monstros e a monstruosidade dos humanos. Na Fronteira não consegue ser totalmente conseguido e verosímil ao longo das suas quase duas horas de duração, mas é um filme original, insólito e perturbador o suficiente para nos ficar a assombrar durante bastante tempo, e dar origem a discussões interessantes. Também é para isto que o cinema existe.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

John C. Reilly e Steve Coogan interpretam Bucha e Estica, isto é,
Stan Laurel e Oliver Hardy, nesta fita de John S. Baird sobre a última digressão que a dupla fez pela Grã-Bretanha em 1953-54, quando já
eram sexagenários e precisavam muito de dinheiro. O argumento toma algumas liberdades dramáticas e cronológicas, mas este filme crepuscular é feito com genuíno afecto pelo génio cómico da parelha, transmitindo
a incomensurável cumplicidade e amizade que os unia, assim como a humildade, a lhaneza e a cortesia que os caracterizava. Reilly e Coogan fizeram interpretam Bucha e Estica muito para lá da mímica aplicada, com um pormenor, uma fluência e uma autenticidade magistrais.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O francês Jacques Audiard pegou num livro de um autor canadiano e foi a Espanha e á Roménia filmar este western interpretado por actores na sua maioria americanos. John C. Reilly e Joaquin Phoenix interpretam Eli e Charlie Sisters, irmãos e temíveis pistoleiros do velho Oeste, mandados em missão pelo misterioso Comodoro, para encontrar e matar um químico que descobriu uma maneira de detectar e extrair ouro dos rios, e não a quis partilhar com aquele. Em Os Irmãos Sisters, Audiard ora dá uma no cravo da tradição do género, ora na ferradura do western revisionista (o final, sem o obrigatório tiroteio climáctico, será, para os puristas, tão inesperado quanto decepcionante), mas o filme acaba por resultar, em boa parte também graças a Reilly e Phoenix, aquele num Eli aquele capaz de compaixão e com vontade de parar de matar e assentar com um negócio legítimo, este irremediavelmente sanguinolento, brutinho e primário. Também com Jake Gyllenhaal, Riz Ahmed e Rutger Hauer.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Terror
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Ghost Stories - Noites de Terror
Ghost Stories - Noites de Terror

Nos anos 60 e 70, a produtora britânica Amicus tornou-se conhecida, sobretudo entre os apreciadores do género, pelas várias antologias de contos de terror que lançou, os chamados portmanteau films. Realizados por nomes como Freddie Francis, e assinados pelo escritor americano Robert Bloch, (autor, entre outros, de clássicos como Psico, adaptado ao cinema por Alfred Hitchcock, ou Night of the Ripper), ou adaptados dos comics de terror da editora EC, estes filmes eram compostos 
por um punhado de histórias sobrenaturais ligadas por um
 fio narrativo comum, em geral com um narrador que podia ser também protagonista de uma delas, e rematados por uma cruel surpresa final. Entre estas fitas da Amicus constam títulos como O Jardim da Tortura (1967), de Freddie Francis, com Peter Cushing 
e Jack Palance, A Casa que Escorria Sangue (1971), de Peter Duffell, com Christopher Lee e Peter Cushing, ou Do Outro Lado da Sepultura (1974), de Kevin Connor (1974), de novo com Peter Cushing, e Donald Pleasence e David Warner. Este Noites de Terror, que Jeremy Dyson e Andy Nyman adaptaram ao cinema a partir da peça de teatro de que são autores, tem uma estrutura semelhante à desses velhos filmes antológicos da Amicus, funcionando assim também como uma homenagem a essa tão britânica tradição do cinema de terror. Nyman interpreta o papel principal da fita, Philip Goodman, um investigador céptico e racionalista, especializado em desmascarar burlões que reivindicam para si poderes paranormais e f

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O tunisino Abdelllatif Kechiche (O Segredo de um Cuscuz, A Vida de Adèle) assina aqui o primeiro filme de uma trilogia baseada num romance de François Bégaudeau. Estamos em 1994, numa cidade costeira francesa, e o jovem Amin vem de Paris, para onde foi para tentar vingar como fotógrafo e argumentista, passar o Verão com
a família e os amigos e engatar raparigas. Há belíssimos nacos de cinema nesta fita onde Kechiche, parte sensualista apolíneo, parte voyeur do esplendor da juventude (sobretudo das raparigas), segue a sua personagem por toda a parte. Embora ao fim de três horas Mektoub, Meu Amor: Canto Primeiro, se transforme no filme de um realizador enfeitiçado pelo seu próprio estilo.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Os nazis chegam a Paris, um homem tenta partir. À falta de melhor, assume a identidade de um escritor que entretanto se suicidou e de quem possui os documentos de identidade. Mas fica retido em Marselha, semanas à espera de um barco para o México. É então que encontra Marie, a mulher do homem a quem Georg roubou a identidade, ignorante da morte do marido que busca. Todavia, são outros os encontros que definem Em Trânsito.

Posto assim, em jeito de sinopse, parece simples, mas o argumento de Christian Petzold, a partir de um romance de Anna Seghers, é mais do que uma adaptação e ainda mais
 do que uma história de fuga, pois o realizador, com muita habilidade, embora de maneira por vezes desnecessariamente complicada, constrói uma obra onde o passado e o presente se confundem. Melhor: convivem, quase em paralelo, política e esteticamente. Isto é: colocando fugitivos antifascistas e refugiados norte-africanos no mesmo lugar no meio desta história que também é de culpa e procura de redenção, Petzold faz de Marselha um limbo, uma variedade de Purgatório intertemporal de onde uns querem fugir e outros desesperam por entrar – no processo fazendo brilhar a interpretação de Franz Rogowski.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

M. Night Shyamalan conclui aqui a sua trilogia alternativa de super- -heróis “realistas”, iniciada com O Protegido (2000) e continuada em Fragmentado (2016). David Dunn (Bruce Willis), o discreto justiceiro urbano, Kevin (James McAvoy), o homem das 23 personalidades, dominadas pela animalesca e assassina Besta, e Elijah Price/ Mr. Glass (Samuel L. Jackson), o assassino de massas super- inteligente, fanático de comics e fisicamente débil, ficam presos no mesmo hospital psiquiátrico, levando Glass a atirar Dunn contra a Besta, num confronto climáctico. Glass nada tem a ver com as fitas de super-heróis da DC e da Marvel, movidas a efeitos digitais, e Shyamalan eleva o género a um patamar superior, embora a história tenha inverosimilhanças chapadas e uma reviravolta a mais no final.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Lisa Spinelli (Maggie Gyllenhaal) é uma educadora de infância nova-iorquina com aspirações a poeta e profundamente frustrada na sua vida conjugal e familiar. Um dia, apercebe-se que Jimmy, uma das crianças da sua aula, fala de vez em quando como se estivesse a dizer um poema, e Lisa começa
a acarinhá-lo e encorajá-lo. E ao projectar nele as suas frustrações e aspirações, torna-se cada vez mais possessiva em relação ao menino. A Educadora de Infância é um remake, assinado por Sara Colangelo, de um filme israelita, e Maggie Gyllenhaal é excelente numa Lisa que começa por ser simpática mas acaba por se tornar aflitiva e patética, à medida que a história progride para paragens crescentemente desconfortáveis. Colangelo conclui o filme com um anticlímax que cancela qualquer sensacionalismo ao modo do thriller ou do melodrama.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Inferior a Creed: O Legado de Rocky, e com Steven Caple Jr.
a substituir Ryan Coogler na realização, esta parte 2 é mais bombástica, conforme aos estereótipos da série Rocky, e previsível. Adonis (Michael B. Jordan) vai agora combater com Viktor Drago, o filho de Ivan Drago (Dolph Lundgren), que lhe matou o pai, Apollo Creed, no ringue em Rocky 5, e foi depois derrotado por Rocky (Sylvester Stallone). Mas a fita não deixa de ter interesse, sobretudo pelo que há de amargura, ressentimento e frustração a pesar sobre as três personagens principais. E, 42 anos depois do filme original, Stallone parece ter dado por concluída esta saga de boxe.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Chloé, uma rapariga muito frágil (Marine Vacth) apaixona-se pelo seu psicanalista, Louis (Jérémie Renier) e descobre que ele tem um irmão gémeo (Renier de novo), também psicanalista, e de quem nunca lhe falou. Baseado num livro de Joyce Carol Oates, François Ozon multiplica-se em referências temáticas, visuais, psicológicas e atmosféricas a Cronenberg, De Palma, Lynch Hitchcock ou Polanksi, e assina um thriller mórbido, assombrado e, a espaços, laborioso a mais
e afectado, insinuando que pisamos terreno instável e movediço, e que as aparências podem enganar.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Uma mãe, Holly Burns (Julia Roberts), recebe na véspera
 de Natal a visita inesperada do filho Ben (Lucas Hedges), um toxicodependente que está internado numa clínica. E vai estar sempre em cima dele, para tentar que Ben resista às muitas tentações que o rodeiam e não volte a consumir. Por isso, ela
vai conhecer os bastidores do pesadelo e da tragédia do tráfico e uso de droga ocultos pela fachada pacata, próspera e decorada com luzes natalícias do seu subúrbio de classe média. O realizador Peter Hedges não tem coragem de levar o enredo até às últimas consequências, mas Roberts
e Hedges (que é filho daquele) seguram bem o filme.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Família e crianças
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Em 2013, o filme Ao Encontro de Mr. Banks contou a história da dificuldade que Walt Disney (interpretado por Tom Hanks) teve para conseguir convencer a escritora P.L. Travers (Emma Thompson), a criadora de Mary Poppins, em ceder-lhe os direitos de adaptação ao cinema dos seus livros, e rodar Mary Poppins (1964), que se tornaria num dos títulos clássicos e mais bem-amados da Disney e daria a Julie Andrews o Óscar de Melhor Actriz (o filme ganhou mais quatro). Walt Disney quis, logo a seguir, fazer uma continuação, mas dessa vez não conseguiu persuadir Travers a dar-lhe a devida autorização. Nos anos 80, o então presidente da Disney, Jeffrey Katzenberg, abordou de novo a escritora com o mesmo projecto, mas ela voltou a recusar. Só em 2015 o estúdio conseguiu ter luz verde dos herdeiros de P.L. Travers para rodar a tão desejada continuação de Mary Poppins. A realização foi entregue a Rob Marshall (Chicago, Caminhos da Floresta), com Emily Blunt no papel da ama mágica. E aí temos O Regresso de Mary Poppins, que se passa de novo em Londres, 20 anos depois do filme original. Michael e Jane Banks (Ben Whishaw e Emily Mortimer) estão agora crescidos. Ben trabalha no banco do pai, tem três filhos pequenos e enviuvou recentemente, Jane é activista política, e estão em risco de perder a casa da família se Ben não pagar rapidamente um empréstimo que contraiu no seu banco. As coisas estão negras para a família, mas Mary Poppins volta a descer suavemente do céu, com o 
seu inseparável gua

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  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A crise da meia-idade pode dar para um homem fazer muita coisa estranha, inesperada ou patética. Aos sete protagonistas de Ou Nadas ou Afundas, de Gilles Lellouche, deu-lhes para fazer natação sincronizada, um desporto geralmente associado ao sexo feminino. Daí que numa parede dos balneários da piscina municipal onde treinam alguém tenha escrito: “NS = PD” (natação sincronizada = mariquinhas).

Actor que também realiza, Gilles Lellouche assina, em Ou Nadas ou Afundas, uma comédia melancólica, afectuosa, consistentemente divertida, jamais caricatural ou cruel, inspiradora q.b., e bem metida na tradição do género em França. E Lellouche deixe brilhar os seus actores e actrizes enquando faz, em simultâneo, uma sábia gestão do óptimo colectivo de que dispõe. Eis um filme passado em grande parte dentro de piscinas, mas que não mete água nenhuma.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Esta longa-metragem de animação digital tem como herói não só o novo Homem-Aranha, o jovem Miles Morales, sucessor de Peter Parker, como também uma série de outros Homens-Aranha, trazidos inadvertidamente das suas respectivas dimensões paralelas pelo acelerador de partículas do Rei do Crime, que destabilizou o espaço-tempo. Um filme apontado ao seu público alvo como uma seta disparada por um archeiro medalha de ouro dos Jogos Olímpicos, que no final abre as portas a mais novidades aracno-quânticas animadas.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Em vez de reduzir confortavelmente Silvio Berlusconi a uma caricatura ou diabolizá-lo, Paolo Sorrentino preferiu uma abordagem mais humana, original e complexa do político e empresário italiano, aqui "apanhado" entre 2006 e 2010, um ano antes da sua demissão do governo. O autor de A Grande Beleza mostra-o como um misto de imperador romano decadente contemporâneo, mas kitsch e sem a grandeza, e bufão genuinamente charmoso, capaz de vender qualquer coisa aos italianos, de um apartamento a um programa político repleto de promessas bonitas, passando por canais de televisão. Toni Servillo, maquilhado como se tivesse saído de um filme de terror passado num museu de figuras de cera, "dissolve-se" na personagem e por ser a versão montada para o mercado internacional, a partir dos dois filmes originais, Silvio e os Outros sofre de alguma desarrumação, repete-se, sobretudo na meia hora inicial, e tem alguns problemas de continuidade.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Livro de Imagem
O Livro de Imagem

Desafiar e confundir, obrigando os espectadores a procurar no seu raciocínio uma explicação para as imagens que organiza quase como um quebra-cabeças semiótico, mas sempre com o traço comum da experimentação. Eis uma constante do cinema de Jean-Luc Godard que esta instalação cinematográfica confirma.

Organizada em cinco partes, crivada de citações fílmicas e artísticas e filosóficas, esta nova produção é ainda, na narração do autor, uma espécie de síntese do seu pensamento político, no qual o Médio Oriente ocupa um papel central. Mas, como por exemplo, e para não ir mais longe, em Adeus à Linguagem, que dirigiu em 2014, O Livro de Imagem é mais uma daquelas obras em que o espectador tem duas possibilidades – além de adormecer, desistindo da compreensão em favor de Orfeu, o que sendo incomum não é raro. A primeira é caçar os significados escondidos em cada plano, espevitar o espírito no esforço de decifrar os símbolos que o espectador vê ou que imagina ver. A segunda é simplesmente recostar-se e fruir, por assim dizer limpando os sentidos da vulgaridade cinematográfica quotidiana, a barragem de som e imagem que o artista nos fornece.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Passaram seis anos desde que Ralph salvou o salão de jogos da vingança de Turbo. O mundo, não apenas o dos videojogos, evoluiu entretanto e Rich Moore, agora partilhando a realização com Phil Johnston (que, com ele, criara o argumento de Força Ralph), atira o protagonista para o emocionante e aventuroso ciberespaço, criando uma sequela que nada deve ao original em graça, e – não fora este um filme com a chancela Disney – moral.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Utoya, 22 de Julho
Utoya, 22 de Julho

Nos antípodas do longo, detalhado e laborioso 22 de Julho, que Paul Greengrass realizou para a Netflix, este segundo filme sobre o massacre feito pelo activista de extrema-direita Anders Breivik na ilha norueguesa de Utoya, a 22 de Julho de 2011, realizado por Erik Poppe, centra-se numa única personagem, a jovem Kaja (Andrea Berntzen). É pelos seus olhos que seguimos os acontecimentos, partilhando a sua confusão e o seu desespero. Poppe filma tudo num só plano-sequência e em tempo real, e a fita dura apenas um pouco mais que os 72 minutos do atentado. Breivik aparece apenas duas vezes, fugazmente, em silhueta.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Depois de A Lei do Mercado, Stéphane Brizé alarga os horizontes e, mantendo-se no registo de cinema social e em cima da actualidade, filma uma empresa francesa fictícia que, apesar de dar lucro vai ser encerrada pela casa-mãe alemã e deslocalizada para o Leste. Os trabalhadores, liderados por um sindicalista muito afoito (de novo o monocórdico Vincent Lindon), decidem então fazer greve. Tal como em A Lei do Mercado, Brizé procura chegar ao máximo de realismo dentro da ficção, tentando também não escolher lados nem diabolizar ou angelizar seja quem for, embora se perceba perfeitamente para que lado pende o seu coração. O que é confirmado pelo final de choque, algo forçado e melodramático.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Este filme de Damien Chazelle é menos sobre a histórica missão da Apollo XI que levou o homem a pisar a Lua, do que sobre o astronauta que o fez, Neil Armstrong. Com um registo intimista, escassamente espectacular e sem exuberâncias patrióticas.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Estamos em 1992 e o escritor americano Joseph Castleman acaba de ganhar o Nobel da Literatura, que celebra com a sua discreta e meticulosa mulher, Joan (Glenn Close). O casal ruma a Estocolmo, para a cerimónia da entrega do prémio, acompanhado do filho, David (Max Irons), também ele escritor e ansioso pela aprovação do pai, e seguidos por Nathaniel Bone (Christian Slater), que quer escrever a biografia
do nobelizado. Mas há um grande segredo por trás do sucesso e da respeitabilidade literária de Castleman. Baseado num livro de Meg Wolitzer, A Mulher é uma parábola ao gosto feminista, que força a credibilidade (os dois filhos do casal não teriam acabado por descobrir o grande segredo?) e é sustentada pela interpretação 
de Glenn Close, exímia a transmitir um máximo de significado e informação num mínimo de expressão. Uma grande actriz que é também uma estrela.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Valeria Sarmiento, viúva e colaboradora do falecido Raúl Ruiz, acaba aqui um dos projectos deixados por este, a adaptação livre de Livro Negro de Padre Dinis, de Camilo Castelo Branco, continuação de Mistérios de Lisboa, que Ruiz filmou em 2010 É uma versão em miniatura deste filme, com o mesmo tipo de personalidade e estrutura folhetinesca e uma história balizada pela Revolução Francesa e pela época napoleónica, que se centra numa criança protegida por um aristocrata português que a confia, no leito de morte, a um amigo francês, e na sua jovem e fiel ama (óptima Lou de Laâge).

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Rowan Atkinson regressa à pele da versão paródica de James Bond neste terceiro filme da série Johnny English, que 
vai encontrar o agente mais trapalhão de Sua Majestade reformado da actividade e a dar aulas num colégio particular.

Mas Johnny vai ser chamado de volta ao activo, depois de um gigantesco ciber-ataque feito por desconhecidos ter revelado ao público as identidades de todos os agentes secretos britânicos, e estar a causar o caos em Londres. Os fãs de Atkinson, e destas fitas que brincam com os clichés
 das fitas de 007 e, por extensão, do género de espionagem,
 vão saborear devidamente esta terceira incursão de Atkinson na personagem, que
 é basicamente uma variante de Mr. Bean, mais falador e metido no mundo dos agentes secretos. A fita dura menos de hora
 e meia e é toda ela feita 
de humor slapstick ou de embaraço social, com Emma Thompson numa primeira-ministra que arrasa com Theresa May, e Rowan Atkinson em óptima forma 
de catástrofe ambulante à solta no meio dos espiões. 
Os melhores gags envolvem um capacete de realidade virtual e um ridículo superfato hidráulico de refugo dos anos 80.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
A Casa Junto ao Mar
A Casa Junto ao Mar

O francês Robert Guédiguian tem aqui um dos seus filmes mais tocantes enraizados na região de Marselha, onde nasceu e roda quase sempre. A Casa Junto ao Mar entronca numa tradição de realismo social, político e romanesco quase extinta no cinema francês e junta vários dos actores habituais do cinema do realizador (a começar pela sua mulher, Alexandra Ascaride), numa história de família nostálgica de um passado irrecuperável e perplexa perante o futuro, e que combina tristeza, bom humor e uma humanidade afectuosa, cedendo apenas no final a algum sentimentalismo demagógico.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O rapaz podia nem sempre ter uma casa para dormir e andar aos caídos pela cidade a pintar paredes quando queria pôr a tinta em telas. Todavia, de acordo com o retrato traçado neste documentário de Sara Driver, convencimento e descaramento não lhe faltavam. E qualquer pessoa que falasse com ele ouvia Jean-Michel Basquiat afirmar que era o mais importante artista da sua geração. Título que, na verdade, não interessa à realizadora na criação deste (roubando um título a Dylan Thomas) retrato do artista enquanto jovem cão, que mostra o antes da carreira meteórica, interrompida pela morte, em 1988, filmado com muitas contribuições dos protagonistas sobreviventes da Nova Vaga nova-iorquina da década de 1980.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Eduardo Lourenço, Guy Maddin, F.J. Ossang, Laura Mulvey ou Augusto M. Seabra são algumas das figuras ligadas ao cinema, e não só (há também especialistas em neurologia, escritores e até membros da família do realizador), que Edgar Pêra foi ouvir neste filme-ensaio em 3D, sobre o que significa ser espectador de cinema, mas também para procurar definir e explicar o sentimento de espanto daquele ante o que se está a passar na tela, ou analisar as pulsões mais profundas, culturais, colectivas e inconscientes, que estão na sua base. O Espectador Espantado, (que antestreou no DocLisboa 2016), não se fica por aqui, já que o tema acaba por levar à discussão do futuro 
do cinema, tendo em conta a revolução digital, a proliferação de ecrãs, as experiências com realidade virtual e a alteração da situação clássica de apreciar um filme numa sala escura e em comunidade.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Uma história de luto, dor e sentimento de culpa passada no seio de uma família luso-francesa e filmada no Alentejo, em plano Verão, pelas irmãs Clara e Laura Laperrousaz, filhas do documentarista Jérôme Laperrousaz (Continental Circus), aqui a estrearem-se nas longas-metragens. Ana Girardot no papel da mãe e as pequenas gémeas Océane e Margaux Le Caoussin, nas filhas, destacam-se nesta fita produzida por Paulo Branco, fotografada em écrã largo por Vasco Vieira (A Fábrica de Nada, Montanha) e contada com delicadeza e justeza emocional pelas duas realizadoras, que também escreveram o argumento.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Mais uma peça de Tchékov no cinema, desta vez uma nova versão de A Gaivota, realizada por Michael Mayer, um homem associado ao teatro. É uma adaptação preocupada em não apresentar a rigidez e a falta de personalidade que costumam caracterizar o teatro filmado, que acaba por ser um elemento de distracção do espectador e esbater e diluir a consistência dramática da peça, que foi também podada aqui e ali. Agarramo-nos então aos actores, sobretudo, do lado dos jovens, a Saiorse Ronan e Billy Howle, e do lado dos mais velhos, a Annette Bening, dominadora na sua Irina, e a Elizabeth Moss numa Masha azeda e de luto pela sua vida frustrada.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Prece ao Nascer do Dia
Prece ao Nascer do Dia

A história real de Billy Moore, um delinquente, toxicodependente
e pugilista inglês que foi encarcerado na prisão de Klong Prem, em Bangkok, e conseguiu sobreviver e manter a sanidade praticando muay thai, a arte marcial da Tailândia e desporto nacional do país, e entrando na equipa da prisão.

O filme é rodado em estilo bruto e feio pelo francês Jean-Stéphane Sauvaire, como bruta e feia é a existência em Klong Prem, e o realizador não desculpabiliza nem tenta tornar Moore (Joe Cole, de Peaky Blinders) simpático, embora não lhe negue humanidade. E o filme teria beneficiado se Sauvaire lhe tivesse rapado uns 20 ou 30 minutos, porque duas horas de violência gráfica e in your face acabam por saturar.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Romance
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
À Distância
À Distância

Esta fita do venezuelano Lorenzo Vigas ganhou o Festival de Veneza de 2015, não sem controvérsia.
 Em Caracas, um homem de meia-idade paga a rapazes da rua para se desnudarem para ele. Nem ele lhes toca, nem eles lhe mexem. Um dia, o homem acolhe um adolescente que o agrediu e roubou, e a indefinida
 e desajeitada relação entre ambos envolve interesse, atracção sexual, dependência económica e afectiva
 e uma modalidade enviesada de carência e compensação tanto paternal como filial. O tom de À Distância é neutro e distante, e
 o filme é resolvido com um final imprevisto e pouco claro, com duas interpretações diferentes. Conforme a escolhida, fará menos ou mais sentido e terá maior ou menor impacto.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Amar Pablo, Odiar Escobar
Amar Pablo, Odiar Escobar

O filme é baseado no livro da jornalista vedeta colombiana Virginia Vallejo, que nos anos 80 se deixou fascinar pelo barão da droga e se tornou sua amante. O filme é um projecto pessoal de Javier Bardem, que o produz e interpreta Escobar com um impecável sotaque colombiano e uma ampla pança, dando o papel de Virgina à mulher, Penélope Cruz, que tem uma interpretação desastrosa, variando entre o registo de beldade e “famosa” tolinha, e o de latina histérica. Felizmente, a fita, mesmo sendo narrada por ela, passa mais tempo com Escobar, a sua família e os capangas, do que com a superficial e insofrível Virginia.

Por Eurico Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Não são poucos os filmes arruinados porque os seus realizadores não souberam quando ou como os acabar. É quase o que acontece a O Meu Amigo Pete, de Andrew Haigh. Charley é um adolescente que vive com o pai no Oregon e arranja um trabalho de Verão a cuidar dos cavalos de um treinador em fim de carreira. E afeiçoa-se a Pete, um cavalo também ele a dar as últimas. Haigh devia ter fechado a fita logo que Pete sai de cena, ou então pouco depois.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Pouco sexo, muitas drogas e rock’n’roll, em versão meia-idade fanada, são o que a realizadora Susanna Nicchiarelli conseguiu empacotar neste filme sobre Christa Paffgen, isto é, Nico, quer dizer, aquela modelo que canta umas canções e depois fica a tocar pandeireta num disco dos Velvet Underground. “A minha carreira musical começou depois dos Velvet Underground”, diz Trine Dyrholm, encarnando muito bem os 40 e muitos anos desleixados e decadentes da cantora e compositora que a vida tão maltratou sem cuidar do seu enorme talento e das suas doridas e comoventes canções.
 A realizadora italiana escolheu acompanhar Nico no ano final da sua vida, revelando em magníficos cinzentos, mas com pouco nervo, o fundo do poço percorrido pela artista mais usada e desprezada da música pop alternativa.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Columbus
Columbus

Jin tem de estar em Columbus para tomar conta do pai, internado no hospital local depois de colapso. Com ele está uma velha amiga, mas o que mais importa à narrativa, é Casey, rapariga ambiciosa a quem o vício materno por metanfetaminas impediu de continuar estudos após o secundário para, também ela, ficar a tomar conta da progenitora. Claro que uma relação começa a desenvolver-se entre Jin e Casey, mas o que torna esta película diferente é a forma dinâmica e, digamos, interior, como o realizador sul-coreano Kogonada filma edifícios e ruas, fazendo da cidade personagem enquanto os protagonistas discorrem sobre o estado das suas vidas e da sua mútua atracção.

Por Rui Monteiro

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  • Terror
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Quando Hereditário foi exibido no Festival de Sundance as comparações com O Exorcista choveram. O que não é de todo exagero, quando se mede a qualidade de um filme de terror pela quantidade de sustos que provoca, embora o argumento não tenha nada a ver com o desse filme seminal de William Friedkin. A comparação deve-se ao ambiente de perigo permanente e à forma como o realizador 
Ari Aster se atira ao assunto, não deixando esquecer que entre a espectacularidade do horror está uma família de luto.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Esplendor
Esplendor

Este filme da japonesa Naomi Kawase confirma uma deriva da cineasta para um cinema mais mainstream já detectável em Uma Pastelaria em Tóquio (2015). É a história de uma rapariga que escreve comentários de filmes projectados para cegos e pessoas com problemas de visão, e do seu encontro com um homem mais velho, fotógrafo, que está a cegar gradualmente, e a desesperar em surdina. A realização de Kawase roça às vezes o adocicado, mas os dois actores, e a sinceridade e delizadeza com que a realizadora maneja os sentimentos das personagens e os transcreve dramatica e visualmente, impedem que Esplendor caramelize e se torne numa lamechice.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O realizador Xavier Beauvois foi desenterrar um velho romance
do esquecido Ernest Pérochon, para recordar as mulheres
 que, em França, ficaram na rectaguarda, com os velhos e as crianças, e a cuidar dos campos
 e das propriedades, enquanto os homens combatiam e morriam nas trincheiras da I Guerra Mundial. Integrando o documental e o romanesco, e contando com excelentes interpretações de Nathalie Baye, de Laura Smet, 
sua filha, e da estreante Iris Bry, uma revelação, As Guardiãs é,
 sem histerias panfletárias, uma homenagem à força, ao estoicismo e à capacidade de sacrifício das mulheres, e uma fita de robusta personalidade clássica.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Este é o primeiro filme sobre o acidente de Chappaquiddick, que envolveu o senador Ted Kennedy no Verão de 1969 (conduzia um carro que caiu
à água e salvou-se, mas uma ex-secretária do seu irmão Bobby morreu afogada e Kennedy
só comunicou o sucedido à polícia na manhã seguinte) e
lhe comprometeu quaisquer planos que tivesse de um dia concorrer à presidência dos EUA. O realizador John Curran recusa a versão oficial do clã Kennedy
e seus apoiantes, mostrando as tentativas de encobrimento e branqueamento feitas por estes à altura, mas não faz de Ted um monstro insensível e egoísta. Sobriamente personificado por Jason Clarke, ele é um homem hesitante, auto-iludido e errático, perdido num labirinto moral e sobre o qual pesa a sombra dos três irmãos mais velhos e a tirania do pai Joe.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Não é Nova Iorque, é Lisboa. Não é um bar americano, é o extinto Maxime. O novo filme de Bruno de Almeida, escrito com o seu habitual colaborador, John Frey, e interpretado por muitos dos actores com quem costuma trabalhar (Michael Imperioli, John Ventimiglia, Drena De Niro, etc.), mais 
Ana Padrão, Manuel João Vieira e Celeste Rodrigues, apresenta uma estranha desconexão espacial: estamos em Nova Iorque do Sodré, ou em Lisbrooklyn? Passada esta sensação, ficamos com uma série B maneirinha, tendência Abel Ferrara, sobre o dono de um cabaré à antiga num bairro decadente, e a sua “família” de empregados e artistas, a braços com o aburguesamento da zona e um mafioso. Mas será que o filme não podia ter sido feito só com actores portugueses?

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

As presenças de Ron Howard na realização, e de Lawrence
Kasdan (que já assinou as histórias de outros filmes da saga) e do seu filho Jonathan no argumento, garantem que este segundo título da “Star Wars Anthology” está, tal como o primeiro, Rogue One (2016), mais fiel ao espírito, ao estilo e à vibração da trilogia original criada por George Lucas, do que os dois novos e muito decepcionantes filmes oficiais. A fita conta as aventuras de
Han Solo na sua juventude (interpretado pelo aceitável Alden Ehrenreich), em estilo de western espacial, destacando-se Chewbacca (que Solo conhece aqui) e L3, a dróide revolucionária e co-piloto de Lando Calrissian (Donald Glover). Woody Harrelson faz muito bem de Beckett, um mercenário pragmático.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Baseando-se em Un An Après, um dos livros escritos pela
actriz Anne Wiazemsky (que morreu o ano passado) sobre Jean-Luc Godard depois de se
ter divorciado dele, em 1979, Michael Hazanavicius (O Artista) filma uma sátira gostosa, se
bem que não inteiramente conseguida, à figura tutelar de toda uma cinefilia, e que decerto não terá agradado nada aos zelotas mais ardentes do autor de O Acossado. Louis Garrel compõe impecavelmente, até ao leve ciciar, o realizador na sua fase de delírio maoísta, algures 
entre A Chinesa e o Maio de
 68, representando-o como
 uma figura de burlesco revolucionário. Dispensava-
se era o pastiche insistente da gramática visual godardiana.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Podia esperar-se o pior deste documentário sobre Eduardo Lourenço, a partir do seu livro O Labirinto da Saudade (1978), e quando o autor faz 95 anos: a mitificação em vida daquele que foi transformado, malgré lui, no pensador do regime, com o patrocínio e a participação de um grupo de amigos e admiradores ilustres. Felizmente, Miguel Gonçalves Mendes foge à estrutura do documentário de cabeças falantes e identidade televisiva, apostando numa encenação cinematográfica, e visualmente muito inventiva, e dando quase sempre a palavra ao biografado. Claro que é impossível sintetizar o pensamento de Eduardo Lourenço, e o referido livro, num filme de pouco mais de uma hora, mas é este um bom esforço. O que não fica nada bem num documentário sobre um homem que sempre recusou o reducionismo, o estereótipo e o sectarismo, é a deferência de O Labirinto da Saudade para com Ramalho Eanes, Jorge Sampaio e Mário Soares, e o tratamento caricatural e gozão dado a Cavaco Silva.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Terror
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O primeiro filme feito fora do Japão, em França, por Kiyoshi Kurosawa, mestre do policial, do terror e do fantástico, transporta os arredores de Paris a atmosfera dos contos de fantasmas tradicionais nipónicos. O enredo passa-se no soturno palacete de
um antigo fotógrafo de moda (Olivier Gourmet) agora obcecado em reproduzir velhos daguerreótipos em tamanho natural, usando a filha (Constance Rousseau) como modelo. O edifício é assombrado pelo espectro da mulher daquele, e a chegada
de um jovem assistente (Tahar Rahim) vai alterar drasticamente a rotina. O filme perde o pé à verosimilhança perto do final, mas até lá, instala um ambiente fantasmagórico cerrado, associando a fotografia à captação do mundo sobrenatural.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A história da rocambolesca e anedótica vinda de Eusébio,  
de Moçambique para o Benfica, às escondidas do Sporting, em Dezembro de 1960, sob o nome de Ruth (o da filha de um benfiquista de Lourenço Marques), contada por António Pinhão Botelho sobre argumento da sua mãe, a jornalista Leonor Pinhão. É um filme lhano, desembaraçado e correcto sobre Eusébio 
(Ivan Regalla) antes de ser o Pantera Negra, e sobre um Portugal autoritário mas em que o futebol e a clubite eram mais inocentes que hoje, e não tinham sido estragados pelas televisões, pelo dinheiro e pelos dirigentes.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Este filme de Juliana Rojas e Marco Dutra insinua​ uma crítica à segregação racial e social no Brasil, antes de investir descaradamente na materialização do horror. E a maneira como o fazem é o mais estimulante da fita. Uma feira de atracções onde a superstição popular se mistura com a banda desenhada e o musical. Aqui e ali, surpreendente.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

As pessoas que gostam mais de gatos do que de cães têm toda a razão para torcer o nariz ao relambório que Wes Anderson faz à espécie canina nesta sua segunda longa-metragem animada, após a muito superior O Fantástico Senhor Raposo (2009), onde associa a gataria a todos os vilões da história, passada no Japão, num futuro próximo, quando o presidente da Câmara da cidade fictícia de Megasaki envia todos os cães, atacados por um vírus contagioso, para uma ilha onde só há lixo e ruínas industriais. O enredo simplório e previsível é em parte compensado pela mestria visual de Anderson, que combina o desenho, a animação de modelos imagem a imagem e os efeitos digitais sob a égide da estética da arte nipónica, da tradicional às manga, e exibe a sua obsessão pontilhista pelos detalhes e a sua fixação pela encenação geométrica.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Este documentário do fotógrafo Tom Volf recorre a fotos, imagens e entrevistas de arquivo e home movies, para pôr Maria, a mulher por detrás da mítica Callas, a maior cantora de ópera de todos os tempos, a contar a sua vida, a dar a sua versão de alguns factos mais importantes da sua carreira e dos seus amores, e a falar da relação com a sua arte. Volf revela assim uma mulher com uma educação e uma visão do mundo tradicional, inteligente, fina, cheia de personalidade e com muito feitio, profissional enorme e exigente, e devotadíssima ao canto. Mas que, se tivesse tido escolha, teria preferido ser mãe de família extremosa e esposa devotada ao marido.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Gonçalo Galvão Teles e Jorge Paixão da Costa assinam um
raro filme de guerra português,
 e o primeiro passado na I Guerra Mundial, para contarem a história de Aníbal Augusto Milhais, o “Soldado Milhões”, herói da Batalha de La Lys,
 faz agora 100 anos. A fita
 tem imprecisões, falhas e ingenuidades, mas há aqui 
uma vontade de fazer cinema narrativo baseado em factos
 da nossa história, e um grande esforço de rigor na recriação
 da época e na apresentação da acção militar (as sequências de guerra foram rodadas no Campo de Tiro de Alcochete). João Arrais interpreta o Milhais jovem do tempo do conflito e Miguel Borges é o Milhais de 1943, já com família e a perseguir um lobo com a filha mais nova, em Valongo, a sua terra natal.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Chavela Vargas será, para a maioria, uma desconhecida. Pudera, a memória é curta e a cantora nascida na Costa Rica, vencedora de um Grammy e ícone da música popular no México, morreu em 2012, depois de anos de silêncio. Com este documentário, baseado numa entrevista registada duas décadas antes da sua morte e até aqui inédita, Catherine Gund e Daresha Kyi pretendem acabar com esse anonimato e apresentar não só uma grande cantora, como, mais do que tudo, uma mulher invulgar, ainda mais na sua época. E não foi só (enfim, também foi, não sejamos inocentes) por se enfiar entre os lençóis de Ava Gardner, viver um ano de cama e pucarinho com Frida Kahlo, ou andar de pistola à cinta (ou à liga?) e não hesitar em disparar quando se sentia particularmente bem-disposta. Pois a jornada em que se meteu, nas
 suas alegrias e dores, aqui conduzida pela sua música e pelas suas palavras, entre a profunda espiritualidade e uma acentuada queda para o deboche e a provocação, é um retrato sério (embora um pouco condescendente) de uma vida sem dúvida singular.

Por Rui Monteiro

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  • Ficção científica
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Steven Spielberg adapta à tela o livro de FC de Ernest Cline, passado num futuro próximo e distópico, em que as pessoas se evadem para um universo de realidade virtual, o OASIS, onde podem ser quem quiserem e viver todas as aventuras, bem como competir pelo seu controlo. O filme é um misto de viagem nostálgica à cultura de massas dos anos 80 e de caça ao tesouro num mundo artificial high tech, com o qual realizador pretende captar duas gerações diferentes: a dos saudosistas da cultura pop daquela década (que incluem fitas realizadas ou produzidas pelo próprio Spielberg) e a dos gamers e geeks da era da net, dos smartphones e dos filmes de super-heróis.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A primeira realização do
actor francês Xavier Legrand, premiada no Festival de Veneza, não é mais um filme banalmente sociológico nem um melodrama pingão sobre uma família despedaçada pela violência doméstica. Todos os membros da família representada são presas do medo, a mãe e os filhos, que saíram de casa, mas também o pai, que reivindica o direito a
ter visitas com o mais novo. Só que aqueles são as vítimas e este é o agressor, atirando Custódia Partilhada para o território do thriller. Legrand fez um filme de terror realista.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Teresa Vilaverde assina o último dos filmes portugueses a estrear-se sobre a crise. Mas a realizadora de Três Irmãos e Os Mutantes usa a crise económica que afectou os portugueses como pretexto para mostrar a crise da família no nosso tempo. Aquela só acentua o crescente distanciamento, a falta de comunicação, o isolamento interior e a alienação emocional entre pai (João Pedro Vaz),
mãe (Beatriz Batarda) e filha adolescente (Alice Albergaria), filmados num apartamento de um bairro indistinto de Lisboa, com austeridade sombria e uma câmara que é como uma testemunha púdica e relutante dos acontecimentos.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

No seu quinto filme a realizar, o actor Stanley Tucci conta uma história verídica ocorrida em 1964, envolvendo o escritor e crítico americano James Lord e
o seu amigo, o pintor e escultor suíço Alberto Giacometti, que lhe propôs posar para um retrato que demorou a acabar mais do que aquele esperava. Em parte, retrato cliché do grande artista enquanto ser humano imperfeito e criador caótico, em parte, história
de uma amizade testada por circunstâncias excêntricas, a fita é resgatada pelas interpretações de Armie Hammer e de Geoffrey Rush, que é a cara chapada do desconchavado e imprevisível Giacometti.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A primeira realização a solo 
da actriz e argumentista Greta Gerwig é um filme indie afável, desempoeirado, sensível, bem observado e bem escrito sobre as inquietações, andanças e hesitações de uma miúda de 17 anos. A autodenominada Lady Bird do título (óptima Saoirse Ronan), chegada ao pai (Tracy Letts) e atazanada pela sempre preocupada e possessiva mãe (Laurie Metcalf, de A Teoria do Big Bang), ansiosa por deixar a pasmaceira da sua Sacramento (onde Gerwig nasceu) e ir estudar numa boa universidade e viver numa grande cidade. Greta Gerwig não inventou a pólvora
do género, apesar de todo o banzé encomiástico gerado em redor do filme, que esteve nomeado para cinco Óscares mas acabou por não ganhar nenhum.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Tudo começou com o exílio, forçado, claro, do poeta, romancista e ensaísta Jorge de Sena. A ausência durou duas décadas passadas primeiro no Brasil, depois nos Estados Unidos. Durante esse tempo, Portugal, de outras maneiras também, mas que agora não vêm a propósito, esteve sempre presente na sua correspondência com a poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen.

É dessa singela matéria que se faz o filme de Rita Azevedo Gomes (Prémio José Saramago para Melhor Documentário na edição de 2016 do Doclisboa), no qual, entre outros, Mário Barroso, Luís Miguel Cintra, Tânia Dinis e Rita Durão 
dão voz às palavras. Juntas, arrumadas conforme os estados de alma, escritas num português exemplar e criativo e vivo como já não se escreve nem ouve. Cartas que são, na verdade, diálogos entre
dois intelectos excepcionais, assim, em privado, exercendo uma liberdade lírica, política
e pessoal que o exílio imposto pelo salazarismo perseguia, mas que estes espíritos privilegiados insistiam em não calar, por difíceis que fossem os caminhos da comunicação.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A quinta longa-metragem de ficção de Manuel Mozos tem como protagonista o Ramiro do título (António Mortágua), alfarrabista, poeta muito bissexto, desmazelado, desprendido das coisas
 e do tempo em que vive. Tem um cão, uma semi-namorada, alguns amigos avulsos e é o encarregado de educação da vizinha adolescente, órfã e grávida, que vive com a avó. Uma comédia
do quotidiano, anónimo e de bairro lisboeta, que evoca um 
Jim Jarmusch trocado por miúdos, onde Mozos leva, discreta, amavelmente e sem sobressaltos, a água ao seu moinho.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Peter Landesman atira-se ao caso Watergate a partir da perspectiva de Mark Felt, vulgo Deep Throat (Garganta Funda), o denunciante cuja identidade permaneceu incógnita durante 30 anos. Mas falta-lhe a garra e a ousadia de ir narrativamente um pouco mais além.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Eu, Tonya
Eu, Tonya

Margot Robbie interpreta a campeã americana e patinadora olímpica que em 1994 caiu em desgraça, após ter estado envolvida numa agressão à sua rival Nancy Kerrigan. Craig Gillespie realiza o filme em estilo de mockumentary, como uma tragédia white trash, e é simpático para com Tonya, apresentada como vítima de uma mãe exploradora do seu enorme talento no gelo, da sua pouca educação, do seu feitio rebelde e de um marido burgesso. Só que depois contradiz-se, por excesso de condescendência gozona para com ela e os seus, e abusa das cabriolas formais.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Eles são o Fred Astaire e a Ginger Rogers do tango na argentina. María Nieves e Juan Carlos Copes, os maiores e mais aclamados bailarinos daquele país e na cena internacional, sinónimos e símbolos do tango, bem como coreógrafos, dançaram juntos durante quase 50 anos. Foram também amantes, casaram-se e separaram-se – Juan Carlos era um Casanova militante – , mas continuaram a ser um par artístico, mesmo quando não se podiam ver um ao outro (insultavam-se em voz baixa durante as actuações). Hoje estão ambos na casa dos 80 e contam, em separado, a sua história ao realizador alemão German Kral, que conseguiu juntá-los brevemente em palco, e a um grupo de jovens bailarinos e coreógrafos de Buenos Aires, seus grandes admiradores.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Criado em 1966 por Stan Lee e Jack Kirby para a Marvel, Black Panther foi o primeiro herói negro dos comics com super-poderes. E é a identidade secreta de T’Challa, o rei de um país africano fictício, Wakanda, uma utopia étnica high tech, que se desenvolveu mais que qualquer outra nação devido a um minério com propriedades especiais, o vibranium. Realizado por Ryan Coogler (Creed: O Legado de Rocky) e interpretado por Chadwick Boseman, Black Panther, apesar do seu original e detalhado enquadramento, obedece em tudo o resto ao caderno de encargos do filme de super-heróis.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Passado num motel barato
 e berrante à sombra do
 Disney Magic Kingdom, 
numa zona degradada
 onde pululam os párias, os chupistas, os marginais e
 os automarginalizados da sociedade da abundância, esta fita de Sean Baker (Tangerine) 
é contada do ponto de vista da travessa e incansável Moonee (Brooklynn Prince), de seis anos, ali que vive com a mãe desempregada e desbocada. The Florida Project tem uma história ténue e a espaços desconexa, mas Baker não transige
 com o miserabilismo ou a condescendência “sociológica”, e faz de Moonee a força motriz do filme, apoiada por Willem Dafoe no papel do severo mas decente gerente do motel.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Na sua segunda-metragem após O Capacete Dourado (2007), Jorge Cramez adapta ao nosso tempo, e situa em Lisboa, a comédia La Place Royale ou l’amoureux extravagant, escrita por Corneille no século XVII. É uma história sobre a dança dos amores e desamores, 
sobre as ousadias, dilemas 
e hesitações sentimentais. Cramez compensa alguns problemas de escrita com uma realização guiada por uma idea visual, uma preocupação com o rigor do enquadramento e a imagem bonita e original, 
sem ser preciosa ou rebuscada (soberba fotografia de João Ribeiro), um olhar de bom gosto sobre a capital e um elenco razoavelmente coeso.

Por Eurico de Barros

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  • Romance
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

História real: em 1979, Gloria Grahame, caída fora das graças de Hollywood, já na casa dos 50 e a sofrer de cancro, estava em Londres a fazer teatro e conheceu Peter Turner, de 28 anos, aspirante a actor e natural de Liverpool. Apaixonaram-se e estiveram juntos por algum tempo, até à morte da actriz,
em 1981. Poucos anos depois, Turner publicou Film Stars Don’t Die in Liverpool, uma memória dessa relação com a intérprete de Corrupção e Cativos do
 Mal. É esse livro que Paul McGuigan adapta neste filme que Annette Bening chama todo a si. Apesar de não ter aquela inconfundível boca de Grahame, Benning interpreta-a com a combinação certa de melancolia na decadência e de voluntarismo carismático, e Jamie Bell dá-lhe boa réplica como Peter Turner.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
The Post
The Post

Steven Spielberg regressa aos anos 70, quando nos jornais ainda nem se sonhava com computadores e internet, para recordar o braço-de-ferro entre o The Washington Post e a Casa Branca, pela publicação dos Pentagon Papers, documentos secretos do governo sobre a Guerra do Vietname. O filme é uma ilustração dramatizada, e sublinhada a grosso, da Primeira Emenda da Constituição americana, que defende a liberdade de imprensa e de expressão. Com Meryl Streep no papel de Katharine Graham, a proprietária e publisher do jornal, e Tom Hanks no do seu director, Ben Bradlee, The Post está no seu melhor quando evoca esses dias das máquinas de escrever e da impressão a chumbo, e faz o elogio
do trabalho de equipa dos jornalistas, sempre sob a tirânica pressão das horas de fecho.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Quando, em 1979, “The Ballad of Lucy Jordan” começou a ser ouvida e um filme a pôs no caminho do êxito, Marianne Faithfull era, para muitos, uma desconhecida, e, para os outros, com mais idade e memória, uma curiosidade da cultura pop dos anos de 60, mais conhecida como amante (em sentido musical, mas principalmente carnal) dos Rolling Stones e de um rancho de outros músicos populares na época. Ninguém, quer dizer, poucos se lembraram dela também como a autora de um álbum terno e fundamental, As Tears Go By, gravado em 1965 com o apoio de vários companheiros de luxúria. Broken English foi, como se costuma dizer, o álbum de regresso de uma grande cantora que sobreviveu a tudo na arte e na vida. E quando todos a pensavam arrumada, esquecida, se não mesmo morta, a antiga musa da década de 1960 renasceu, tal qual como a Fénix. É este percurso acidentado que a actriz e realizadora francesa Sandrine Bonnaire regista com sensibilidade, através de documentos, imagens de arquivo e múltiplos testemunhos (incluindo o de Mick Jagger), neste retrato sobre o declínio e o renascimento, onde é a intimidade da mulher por detrás da artista que sobressai.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Jogo da Alta Roda
Jogo da Alta Roda

O primeiro filme como realizador do argumentista Aaron Sorkin conta a história da ascensão e queda de Molly Bloom (Jessica Chastain),
 a chamada “princesa do póquer” dos EUA, que organizava jogos de póquer exclusivos, frequentados
 por estrelas de cinema, milionários, realeza saudita, músicos e atletas famosos. Sorkin pinta Molly como uma vítima da sua intromissão num mundo exclusivamente masculino, mas também
de alguns passos em falso
que deu, nesta fita “de argumento”, em que a palavra tem mais peso – por vezes, demasiado – do que a câmara.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Um “falso” filme biográfico, ou um filme biográfico conceptual sobre a cantora francesa Barbara (1930-1997), em que o realizador, Mathieu Amalric, também interpreta o realizador do filme dentro do filme, e Jeanne Balibar, por sua vez, personifica a actriz que faz de Barbara neste. Saímos desta fita hábil, amaneirada e impressionista tão pouco informados sobre a cantora como entrámos.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Sou Abadi, iraniana a viver em França, assina esta divertida farsa que mete a ridículo o fundamentalismo islâmico, recorrendo a um velho expediente do género, a troca de identidade sexual. Martin não pode ver a namorada, Leila, presa no seu apartamento de Paris pelo irmão mais velho, que voltou radicalizado do Médio Oriente, e veste uma burca para passar por muçulmana e libertar a sua amada.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O argumentista (A Turma) e realizador (Les Revenants) Robin Campillo recua ao início da década de 90 em Paris, para reconstituir a militância radical da Act-Up Paris (organização a que pertenceu), formada para defender os direitos dos seropositivos. A fita tem uma urgência e uma efervescência visual, narrativa e dramática que espelha a do colectivo e das personagens principais, uma delas representante do próprio Campillo.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Uma dramatização dos factos passados com um grupo de bombeiros do Arizona que em 2013 esteve envolvido num enorme incêndio florestal. Baseado num artigo de 2017 da GQ, Joseph Kosinski conta esta história de coragem, dedicação, amizade e espírito de sacrifício colectivo de forma clássica, limpa e directa no cinema e na emoção, filmando os incêndios com realismo e sem abusar da espectacularidade. Com Josh Brolin, Jeff Bridges, Jennifer Connelly e Miles Teller.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Mark Webb, que circula entre os videoclips, as superproduções de estúdio e os filmes indie, assina aqui uma história nova- iorquina de crise familiar e iniciação à maturidade, com tacto narrativo e sentido da
 boa temperatura emocional, sem tirar dividendos melodramáticos ou estereotipar as personagens. E tem um sólido naipe de actores, com Jeff Bridges (também produtor) à cabeça, mais o jovem Callum Turner no protagonista e ainda Pierce Brosnan, Kate Beckinsale e Cynthia Nixon.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

José Afonso estava em Coimbra e durante três anos não teve notícias dos pais nem da irmã mais nova, que, sabiam lá ele e o irmão, estavam presos em Timor. Foi durante a II Guerra Mundial, e a história desta família apartada pelas circunstâncias, que seria sempre interessante contar, mais interessante se torna quando se sabe ser a família do autor de Venham Mais Cinco.

Por Rui Monteiro

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

João Botelho transformou a incrível aventura de Fernão Mendes Pinto nos Descobrimentos num exemplo de como se pode rodar um filme histórico num país sem indústria de cinema e sem dinheiro para tais andanças.Peregrinação é, inevitavelmente, visualmente parco e sem rasgos de espectacularidade, mas mesmo assim, sempre a tentar que não se vejam as costuras, consegue reter algo do poder dramático, da força evocativa e do ímpeto aventureiro do livro.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A história real de Jeff Bauman, que perdeu as pernas no atentado terrorista da Maratona de Boston de 2013, identificou os bombistas e
foi transformado, contra sua vontade, num herói americano, é contada por David Gordon Green com um realismo e uma franqueza pouco vulgares neste tipo de filmes de superação 
da adversidade. Com um excelente Jake Gyllenhaa
l no papel de Bauman, muito bem coadjuvado por Miranda Richardson e Tatiana
 Maslay.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Filha de imigrantes em França, Laurence Ferreira Barbosa
 conta a história do desejo de emancipação de Paméla, uma adolescente da lusodescendência francesa, e através dela, dá uma ideia das tensões de geração, das sensibilidades dos dilemas de identidade e das aspirações dos jovens luso-descendentes, e da sua relação diversa com Portugal. Sem caricaturas ou clichés e com uma protagonista, Paméla Ramos, que, em parte,
 se interpreta a si própria.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Outro Lado da Esperança
O Outro Lado da Esperança

Uma história que mistura dureza e compaixão, cepticismo em relação ao sistema e esperança na decência de pessoas avulsas, muita música retro, uma realização sobriamente pragmática, humor de cara fechada e actores patuscos. Adivinharam, é mais um 
filme de Aki Kaurismaki, 
que aqui cruza os destinos
 de um finlandês dono de um restaurante e de um refugiado sírio em fuga em Helsínquia.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Amor de Improviso
Amor de Improviso

O cómico paquistano-americano Kumali Nanjani transformou a história de como conheceu a mulher,
 a autora e argumentista Emily V. Gordon, numa comédia romântica semi-autobiográfica. Que é também um filme sobre lealdades familiares e culturais divididas e como lidar com
os prováveis futuros sogros quando a ex-namorada está em coma no hospital. Com o próprio Nanjani, Zoe Kazan e os estupendos Ray Romano e Holly Hunter.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O Sabor da Cereja, embora um pouco corroído pelo tempo e sem o fulgor de 1997, quando sacou Palma de Ouro no Festival de Cannes, tem algo que se lhe diga. O que se mantém e continua 
a sustentar esta história de um homem que se quer suicidar e procura quem o enterre a seguir, é o humanismo das personagens e a substância dos diálogos que
 o cineasta iraniano criou para Badii. Dele, não sabemos nem saberemos nada. Nem a razão
 do desespero ou o porquê da preocupação com o enterro. Nem interessa, pois estamos perante uma busca para encontrar razão de esperança, mesmo no interior de uma ditadura saída da idade das trevas, realizada com subtileza e elegância – e considerável dose de ingenuidade.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Vicente Alves do Ó continua
a filmar a vida de poetas portugueses, recriando aqui os tempos que Al Berto passou na sua Sines natal, logo depois do 25 de Abril e de ter voltado de Bruxelas, para onde tinha fugido do serviço militar. O filme dirá muito ao realizador, por motivos pessoais, e àqueles que viveram esses tempos com Al Berto. O mesmo já não se passa com quem o vá ver à espera de uma biografia mais convencional e mais completa.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Mais do que um filme sobre a célebre final do Torneio de Wimbledon de 1980, onde Bjorn Borg procurava a quinta vitória consecutiva e John McEnroe procurava, por seu lado, derrotá-lo e derrubá-lo do poleiro de “menino de ouro” do ténis mundial, Borg vs McEnroe é sobre o próprio Borg (Sverrir Gudnason), ou não fosse o realizador, Janus Metz, sueco como ele. Esta é uma fita diligente, sem grandes surpresas ou revelações sobre os jogadores (Shia LaBoeuf personifica McEnroe) ou a final propriamente dita.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O filme de Pedro Pinho sobre uma empresa de elevadores de Alverca ameaçada de fecho, e as movimentações do seu pessoal para a manter a funcionar e salvarem os empregos, dispara em muitas direcções: é uma ficção chegadinha à realidade da crise, uma reflexão sobre o estado do movimento laboral e o futuro do capitalismo, uma interrogação sobre os tempos de transição que vivemos e até tem um interlúdio musical. E precisava de um produtor que tivesse sabido 
onde talhar nas suas atarefadas e prolixas três horas de duração.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Terror
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Depois da minissérie de 1990 de Tommy Lee Wallace, eis
a adaptação ao cinema do
livro de Stephen King pelo argentino Andy Muschietti, dividida em dois filmes, um para cada época em que a acção decorre (aqui actualizada para os anos 80 e os nossos dias).
O bom jovem elenco de It, e
o tempo que Muschietti dá a cada um dos sete miúdos para serem personagens plenas, compensa o Pennywise de Bill Skarsgard, inferior ao de Tim Curry na minissérie.

Por Eurico de Barros

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Sorte à Logan
Sorte à Logan

Sob o signo de uma celebérrima canção de John Denver, Steven Soderbergh assina uma versão sulista e redneck de Ocean’s Eleven, um divertimento engenhoso, castiço, muito ritmado e que contorna várias convenções do filme de grande assalto, mantendo-se fiel ao formato no essencial. Com Channing Tatum, Adam Drive, Riley Keogh (que é neta de Elvis Presley), e um Daniel Craig desopilante num rebenta-cofres de cabelo oxigenado chamado Joe Bang.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Una - Negra Sedução
Una - Negra Sedução

Algures em Inglaterra, uma rapariga entra
 numa empresa e confronta 
um dos seus quadros, um homem chamado Peter. Passa-se que 15 anos antes, quando 
a rapariga, chamada Una (Rooney Mara), tinha 13 e era vizinha do homem, Peter (Ben Mendelsohn), este envolveu-se sexualmente com ela. Depois de tudo ter vindo a público, Peter foi julgado por abuso de menores, passou quatro anos na cadeia, saiu e depois mudou de nome, de cidade, de emprego, de vida. Una veio procurar Peter não para se vingar dele expondo-o aos colegas, ou para
 o matar. É que a relação entre ambos não foi forçada por Peter nem envolveu violência. Una veio procurar Peter para saber porque é que ele a abandonou numa pensão sem dizer água vai, antes de ser preso. Adaptado por Peter Harrower da sua peça Blackbird, este filme de Benedict Andrews dá um twist inesperado – e ousado – nos estereótipos das histórias sobre pedofilia. Mara 
e Mendelsohn são muito bons 
e, no final, o filme deixa uma dúvida inquietante no ar.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
A Viagem a Espanha
A Viagem a Espanha

Depois de A Viagem e A Viagem a Itália, que começaram como séries de televisão e depois tiveram montagens para cinema, eis mais do mesmo. Desta vez, Steve Coogan e Rob Brydon levam as suas personas audiovisuais até ao país vizinho, falam das dores pessoais e profissionais e de tudo e mais alguma coisa, e fartam-se de comer e beber. A Viagem a Espanha saboreia-se bem, mas já se nota um certo travo a comida requentada.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Radicado em Espanha há 20 anos, o brasileiro Sérgio Oksman aproveitou o Mundial de 2014, disputado no seu país, para, em colaboração com o espanhol Carlos Mugiro, rodar esta melancólica elaboração ficcional muito próxima da realidade, sobre o seu reencontro com o pai, em São Paulo, em 2013. 
De resto, há pouquíssimo futebol em O Futebol: farrapos de conversa sobre bola, relances de jogos na televisão, uma velha caderneta de cromos.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Como Cães Selvagens
Como Cães Selvagens

Nicolas Cage protagoniza, por uma vez em modo bom actor, o novo filme de Paul Schrader – argumentista de Taxi Driver e O Touro Enraivecido, realizador de American Gigolo ou O Acompanhante. O subtil sarcasmo que o realizador introduz na construção desta tragicomédia é a sua mais-valia. Contudo, embora enuncie uma estética, às tantas parece determinado em amaciá-la, torná-la mais conforme à regra.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Uma Vida de Cão
Uma Vida de Cão
A nova comédia triste de Todd Solondz recorre a uma cadela “salsicha” para veicular a visão cerradamente misantrópica e cruelmente sardónica que o autor de Felicidade tem do seu semelhante, e da existência em geral. O cãozinho do título é o macguffin que Solondz utiliza para contar quatro histórias de pessoas cruéis, infelizes, à deriva, imbecis ou frustradas (só escapam um menino a recuperar de um cancro e um casal trissómico). Entre os actores estão Julie Delpy, Greta Gerwig, Danny devito (em cujo segmento Solondz crava várias farpas no meio cinematográfico) e Ellen Burstyn, e o final é de uma brutalidade patética inaudita. Uma Vida de Cão é desigual, mas ao menos o realizador continua a não ceder terreno ao sentimentalismo de tostão a dúzia ou à demagogia do optimismo.
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
As Donzelas De Rochefort (The Young Girls Of Rochefort)
As Donzelas De Rochefort (The Young Girls Of Rochefort)

Três anos depois do êxito do musical experimental Os Chapéus de Chuva de Cherburgo, o realizador francês voltou a insistir no género e mais uma vez, porque em equipa que ganha não se mexe, com Catherine Deneuve (em parceria com a irmã, Françoise Dorléac) na interpretação e Michel Legrand responsável pela banda sonora. Agora em versão restaurada, foi outro êxito e ainda valeu candidatura a Óscar, mas… Esta história de amores simples atormentados por problemas reais, embora na aparência tão delirante e graciosa como a anterior, surge um pouco domada. Apesar de uma até mais apurada partitura de Legrand; mesmo com a experiência de Dorléac a espevitar o talento de Deneuve, é como se o cineasta retirasse os elementos mais experimentais e estimulantes para se comprazer com uma norma mais acessível ao gosto do público.

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Eis um bom filme para a família e que consegue ser sentimental sem nunca caramelizar. A adolescente do título (interpretada pela espigadota Sophie Nélisse), encontra o lar de adopção de sonho, para depois aparecer a sua rica e bondosa avó (Glen Close), que a quer levar para casa e fazê-la conhecer a mãe, a qual Gilly sempre idealizou.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Valérian e a Cidade dos Mil Planetas
Valérian e a Cidade dos Mil Planetas

É o filme francês, europeu e independente mais caro de sempre (197 milhões de euros), com o qual Luc Besson desafia Hollywood no seu próprio jogo e no seu território (uma superprodução de ficção científica baseada numa banda desenhada, apontada ao mercado global). E é também uma transposição para a tela, com aceitável sucesso, do complexo e riquíssimo universo gráfico da série Valérian e Laureline, criada
há exactamente 50 anos por Mézières (desenho) e Christin (argumento). Dane DeHaan não serve na personagem de Valérian, do aspecto ao modo de ser, mas a Laureline de Cara Delevingne vai sendo cada vez mais convincente, à medida que o enredo progride. É o melhor trabalho de Besson desde Vertigem Azul, e superior a qualquer filme de super-heróis saído da salsicharia cinematográfica de Hollywood.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Carros 3
Carros 3

Faísca McQueen é atirado sem cerimónias para fora das pistas pelos carros de uma nova geração high tech, mas quer mostrar que não está acabado e passa a ter uma treinadora motivacional, a jovem Cruz Rodriguez, sua grande fã. A agradável surpresa introduzida a certa altura no argumento, o talento único da Pixar para humanizar objectos e máquinas e a altíssima qualidade da animação digital do estúdio, fazem de Carros 3 uma animação ganhadora, e melhor que Carros 2.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Se tivesse sido rodado com a II Guerra Mundial ainda fresca na memória colectiva britânica, como foi o caso, em 1958, de A Epopeia de Dunquerque, de Leslie Norman, este Dunkirk de Christopher Nolan seria um filme de agitação e inspiração patriótica. Pelo contrário, é uma fita onde a escala de superprodução contrasta com a abordagem semidocumental e descritiva, e o tom carregado e não-heróico. Nolan recorreu a um mínimo de efeitos digitais e apostou em aviões e barcos da época, ou réplicas, o que confere outra autenticidade ao filme.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Lady Macbeth
Lady Macbeth

Filme de estreia de William Oldroyd, que pega no romance 
de Nikolai Leskov, Lady Macbeth do Distrito de Mtsensk (1865)
 e o transpõe da Sibéria para a Inglaterra rural do século XIX. Esta história sombria e secamente brutal de uma jovem (Florence Pugh) mal casada com um proprietário rico, rude e opressor, arrasa os clichés do filme de época romântico, bucólico e arrumadinho.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

A história de Chuck Wepner, o pugilista anónimo que inspirou a personagem de Rocky Balboa a Sylvester Stallone, ao combater com Muhammad Ali em 1975. Liev Schreiber produz o filme e interpreta Wepner neste modesto mas honesto drama proletário americano, realizado por Philippe Falardeau. Também com Naomi Watts, Elizabeth Moss e Ron Perlman.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O compositor e pianista russo Oleg Karavaychuk, que morreu no ano passado, aos 89 anos, era um figura extravagante, com o seu ar andrógino, a sua cabeleira desarrumada e a sua voz de cana rachada, que lhe valeram a alcunha de “o compositor louco”. Nos anos 50, Karavaychuk foi proibido de tocar, e dedicou-se a compor música para os filmes de cineastas como Sergei Parajanov ou Kira Muratova, e a colaborar com artistas de vanguarda. Foi ao ouvir a sua música num filme de Muratova, e ao ver no YouTube um vídeo dele a tocar piano, que Andrés Duque, venezuelano radicado em Espanha, o descobriu, e rumou à Rússia para fazer um filme sobre ele. Em Oleg y las Malas Artes, Duque dá carta branca a Karavaychuk, que fala sobre os tempos de Estaline e Putin, toca o piano de Nicolau II no Hermitage e expõe as suas originais teorias sobre música. É pena que a fita seja tão curta e saiba a tão pouco, porque ficou mesmo muito por contar.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
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Homem-Aranha - Regresso a Casa
Homem-Aranha - Regresso a Casa

O segundo reboot do super-herói aracnídeo é o melhor filme desta série, com Tom Holland bem metido no papel de Peter Parker/Spidey. O realizador Jon Watts cruza o filme de super-heróis com a comédia de adolescentes liceais, arrancando uma fita descontraída, cheia de sentido de humor e sem a sisudez, a auto-importância e o gigantismo descerebrado do costume. Há ainda um vilão original (Michael Keaton na boa forma habitual) e responsável por um twist no argumento daqueles de causar um torcicolo.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

O falecido encenador e realizador suíço Luc Bondy rodou esta versão contemporânea da comédia de Marivaux para o canal ARTE, ao mesmo tempo que apresentava a sua encenação num teatro de Paris. Os actores filmavam-na durante o dia e interpretavam-na em palco à noite, e Bondy funde os dois espaços no final, já que As Falsas Confidências tem o seu clímax na cena do Teatro Odeon. 

Esta história de um homem (Louis Garrel) que vai trabalhar para a viúva rica e mais velha (Isabelle Huppert) pela qual estáapaixonadosofre,na linguagem e nas peripécias,
com o deslocamento temporal e epocal a que é submetido, já que foi escrita em 1737 e “arrastada” por Bondy para a Paris do século XXI, e nem sempre resulta vestir roupas modernas a obras antigas. 

Garrell, Huppert, Bulle Ogier e o restante elenco ajudam
a atenuar esta sensação de anacronismo, mas nunca nos abstraímos totalmente dela. E aquele final “fora da ficção” era dispensável. 

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Mãe Rosa
Mãe Rosa

O filipino Brillante Mendoza, autor de Lola e Cativos, conta uma história de corrupção “ordinária” nos bairros pobres de Manila, nesta fita de um naturalismo feio e sujo, atirado à cara do espectador por uma câmara peripatética 
em simulação de imediatismo documental. Mas Lino Brocka já andou por aqui antes de Mendoza. No papel principal, Jaclyn Jose ganhou o prémio de Melhor Actriz no Festival de Cannes de 2016.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Aos 80 anos, Eleanor Coppola realizou a sua primeira longa- metragem de ficção, vagamente baseada em recordações pessoais. É uma versão estival, muito light
e com ênfase na gastronomia, de Lost in Translation da filha Sofia, passada numa França próspera
e sem problemas. Confeitaria cinematográfica despretensiosa e escapista, com a sempre luminosa Diane Lane, Alec Baldwin e Arnaud Viard.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Dos realizadores búlgaros de A Lição, Kristina Grozeva e Petar Valchanov, um bom filme satírico e negro sobre a corrupção política na Bulgária. Um honesto, humilde e gago trabalhador ferroviário acha uma pequena fortuna em notas na linha, e devolve o dinheiro. Uma troca de relógios vai levar a que passe de herói nacional e trabalhador exemplar, a mentiroso ridicularizado em público e malandro destratado pela polícia.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

É um mundo de contrastes. Um mundo sem alternativa. Um mundo em que a adaptação às circunstâncias é uma forma de sobrevivência. A vida de Félicité (a estreante e muito impressionante Véro Tshanda Beya Mputu) vai dar um grande volta quando o filho adolescente tem um desastre de moto, vai parar ao hospital, e esta cantora de cabaré, em Kinshasa, descobre que tem de pagar um balúrdio de dinheiro que não tem pela operação. Adaptando- se, como de costume, a protagonista acaba por aceitar
o auxílio oferecido por Tabu (Papi Mpaka), que ainda vai arranjando os distúrbios crónicos do frigorífico da cantora e se torna seu amante, o que é fonte de tanto prazer como de perturbação. Alain Gomis, no seu quarto filme, além de transportar uma influência clara dos irmãos Dardenne, prossegue o seu caminho de cineasta em busca de uma identidade cultural, explorando, em jeito de realismo social e ao ritmo bamboleante da pop africana, as ruas da capital da República Democrática do Congo, o que faz do filme uma obra estimulante, embora algo condescendente.

Por Rui Monteiro

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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
David Lynch: The Art Life
David Lynch: The Art Life

O trio de realizadores deste documentário está interessado não nos filmes de David Lynch, mas sim nos seus quadros, já que antes de se dedicar ao cinema, o realizador de Veludo Azul e Mulholland Drive cursou artes plásticas e queria ser pintor e levar uma “vida de artista”. Lynch não se descose sobre o significado dos seus quadros, como seria de esperar, mas fala sobre a sua infância feliz, a família e os tempos de estudante e jovem artista pobretanas, antes de descobrir o cinema.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Sentido do Fim
O Sentido do Fim

Um filme inglês baseado no livro de Julian Barnes que ganhou o Prémio Booker. Ritesh Batra (A Lancheira) assina esta história intrigante e absorvente, sobre segredos antigos que ficaram escondidos daqueles que nos são mais próximos, e que regressam do passado para perturbar o presente. Óptimas interpretações de Jim Broadbent, Charlotte Rampling, Harriet Walter e Emily Mortimer, entre outros. Única falha: um fim em anti-clímax.

Por Eurico de Barros

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  • Ficção científica
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Alien: Covenant
Alien: Covenant

O segundo filme da nova trilogia de Alien, que vai fazer a ponte para o filme original de 1979, é muito familiar. Mas Michael Fassbender num papel duplo (há dois andróides em Covenant, iguais como gotas de água), os aliens que rilham humanos como se fossem bifes tártaros e o consumado talento visual de Ridley Scott, bem como a sua capacidade de gestão do terror e da tensão, ajudam a compensar a forte sensação de “já vi isto em qualquer lado”.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Dentro de cada um de nós, por mais medíocres e desastradas que as nossas vidinhas sejam, existe um colosso capaz de fazer tudo em cacos. A ideia não é má, mas é melhor quando, para ali chegar, Nacho Vigalondo faz o seu argumento e a sua realização percorrer os mais esconsos, desviantes e bizarros caminhos.

Por Rui Monteiro

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  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Chamar “Courgette” a uma criança já tem que se lhe diga. Agora, fazer um miúdo de nove anos acreditar ser o responsável pela morte da mãe, uma alcoólica dada à violência que caiu escada abaixo, é, convenhamos, pelo menos cruel. Embora um pouco dada ao moralismo, é verdade que a narrativa decorre a bom ritmo, como que deslizando entre quadros que confrontam a visão infantil com a perspectiva adulta, sem esquecer a violência inerente ao novo, digamos,
 estilo de vida de Courgette. O seu percurso é, aliás, bem preenchido pelo humor, conseguindo a realização introduzir com astúcia e sem pinga de propaganda o universo de crianças abandonadas e traumatizadas e sós, enfim, deixadas à sua sorte e à bondade de estranhos.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Esta estreia na realização do argumentista Bob Nelson (Nebraska, de Alexander Payne) é
 uma sólida comédia dramática sobre um miúdo certinho que vai passar o fim-de-semana com o pai divorciado (Clive
 Owen), um carpinteiro perfeccionista e alcoólico, que vive de biscates, e sobre as peripécias que vivem após o roubo de uma caixa de ferramentas,
 e que acabam por os aproximar. Um filme de argumento e de actores, sem estereótipos nem pieguices.

Por Eduardo de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Jovem Karl Marx
O Jovem Karl Marx

O cineasta haitiano Raoul Peck escolheu o mais percorrido e académico género biográfico, talvez como forma de diminuir a carga ideológica que qualquer filme com Karl Marx no título tem, procurando evitar controvérsia como forma de passar a sua mensagem, de preferência a não conversos, criando, a maior parte do tempo, uma atmosfera onde florescem ideias alimentadas por dois homens tão distintos como complementares. August Diehl e Stefan Konarske vão muito bem nos papéis de Karl Marx e Friedrich Engel.

Por Eduardo de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Adaptação, para o nosso tempo, do conto homónimo e autobiográfico de Joseph Conrad. Um rapaz que sonha com o mar e com terras distantes consegue embarcar num cargueiro a cair de podre. Paulo Branco produz esta fita de Julien Samani, uma modesta mas aceitável narrativa de iniciação e, em simultâneo, de desilusão.

Por Eurico de Barros

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  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
The Boss Baby
The Boss Baby

A nova longa-metragem animada da DreamWorks chega a Portugal apenas na versão dobrada em português, pelo que ficamos privados da voz de Alec Baldwin na personagem principal, o Boss Baby do título. Como a dita foi concebida a pensar em Baldwin, tem pormenores de caracterização e profere várias tiradas que remetem a papéis seus no cinema e na televisão, nomeadamente o executivo de televisão autoritário e lorpa de Rockefeller 30, é de lamentar que o filme não se estreie em versão original e dobrada.Baseado num livro infantil de Maria Frazee, The Boss Baby é uma daquelas animações que tem a família como alvo e procura conquistar o público mais novo sem perder o interesse dos adultos. É um malabarismo difícil, sobretudo quando a história – a chegada de um bebé a uma família com um filho único, e que este transforma numa elaborada fantasia de disputa pela atenção dos pais– tem que manter uma componente cute, ao mesmo tempo que desenvolve um tipo de humor em parte à base de gags, citações (e alguma autoparódia) que só os mais velhos captarão. A bota nem sempre joga com a perdigota, mas The Boss Baby tem os seus momentos, sobretudo graças a um estilo visual que de vez em quando extravasa da rotina da animação digital de grande estúdio.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
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Sonhos Cor-de-Rosa
Sonhos Cor-de-Rosa

O jornalista italiano Massimo Gramellini publicou há meia década o romance autobiográfico Fai Bei Sogni, êxito de vendas agora transposto para filme por Marco Bellocchio. O título é a última coisa que a mãe lhe diz antes de morrer, tem Massimo nove anos e o mundo está a chegar a 1970 – arranque para um filme estimável que teria ganho em veemência se não abusasse do simbolismo para acentuar o que já se percebeu. O pai do garoto é de nulo préstimo afectivo, o que, aliado ao desaparecimento precoce e mal explicado da idolatrada âncora maternal, resulta num crescimento por sua conta, criando um mundo aos soluços. A blindagem emocional de Massimo prolonga-se pela vida adulta, com sucesso no jornalismo desportivo, como repórter de guerra em Sarajevo e no correio sentimental do La Stampa. E é ver o emprego invulgar, pungente e terapêutico, de “Surfin’ Bird” dos Cramps.

Por Jorge Lopes

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  • Comédia
  • 3/5 estrelas
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Ladrões com Muito Estilo
Ladrões com Muito Estilo

Este remake de uma comédia esquecida de 1979, A Brigada do Reumático, passaria em branco, não fosse contar nos papéis principais com Michael Caine, Morgan Freeman e Alan Arkin, no papel de três reformados que ficam sem a pensão e decidem assaltar um banco. O filme, são eles. E até no cinema, há que ter respeito pelos mais velhos.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Juntamente com Toni Erdmann, da alemã Maren Ade, este sueco Um Homem Chamado Ove, de Hannes Holm, foi candidato ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro e um dos sucessos internacionais de 2016 made in Europe. É a história do Ove do título, um idoso aparentemente intratável, mas que afinal tem um coração de ouro, contada com humor – bastante negro, por vezes – e algum drama – um pouco xaroposo, a espaços. No papel principal, Rolf Lassgard, mais conhecido na Suécia pelos seus papéis em séries policiais, é muito bom.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
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O realizador Filipe Ascensão é completamente claro ao que vem: homenagear Eusébio. Não se espere, portanto, qualquer tipo de perspectiva crítica nem nenhuma espécie de contextualização séria do papel do jogador na propaganda de um regime com pouco ou nada de que se orgulhar. O que se encontra é um trabalho respeitador das regras canónicas do documentário, recorrendo, sem grande imaginação, contudo com grande critério, a imagens de arquivo, assim como na recolha de depoimentos e sua organização que, apesar do carácter hagiográfico, nunca resvala para a propaganda cega. No fim sobra uma homenagem. Justa.

Por Rui Monteiro

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Aquarius
Aquarius

Uma jornalista reformada (Sónia Braga) é a última inquilina de um prédio à beira-mar no Recife, e nem à lei da bala vende o seu andar à construtora que quer demolir o edifício e construir apartamentos de luxo. A segunda realização de Kleber Mendonça Filho, autor de O Som em Redor, é uma decepção quando comparada com esta: óbvia, maniqueísta, telenovelesca, com personagens de cartão e cola grossa. Fica a interpretação de Sónia Braga a segurar tudo.

Por Eurico de Barros

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Este épico razoavelmente contido em torno da luta pela reconquista da independência da Coreia durante a anexação japonesa, situado na década de 1920, passa por vários estados climatéricos. Primeiro é uma malha densa de espionagem e duplicidade com o seu quê de John le Carré em que o espectador pode perder-se entre a batelada de personagens que irrompe pelo ecrã: a resistência no terreno, cercada, tenta angariar dinheiro para adquirir explosivos em Xangai, onde se refugia o seu líder, Jung Che-san (Byung-hun Lee); ao mesmo tempo que faz por convencer Lee Jung-chool (Kang-ho Song), novo capitão coreano da polícia de Seul, ex-intérprete da oposição e o eixo do filme, a passar de novo para o lado da insurgência. A teia simplifica- -se e a tensão cresce na longa viagem de comboio Xangai-Seul, momento alto do filme, com o seu quê de Scorsese, a resistência a dissimular dinamite na bagagem e Lee no meio da ponte entre rebeldes e o seu parceiro Hashimoto (Tae-goo Eom), um japonês alucinado. A captura dos resistentes e o contra-ataque no último terço polui os sentidos com sadismo em excesso, mas o requinte do atentado final, ao som do Boléro de Ravel, tem um certo ar redentor.

Por Jorge Lopes

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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Poucas pessoas, fora aquelas que se interessam por história militar, sabem que o Brasil entrou na II Guerra Mundial, lutando em Itália sob comando americano. Esta fita de Vicente Ferraz, uma co-produção com Portugal, põe em cena com eficácia e interesse dramático a história de um punhado de soldados brasileiros que se perdem da sua unidade na frente de combate, em pleno Inverno.

Por Eurico de Barros

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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado

Há os factos e há a ficção, a poesia e ainda uma viagem às contradições e peculiaridades do carácter de um homem. Poeta, boémio, comunista, senador do seu partido, homem do povo com gosto pelas coisas da burguesia. Isto é: Neruda, segundo o realizador chileno Pablo Larraín, numa película astuta em evitar os hábitos do género biográfico, mas um pouco dispersa e vaga na disposição do seu conjunto de símbolos.

Por Rui Monteiro

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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Logan
Logan
Os mutantes da série X-Men (ou o que resta deles) já não podem com uma gata pelo rabo, mas antes de pendurar de vez as garras de adamântio, Logan (Hugh Jackman) tem que cumprir uma derradeira tarefa, nesta fita elegíaca e ultra-violenta de James Mangold. A continuação da franchise está garantida, claro, com uma nova geração de mutantes liderada pela jovem Laura, uma Wolverine teen.

Por Eurico de Barros
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  • 3/5 estrelas
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Um Instante de Amor
Um Instante de Amor
Escrito mais uma vez com Jacques Fieschi, seu colaborador desde o primeiro filme que realizou, Encontro de Fim-de-Semana, o novo filme de Nicole Garcia, Um Instante de Amor, mantém-se fiel à uma linha romanesca e clássica do cinema francês e reitera o interesse da realizadora e actriz por enredos de conflitos humanos com protagonistas masculinas ou femininas de personalidades bem vincadas. Baseado num livro da escritora italiana Milena Agus, que Garcia e Fieschi adaptaram muito livremente e transpuseram para a França rural dos anos 50, Um Instante de Amor tem como heroína Gabrielle (Marion Cotillard), uma rapariga espontânea e brusca, que os pais julgam ser desequilibrada, que se resigna a uma união sem amor, para depois se apaixonar por um jovem militar internado na clínica suíça onde se foi tratar. É uma história sobre as ironias dolorosas do amor, totalmente dominada pela figura excessiva de Gabrielle, que Marion Cotillard interpreta com total controlo dramático da personagem.

Por Eurico de Barros
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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O maior elogio que se pode fazer a Adeus, Europa é notar que a desesperança que vai tomando conta do escritor austríaco Stefan Zweig no período aqui retratado, entre 1936 e 1942, transparece exemplarmente nas feições de Josef Hader, o actor que lhe dá corpo. Nele e em Aenne Schwarz, que compõe Lotte Zweig, ex-secretária e segunda esposa do autor. A progressão da desesperança é mostrada na mão cheia de capítulos em que o filme se divide. Em Setembro de 36 Zweig, judeu exilado e um dos mais famosos escritores em língua germânica do século passado, insiste em Buenos Aires, num encontro do PEN Club, quando a sombra da guerra se avoluma, que a mais fundamental das questões é a necessidade de encontrar forma de coexistência pacífica entre raças, classes e credos. Soa a anacronismo bem-intencionado, e o rápido evoluir dos acontecimentos, ilustrado nas suas passagens pela Baía e por Nova Iorque em 1941, demonstram a impossibilidade da condição não interventiva e racional que Zweig considerava basilar no papel de um intelectual, desembocando na ida do casal para Petrópolis, refúgio ilusório que termina com o suicídio de ambos em 42. A estrutura narrativa de Adeus, Europa livra-o da formatação dos telefilmes. O elenco está recheado de actores portugueses – uns sobressaem a espaços, outros estão no papel de parede.

Por Jorge Lopes
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  • Filmes
  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Lego Batman: O Filme
Lego Batman: O Filme

Vindo da iconoclasta série de televisão Robot Chicken, o realizador Chris Mckay faz aqui, em animação digital e tom gozão em jorro contínuo, um filme superior aos presunçosos e solenes da série O Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan. Batman.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Embora tecnicamente dirigido pelo dramaturgo e novelista Peter Handke, a adaptação ao cinema deste, digamos, thriller intelectual e psicológico, é, dizem más-línguas bem informadas, tão influenciada por Wim Wenders (um dos produtores da película) que faz sentido incluí-la na programação do ciclo dedicado ao realizador de As Asas do Desejo.

Em resumo, o filme conta a história de Marianne (Edith Clever), aos 30 anos aborrecida e infeliz que nem uma alforreca no casamento com o seu dominador marido, Bruno (Bruno Ganz), que resolve abandoná-lo para viver sozinha com o filho, Stefan (Markus Mühleisen), com quem, aliás, não se consegue relacionar. Assim como não se consegue relacionar com o pai ou qualquer dos seus amigos. Mais, para viver como mulher independente financeiramente não tem outro remédio senão trabalhar de tradutora para o mulherengo editor interpretado por Bernhard Wicki. Até reencontrar Franziska (Angela Winkler), uma amiga perdida no tempo, que não só admira a sua coragem como a introduz em um círculo feminista onde o mal-estar de Marianne não é uma excentricidade. Este é o resumo, porque o tutano deste enredo em que nunca nada parece acontecer, e o objectivo do autor, esses, encontram-se no subtexto, debaixo de muitos panos de psicologia e uma boa camada de semiótica que se desvendam como um quebra-cabeças.

Por Rui Monteiro
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  • Filmes
  • Suspense
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Fragmentado
Fragmentado
M. Night Shyamalan regressa do limbo dos maus filmes com este thriller sobrenatural sobre um homem com 23 personalidades (James McAvoy) que rapta três adolescentes para as sacrificar a uma 24ª identidade, maligna e com poderes sobre-humanos, que está para se manifestar. Tem atmosfera, suspense, terror e uma jovem actriz em ascensão, Anya Taylor-Joy (A Bruxa) no papel da refém mais inteligente e astuta.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • Comédia
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
As carradas de nomeações para os Globos de Ouro e para os Óscares, o entusiasmo e o hype em redor deste musical de Damien Chazelle são manifestamente exagerados. É um gigantesco déjà vu do género, com citações em todas as direcções, dos musicais da MGM a Jacques Demy e ao Coppola de Do Fundo do Coração, de que o realizador é um conhecedor e um fã sincero e entusiástico.

Por Eurico de Barros
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  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Divã de Estaline
O Divã de Estaline
Rodado em Portugal, o terceiro filme de Fanny Ardant como realizadora tem um imponente Gérard Depardieu no papel de Estaline, e é uma fábula sombria e pessimista sobre o poder totalitário e aqueles que se vendem a ele ou tentam resistir. Também com Emmanuelle Seigner e Paul Hamy.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Só as crianças e os na sua situação vêem Damiel (Bruno Ganz) e Cassiel (Otto Sander), velhos anjos deambulando pela nublada Berlim Ocidental de 80s, olhando para os humanos, às vezes olhando por eles, eventualmente fornecendo algum alívio aos aflitos, mas nem sempre com êxito. Um dia, porém, Damiel apaixona-se por um dos seus objectos de observação. E vai daí anuncia o desejo de se tornar humano, sentir as coisas fisicamente e senti-las ainda mais emocionalmente para concretizar a sua paixão por Marion (Solveig Dommartin), a trapezista do circo falido a que dedica atenção, como dedica, mas sem amor de premeio, àquela equipa de cinema onde Peter Falk faz de tipo sensível e sensitivo. O que traz um problema. Ao tornar-se humano não há garantias do anjo transviado encontrar a sua amada. Em As Asas do Desejo, a cinefilia que andava a infectar o cinema de Wenders desde O Amigo Americano, tornou-se marca, sinal de autoria, porém sem causar estrago (esse viria depois) a esta película tão poética como desconsolada.

Por Rui Monteiro
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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Bone Tomahawk
Bone Tomahawk
Um raro, bem carpinteirado e consideravelmente arrepiante western de terror, primeiro filme de S. Craig Zahler. O inafundável Kurt Russell interpreta um xerife que lidera um grupo que vai salvar três pessoas raptadas por um grupo de índios que degeneraram e se tornaram canibais.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Primeira longa-metragem realizada pelo jovem actor francês Grégoire Leprince-Radiguet, que é também o protagonista e o argumentista. Um típico pequeno filme de autor francês, com uma insólita (e artificial) particularidade: uma boa parte dos diálogos são ditos em verso alexandrino. Nem sempre convence, mas há que louvar o arrojo de Leprince- -Radiguet logo no filme de estreia.

Por Eurico de Barro
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Homenzinhos
Homenzinhos
O novo filme de Ira Sachs (O Amor é uma Coisa Estranha) é uma história nova- -iorquina, portátil e muito económica (talvez até um pouco demais) sobre o diferendo entre duas famílias por causa da renda de uma loja, que põe em causa a amizade entre dois adolescentes, um da família proprietária, outro da que aluga. Os miúdos (Theo Taplitz e Michael Barbieri), ambos estreantes, são muito bons.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Há mais de 30 anos, as coisas não corriam nada bem entre o realizador alemão e os seus produtores em Hollywood. Aproveitando um intervalo nas filmagens de Hammett, Wim Wenders vem para Portugal, instala-se na Praia Grande e (com uma passagem narrativa fundamental e conclusiva por Los Angeles) cria uma obra em que uma equipa de filmagens é forçada a parar tudo quando o dinheiro acaba e o fornecimento de película estanca no meio de uma disputa, digamos, conceptual, entre os produtores americano e europeu. Sem nada para fazer, a equipa fala. Fala de cinema, no momento em que quer o papel do autor quer o da arte estavam definitivamente a ser postos em causa.

Por Rui Monteiro
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O catalão Albert Serra recria a agonia do Rei-Sol, morto de gangrena numa perna a 1 de Setembro de 1715. O filme, com um impressionante Jean-Pierre Léaud no papel principal, nunca sai do quarto do monarca, e é pictórico, claustrofóbico e arrastado. Serra não frisa o suficiente o facto de aquele homem que se despede da vida, entre médicos, cortesãos, familiares e amantes, ser também um símbolo supremo de poder.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
“Amei muito o Mário, o que não dizer que fossemos amantes, não fomos.” As palavras de Cruzeiro Seixas marcam o documentário de Cláudia Rita Oliveira, destinado a mostrar a obra de um representante do surrealismo, porém tomado pelo amor nascido da longa amizade com Mário Cesariny. O que explica a sua exibição em conjunto com Autografia, versão restaurada do documentário realizado por Miguel Gonçalves Mendes, em 2004. É, pode-se dizer, a história de um desencontro amoroso, de uma relação com altos e baixos. Baixos muito baixos e muito tardiamente resolvidos; altos e baixos de uma intensidade que transborda para as respectivas obras como um prolongamento da vida.

Por Rui Monteiro
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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Emir Kusturica regressa ao território e ao tempo da Guerra da Bósnia, para encenar, no meio de grande fogo de artifício, a história de amor entre um leiteiro sérvio comprometido e uma misteriosa refugiada ítalo-sérvia ainda mais comprometida. O cenário é o do costume: caos e destruição e nonsense, onde não faltam um sortido de militares, oportunistas, bandidos, ciumeira, muito álcool e tiroteio e inevitável pop balcânica… Ou seja: Kusturica a fazer valer a sua marca através de um leiteiro melancólico no meio de uma miríade de metáforas.

Por Rui Monteiro
  • Filmes
  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Vendedor
O Vendedor
Asghar Farhadi (O Passado, Uma Separação) continua a contar histórias da classe média urbana e educada do Irão. O Vendedor expõe um sismo emocional no seio de um casal, ele professor, encenador e actor, ela actriz, e reitera todas as qualidades de escrita, realização e direcção de actores de Farhadi, embora seja demasiado demonstrativo no último acto.

Por Eurico de Barros
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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Porquê Ele?
Porquê Ele?
É o dia fatal em que os pais vão conhecer o namorado. Com as devidas adaptações de género e circunstância, apesar do seu potencial cómico, convenhamos, não costuma ser um grande dia para os protagonistas. Nem dar grandes comédias. Contudo, desta vez, sem ser realmente uma grande comédia, verdade é John Hamburg apresentar um filme em que o riso não é provocado apenas pela boçalidade de certas situações e diálogos, mas também pelo sentido de observação, pela inteligência e pela radicalização de situações vulgares em indutores de riso. E ter Bryan Cranston e James Franco no mesmo elenco, enfim, dá um jeitaço.

Por Rui Monteiro
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Décadas depois de ser abandonado num comboio, Dev Patel surge como um homem aprumado e calmo a sair das águas, como um renascido. E depois a realização entre o xaroposo, o demagógico e o comovente de Garth Davis regressa ao passado, à aventura de uma criança numa metrópole sobrelotada. Um filme torpedeado pela ausência de ousadia, pela incapacidade de ir além do postal ilustrado por bons sentimentos.

Por Rui Monteiro
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  • Animação
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Cantar!
Cantar!
A nova longa-metragem animada dos Estúdios Illumination, criadores dos Minions, transpõe a ideia de programas como American Idol ou The Voice para um mundo de animais antropomorfizados. E os bichos que querem ser cantores são o melhor do filme, porque a animação digital está uns furos abaixo da da concorrência.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
José Barahona, português radicado no Brasil, filma um livro do brasileiro Luiz Ruffato, sobre um rapaz de Minas Gerais que vem trabalhar para Lisboa e apanha em cheio com um Portugal em crise. Uma produção luso-brasileira modesta, mas honesta no seu realismo.

Por Eurico de Barros
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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Eis o Admirável Mundo em Rede
Eis o Admirável Mundo em Rede
Werner Herzog, se nunca trata a internet como um ser vivo, não deixa por isso de a ver como capaz de um dia se transformar em qualquer coisa com inteligência e vontade próprias. Como estado da arte das fantasias do momento, o filme de Herzog é divertido e às vezes mesmo um gozo pegado. Como exercício especulativo, é igual a tantos outros. Vale pela paródia com base em factos reais e ideias fantásticas, portanto.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Miss Violence
Miss Violence
Era uma família tão disfuncional como qualquer outra comemorando o aniversário de uma das filhas. Eis senão quando a rapariga vai até à janela, põe uma perna de fora, depois a outra, e, sentada no parapeito, a família por detrás em grande festança, sorri, e atira-se. Escusado será dizer que a vida desta gente nunca mais será a mesma, neste filme do realizador grego Alexandros Avranas.

Por Rui Monteiro
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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
A Primavera de Christine, da austríaca Mirjam Unger, é a história de uma menina de nove anos, a Christine do título (interpretada por Zita Gaier), que passa os últimos dias da Segunda Guerra Mundial refugiada com a família num casarão deserto nos arredores de Viena. A loucura dos tempos nunca é camuflada, mas sobre ela está sempre um olhar sardónico e optimista, sem jamais ser pateta ou piegas, que faz de A Primavera de Christine um filme delicioso sobre uma criança que se adapta como pode ao mundo, um mundo que nunca é o previsto.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Monstros Fantásticos e Onde Encontrá-los
Monstros Fantásticos e Onde Encontrá-los
Realizado por David Yates a partir do livro de JK Rowling com o mesmo nome, Monstros Fantásticos é a história de Newt Scamander, um cientista despistado que vive para procurar, estudar e proteger criaturas mágicas. Não é um grande filme, mas é uma boa diversão em estilo retrofuturista, e Redmayne, no papel de Newt, é uma presença mais contagiante do que Daniel Radcliffe alguma vez foi como Harry Potter.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Gimme Danger
Gimme Danger
Gimme Danger é um filme de Jim Jarmusch sobre Iggy Pop e os Stooges. Acima de tudo, é a história visceral, comovente, inacreditável de uma das bandas mais influentes do rock.

Por Nuno Henrique Luz
  • Filmes
  • Drama
Uma História Americana
Uma História Americana
Ewan McGregor estreia-se a realizar com esta adaptação de Pastoral Americana , o bestseller de Philip Roth. Mas é areia literária a mais para a camioneta cinematográfica de McGregor, que também reservou para si o papel principal.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Sete Minutos Depois da Meia-Noite
Sete Minutos Depois da Meia-Noite
Rufias fazem a vida negra a Conor. A mãe sofre de cancro, o pai sem utilidade, e a avó, na verdade, uma desconhecida. O miúdo fecha-se em si, tem pesadelos. Às tantas aparece um monstro à janela. E uma erupção de fantasia no filme de J. A. Bayona.

Por Rui Monteiro
  • Filmes
  • Documentários
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
A Toca do Lobo é porventura o livro mais conhecido de Tomaz de Figueiredo (1902-1970), avô que a realizadora Catarina Mourão não chegou a conhecer e pai de Maria Rosa Figueiredo. A relação, quer dizer, a não-relação entre Tomaz e Maria Rosa é o núcleo deste documentário aturadamente pesquisado (abundam as fotografias e documentos de arquivo, os filmes caseiros e as imagens da RTP) e delicadamente urdido.

Por Jorge Lopes
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
O Clã
O Clã
Pablo Trapero baseia-se em história verdadeira e apresenta-a como uma fábula política e criminal com inclinação psicológica. Uma espécie de análise das motivações dos criminosos no contexto da Argentina pós-ditadura militar, através de uma família exemplar… que se dedicava ao rapto e à tortura.

Por Rui Monteiro
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  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Abril e o Mundo Extraordinário
Abril e o Mundo Extraordinário
Em 1941 a Europa ainda está na era da máquina a vapor. E depois há um crime, uma invenção perdida que faria avançar a humanidade e uma investigação que leva Avril, o seu gato falante, o avô, e o aventureiro Julius à descoberta de quem matou e porque foram mortos os pais da moça, cientistas que talvez tivessem descoberto o segredo para sair da pasmaceira.

Por Rui Monteiro
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
A Filha
A Filha
Simon Stone encontrou a tragédia das suas personagens nas páginas de O Pato Selvagem e construiu o seu argumento em clima de tensão, realçado pela fotografia densa e espectral, o que torna o filme estimulantemente fantasmático.

Por Eurico de Barros
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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
A Casa da Sra Peregrine para Crianças Peculiares
A Casa da Sra Peregrine para Crianças Peculiares
Um herói adolescente ignorado em casa e com segredos familiares antigos. Um grupo de miúdos com poderes especiais. Um casarão com ambições de castelo mágico, acessível através de um caminho secreto. Em suma, é um pouco estranho ver Tim Burton armado em David Yates ou Chris Columbus, os dois realizadores mais assíduos de Harry Potter.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Drama
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Una - Negra Sedução
Una - Negra Sedução
Algures em Inglaterra, uma rapariga entra
 numa empresa e confronta 
um dos seus quadros, um homem chamado Peter. Passa-se que 15 anos antes, quando 
a rapariga, chamada Una (Rooney Mara), tinha 13 e era vizinha do homem, Peter (Ben Mendelsohn), este envolveu-se sexualmente com ela. Depois de tudo ter vindo a público, Peter foi julgado por abuso de menores, passou quatro anos na cadeia, saiu e depois mudou de nome, de cidade, de emprego, de vida. Una veio procurar Peter não para se vingar dele expondo-o aos colegas, ou para
 o matar. É que a relação entre ambos não foi forçada por Peter nem envolveu violência. Una veio procurar Peter para saber porque é que ele a abandonou numa pensão sem dizer água vai, antes de ser preso. Adaptado por Peter Harrower da sua peça Blackbird, este filme de Benedict Andrews dá um twist inesperado – e ousado – nos estereótipos das histórias sobre pedofilia. Mara 
e Mendelsohn são muito bons 
e, no final, o filme deixa uma dúvida inquietante no ar. Por Eurico de Barros

Críticas de cinema - 2 Estrelas

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  • Suspense

Nightmare Alley – Beco das Almas Perdidas é o primeiro filme realizado por Guillermo del Toro em que não há elementos de fantástico, terror ou de ficção científica, embora paire sobre ele uma dimensão fantasmagórica que depois se revela ser falsa, um embuste. O filme adapta um livro policial de William Lindsay Gresham, Nightmare Alley, escrito em 1946, e que Hollywood filmou logo no ano seguinte em O Beco das Almas Perdidas, pela mão do experientíssimo Edmund Goulding, com Tyrone Power no principal papel, o de Stanton Carlisle.

Stanton é um sujeito sem eira nem beira que arranja emprego numa feira itinerante manhosa, daquelas que percorriam os EUA com atracções várias, incluindo aberrações humanas reais ou falsas, carrosséis e números de mentalismo. Stanton começa a trabalhar num desses espectáculos de falsa adivinhação mental com uma vidente chamada Zeena e o seu marido alcoólico, cuja morte causa certa noite, por acidente. Já não sendo bem-vindo na feira, Stanton vai-se embora com Molly, uma jovem que fazia um número de mulher imune à electricidade, formando uma parceria com esta em que aperfeiçoa o que aprendeu com Zeena e o marido. Transforma-se então num mentalista de renome, “O Grande Stanton”, que trabalha nos melhores hotéis tendo Molly como parceira.

Quando Lilith, uma astuta psicóloga, o tenta desmascarar numa actuação e falha, Stanton percebe que ela, por via da sua profissão, tem informação privada e muito valiosa sobre a elite de Chicago, e juntam-se para enganar pessoas ricas que julgam que ele consegue mesmo comunicar com os mortos. E a sua maior presa vai ser um velho e poderoso milionário, Ezra Grindle, o qual Stanton convence poder materializar o espectro da sua jovem amada há muito morta, que será personificada por Molly. Só que esta, à última da hora, arrepende-se, o golpe falha, Stanton mata Grindle, é perseguido pela polícia e tem que regressar às feiras de onde veio, agora numa situação degradante.

Esta primeira versão de O Beco das Almas Perdidas é uma adaptação do livro de William Lindsay Gresham rodada ao estilo profissional, directo, despretensioso e prático do film noir de Hollywood desses distantes anos 40, uma série B com aspecto e meios de série A, porque Tyrone Power gozava dos favores de Darryl F. Zanuck, o então poderoso director dos estúdios 20th Century Fox. A versão realizada e co-escrita por Guillermo del Toro é muito mais ambiciosa e elaborada, formal, estética e dramaticamente, e apresenta um elenco em que Bradley Cooper sucede a Tyrone Power no papel de Stanton Carlisle, acompanhado por Cate Blanchett, Rooney Mara, Willem Dafoe, Toni Collette, David Strathairn, Richard Jenkins, Mary Steenburgen e Ron Perlman – um luxo de elenco.

Nightmare Alley – Beco das Almas Perdidas é um filme que se esmera até ao mais ínfimo detalhe na recriação das atmosferas da época em que decorre a acção, sejam os recantos sórdidos da feira em que Stanton arranja trabalho e vai depois aprendendo os truques por detrás do número de mentalismo, sejam os ambientes luxuosos que vai frequentar com Molly e com a sua cúmplice, após se tornar célebre e requisitado. Só que enquanto o despachado Edmund Goulding narrava a história do seu anti-herói em menos de duas horas, Guillermo del Toro demora duas horas e meia a descrever a ascensão e a queda do ousado vigarista. E parece mais interessado em impressionar com os aspectos ora mais desagradáveis (a colecção de fetos disformes da personagem de Willem Dafoe na feira), ora mais requintados da direcção artística da fita (os interiores luxuosos por onde Stanton e Molly se movimentam após terem ascendido no mundo do espectáculo), do que em contar a história depressa, bem e com emoção. Basta ver, por exemplo, o tempo que perde a mostrar Stanton a convencer Ezra Grindle de que consegue mesmo comunicar com os mortos, ou a exibir o sumptuoso consultório art déco da sua sensual e amoral cúmplice Lilith (Blanchett).

Nightmare Alley – Beco das Almas Perdidas é um interessante exemplo de história ilustrativa da insondável credulidade humana, sobretudo no que respeita ao desgosto pela perda dos entes queridos, e que está povoada por actores nunca menos que bons (e Bradley Cooper volta a mostrar o que consegue fazer desde que tenha um papel decente e seja bem dirigido). Só que Guillermo del Toro podia ter aprendido a lição do seu antecessor da década de 40, e filmado Nightmare Alley – Beco das Almas Perdidas com muito mais eficácia, espírito de síntese e impacto dramático, e menos insistência quer no grotesco, quer no sofisticado, que de tão reiterados e pormenorizados acabam por perder o desejado efeito de realismo e tornar-se óbvia e melindrosamente encenados e artificiais. E ainda por cima, com algumas costuras digitais à mostra.

  • Filmes
  • Família e crianças

Naomi Watts interpreta, neste filme baseado numa história real, uma australiana, mãe de três filhos pequenos, amante de surf, de natação e da natureza, que tem um acidente numa viagem de férias à Tailândia, fica paralisada da cintura para baixo e cai numa depressão. O marido e os filhos fazem tudo para a puxar para cima, mas é uma cria de gralha ferida, que aqueles trazem para casa e baptizam de Penguin, que a vai ajudar a recuperar e a voltar a ganhar gosto pela vida. Esta fita de Glendyn Ivin é simpática, sincera e bem-intencionada, mas também sentimentalona e trivialmente óbvia no seu simbolismo.

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  • Ficção científica

Uma pessoa olha para todos os lados deste quarto filme da série Matrix e não encontra outra razão para que tenha sido feito, senão para capitalizar na bilheteira à conta do culto que rodeia esta trilogia de ficção científica cyberpunk. Qualquer resíduo da sintonia com o espírito da época, da inovação nos efeitos especiais (o “bullet time”, depois copiado até à exaustão) e das pretensões intelectualizantes que os então irmãos Wachowski ali mostraram, muito em especial no primeiro Matrix (1999), desapareceu por completo.

Exceptuando os primeiros 20 minutos, antes de Thomas Anderson, agora um autor de sucesso de jogos de vídeo na meia-idade, regressar ao mundo da Matrix e à pele de Neo, e nos quais Matrix Resurrection (agora realizado apenas por Lana Wachowski) mostra que é capaz de brincar com a trilogia e de ser auto-irónico, o filme mais não faz do que, essencialmente, repetir a história do original, com algumas personagens novas (e quase todas indiferentes), ligeiras modificações e pequenos ajustes. Sem apresentar um único rasgo de originalidade, nem sequer no plano dos efeitos especiais, e transformando-se rapidamente em mais um blockbuster, com todos os seus tiques, vícios e clichés, a mesma azáfama repetitiva e o mesmo gigantismo cansativo (há alturas em que parece estarmos num filme da série John Wick em atmosfera futurista e servido por um mega-orçamento).

Nem Neil Patrick Harris a fazer de Analista, o vilão substituto do Agente Smith de Hugo Weaving, consegue acrescentar algo ao conjunto, e Yahya Abdul-Mateen II, que substitui Laurence Fisburne no papel de Morpheus, não lhe chega nem aos calcanhares. Cabe ao gato daquele, chamado Déjà Vu, sintetizar no seu nome aquilo que o espectador mais sente ao longo das enchumaçadas, ruidosas e intermináveis duas horas e meia de duração da fita.

É sempre um gosto ver Keanu Reeves fazer das suas fraquezas de actor forças (o seu Neo parece quase sempre passar ao lado de tudo o que lhe está a acontecer) e reencontrar Carrie-Anne Moss no papel da destemida Trinity, e Lambert Wilson tem uma divertida aparição num Merovíngio agora transformado em sem-abrigo a elogiar, aos berros, a cultura da era pré-digital, mas pouco mais há que se aproveite neste Matrix Resurrections, que nem se preocupa em desvendar mais alguma coisa sobre as máquinas inteligentes que criaram a Matrix e usam os humanos como pilhas. Talvez fique para um próximo filme, se é que este irá ter uma continuação, ou várias continuações. Mas esperamos sinceramente que não.

  • Filmes
  • Drama

Em Mães Paralelas, novo filme de Pedro Almodóvar, Janis (Penélope Cruz), uma fotógrafa de moda de meia-idade e solteira, engravida por acidente. Na maternidade, quando está prestes a dar à luz, conhece a jovem Ana (Milena Smit, uma boa revelação), também solteira, que vive com a mãe, uma actriz, e que também ficou grávida, embora em circunstâncias mais dramáticas. Janis está contente por ir ter um bebé, Ana está apreensiva e assustada. Ficam amigas e não fazem ideia da forma como as suas vidas irão ficar ligadas a partir do momento em que se encontraram nos corredores da maternidade.

Almodóvar é muito gabado (e quase sempre justamente) por compreender como poucos cineastas o funcionamento emocional e psicológico das mulheres, pela sua capacidade de sondar em profundidade o mundo sentimental e mental feminino em toda a sua complexidade e nas suas múltiplas idiossincrasias, e depois traduzir tudo em personagens, situações e histórias cativantes, entusiasmantes e intrincadas nos seus filmes. Em Mães Paralelas, onde o realizador vai buscar, para dar combustível narrativo e sentimental ao enredo, a troca inadvertida de bebés, um dos mais velhos, fáceis e batidos tropos da literatura de cordel, do melodrama barato e das telenovelas de fabrico industrial, esse dom falha-lhe.

Apesar das incontestáveis qualidades de representação das actrizes que as incarnam, Ana e Janis são personagens menos convincentes, consistentes e empaticamente almodovarianas do que é habitual, e circulam por uma intriga que Pedro Almodóvar não consegue evitar ser rasa e choramingona, emocionalmente calculista e reiterativa, que deixa o espectador distante em vez de operar a desejada identificação e envolvimento. E na qual as duas personagens principais mudam de preferências sexuais de um plano para o outro, com a leveza de quem muda de marca de detergente da roupa ou de canal quando se está a ver televisão.

Isto já sem falar nos subenredos de Mães Paralelas, para Almodóvar demonstrar preocupação social e mostrar virtude ideológica, sobre a violência sexual e a controvérsia da memória histórica em Espanha, este último apresentado de forma descaradamente tendenciosa, e com clima em “inho”, a lágrima sempre a tremer no canto do olho das personagens, tal como o próprio filme.

Mães Paralelas não deixa de ter dois ou três momentos brilhantemente almodovarianos (ver a sequência em que Janis e o seu amante arqueólogo estão a fazer amor e o realizador foge do quarto e filma, da rua, as cortinas brancas do quarto a bater ao vento). Mas, do tratamento superficialmente lacrimal do tema da maternidade à intromissão oportunista e deslocada da agenda política, é uma senhora decepção.

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Uma de várias produções de cinema e televisão feitas para assinalar os 50 anos do nascimento do general Charles De Gaulle, esta fita de Gabriel Le Bomin segue o futuro presidente francês (interpretado por Lambert Wilson) entre a invasão de França pelas tropas alemãs e a queda de Paris, e a sua fuga para Inglaterra e o célebre apelo à resistência que fez aos microfones da BBC, a 18 de Junho de 1940. Ao mesmo tempo, mostra a vida familiar de De Gaulle e a fuga separada e arriscada da sua mulher e dos filhos para Inglaterra. Tudo isto é feito com um didactismo tão aplicado como sensaborão.

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  • Drama

O novo filme de Ridley Scott arrebatará os admiradores de séries como Dallas e Dinastia, e os apreciadores de histórias reais de faca e alguidar passadas no seio de famílias ricas e conhecidas. No caso vertente, a dinastia italiana Gucci. Baseando-se no livro de Sara Gay Forden, Casa Gucci recria a luta pelo poder dentro da família fundadora desta marca de luxo, entre os anos 70 e 90, destacando a figura da ambiciosa e astuta Patrizia Gucci, a mulher de Maurizio Gucci, o herdeiro de metade do império, que acabaria por mandar matar o marido e a quem a imprensa alcunhou de “Viúva Negra”. Metida no papel de Patrizia como ervilha numa vagem, Lady Gaga domina esta soap opera impessoalmente realizada por Scott. Também com Adam Driver, Jeremy Irons, Al Pacino, Salma Hayek e um Jared Leto irreconhecível e hilariante no papel do piroso e tonto Paolo, o Gucci sem pinga de gosto, talento ou jeito para o negócio.

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  • Drama

Sexo lésbico, êxtases místicos e visões sobrenaturais dentro de um convento de freiras? Não são poucos os filmes de época que têm praticado a chamada “nunsploitation”, com maior ou menor qualidade, erotismo e intenção anticlerical. Este, de Paul Verhoven, passa- -se na Itália do século XVII assolada pela peste e baseia-se na figura real da irmã Benedetta Carlini, que começou por ter visões de Cristo, apresentar estigmas e ser considerada santa, e depois foi acusada de ter relações sexuais com outra freira e de blasfemar, e condenada à fogueira. Virginie Effira interpreta Benedetta e Verhoeven, surpreendentemente, não se estica muito nem na provocação softcore para chocar o crente, nem no discurso contra o poder da Igreja e a religião católica.

  • Filmes
  • Ficção científica

Há mais de 30 anos que se fala num terceiro filme dos Caça-Fantasmas, mas o projecto nunca tinha ido para diante por várias razões, nomeadamente a forte relutância de Bill Murray em continuar a série, que entretanto gerou uma versão em animação e um comic. Em 2016, fez-se um Caça-Fantasmas interpretado apenas por mulheres, mas o foi um desastre de crítica e de bilheteira. Agora, surge finalmente a continuação oficial dos dois Caça-Fantasmas originais, Caça-Fantasmas: O Legado, realizada por Jason Reitman, filho de Ivan Reitman, que assinou aqueles, e que é também autor do argumento, em parceria com Gil Keenan e Dan Aykroyd, um dos quatro intérpretes dos Caça-Fantasmas.

Esta terceira fita aposta claramente na conquista de um público jovem que nunca viu os dois primeiros filmes ou só ouviu falar neles, ao mesmo tempo que se dirige aos nostálgicos dos Caça-Fantasmas e do cinema americano dos anos 80. Há em Caça-Fantasmas: O Legado ecos de Os Goonies e do cinema de Steven Spielberg (Encontros Imediatos do Terceiro Grau é citado directamente, por exemplo), e também de séries mais recentes como Stranger Things. Mas o filme é, no essencial, um Caça-Fantasmas Kids, cujos protagonistas são a filha e os dois netos de Egon Spengler (Harold Ramis, o único dos quatro Caça-Fantasmas originais que morreu e a quem a fita é dedicada), que herdam a quinta onde este vivia em reclusão, algures no meio do Oklahoma, e descobrem que a humanidade está de novo ameaçada por horríveis forças sobrenaturais.

Carrie Coon interpreta Callie Spengler, a filha de Egon e mãe solteira, Finn Wolfhard é Trevor, o seu filho mais velho e o típico adolescente americano, McKenna Grace é Phoebe, a filha mais nova e nerd de ciências, que faz amizade com o seu novo colega de escola Podcast (Logan Kim), um miúdo interessado em tecnologia e no paranormal. Juntamente com ele, Phoebe vai descobrir o equipamento anti-espectros que o seu avô deixou, o seu passado como Caça-Fantasmas e o novo perigo vindo do Além que este detectou na região e procurou conter e prevenir. Paul Rudd também aparece no papel de Grooberson, o professor de Ciências do liceu local que vai alinhar com os miúdos na investigação.

Jason Reitman, basicamente, transferiu o grosso do enredo do primeiro filme para o interior dos EUA, juntando-lhe um par de elementos da continuação. Assim, reencontramos velhos conhecidos como Gozer o Gozeriano, Zuul e o homem de marshmallow (este em versão miniatura e plural, que nos proporciona alguns bons gags), e conhecemos o sucessor do fantasma verde Slimer, que se chama Muncher, devora metal e depois o cospe sob a forma de metralha sobre quem quer que lhe perturbe a refeição. E a vistosa ambulância Cadillac dos Caça-Fantasmas volta a rodar, agora dispondo de uma posição de artilheiro.

O filme farta-se de trabalhar para agradar a gregos (os fãs nostálgicos da série) e a troianos (a nova e jovem geração de espectadores), mas apesar de todos os esforços de Jason Reitman, não passa de um decalque menor e teen dos dois primeiros, valendo mesmo só pelos 15 minutos finais, em que o trio sobrevivente dos verdadeiros Caça-Fantasmas, Venkmann, Stantz e Zeddmore (Bill Murray, Dan Aykroyd e Ernie Hudson) aparece para salvar o dia (há ainda uma surpresa do Além por via digital, que não será do agrado de todos mas resulta neste contexto), e fica a saber a pouco.

Em Caça-Fantasmas: O Legado, a nostalgia ainda é o que era, mas não chega para fazer um filme razoavelmente satisfatório. Pelo menos, para os fãs mais velhos dos Caça- -Fantasmas. (Aviso: fiquem a ver a ficha técnica final porque lá pelo meio há um divertidísimo gag “parapsicológico” com Bill Murray e Sigourney Weaver).

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  • Filmes
  • Drama

Onde pára o Nanni Moretti emocionalmente arrasador de O Quarto do Filho e finamente sarcástico de O Caimão? Certamente não neste sensaborão, arrastado e monocórdico Três Andares, uma dramalhice cheia de sentimentalismo enlatado, a namorar por vezes com as situações da mais banal e previsível telenovela, passada em Roma e envolvendo três famílias que vivem num prédio de condomínio. Moretti, que também faz o papel de um pai e juiz severo e intransigente, adaptou o livro do escritor e argumentista israelita Eshkol Nevo, e talvez o defeito esteja na origem. É que em Três Andares o cineasta italiano está irreconhecível, desperdiçando ainda um lote de actores de primeira água. O enredo decorre ao longo de 10 anos e a coisa chega ao ponto de algumas personagens adultas não apresentarem o menor sinal da passagem do tempo.

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  • Acção e aventura

Ridley Scott já visitou a Idade Média algumas vezes nos seus filmes, e os resultados não têm sido dos melhores. Como podemos ver no elefantino Reino dos Céus (2005), passado nas cruzadas e no cerco de Jerusalém, em 1187, quando a cidade foi conquistada por Saladino, e em Robin Hood (2010), a sua versão pseudo-histórica e confusa da lenda de Robin dos Bosques. Scott regressa agora aos tempos medievais em O Último Duelo, baseado no livro homónimo de Eric Jager.

Passado na França do século XIV, a fita recria um acontecimento real. O duelo até à morte travado em 1386 entre o cavaleiro Jean de Carrouges e o escudeiro Jacques Le Gris, que tinham combatido juntos e sido grandes amigos, até se terem zangado por questões de terras e de poder, e sobretudo por Marguerite, a mulher de Carrouges, ter acusado Le Gris de violação. O duelo, que teve que ser autorizado pelo rei por já estar proibido na altura, tinha a particularidade de ser por “julgamento de Deus”. Se Carrouges perdesse e morresse, era sinal divino de que a sua mulher tinha mentido e ela seria queimada viva como punição; se ele ganhasse, Deus estava do lado do vencedor, ela tinha dito a verdade e o opróbrio cairia sobre o derrotado.

Tal como Às Portas do Inferno, de Akira Kurosawa, um filme com o qual tem sido comparado, O Último Duelo é contado dos pontos de vista dos três principais intervenientes – Carrouges, Le Gris e Marguerite – em três segmentos sucessivos (escritos, respectivamente, por dois dos actores, Matt Damon e Ben Affleck, que interpreta o suserano de Carrouges, o conde Pierre d’Alençon, e pela argumentista e realizadora Nicole Holofcener). Mas ao contrário da fita do mestre japonês, que se mantém ambígua no final e não aponta uma das versões como correspondendo à verdade dos factos, O Último Duelo fá-lo, indicando o ponto de vista da vítima como sendo o verdadeiro (o que aliás deve corresponder à verdade histórica).

Uma das principais qualidades de Ridley Scott enquanto realizador é o seu talento de meticuloso construtor de mundos (ver o futuro distópico de Blade Runner – Perigo Iminente ou o reino mágico de A Lenda da Floresta) e de recriador do passado (a França napoleónica de O Duelo, a Roma clássica de Gladiador). Embora insista, em O Último Duelo, no irritante cliché cinematográfico que se instituiu nestes últimos tempos e que consiste em drenar de cor e “escurecer” o passado mais distante, em especial a Idade Média (um perfeito disparate, para quem conheça a época e as suas representações artísticas), Scott esmera-se aqui mais uma vez na reconstituição dos tempos medievais, quer no plano físico e dos costumes, quer das estruturas mentais, apresentando-nos um mundo tão fascinante como perigoso e agreste, e que nos é hoje intelectual, jurídica e moralmente alienígena.

Esse rigor na recriação choca de frente com a escolha dos actores principais, que é simplesmente fatal para o filme. Tirando Jodie Comer, no papel de Marguerite de Carrouges, Matt Damon (Carrouges), Ben Affleck e Adam Driver (que faz de Jacques Le Gris) não têm pinga de credibilidade a fazer de nobres franceses medievais (o Pierre d’Alençon de Affleck, de cabelo e barba pintados de louro, é particularmente desastroso). São os três actores marcada e caracteristicamente “americanos” e de capacidades interpretativas limitadas, e que, tirados de um certo contexto nacional e temporal, e postos em épocas e lugares muito diferentes a fazer personagens muito específicas, pura e simplesmente não funcionam.

Há ainda o facto do enredo de O Último Duelo abordar o tema da situação da mulher na Idade Média com um viés contemporâneo, pretendendo, através dele, mais do que fazer uma constatação de uma realidade histórica que hoje nos é insuportável e impensável, realçar o estereótipo corrente da “opressão patriarcal” e o seu carácter secular. Vá lá que o duelo propriamente dito, com que o filme abre e que ocupa a sua parte final, está feito com o devido rigor no ritual, nos procedimentos e nas armas usadas, e a natural violência sem quartel no confronto, até à consagração do vencedor e à execração em morte do vencido.

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  • Filmes

Este filme de Artur Ribeiro é a montagem para cinema da série homónima já transmitida pela RTP, co-assinada com Joaquim Leitão, que prescinde da parte da história passada em terra e se centra unicamente na acção no navio bacalhoeiro que rumou às águas geladas e perigosas da Terra Nova e não está a ter sorte na pesca, o que leva o capitão a arriscar-se a navegar até à Gronelândia, rota nunca antes seguida por este tipo de embarcações. O que, aliado à escassez de bacalhau, causa um crescente mal-estar na tripulação. Terra Nova tem o mérito de recriar e dar embrulho dramático a uma saga marítima portuguesa próxima de nós mas hoje desconhecida de muitos, a chamada “epopeia do bacalhau”, embora sofra com a falta de homogeneidade das interpretações e o peso da formatação televisiva.

  • Filmes
  • Terror

O novo filme da série Halloween iniciada em 2018 é outra vez realizado por David Gordon Green. Continuação directa do original de John Carpenter, retoma, após um breve flashback para os acontecimentos dos anos 70, a história onde este a deixou. Laurie Strode (Jamie Lee Curtis), a filha e a neta vão a caminho do hospital, enquanto o fogo consome a casa onde elas prenderam Michael Myers. Só que os bombeiros vão libertá-lo inadvertidamente. Com Laurie numa cama de hospital, é Haddonville em peso que se vai levantar contra Myers para o tentar eliminar em Halloween Mata, um vigilante movie de terror. A fita sofre muito com a ausência de Laurie e a mensagem de Gordon Green – podemos também tornar-nos em monstros ao perseguir um – é passada com a subtileza de um garfo enfiado no olho. Há gore a mais, pontapés na verosimilhança, poucos sustos dignos desse nome e um final canhestro. Já está na calha Halloween Ends que, esperamos bem, acabe com Myers de uma vez por todas, e com a série.

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  • Filmes
  • Drama

No novo filme de Mia Hansen-Love, um casal de realizadores e argumentistas (Tim Roth e Vicky Krieps) instala-se no Verão em Farö – a ilha onde Ingmar Bergman viveu, rodou vários filmes e está enterrado – para escreverem os seus novos projectos. À medida que o tempo passa, instala-se algum mal-estar entre o casal. De repente, passamos para um filme dentro do filme, aquele que a personagem de Krieps está a escrever, também passado na ilha, com Mia Wasikowska no papel de uma rapariga que vem ao casamento de uma amiga e reencontra um antigo amor. O mais interessante deste filme tépido e ambíguo é mesmo o ambiente que se vive em Farö e a forma como a memória de Bergman é conservada, potenciada e mercantilizada, já que se Mia Hansen-Love queria aproveitar o envolvimento da ilha e o mote bergmaniano para falar sobre os problemas, as angústias e os dilemas das relações entre homens e mulheres, falhou por completo, tanto na história principal como na secundária.

  • Filmes

Chloe (Kiera Allen) é uma adolescente muito doente, que tem que estar numa cadeira de rodas e é educada em casa pela desvelada e afectuosa mãe (Sarah Paulson), que passa o tempo preocupada com ela e não a deixa ter quase nenhum contacto com o mundo exterior, por causa da sua saúde. Mas, pouco a pouco, Chloe começa a notar coisas estranhas no comportamento da mãe, até que um dia descobre um documento perturbador. Este filme de “terror familiar” realizado e co-escrito por Aneesh Chaganty até começa bem, mas vai-se tornando gradualmente inverosímil e previsível, a partir do momento em que Chloe descobre o segredo da mãe, e o final é de bradar aos céus de primário. Allen e Paulson são bem melhores que o filme.

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  • Filmes
  • Drama

No seu primeiro filme como realizador, que também produz e interpreta, Viggo Mortensen é John Peterson, um piloto da aviação civil e gay que vive na Califórnia com o marido e a filha adoptiva do casal. O pai, Willis (Lance Henriksen), duas vezes viúvo, é um homem conservador e conflituoso que vive na quinta da família e tem sintomas de demência senil, e John trá-lo para casa, com a intenção de que se instale perto dele e da irmã, Sarah (Laura Linney). Falling – Um Homem Só é um filme que padece de esquematismo dramático e de caracterização: homofóbico, racista, amargo e torto que nem um cabide, Willis é uma caricatura ambulante de maldade e intolerância, enquanto os outros membros da família são modelos de paciência, compreensão e disponibilidade. Muito implausível e repetitivo.

  • Filmes
  • Drama

O filme biográfico é desesperante e preguiçosamente formatado, e a mais recente celebridade a sofrer essa formatação é a Rainha da Soul, Aretha Franklin, em Respect, de Liesl Tommy, que contempla os lugares-comuns, convenções de enredo, simplificações dramáticas, facilidades psicológicas e pedagogismos demonstrativos do costume, sem falar da estenografia emocional. O filme vai da juventude de Aretha nos anos 50 até aos anos 70, quando ela gravou o lendário álbum de gospel Amazing Grace, com Jennifer Hudson (escolhida pela própria Aretha) a interpretá-la (bem, e também a cantar) dos 17 anos em diante – embora Hudson já tenha quase 40 anos. Os bons momentos de Respect são os que envolvem música, como as sequências nos estúdios Muscle Shoals ou aquelas em que Aretha improvisa com as irmãs. Mas são poucos para tanto cliché requentado e tanta sinalização narrativa, mais algum kitsch ocasional.

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  • Filmes

Uma sátira frouxa e desinspirada aos meandros do cinema em Hollywood. Robert De Niro é um produtor manhoso e falido que deve dinheiro a um mafioso (Morgan Freeman). Para lhe conseguir pagar, vai rodar um western de série Z que lhe permita matar o protagonista, um velho actor copofónico (Tommy Lee Jones), durante uma cena arriscada, ficar com o dinheiro do seguro e escapar de aparecer morto por “acidente”. Tommy Lee Jones é divertidíssimo no papel do cowboy decadente e conservado em whisky, e há fogachos de riso aqui e ali, mas de resto este filme de George Gallo não tem mais nada de especial para oferecer.

  • Filmes

Chloe (Kiera Allen) é uma adolescente com problemas de mobilidade, atingida por várias doenças. Desde que nasceu que vive só com a mãe, Diane (Sarah Paulson), que a trata com todo o desvelo e lhe dá aulas em casa, mantendo-a muito isolada do mundo. Mas, a pouco e pouco, Chloe começa a descobrir coisas sobre o seu estado de saúde e sobre a mãe, que a começam a fazer duvidar de muita coisa. Este thriller “em família” de Aneesh Chaganty até começa bastante bem, mas depois soçobra na previsibilidade e na inverosimilhança, embora Allen e Paulsen dêem tudo o que têm para nos manter na pontinha da cadeira.

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  • Filmes
  • Animação

É irónico que Aya e a Feiticeira, o primeiro filme inteiramente feito em animação digital pelo Studio Ghibli, seja realizado por Gorô Miyazaki, o filho de Hayao Miyazaki, um campeão de sempre da animação tradicional e firme detractor da utilização do computador nesta arte. Pelo menos no Japão, o filme, feito para a televisão, foi recebido com veementes protestos pelos incondicionais da animação em 2D que celebrizou mundialmente o Studio Ghibli, e encarado como uma gravíssima traição ao espírito artístico e aos princípios estéticos que animam a produtora desde a sua criação.

Gorô Miyazaki, já autor de filmes em animação clássica como Contos de Terramar (2006) e A Colina das Papoilas (2011), para fazer Aya e a Feiticeira, foi buscar um livro de uma das autoras favoritas do pai Hayao, a inglesa Diana Wynne Jones (ver O Castelo Andante), falecida em 2011, e aclamada e multipremiada especialista em obras de fantasy e ficção científica para crianças e adolescentes. A heroína da história, que se passa na Inglaterra rural dos anos 90, é Aya, uma espigada e espertíssima menina de 10 anos que foi deixada pela mãe à porta de um orfanato quando era bebé.

Certo dia, um estranho casal, Bella Yaga e Mandrake, adopta Aya contra vontade desta, e leva-a para casa. Bella Yaga conta à menina que é uma feiticeira e que a adoptou para ter uma ajudante. Aya diz que a vai ajudar, se ela por seu lado lhe ensinar magia, mas Bella Yaga mostra-se relutante em fazê-lo. Pouco a pouco, Aya vai explorando a casa, que o lacónico e maldisposto Mandrake mantém selada por artes mágicas para que ela não fuja. E descobre que Thomas, o gato preto da feiticeira, fala, tornando-se amiga dele; que Bella Yaga e Mandrake conheceram a sua mãe, que também era feiticeira; que os três tocaram num famoso grupo de rock, os Earwig, que se desfez quando a mãe saiu, irremediavelmente zangada com Bella Yaga; que a deixou no orfanato por estar a ser perseguida por 12 outras bruxas. E que ela mesma, por ser filha de quem é, tem dotes mágicos.

Em termos de qualidade da animação, de trabalho do detalhe, de efeito estético global e de capacidade de surpreender e deslumbrar, Aya e a Feiticeira empalidece não só quando comparado com o estilo tradicional das produções do Studio Ghibli, como também com os filmes da concorrência americana – está bastantes furos abaixo da mais mediana fita da Pixar, por exemplo. As personagens, sobretudo, têm um aspecto demasiadamente sintético e plastificado, e são pouco dinâmicas e limitadas na sua expressividade. É como se Gorô Miyazaki tivesse querido realizar um filme de animação computacional de aspecto deliberadamente naïf, como que feito há 20 anos. Seja como for, Aya e a Feiticeira é uma experiência muito decepcionante.

Por seu lado, Miyazaki pai continua a trabalhar na sua nova longa-metragem, How do You Live?, feita, como sempre, em animação tradicional, saída de mãos humanas e não de programas de software. Ao pausado ritmo de um minuto de imagens animadas por mês, How do You Live?, a história de um rapaz e da sua amizade com o tio e outros adolescentes, estará pronto para chegar aos cinemas, de acordo com a planificação do Studio Ghibli e do realizador, daqui a três anos, em 2024.

  • Filmes
  • Terror

Esbatido o impacto do filme original, em que criaturas alienígenas cegas mas com audição hipersensível invadem a Terra, neste segundo filme da trilogia de ficção científica pós-apocalíptica, e após um prólogo onde mostra como tudo começou, John Krasinski põe os sobreviventes da família Abbott a terem que deixar o seu refúgio e meterem-se ao caminho. As situações de suspense e terror com as criaturas são eficazes mas não trazem nada de novo, e permanece o problema de racionalização do primeiro filme: de onde vieram estes monstros, e o que são? A guarda avançada de aliens mais desenvolvidos? O equivalente a cães de caça extraterrestres? Parece que temos que esperar pela Parte 3 para termos uma explicação plausível.

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  • Filmes
  • Drama

Em 2006, Michael Winterbottom realizou A Caminho de Guantánamo, a história real de três muçulmanos ingleses que, depois de várias peripécias no Paquistão e no Afeganistão, foram enviados para a prisão de Guantánamo como suspeitos de terrorismo, tendo sido libertados dois anos depois, sem que nenhuma acusação fosse levantada contra eles. A Caminho de Guantánamo foi o primeiro filme a ficcionar a situação dos prisioneiros da base americana de alta segurança em Cuba, estabelecida pela administração de George W. Bush após os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 sob um muito contestado regime legal de excepção, por violar os direitos humanos e a Constituição dos EUA.

Vários outros filmes (até mesmo uma comédia…), documentários, telefilmes e programas de televisão foram feitos entretanto, após a fita de Winterbottom, sobre as condições de detenção ilegais, os abusos e torturas sofridos pelos suspeitos de terrorismo aprisionados em Guantánamo, que nenhum dos presidentes americanos que sucedeu a George W. Bush encerrou, permanecendo em funcionamento sob a administração de Joe Biden. O Mauritano, de Kevin Mcdonald (O Último Rei da Escócia), é o mais recente desta linha, e a ele se aplica aquela máxima segundo a qual as boas intenções e as boas causas não fazem necessariamente os bons filmes, muito menos estar do lado da razão.

O Mauritano é a recriação meticulosa, indignada, maçuda e auto-congratulatória do calvário carcerário e jurídico de Mohamedu Ould Slahi (Tahar Rahim, de The Serpent), o mauritano do título. Slahi foi detido pelas autoridades do seu país quando estava num casamento e enviado para Guantánamo. Lá esteve preso durante 14 anos, entre 2002 e 2016, sem ser acusado nem julgado, e confessou sob tortura coisas que nunca fez, tendo sido representado e defendido pela advogada Nancy Hollander (Jodie Foster), conhecida pela sua ligação a causas relacionadas com direitos civis.

O filme (que se apoia no livro de Slahi Guantánamo Diary) não é muito claro sobre o passado do protagonista, que havia combatido contra os russos no Afeganistão nos anos 90 (“Eu estava do vosso lado”, diz ele aos seus interrogadores a certa altura) e tinha um primo que poderia estar ligado a Bin Laden. Mas a verdade é que os americanos não conseguiram provar nada contra ele, e na sua ânsia de apresentar serviço a qualquer custo, transformaram-no num “culpado inocente”. Kevin Macdonald segue, por um lado, o tormento de Slahi em Guantánamo; e, pelo outro, os esforços de Hollander para ter acesso a cada vez mais documentos oficiais e provar a inocência do seu cliente, bem como o trabalho do acusador militar, o tenente-coronel Stuart Couch (Benedict Cumberbatch), encarregue de justificar a pena de morte para Slahi, mas que acaba por ser posto entre a sua consciência e as pressões dos superiores.

Essencialmente, O Mauritano aplica o formato do filme policial jurídico sobre falsos culpados à história de Slahi, seguindo todos os seus trâmites dramáticos, situações feitas e voltas de enredo, até culminar no final “edificante”, em que o acusado vai finalmente a tribunal e, ao som de música emocional, elogia a justiça americana e até algumas séries de televisão sobre advogados. Mas deixa coisas por responder, como por exemplo, a razão pela qual Slahi ainda ficou mais seis anos fechado em Guantánamo, apesar de uma tão clara e retumbante vitória, ou porque é que ele não agiu depois judicialmente contra o governo dos EUA, quando tinha mais do que razões para isso (mesmo que as imagens e legendas finais deixem implícito que ele é muito “boa pessoa” e não guarda rancor a ninguém).

A sensação com que ficamos é que o vergonhoso caso de Mohamedu Ould Slahi teria sido mais bem explicado e ficado bastante mais claro num documentário do que numa dramatização ficcionada como esta, que ainda por cima subaproveita actores do calibre de Rahim, Foster e Cumberbatch. Não é o fundo de O Mauritano que está em causa, mas sim a forma com que se apresenta.

  • Filmes

Após ter realizado em 2019 Mr. Jones, em que recordou o esforço do jornalista britânico Gareth Jones para revelar ao mundo, nos anos 30, a Grande Fome e os milhões de mortos deliberadamente causados por Estaline na Ucrânia, a checa Agnieszka Holland regressa, em Charlatão, com uma história verídica – e insólita – passada no seu país, que abrange os períodos da ocupação nazi e da governação comunista que se lhe seguiu. A personagem principal de Charlatão é Jan Mikolasek (1889-1973), um herbalista (ou fitoterapeuta) que se tornou conhecido na Checoslováquia de antes da II Guerra Mundial, por conseguir curas ditas milagrosas recorrendo apenas a ervas e produtos naturais.

As pessoas vinham de todos os cantos do país para consultar Mikolasek (interpretado por Ivan Trojan, consagrado actor checo) e faziam fila durante horas à porta de sua casa, que também servia de consultório e laboratório. A acreditar no filme, ele conseguia fazer o diagnóstico a um paciente só de olhar para a urina deste (Charlatão abusa um pouco dos planos de Mikolasek a fitar com ar sério recipientes de vidro cheios de líquido amarelo…). Era muito generoso para com os mais pobres e tratou pacientes alemães durante o período da ocupação nazi, bem como altos dignitários comunistas nos anos após a guerra, incluindo pelo menos um Presidente da República.

Nos finais da década de 50, o regime decidiu acusá-lo de charlatanismo, julgá-lo e prendê-lo, já que a sua figura e os seus métodos heterodoxos de análise e tratamento não encaixavam no rígido quadro da medicina estatizada do país, e a sua enorme popularidade era cada vez mais incómoda para as autoridades. O facto de Mikolasek ser um católico devoto também ajudou à acusação. Para Agnieszka Holland e para o argumentista Marek Epstein, não há a menor dúvida: longe de ser um vulgar vigarista ou um curandeiro habilidoso, Marek Mikolasek tinha um dom quase sobrenatural (e que fica por analisar ou explicar); era o artigo genuíno, e tratava a todos por igual, fosse rico ou pobre, anónimo ou poderoso, ocupante alemão ou usurpador comunista.

Charlatão inclui, no entanto, uma forte componente ficcional, representada pela figura do assistente de Mikolasek, Frantisek Palko (Juraj Loj). Baseada apenas em especulações, Agnieszka Holland inventa uma relação homossexual entre os dois homens, que lhe serve não só para dramatizar os conflitos internos do protagonista (um católico praticante com um casamento falhado e dilacerado por causa das suas tendências sexuais, numa altura em que nem sequer se pensava em serem socialmente aceites) como também para resolver o filme com uma reviravolta inesperada, após a prisão dos dois homens e o fecho das instalações pela polícia secreta checa.

E no final de Charlatão, o comportamento surpreendentemente pusilânime de Mikolasek entra em contradição com tudo aquilo que o filme mostrou antes sobre ele e os seus princípios, deixando no ar uma nota de ambiguidade que soa falsa e forçada, já que Holland tinha, por várias vezes ao longo da história, posto em relevo as várias e muito humanas imperfeições da personalidade e do carácter da personagem. É como se houvesse uma dupla traição: a de um dos homens ao outro, e a do próprio filme ao seu protagonista. E nenhuma delas nos deixa convencidos ou satisfeitos.

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  • Filmes
  • Drama

A realizadora Chloé Zhao baseou-se no livro de Jessica Bruder para rodar este multipremiado filme em que Frances McDormand interpreta uma viúva que perdeu tudo na crise de 2011, e decide ir vaguear pelos EUA numa autocaravana, sobrevivendo de empregos temporários. Superficial no plano documental e ténue no plano ficcional, a fita nunca nos consegue explicar satisfatoriamente porque é que todas aquelas pessoas escolheram levar uma vida nómada, e a personagem de McDormand é um enigma de expressão emocional monocórdica.

  • Filmes
  • Acção e aventura

A Liga da Justiça de Zack Snyder pode finalmente ser vista. E é tudo o que ele prometeu aos fãs: tem uma história de fundo mais robusta, uma narrativa mais coerente do que a versão de Joss Whedon e uma nova banda sonora original. Como seria de esperar, o filme de Snyder também é mais temperamental, mais violento e até mais fiel aos comics. Mas não é melhor. Dura o dobro do original, e as duas horas adicionais são usadas para tapar buracos na narrativa, só que pelo caminho o filme perde muita da sua energia e ritmo.

Snyder divide a história em quatro capítulos e um epílogo, e nalguns momentos a sua Liga da Justiça lembra mais uma série de televisão com um orçamento multimilionário do que uma longa-metragem. No geral, porém, o enredo é parecido ao que vimos em 2017. Steppenwolf (Ciarán Hinds) chega à Terra com um exército de insectos robóticos voadores para recuperar três artefactos ancestrais e destruir o planeta. Naturalmente, o Batman (Ben Affleck) quer pará-lo. Para o fazer, vai até à Islândia à procura do Aquaman (Jason Momoa) e começa a juntar uma equipa que também inclui o Ciborgue (Ray Fisher), a Mulher Maravilha (Gal Gadot), o Flash (Ezra Miller) e a dada altura – vem aí um spoiler – um Super-Homem que pelos vistos não estava tão morto como se pensava (Henry Cavill).

A primeira metade do filme é passada nisto, e é tão empolgante como ver alguém a fazer networking no LinkedIn – o Aquaman de Momoa, que se revela o contraponto perfeito para o Batman moroso de Affleck, é um dos poucos personagens que ganha alguma coisa com o tempo de ecrã adicional. Mesmo assim, alguns fãs dos comics da DC vão gostar mais do novo filme, nem que seja porque Snyder criou uma versão da Liga da Justiça mais familiar do que aquela que encontrámos nos cinemas há três anos e meio. O resto das pessoas, no entanto, ficará mais bem servida com o original. Pode ter muitos defeitos, mas pelo menos não demora quatro horas.

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  • Filmes
  • Comédia

O filme original, Um Príncipe em Nova Iorque, realizado em 1988 por John Landis, é uma das melhores comédias da sua década. Eddie Murphy personifica o príncipe Hakeem, do reino africano imaginário de Zamunda, que juntamente com Semmi (Arsenio Hall), o conselheiro do rei seu pai, ruma incógnito a Nova Iorque, instalando-se no bairro de Queens para encontrar uma noiva que o queira pelas suas qualidades e não pela sua riqueza e estatuto real. O riso, abundante e ininterrupto, nasce do choque cultural e social entre o aristocrático duo e os habitantes de Queens e seus usos e costumes, e Murphy e Hall desdobram-se por vários outros hilariantes papéis. Na continuação, 2 Príncipes em Nova Iorque, realizada por Craig Brewer e estreada na Amazon Prime Video, Hakeem, agora rei e pai de três filhas, descobre que tem um filho ilegítimo em Queens, Lavelle Junson (Jermaine Fowler), e vai buscá-lo, para o educar nos modos da corte de Zamunda e fazer dele um sucessor à altura. É uma comédia penosa, de forçada e raquítica de riso, em que toda a gente que lá entra parece ter-se divertido muito, mas nós, os espectadores, não nos divertimos nada a vê-la. Mais valia terem estado quietos.

  • Filmes

Foi Agatha Christie quem criou e popularizou, na literatura policial, o modelo de enredo em que um grupo de pessoas fica isolada numa casa remota e um assassino começa a matá-las uma a uma. Os membros do grupo têm que correr contra o tempo para descobrirem qual dentre eles é o criminoso, e o que é que o motiva na sua senda assassina. O filme policial franco-belga Os Tradutores, de Régis Roinsard (A Dactilógrafa), estreado na HBO, pega neste formato consagrado e já muito explorado – inclusive no cinema – e dá-lhe uma voltinha espertalhona, fazendo o espectador crer que vai ver uma coisa, para afinal sair-lhe outra.

Eric Angstrom (Lambert Wilson), um poderoso editor, vai lançar o último volume de uma popularíssima trilogia escrita pelo misterioso Oscar Brach, cuja identidade só ele conhece. Para evitar que haja fugas na internet, Angstrom contrata nove tradutores dos nove países em que os dois livros anteriores de Brach melhor se venderam (no grupo está uma portuguesa, Telma Alves, interpretada por Maria Leite, com aspecto pós-punk e que pragueja como uma carroceira) e fecha-os, sem telemóveis nem acesso à net, no luxuoso bunker anti-ataque nuclear que um milionário russo mandou construir num castelo no interior de França.

São dadas dez páginas de cada vez a cada um dos tradutores (personificados por nomes como Olga Kurylenko, Eduardo Noriega, Alex Lawther ou Riccardo Scamarcio) que estão vigiados por seguranças armados e de má catadura. Terão um mês para traduzir, nas respectivas línguas, as 480 páginas do último volume da trilogia bestseller do enigmático Brach, que nunca tinha publicado nada antes. Mas apesar de todos estes cuidados, essas primeiras dez páginas do manuscrito aparecem online, num site anónimo, com uma ameaça. Se Angstrom não pagar uns consideráveis milhões de euros, continuarão a ser divulgadas mais páginas da obra na net. E quanto mais tempo ele demorar a pagar, mais a quantia aumenta.

Em Os Tradutores, não se trata, assim, de procurar um assassino num espaço fechado e isolado do mundo, mas sim um pirata literário. Que, pela lógica, terá de ser um dos nove tradutores reunidos por Eric Angstrom no bunker. Mas em vez de manter o filme entre quatro paredes, como um huis clos clássico, e o enredo centrado na descoberta da identidade do pirata (ou piratas), Regis Roinsard vai complicando cada vez mais a história, multiplica-se em flashbacks e flashforwards, começa a coleccionar inesperados e a dar piruetas a todo o pé de passada, transformando Os Tradutores num filme mais retorcido do que um parafuso e excessivamente artificioso, até forçar a nota da verosimilhança. Metendo, lá pelo meio, algumas notas sobre como quão ingrato, pouco reconhecido e mal pago é o ofício de tradutor.

Este é um daqueles filmes que não só ignora que, muitas vezes, menos é mais, como julga que mais é sempre melhor, quando costuma ser é demais. Há muitos livros que precisam de um editor para lhes cortar as gorduras. Os Tradutores tinha beneficiado de alguém que lhe tivesse peneirado o argumento da palha de peripécias, golpes de rins e surpresas que contém, e que acabam por o tornar enfadonho e implausível, em vez de empolgante e inventivo.

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  • Drama

Malcom (John David Washington) é um jovem realizador negro que acaba de assistir à antestreia triunfal do seu filme em Los Angeles; Marie (Zendaya) é a sua namorada, actriz e ex-toxicodependente. São os únicos protagonistas deste filme de Sam Levinson, rodado durante a quarentena. Fechados numa luxuosa moradia, lançam-se numa montanha russa de emoções, recriminações e ressentimentos. Marie ficou zangada com Malcom por ele ter dado o papel principal da fita a outra, quando baseou a personagem nela; Malcom diz que isso é mentira e que Marie não fez nada para justificar o papel. Tudo em Malcom & Marie (Netflix), do preto e branco lustroso aos monólogos em overdose de angústias, revelações, confissões e acusações azedamente esgrimidos pelo casal, passando pelo maneirismo cool do estilo visual do realizador e pela bílis lançada a espaços sobre o sistema de Hollywood, é exibicionista, raso, presunçoso e cabotino. Sam Levinson andou a ver filmes arty franceses dos anos 60 e 70 e de John Cassavetes a mais, e regurgitou este pastiche fátuo, cansativo e pseudo-“importante”, que desperdiça os seus dois bons intérpretes, em especial o vivaz filho de Denzel Washington.

  • Filmes

O filme de acção militar e ficção científica é um clássico do cinema de série B, sendo frequentado por nomes como Jean-Claude Van Damme ou Dolph Lundgren. Que nem por acaso protagonizaram uma das séries mais conhecidas e de maior sucesso do género, Máquinas de Guerra, composta por quatro filmes rodados entre 1992 e 2012, e nos quais interpretam dois veteranos do Vietname que morrem em combate, são ressuscitados num laboratório militar secreto e transformados em ciber-soldados de elite que combatem terroristas e ameaças semelhantes.

Há algo de Máquinas de Guerra em Zona de Perigo, assinado por Mikael Hafstrom e acabado de estrear na Netflix, embora este filme tenha um orçamento, meios técnicos e um arsenal de efeitos digitais com os quais os realizadores de séries B da mesma categoria podem apenas sonhar. A história passa-se num futuro próximo nada verosímil, em que os EUA estão envolvidos num conflito na Ucrânia que opõe milícias apoiadas pela Rússia mas pouco obedientes a Moscovo, e resistentes locais. O tenente Harp (Damson Idris), um piloto de drones que desobedeceu a uma ordem, é enviado, como castigo, para a zona de combate ucraniana e posto sob as ordens do capitão Leo (Anthony Mackie).

Este revela ser um andróide, o protótipo de uma experiência militar ultra-secreta, infinitamente mais sofisticado do que os “Gumps”, os desajeitados robôs-soldados que acompanham os soldados humanos nas suas missões. Além de invulgarmente inteligente, Leo tem sentimentos e muita autonomia, além de capacidades físicas sobre-humanas de dar inveja aos super-heróis da Marvel e da DC. O inexperiente Harp vai ter que o ajudar a localizar e eliminar o líder dos insurgentes, antes que este fique de posse dos códigos de lançamento dos mísseis nucleares que os russos deixaram na Ucrânia depois do fim do comunismo, e que ainda estão activos.

Rodado na Hungria, Zona de Perigo não quer ser apenas um thriller de acção militar futurista que cumpre com todos os requisitos do formato, coisa que fica evidente quando a meio do filme o argumento dá um golpe de rins, e um dos heróis parece transformar-se num vilão ainda pior do que o de serviço à história. Passa-se que Zona de Perigo quer ter sol na eira e chuva no nabal. Ou seja, transmitir uma sisuda mas nada convincente mensagem pacifista, ao mesmo tempo que alinha as rotineiras cenas de combate e carnificina, uma delas envolvendo muitas vítimas civis. Ao menos, as séries B pobrezinhas do mesmo género não têm tais presunções nem se revelam tão hipócritas.

A realização é prosaica, o argumento muito remendado, as sequências de acção trivialmente espectaculares (com a inevitável câmara lenta nos momentos fulcrais), o elemento de ficção científica está subaproveitado e estereotipado (meia dúzia de piadolas e de tiradas pseudo-profundas sobre inteligência artificial, humanização das máquinas e desumanização dos humanos, e a guerra do futuro) e as interpretações são descartáveis (que raio faz Emily Beecham, prémio de Melhor Actriz no Festival de Cannes em 2019 por A Flor da Felicidade, no meio disto?), até porque as personagens têm a espessura do papel vegetal. Zona de Perigo exibe aparato e peneiras de série A, mas não passa de uma série B que levou uma injecção maciça de esteróides digitais.

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Estão já muito distantes os tempos em que Abel Ferrara saía de câmara em riste para as ruas e os antros de vício de Nova Iorque, e muito especialmente da sua Bronx natal, para rodar policiais violentos, crus e moralmente sombrios como Vingança de uma Mulher, Nova Iorque, Duas Horas da Manhã, A Rapariga da China, O Rei de Nova Iorque ou Polícia Sem Lei, dramas de família crispados e intensos como O Funeral e R Xmas-O Nosso Natal ou ainda fitas de vampiro fora da norma como Os Viciosos.

Ferrara, que vive em Itália desde os ataques terroristas de 11 de Setembro, passou a filmar muito na Europa e a tentar construir uma reputação de realizador “autorista” com preocupações intelectuais e até mesmo espirituais. Mas a verdade é que já há muito tempo que não assina uma fita à altura dos seus tempos nova-iorquinos e das histórias ambientadas nas “mean streets” da cidade. Sibéria é mais um daqueles filmes que fica aquém das intenções e das ambições do realizador, que talvez não tenha bem consciência dos seus limites criativos. Mais uma vez interpretado pelo actor favorito do realizador, Willem Dafoe, Sibéria é uma desconcertante, desarticulada e opaca tentativa de dar expressão cinematográfica não só ao mundo dos sonhos como à vida do subconsciente. Jung anda algures por aqui, mas de forma tão vaga como simplista. Dafoe personifica Clint, um americano que vive algures na tundra árctica, dirigindo um pequeno bar onde vão beber inuítes, caçadores e avozinhas russas. Entre servir vodkas, ir para a cama com uma bela cliente, ver outro jogar flippers e sair de trenó com os cães, Abel Ferrara filma o mundo onírico e interior de Clint: medos, remorsos, recordações, problemas familiares mal resolvidos, visões, terrores profundos.

E é tudo muito pouco imaginativo, bastante banal, superficialmente simbólico ou simplesmente incompreensível. Clint ora sonha que está a ser atacado por um urso no bar, ora lhe aparece, numa caverna, o pai (também interpretado por Dafoe) com a cara cheia de espuma da barba. Ora troca recriminações com uma mulher do seu passado (com a qual poderá ter sido casado ou não), ora é visitado por um estranho indivíduo que poderá ser uma entidade maléfica e com o qual acaba a dançar ao som de “Runaway”, de Del Shannon – um dos momentos inadvertidamente risíveis de Sibéria.

Ferrara não consegue dar um sentido perceptível, um mínimo de ordem, um semblante de associação entre todos estes elementos, que parecem coexistir na maior arbitrariedade. Uma das poucas coisas que conseguimos perceber da mole de sequências oníricas, irracionais e subliminares que formam Sibéria, é que Clint tinha problemas com o pai. A partir de certa altura, desistimos pura e simplesmente do filme, perdemos o pouco interesse que tínhamos nas deambulações e nos encontros da personagem no mundo real e no interior de si mesmo. E não é o peixe falante do final que nos vai convencer nem dos eventuais méritos de Sibéria, nem de que Abel Ferrara tinha coisas muito profundas e relevantes para nos comunicar através dele.

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Os meninos costumam querer ser astronautas, bombeiros ou cowboys. Alex, o herói de Miss, segunda longa-metragem de Ruben Alves (A Gaiola Dourada), queria ser Miss França. Um desejo que vai tentar realizar quando crescido, interpretado pelo andrógino manequim Alexandre Wetter. Para isso conta com a ajuda da sua excêntrica família adoptiva, que vive na mesma pensão que ele, e inclui desde Lola, um travesti veterano, até duas indianas que ali têm um ateliê de costura ilegal. Ruben Alves pisa terreno delicado em Miss, que quer ser, ao mesmo tempo, uma farsa de transformismo na linha de A Gaiola das Malucas, que atraia o espectador médio, e um filme sobre um rapaz que, não pretendendo mudar de sexo, se sente mais mulher do que homem (ambicionando assim falar para o sector LGBT e ser inspirador de tolerância à diferença em geral). E não convence em nenhuma das vertentes, apesar do confortável orçamento, de um robusto pelotão de secundários (a patusca Isabelle Nanty na dona da pensão, Thibault de Montalembert desopilante em Lola, Stéfi Celma na azougada Miss PACA) e de alguns bons gags sortidos. Sem falar numa aparição da octogenária Amanda Lear.

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  • Filmes

Só mesmo os italianos para representarem o Paraíso (ou a antecâmara do Paraíso) como uma gigantesca e caótica sala de espera da Função Pública, onde os recém-falecidos se aglomeram em confusão, gesticulando e barafustando com quem os atende. É o que descobre Paolo (o actor e realizador Pif, vulgo Pierfrancesco Diliberto), o herói de A Felicidade das Pequenas Coisas, de Daniele Luchetti, que morre quando a sua lambreta é colhida por uma carrinha num cruzamento em que passou um sinal vermelho, como costuma fazer habitualmente, e com enorme risco, num desafio diário ao cronómetro.

E quando a sua senha é chamada no Paraíso, o anjo que o atende descobre que houve um erro. O sistema informático que calcula a duração da vida das pessoas e determina a hora da sua morte não contabilizou os litros e litros de sumos saudáveis que Paolo tomou, pelo que houve um erro na hora da sua despedida do mundo: Paolo foi enviado para o Paraíso mais cedo do que devia. Por isso, é devolvido à Terra, e ao seio da família, com mais algum tempo de vida, pouco mais de hora e meia, e alguns bons conselhos para o aproveitar o melhor possível.

Nada do que se segue em A Felicidade das Pequena Coisas está à altura destes divertidos minutos iniciais. Luchetti, que escreveu o argumento em parceria com Francesco Piccolo, baseado no livro deste, pega em Paolo, um exemplo chapado do chamado “homem médio” e põe-no não só a tentar aproveitar o tempo que lhe resta para estar próximo da mulher, da filha adolescente e do filho mais novo, como também para passar em revista a sua vida, o que fez de bom e de menos bom com ela (descobrimos, por exemplo, que enganou a mulher várias vezes) e perceber a forma como os que lhe eram mais próximos o viam.

O filme transforma-se assim numa sucessão, temporalmente baralhada, de farrapos da vida de Paolo. Este toma consciência das suas falhas e insuficiências como marido, pai e amigo, revê alguns momentos de alegria e interroga-se sobre minúsculos enigmas do quotidiano (por exemplo, porque é que o primeiro táxi da fila numa praça nunca é na realidade o primeiro?), entre situações cómicas e dramáticas. E cuja coabitação Luchetti nem sempre gere bem, o que dá ao filme um tom incerto e errático.

Tudo isto para chegar à banalíssima, superficialíssima conclusão de que a felicidade reside essencialmente nas pequenas coisas da vida, que temos que valorizar como se fossem grandes e aproveitar o melhor que podemos, junto daqueles de quem mais gostamos. A Felicidade das Pequenas Coisas é uma historiazinha peso-pluma, canja de galinha emocional e existencial. E pensar que Daniele Luchetti já fez filmes relevantes como O Homem da Pasta, O Meu Irmão é Filho Único ou A Nossa Vida.

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  • Ficção científica

Em O Céu da Meia-Noite, de e com George Clooney (em estreia na Netflix), passado num futuro próximo, o nosso planeta está a morrer e a humanidade em extinção devido a uma catástrofe planetária. Há uma sofisticadíssima nave espacial que regressa à Terra, depois de ter detectado um planeta semelhante ao nosso algures no cosmos, e cujos tripulantes ainda não sabem o que aconteceu. E Clooney é um cientista com uma doença terminal que ficou sozinho numa estação no Árctico e desafia a neve, os gelos e as temperaturas frígidas, acompanhado por uma criança esquecida na evacuação, para chegar a uma antena com alcance suficiente para avisar os astronautas do que se passa. Mas o que é que descobrimos estar, afinal, no centro dramático desta dispendiosa ficção científica distópica cheia de efeitos digitais? Uma história de remorso e redenção paternal corriqueira, estereotipada e pegajosamente hollywoodesca. Interstellar, de que O Céu da Meia-Noite parece um epígono medíocre, fez tudo muito melhor: o enredo de ficção científica apocalíptica e o drama familiar. E Matthew McConaughey nem precisou de arvorar uma barba severamente bíblica como a de Clooney.

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  • Filmes

Em Let Them All Talk, de Steven Soderbergh, estamos num outro mundo cinematográfico. Com a colaboração da argumentista, a escritora Deborah Eisenberg, Soderbergh concebeu um filme baseado na improvisação, em que foram dadas aos actores sugestões gerais das cenas a interpretar, que eles seguiram e desenvolveram. A fita foi rodada numa semana no paquete Queen Mary 2, durante uma travessia dos EUA para Inglaterra.

Meryl Streep é Alice Hughes, uma romancista prestigiada e convencida que viaja no paquete para ir receber um prémio a Inglaterra, e convida para a acompanharem o sobrinho (Lucas Hedges) e duas grandes amigas de juventude (Candice Bergen e Dianne Wiest). As três mulheres não se vêem há décadas e percebemos que já não têm muito em comum, e o ambiente de desconforto é ainda maior porque Alice está sempre a esquivar-se da companhia das suas duas convidadas.

Let Them All Talk é um filme tão esquivo, enigmático e lacónico como Alice, uma sucessão de pequenos anticlímaxes, frustrando sucessivamente as nossas expectativas de conflito, confronto ou envolvimento romântico. Mesmo quando se dá a revelação final, que faz luz sobre os motivos do convite de Alice ao sobrinho e às amigas, e sobre as suas atitudes a bordo, a fita não consegue sacudir a reticência narrativa e a frouxidão dramatúrgica que o caracteriza.

Tal como as personagens de Bergen e Wiest, também a de Meryl Streep está parcimoniosamente caracterizada. E assim o filme deixa-nos com Streep a procurar dar-lhe alguma substância de composição, alguma margem de credibilidade, alguma justificação de empatia. A aposta de Steven Soderbergh na improvisação acabou por não beneficiar nem o efeito geral desejado para Let Them All Talk, nem o seu trio de distintíssimas actrizes.

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  • Comédia

Em The Prom, adaptado de um espectáculo de palco, Ryan Murphy segue a matriz tradicional da comédia musical, ao mesmo tempo que lhe introduz um elemento de activismo social. Streep interpreta Dee Dee Allen, uma diva decadente da Broadway cujo novo espectáculo, um musical sobre Eleanor Roosevelt, falhou com estrondo. Dee Dee e os seus colegas Barry (James Corden), Angie (Nicole Kidman) e Trent (Andrew Rannells), também eles desempregados e todos donos de egos do tamanho do Empire State Building, decidem abraçar uma causa nobre para chamarem a atenção dos media e das redes sociais sobre as suas pessoas, e darem a volta à precária situação em que se encontram.

E essa causa é representada por Emma (Jo Ellen Pellman), uma liceal de uma cidadezinha do Indiana, que foi proibida pela Associação de Pais do liceu local de ir ao baile de finalistas por ser lésbica e querer ir acompanhada pela namorada, outra aluna. Os quatro oportunistas da Broadway vão arvorar-se em seus defensores encartados e desinteressados.

A comédia de The Prom é feita à custa do narcisismo, da snobeira e da presunção do quarteto de actores, que rumam de Nova Iorque ao Indiana como se viessem da civilização para as berças ensinar tolerância aos pacóvios. Mas o filme claudica, por um lado, porque Ryan Murphy não prima pela subtileza nem pela síntese na transmissão da mensagem anti-preconceitos; e, pelo outro, pela mediocridade das canções e a banalidade repetitiva das coreografias (nem parece que Murphy foi o responsável por uma série de arromba chamada Glee).

Os actores também não têm muitas oportunidades para brilhar e Meryl Streep está subaproveitada na sua composição saborosamente caricatural e kitsch da egocêntrica e atontada Dee Dee, embora o argumento lhe ponha meia-dúzia de bons momentos e deixas cómicas na boca, caso da cena em que ela puxa de dois prémios Tony da mala para conseguir uma suíte (inexistente) num hotel de província.

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  • Filmes
  • Acção e aventura

Estreada em 1998, a longa-metragem animada Mulan, da Disney, sobre uma rapariga que, na China antiga, finge ser um rapaz e vai combater no exército do imperador no lugar do seu debilitado pai, apresentava uma forte influência gráfica da arte chinesa e tinha entre as personagens principais um dragão, amigo da heroína, chamado Mushu, cuja voz estava a cargo de Eddie Murphy e que se encarregava da parte cómica da história.

A nova versão de Mulan, realizada por Niki Caro e disponível na Disney+, a partir de dia 4 de Dezembro, inclui-se no plano do estúdio de fazer remakes em imagem real (e com muitos efeitos digitais) das suas longas-metragens de animação. Perdida a componente de comédia e as canções do original (o dragão pachola foi substituído por uma silenciosa fénix), este Mulan não passa de mais uma bisarma histórico-fantasiosa de acção e aventuras como se fazem muitas actualmente na China, solene e laboriosa, que tem como único atractivo a presença de Gong Li numa bruxa que tanto se pode transformar numa águia como num bando de pardais.

  • Filmes
  • Ficção científica

Este é o mais ambicioso filme feito até agora por Christopher Nolan, que após ter contado em Intersteller uma história de ficção científica (FC) onde abordava temas como as viagens no tempo e os paradoxos temporais, realiza agora uma fita de James Bond elevada ao cubo e cruzada com um enredo de FC que volta a tratar aqueles dois assuntos, mais uma vez seguindo princípios teóricos da Física Quântica. John David Washington é o enigmático Protagonista, que procura impedir uma catástrofe mundial nunca imaginada. E em Tenet a ameaça não está tanto no presente como chega do futuro pela mão de um vilão bilionário russo, Sator (Kenneth Branagh). Só que a ousadia de Nolan, que, tal como fez em A Origem e Interstellar, quer voltar a dar ao público um grande espectáculo de cinema que também o ponha a pensar, é maior do que a sua capacidade de alinhar uma narrativa plausível, arrumada e clara com base em especulações científicas. Tenet torna-se arrevesado, inconsistente e confuso, e uma vez quebrada a suspensão da descrença do espectador, não há avanço ou recuo no tempo que lhe valha.

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Alguém anda a assassinar cineastas iranianos, a decapitá-los e a deixar as cabeças em locais públicos, com a palavra “porco” talhada na testa. Entretanto, Hasan Kasmai, um realizador “anarquista” (usa T-shirts dos AC/DC e faz anúncios de insecticidas com raparigas vestidas de baratas gigantes que vomitam gelatina ao morrer) banido de filmar pelo governo durante dois anos, pergunta-se porque é que o assassino ainda não veio atrás dele; ao mesmo tempo, anda a tentar saber se a sua ex-mulher, uma bela e famosa actriz, está envolvida com o realizador em cuja superprodução aceitou um papel, e é perseguido por uma actriz obcecada por ele. Pig – Porco é o primeiro filme do realizador e actor iraniano Mani Haghighi a estrear-se em Portugal, e não alinha com a norma formal, ideológica e social dos filmes do Irão que costumamos ver. É uma comédia satírica com toques onírico-absurdos, onde Haghighi se atira ao meio cinematográfico e artístico a que pertence, bem como à tirania das redes sociais e aos constrangimentos do regime teocrático. Só é pena que a fita, apesar de ter bons momentos, seja tão atabalhoada quanto autocomplacente.

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É muito, muito raro, vermos fantasmas no cinema português, e há um em O Ano da Morte de Ricardo Reis, a adaptação do livro homónimo de José Saramago por João Botelho. E logo um fantasma de peso: o de Fernando Pessoa (Luís Lima Barreto), que passa todo o filme a visitar o seu heterónimo Ricardo Reis (o brasileiro Chico Diaz), que aqui tem existência própria. Reis é médico e monárquico dos quatro costados e exilou-se no Brasil depois do falhanço da instauração da chamada Monarquia do Norte, em 1919. E volta a Lisboa em 1936, um mês depois da morte do seu criador, encontrando um país sob o regime do Estado Novo, e também o espectro de Pessoa.

Em vez de morrer de medo, Reis encara como perfeitamente naturais estas aparições do defunto, com o qual conversa longamente sobre a vida e a morte, sobre este mundo e o outro, sobre poesia e sobre as duas mulheres completamente diferentes com as quais se envolve. Lídia (Catarina Wallenstein), criada no hotel onde se hospeda quando chega à capital, e Marcenda (Victoria Guerra), a filha de um notável de Coimbra que está no mesmo hotel com o pai e que tem o braço esquerdo paralisado.

Depois de ter adaptado obras de Agustina (A Corte do Norte), Eça (Os Maias) e Fernão Mendes Pinto (Peregrinação), João Botelho continua aqui a sua jornada cinematográfica pelo cânone da literatura portuguesa. Filmando num preto e branco muito contrastado (que recorda outro filme do realizador, Tempos Difíceis, que transporta o livro de Charles Dickens para um contexto português), plúmbeo e fantasmagórico, Botelho tenta, mais uma vez, não ficar preso ao livro que passa para a tela, não deixar que o cinema fique submetido ao universo literário de que se apropriou, evitar que a imagem seja cativa da palavra.

Apesar deste esforço para que a fita não saia muito literária, o que passa por lhe dar uma personalidade visual poético-fantástica, embora ancorada numa real e reconhecível Lisboa dos anos 30, quer aproveitando locais ainda existentes, quer recriando outros (o Hotel Astória de Coimbra passa pelo desaparecido Hotel Bragança da capital), O Ano da Morte de Ricardo Reis acaba por se tornar repetitivo, monocórdico e bocejante, também pela escassez de peripécias vividas pela personagem principal (uma boa parte do enredo é ocupado pelos palavrosos encontros entre Reis e o espectro de Pessoa). Algumas das quais, aliás, servem apenas para ilustrar uma vulgata antifascista tão fatigada como previsível (agentes da PIDE viscosos, porteiras coscuvilheiras e delatoras, burgueses bem-falantes colados ao regime, um comício roncante da União Nacional no Campo Pequeno).

Há ainda outro problema. Nem sempre conseguimos perceber bem o que diz Chico Diaz, já que a tentativa do actor brasileiro de falar português com o sotaque de um português que viveu quase 20 anos no Brasil, não resulta em pleno. Sobretudo quando contracena com um actor com uma dicção tão impecável como Luís Lima Barreto.

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O novo filme de Philippe Garrel podia ser uma ilustração do provérbio que diz “Quem tudo quer, tudo perde” aplicado às relações amorosas. Luc, um jovem carpinteiro que trabalha com o pai idoso, e vai candidatar-se a uma grande escola técnica de Paris, envolve-se brevemente com a jovem Djemila, logo a seguir com Geneviève, uma antiga colega de liceu, que engravida e abandona, e finalmente com Betsy, uma enfermeira, submetendo-se a uma relação a três, já que esta dorme também com o colega de casa, indo finalmente pagar pela sua inconstância. Garrel filma, como sempre, a preto e branco austero e no seu registo sobejamente conhecido, o realismo fino e emocionalmente hipersensível, com interpretações naturalistas, mas em O Sal das Lágrimas os diálogos soam demasiado como os das telenovelas, o percurso sentimental de Luc força a verosimilhança e o filme parece uma bolha da espuma que ficou de uma Nova Vaga há muito desfeita na praia. Fica apenas o segundo plano da relação cúmplice e comovedora entre Luc e o seu sempre preocupado pai, interpretado pelo veterano André Wilms.

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A Flor da Felicidade
A Flor da Felicidade

E se me vez de antidepressivos sob a forma de comprimidos, houvesse uma planta de casa que tivesse exactamente o mesmo efeito destes? Essa planta está no centro de A Flor da Felecidade, que a austríaca Jessica Hausner (Lourdes) rodou em Inglaterra. Alice (Emily Beecham, eleita Melhor Actriz no Festival de Cannes) é uma botânica e mãe divorciada que desenvolveu geneticamente, num moderno laboratório, com o seu colega Chris (Ben Whishaw), que está secretamente apaixonado por ela, uma flor vermelha que exige muita atenção para a sua conservação – convém até que lhe falem todos os dias –, mas que recompensa todo este desvelo com um perfume que não só é agradável como também deixa as pessoas a sentirem-se mais felizes.

Alice baptizou a flor com o nome do filho, Little Joe, e alguns colegas não deixaram de a criticar por ela a ter feito estéril, já que isso não é natural. Mas Alice não lhes presta atenção, e agindo contra as normas do laboratório, leva uma flor para casa, para mostrar ao filho adolescente. Entretanto, começam a acontecer coisas estranhas. Todas as plantas que estavam ao pé das Little Joe de Alice começam a definhar de súbito e morrem. O cão de uma outra botânica, que por ter estado de baixa com problemas psicológicos, foi autorizada a levar o animal para o laboratório, começa a comportar-se de forma anormal e vira-se à dona. E o filho de Alice, que não era nada chegado ao pai, comunica de repente à mão que tem vontade de ir viver com ele. Pouco a pouco, as pessoas em redor da botânica vão alterando o seu modo de ser, e até aquelas que questionavam Alice pelo seu trabalho com Little Joe, mostrando-se hostis à flor, passam a apoiá-la e a elogiá-la.

A Flor da Felicidade é uma combinação, no tema, de ficção científica da modalidade "invasão secreta" com um twist (as entidades que querem controlar a humanidade não são desta feita alienígenas mas sim flores geneticamente modificadas) e, na forma, de filme arty. Em vez de uma abordagem convencional baseada na tensão, nos sustos e nos choques que convergem para um final espectacular, Jessica Hausner conta a história com frieza clínica, lentidão e em surdina, privilegiano arrepiozinhos em vez de sobressaltos, e confia muita na percussiva banda sonora de Teiji Ito para a instauração da atmosfera de inquietação.

Esse desprendimento, esse vagar e essa astenia acabam por afectar o filme do ponto de vista emocional, criando no espectador uma sensação de entorpecimento e de distância em relação ao enredo e às personagens, em vez de o envolver, empolgar e inquietar. A isto juntam-se algumas implausibilidades óbvias na história (por exemplo, o filho de Alice e a namorada entram no laboratório high tech com uma facilidade e uma descontração descaradas, e não fica nenhum registo electrónico nem visual da sua presença) e um final desnecessariamente reiterativo. A Flor da Felicidade acaba por parecer um episódio menor e presumido de Black Mirror.

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Em Faz-me Companhia, primeira longa-metragem de Gonçalo Almeida, há uma bomba de piscina assombrada. Ou talvez seja uma piscina maléfica. Ou uma canalização de piscina ectoplásmica. Seja o que for que perturba o fim-de-semana de Sílvia (Cleia Almeida) e Clara (Filipa Areosa) numa casa de campo alugada, fica por explicar neste filme de terror que do mesmo tem apenas um cheirinho. Sílvia e Clara são amantes, mas aquela ficou grávida de um homem de que não gosta enquanto que esta, actriz, se envolveu com uma colega na peça que está a ensaiar, o que frustra o pedido de Sílvia para ficarem juntas. Clara ouve ruídos estranhos vindos da arrecadação onde estão a bomba e os filtros da piscina, uma voz de mulher quando nada e sangra do nariz a todo o pé de passada. Nem Sílvia, nem nós, percebemos o que lhe está a acontecer (perdeu a sanidade mental? É vítima de uma assombração? É uma encenação para afastar a amante?), até um final às três pancadas. Faz-me Companhia tem um bom cenário, duas actrizes capazes, uma atmosfera. Só que não tem história. Ou melhor: tem uma história-fantasma.

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Em 1917, durante a I Guerra Mundial, Zacarias, um soldado português (João Nunes Monteiro) enviado para Moçambique combater os alemães, separa-se dos seus camaradas, perde-se na selva e vive um punhado de peripécias entre o perigoso e alucinante. João Nuno Monteiro narra uma aventura de perda de inocência sob a forma de um pesadelo febril, passada em terra desconhecida e ameaçadora, com uma intenção antimilitarista e anticolonialista embutida. A certa altura, Mosquito começa a marcar passo e dura mais tempo do que aquilo que tem para contar e transmitir.

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  • Drama

Jack London, que além de escrever também andou metido no cinema, não podia fazer ideia que um dia, Hollywood haveria de fazer uma adaptação do seu clássico O Apelo da Floresta em que o cão Buck não fosse um cão real, treinado, mas sim gerado por computador. É precisamente o que acontece em O Apelo Selvagem, de Chris Sanders, e o resultado não é nada convincente. Este Buck parece muito artificial, sobretudo quando se movimenta, e ainda por cima, tanto ele como os restantes animais do filme estão bastante "disneyficados". Mais valia terem feito uma animação digital. Com um Harrison Ford ainda de carne e osso no papel do narrador e último dono do cão computacional.

  • Filmes

Pedro Filipe Marques venceu a competiç\ao nacional do último DocLisboa com este filme que se demora no quotidiano do Sporting Clube de Arcozelo, ficando quase todo o tempo junto de São e Cunha, os roupeiros. Percebe-se que o realizador está mais interessado neste cantinho específico do que na vida, na actividade e nos problemas do Arcozelo enquanto pequeno clube regional, mas isto não é suficiente para preencher um filme durante quase hora e meia e prender a atenção do espectador durante quase todo esse tempo.

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  • Filmes

Este filme de Karim Ainouz (Madame Satã, O Céu de Suely, Praia do Futuro), passado no Rio de Janeiro dos anos 50, sobre duas irmãs muito chegadas, e que as circunstâncias da vida, e um pai tirano e conservador, separam dramaticamente, tem actores inatacáveis, uma época bem recriada e um esforço de realismo quotidiano feio e sujo. Juntamente com um fortíssimo sabor telenovelesco, que se manifesta desde a estereotipação das personagens até à sucessão previsível de clichés com que a história é construída, e em que é pendurado um comentário "social" de circunstância (a condição social da mulher no Brasil de há meio século).

  • Filmes
  • Comédia

O neozelandês Taika Waititi não é o primeiro cineasta a fazer humor com Hitler e com o nazismo, para melhor os atacar. Mas em Jojo Rabbit, passado na Alemanha durante a II Guerra Mundial, e cujo herói, o Jojo do título, um menino com 10 anos que adora o regime e tem Hitler como amigo imaginário (interpretado pelo próprio realizador), Waititi não consegue conciliar a comédia satírica nonsense e o drama lancinante, e o filme redunda forçadamente lamechas e caricaturalmente simplista, e ajoujado a uma pesada mochila de didactismo pueril.

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  • Filmes
  • Drama

Esta fita de Jay Roach escrita por Charles Randolph, autor do excelente A Queda de Wall Street, não se limita a documentar os abusos cometidos pelo falecido Roger Ailes, criador da Fox News e presidente dos canais Fox, na pessoa de várias jornalistas suas, já que, assumindo um forte e claro viés político-partidário, ataca também o próprio canal noticioso e, por associação, o Partido Republicano e todo o universo conservador dos EUA. John Lithgow, artificial e grotescamente engordado por próteses de maquilhagem, interpreta Aisles, Charlize Theron e Nicole Kidman são as pivôs-vedetas Megyn Kelly e Gretchen Carlson, e Margot Robbie é uma personagem inventada. Bombshell-O Escândalo é claramente tendencioso quando pretende confinar o assédio sexual e a cultura sexista e de ocultação dos abusos a uma estação, ao meio televisivo e a um universo ideológico específico.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Terrence Malick recorda a história de Franz Jaggerstatter (August Diehl), um fazendeiro austríaco católico que foi preso e executado por objecção de consciência na Alemanha, durante a II Guerra Mundial, e considerado mártir e beatificado pelo Papa Bento XVI já neste século. A grandíloquência cabotina e demonstrativa com que Malick filma o calvário do protagonista contrasta com o heroísmo estóico e monocórdico deste, e ao fim de três horas o espectador sente-se já tão mártir como ele.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

James Norton, da série policial Grantchester, interpreta, neste filme da polaca Agnieszka Holland, o jornalista galês Gareth Jones, que nos anos 30 arriscou a vida para revelar a tragédia da fome na Ucrânia durante o regime estalinista, que fez milhões de mortos e o governo da URSS quis esconder. A história inspirou a Orwell O Triunfo dos Porcos. Faltaram à realizadora os meios necessários para dar a dimensão do acontecimento, cujo horror fica apenas sugerido, sobressaindo apenas a história de Jones.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Um filme de denúncia com Mark Ruffalo (também produtor executivo), que interpreta Robert Ballot, um advogado de causas ambientalistas que levou anos e processar a empresa química DuPont por um caso de contaminação de águas, terrenos e pessoas (e de encobrimento do mesmo) no estado da Virgínia. A causa é meritória, embora tais causas raramente dêem bom cinema. É o caso deste filme anónimo, insistentemente demonstrativo e televisivo, realizado por um Todd Haynes muito longe do brilho de Seguro, Velvet Goldmine ou I'm Not There.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Uma adolescente haitiana revela, às suas amigas mais chegadas do colégio que frequenta em Paris, que é neta de um homem que foi zombificado nos anos 60 no Haiti e forçado a trabalhar nas plantações de cana de açúcar. Bertrand Bonnelo faz uma mistura instável de filme de adolescentes e de filme de terror da vertente vudu em A Criança Zombie, que revisita também as memórias recentes da história do Haiti, da ditadura da família Duvalier ao terramoto que devastou o país em 2010.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia

Juliette Binoche é a principal intérprete deste filme que Safy Nebbou adaptou de um romance de Camille Laurens e que colecciona lugares-comuns sobre os perigos, os logros de identidade e os efeitos viciantes do Facebook. Binoche faz o papel de Claire, uma professora universitária divorciada e mãe de dois filhos, que cria um perfil falso para seguir um amante que a rejeitou, e acaba dramaticamente envolvida numa relação virtual e por telemóvel com um jovem colaborador deste. O enredo é previsível à distância e o filme desperdiça também Nicole Garcia, que personifica a psiquiatra de Claire.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

O novo filme de Ira Sachs foi rodado em Sintra e tem Isabelle Huppert no papel da Frankie do título, uma famosa actriz a morrer de cancro e junta a sua complicada família, mais uma amiga que muito preza, para deixar tudo resolvido a apaziguado, dos aspectos materiais aos sentimentais. O rol de actores é multinacional e vistoso (além de Huppert, Marisa Tomei, Brendan Gleeson, Greg Kinnear, Pascal Greggory, Jérémie Rénier ou Carloto Cotta) e a câmara de Rui Poças filma tão bem Sintra e arredores que a paisagem ameaça monopolizar a fita embora Frankie funcione em baixa voltagem dramática. É um filme tão bonito como monótono.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Filmado em casa de Abel Ferrara em Roma, com a sua mulher e filha e Willem Dafoe no papel de uma versão do realizador, um homem ainda assombrado pelos fantasmas do alcoolismo e da dependência das drogas, Tommaso aglomera autobiografia e ficção e tem momentos conseguidos, sobretudo graças a Dafoe. Só que ao final de quase duas horas, a auto-indulgência, a desarrumação estilística, o discurso abstruso, a afectação e a simbologia pobre levam a melhor sobre o resto.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Adaptação ao cinema, por Tiago Guedes, da peça de Tiago Rodrigues escrita em 2011, no auge da crise económica. Uma menina órfã de mãe e precoce, cujo pai, actor, não consegue arranjar trabalho, tenta tudo, acompanhada pelo seu urso de peluche de estimação, para arranjar dinheiro para consertar a televisão de casa. Os pais não levarão os filhos a ver um filme onde uma das personagens principais passa o tempo a desfazer-se em palavrões, e os adultos acharão poucos ou nenhuns motivos de atracção no filme por causa da história. Nem carne nem peixe, esta fita é um equívoco e nunca devia ter saído do palco.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

Este filme sobre uma batalha travada em 1966, no Vietname, entre um punhado de soldados australianos e neozelandeses com pouca experiência de combate e uma força muito superior de guerrilheiros e tropas comunistas, não consegue fazer melhor do que reproduzir os estereótipos dos "Vietnam movies" de Hollywood. Há mesmo alturas em que parece decalcar cenas inteiras de Os Bravos do Pelotão ou Fomos Soldados...

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

A nova longa-metragem de João Nicolau tem Miguel Lobo Antunes no papel de Luís Rovisco, um sexagenário divorciado que trabalha numa empresa de segurança electrónica e corre o país de carro a atender clientes e cantar ao volante. Uma patusca, excêntrica e precária combinação de comédia exisfencial de cara fechada e parcimónia verbal, e de slapstick de baixa intensidade, Technoboss prolonga-se por mais tempo do que aquele que consegue preencher com o enredo de que dispõe, e a certa altura deixa de ser capaz de justificar a sua existência e defender a sua duração (quase duas horas).

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Filho de pai incógnito é uma condição que a lei portuguesa prevê, desde 1977, apenas para casos excepcionais. Mesmo assim, é uma realidade que persiste: em 2010, existiam 150 mil nessas condições, e o número de registos anuais tem aumentado. O pai de Paulo Carneiro, que aqui se estreia na realização, é um deles. E o propósito deste documentário é uma busca por respostas, por histórias e até por uma simples fotografia que o ajudem a conhecer o avô, que só é incógnito no papel – na aldeia barrosã de Bostofrio, 30 habitantes, toda a gente sabe quem foi, como foi, o que aconteceu. Carneiro (Lisboa, 1990) passou por dificuldades para fazer este filme, não em quebrar a “lei do silêncio”, como quer fazer crer, mas em ganhar a confiança daquela gente simples, intimidada pela câmara e por inquirições delicadas. Esse processo ficaria bem fora do filme. Seria igualmente vantajoso que preparasse as entrevistas, para evitar ser errático, repetitivo e disfarçar o mau jeito. Descontando redundâncias narrativas e as bucólicas paisagens transmontanas, sobra pouco. É aí, e não no plano técnico, que se sente a falta de meios: seria necessária outra dedicação para alcançar o resultado pretendido. O documentário é exibido em conjunto com a curta Cinzas e Brasas, de Manuel Mozos.

Por Hugo Torres

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  • Filmes
  • Acção e aventura

A continuação "oficial" dos dois filmes assinados por James Cameron (que aqui produz e participa no argumento) vai buscar o essencial do enredo de O Exterminador Implacável (1984) e acrescenta-lhe uma Sarah Connor (Linda Hamilton) agora transformada em eliminadora de Exterminadores, e um T-800 (Arnold Schwarzenegger) "humanizado". Exterminador Implacável-Destino Sombrio é demasiado parecido com a maioria das superproduções que se fazem hoje em Hollywood - ribombante, espalhafatoso, inconsistente e longo demais -, os jovens actores escolhidos para as novas personagens não têm carisma nem genica e as presenças de Hamilton e Schwarzenegger, e a gravidade e o peso emocional que trazem à história, não são suficientes para que este terceiro filme chegue sequer aos calcanhares dos dois anteriores.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

O novo filme de Pedro Costa é um pouco mais legível e um tudo nada mais narrativo que o anterior, o impenetrável Cavalo Dinheiro, e tem como protagonista a personagem de Vitalina Varela, que já tinha aparecido neste. Mas o realizador continua no mesmo comprimento de onda cinematográfico, contemplando o mesmo ponto de vista e preso no mesmo discurso. É a vulgata auto-referencial do miserabilismo estóico, o chover no molhado do abjeccionismo amaneirado e condescendente. Tudo é plúmbeo, desgraçado, sofrido, inexpressivo e lento em Vitalina Varela, um The Walking Dead dos deserdados e de autor na Cova da Moura.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

Anulado o efeito de surpresa do revisionismo do primeiro filme (a fada má de A Bela Adormecida afinal é boa e até cria a princesa Aurora como se fosse sua filha), Maléfica: Mestre do Mal vai agora buscar a história das origens da personagem (de novo interpretada por Angelina Jolie), em paralelo com um enredo em que o mundo dos homens e o das fadas vão entrar em guerra. Michelle Pfeiffer, na cruel rainha Ingrith, é a má da história, e o filme gasta-se numa longa e maçadora batalha com muitos efeitos digitais.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia

Anne Fontaine faz neste filme uma releitura contemporânea da história de Branca de Neve, com Lou de Laâge no papel principal e Isabelle Huppert no da madrasta má. Aqui, depois de sobreviver ao atentado contra a sua vida pela ciumenta madrasta, a cândida protagonista encontra sete homens que irão cair sob o seu encanto e levá-la à sua emancipação emocional e sexual. Esta ideia revisionista cedo se esgota e o filme, em vez de encantar ou provocar, limita-se a maçar. E Huppert é pura e simplesmente subaproveitada como vilã.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Esta realização de Fernando Alle, que conta com a co-produção da Troma, deverá ficar para a história do cinema português como o seu primeiro filme trash. Embora seja já um epifenómeno tardio e gozão, para ser visto com muitas aspas irónicas. É uma história pós-apocalíptica de zombies que espirra sangue a cada passada e safa-se de levar a classificação mínima por causa da mão-rato mutante e da lagosta francesa gigante francesa chamada Jean-Pierre que odeia golfinhos.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Ficção científica

Will Smith interpreta neste novo filme de Ang Lee um assassino de elite do governo dos EUA que se vai reformar e se vê perseguido pelo seu clone, com menos 30 anos. Projecto Gemini é uma fita em que a tecnologia de ponta usada para o rodar (3D+ em HFR) é serviçal de um argumento crivado de lugares-comuns do filme de espionagem de acção, com enxerto de uma ideia de ficção científica também ela cliché: a criação do soldado perfeito em laboratório.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Este é um daqueles filmes que sofreram tratos de polé antes de chegar às telas. Estreado em 2017 no Festival de Toronto, foi
 posto na prateleira durante dois anos pelo produtor, Harvey Weinstein. Depois de ter sido remontado por este, entretanto
 caído em desgraça, Guerra das Correntes foi comprado por outro produtor, e trabalhado pelo realizador, Alfonso Gomez-Rejon,
que lhe acrescentou cenas e cortou as que tinham sido montadas por Weinstein. Mesmo mexida por Gomez-Rejon, a fita, que
 conta a história da rivalidade entre Thomas Edison (Benedict Cumberbatch) e George Westinghouse (Michael Shannon) pela electrificação dos EUA (Nikola Tesla também aparece), é deslavada, enfadonha e sem faísca. Fatal, para um filme sobre o tema.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

Em Joker, passado nos anos 80, Todd Phillips tira do saco os mais fatigados lugares-comuns da sociologia pronta-a-usar, para contar como é que o anónimo Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) se transformou no maléfico Joker, um dos arqui-inimigos de Batman. É a vulgata da “vítima da sociedade” em toda a sua desgraça pingona e auto-comiseração em jorro contínuo. Não há mal que não venha a Fleck, um pobre diabo com problemas mentais, interpretado com cabotinismo exibicionista por Joaquin Phoenix, uma colecção de tiques, caretas e contorções.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Dominic Pinon é o principal intérprete deste filme de Edgar Pêra, que volta a inspirar-se em textos de Branquinho da Fonseca. É uma distopia passada num Portugal alternativo, e a história, que se centra em Raymond (Pinon), um francês que vive há 40 anos em Portugal, depende da mulher economicamente e vai casar a filha com um homem mais velho, ligado ao poder autoritário, é desconjuntada e pobre em interesse, apesar do apuro visual da realização.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Só na aparência esta nova fita de James Gray é uma aventura espacial de ficção científica com pretensões kubrickianas. As paisagens cósmicas e as naves do filme são apenas gigantescos e vistosos cabides em que o realizador pendura uma história sobre um filho (Brad Pitt) e a sua relação mal resolvida com o pai (Tommy Lee Jones), um dos temas que atravessa toda a sua filmografia, e que em vez de se passar em terra firme, porque ambos são astronautas, decorre entre a Terra e a orla de Neptuno, algures num futuro próximo, embora com pouca verosimilhança científica.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Terror

A conclusão desta adaptação ao cinema do clássico de terror de Stephen King, de novo realizada por Andy Muschietti, não consegue estar à altura do primeiro filme. Não só era mais fácil empatizar com os membros do Clube dos Falhados quando eram adolescentes, do que agora quando já são adultos (e a escolha infeliz de alguns dos actores, caso do insuportável Bill Hader, contribui para isso...), como também esta parte 2 cai na rotina de muitos filmes do género, reduzindo praticamente a narrativa a uma sucessão de momentos aterrorizantes muito elaborados e muito dependentes dos efeitos especiais, aqui entrecortados por flashbacks para os anos 80 A própria figura do palhaço maléfico Pennywise (Bill Skarsgard) acaba por fatigar por excesso de exposição, e com quase três horas de duração, It: Capítulo 2 produz o efeito oposto ao que desejava: acaba por aborrecer em vez de aterrorizar.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia

Baseado na juventude do jornalista e escritor Safraz Manzoor, filho de emigrantes paquistaneses em Inglaterra, na Luton dos anos 80, este filme da realizadora Gurinder Chadha (Joga como Beckham) é um insólito casamento entre uma produção de Bollywood ambientada em solo britânico e as canções de Bruce Springsteen, resultando num musical desajeitado, pueril e com algumas pretensões socio-políticas.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Entre os produtores de Tudo Bons Meninos estão vários nomes associados à comédia liceal de sucesso Super Baldas (2007) caso de Seth Rogen, Jonah Hill ou Evan Goldberg, pelo que não é para admirar que o filme de Gene Stupnitsky seja uma versão daquele, mas com miúdos de 12 anos. Aqui, a comédia assenta na inexperiência e na ignorância do jovem trio de protagonistas face ao mundo adulto, em especial no que respeita às relações amorosas e ao sexo. Ou seja, tal como Super Baldas, este filme carbura com piadas que misturam inocência e javardice, e envolvem um drone, drogas leves, brinquedos sexuais, cerveja e raparigas de várias faixas etárias.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Animação

Eis a continuação da animação em que pássaros e porcos se confrontam, a partir das ilhas em que vivem. Mas agora, eles vão ter que se aliar para combater uma ameaça comum, a Ilha das Águias. O resto, é mais do mesmo: muitas personagens barulhentas, muita cor, muito movimento, muita fofice, num estilo de animação “rebuçado visual” que volta a remeter para o universo dos jogos originais.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Ethan Hawke é o principal intérprete desta fita do canadiano Robert Budreau, que recria, muito livremente, o assalto a um banco de Estocolmo em 1973, que cunhou a expressão do título, e que corresponde, segundo alguns especialistas, um caso clínico configurando o laço de identificação que pode nascer entre captores e cativos. O filme é tão destrambelhado, disperso e errático quanto Lars, a personagem de Hawke, o cabeça do assalto ao banco, e Budreau não consegue explicar de forma satisfatória nem a relação que nasce entre este e Bianca, a caixa casada e mãe de filhos (Noomi Rapace, desperdiçada), nem a razão porque os reféns ajudam os seus sequestradores. Síndrome de Estocolmo acaba por ser um one man show de Ethan Hawke.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
Adeus, Professor
Adeus, Professor

Johnny Depp interpreta, 
nesta fita de Wayne Roberts,
 um professor de um colégio particular que descobre que tem um cancro em fase terminal. Decide então não fazer nenhum tratamento, passar a viver o pouco tempo que lhe resta
 como lhe apetece e borrifar-se para tudo em seu redor. Adeus, Professor tinha tudo para ser uma boa comédia negra de
veia satírica e iconoclasta, mas Roberts fica-se por piedades convencionais e lugares-comuns de pacote sobre como aproveitar bem a vida. Não admira que até Johnny Depp pareça enfadado.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Uma pequena e alva aldeia no cantão suíço dos Grisões vive uma ilusão: a normalidade dos casais, dos filhos, dos bolinhos, dos ajuntamentos de vizinhos e das missas dominicais esconde uma paz podre que vai deixar esta comunidade à beira do precipício. O catalisador é a chegada de um forasteiro no lugar onde ele é menos esperado: o púlpito da igreja. A diocese destaca para ali um pároco indiano com uma mensagem mais cristã do que a hierarquia católica gostaria, centrada no amor. Não só o amor etéreo: o padre Sharma aconselha o seu rebanho sobre o amor executado entre lençóis. Se no início é recebido com desconfiança racista, quando os homens descobrem as mulheres de Kama Sutra na mão, tentam afastá-lo para camuflar infidelidades, inseguranças e impotências. O filme de Christoph Schaub não cria o clima de tensão que uma história destas teria numa aldeia remota, nem funciona como a comédia que se anuncia (o mais hilariante da fita é o título em português). Salva-se a possibilidade de ouvirmos diálogos em romanche, uma língua em risco de extinção.

Por Hugo Torres

  • Filmes
  • Animação

A nova versão hiper-realista da genial animação da Disney de 1994, feita com computadores e câmaras de realidade virtual, é um trabalho impressionante do ponto de vista tecnológico, mas apresenta um enorme défice de emoção. Este Rei Leão em formato high tech é falho de expressividade, de arrebatamento emocional, de empatia, tudo o contrário da animação original. Só James Earl Jones é "repetente" nas vozes, e quase todos os outros actores não estão à altura dos do filme de 1994. A fita tem também três canções novas, duas compostas propositadamente por Elton John, Tim Rice e Beyoncé, e outra pedida "emprestada" à versão musical da Broadway, mas entram por um ouvido e saem pelo outro. Jon Favreau, que já tinha assinado o magnífico O Livro da Selva em 2016, não conseguiu, aqui, repetir o feito. Com este asséptico e distante O Rei Leão, Disney fica a perseguir a própria cauda. Uma cauda virtual.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

O novo filme de Luc Besson é uma reciclagem do seu Nikita-Dura de Matar (1990) para um enredo de Guerra Fria, com a top model russa Sasha Luss no papel de uma sexy e implacável assassina do KGB. Mas o enredo de Anna-Assassina Profissional dá tantas voltas que cedo perde a verosimilhança, as personagens são caricaturais (em especial a veterana directora do KGB interpretada com sotaque cómico por Helen Mirren) e a realização é martelada. Luss é sem dúvida muito bonita e bem lançada, mas expressiva como um pau e sem pinga de talento.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense

Paris, anos 70. Anne (Vanessa Paradis) produz filmes pornográficos gay, e os seus actores estão a ser metodica e barbaramente assassinados por um serial killer de que ela pode também vir a tornar-se vítima. O realizador Yann Gonzalez, ao mesmo tempo que recria os bastidores da produção de um tipo de cinema completamente marginal à altura, usa Coração Aberto para fazer pastiches do giallo, o policial italiano de cores berrantes e violência chocante contemporâneo da acção, do próprio porno gay como se rodava então, e para piscar o olho ao cinema experimental. Tudo isto seria pertinente se o enredo não fosse rebuscado e muito pouco consistente, dos actores serem maus, ou mal dirigidos, e da fita estar segura quase somente pelas suas referências.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

No novo filme a solo do Homem-Aranha interpretado por Tom Holland, Peter Parker, MJ e outros colegas do liceu vão passar férias a várias cidades europeias, surge um novo super-herói, Mysterio (Jake Gyllenhaal) e o planeta é ameaçado por criaturas monstruosas, os Elementais, vindas de uma Terra paralela que destruíram. Tal como no filme anterior, Homem-Aranha: Regresso a Casa, o realizador Jon Watts tenta harmonizar a atmosfera de comédia e romance típica dos teen movies com a acção de enchar a vista das fitas de super-heróis, mas falta-lhe o ambiente novaiorquino, um vilão como o interpretado por Michael Keaton e a história mais original, leve e "humana" daquele, deixando que Homem-Aranha: Longe de Casa acabe por ser dominado pela rotina da espectacularidade mastodôntica do género.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

A Petra do título desta fita do catalão Jaime Navarro é uma pintora que vai fazer uma residência a casa de Jaume, um velho e consagrado artista plástico, e um tirano cruel e egoísta, convencida que ele é o pai que ela nunca conheceu. Navarro tem aqui a tragédia grega como óbvio referente e quer situar Petra nos antípodas de um filme de Pedro Almodóvar, ao drenar de emoção, tensão e arrebatamento dramático uma história que o autor de Tudo Sobre a Minha Mãe decerto não desdenharia. No entanto, e apesar da seriedade de intenções do realizador e da qualidade do elenco, Petra acaba por resultar seco e distante, e não é ajudado pela deliberada mas redundante desarrumação cronológica.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Luísa é uma jovem e bela actriz. Acaba de regressar a Lisboa, tendo importado de Londres uma relação infeliz. António é um arguto e reconhecido escritor, que assina uma celebrada coluna de jornal: “Linhas Tortas”. É casado e tem um filho da idade de Luísa. São ambos utilizadores do Twitter e é aí que se enamoram. Mas um acidente impede que se encontrem. Nesta estreia de Rita Nunes nas longas de ficção, os actores estão tão bem quanto lhes permite o argumento de Carmo Afonso. Sem espaço para se desenvolverem, as personagens avançam por uma narrativa esquemática que contrasta com o tema subjacente ao filme – o acaso. A duração, de pouco mais de uma hora, não ajuda.

Por Hugo Torres

  • Filmes
  • Drama

Às tantas diz uma personagem ao protagonista: “Mata a pessoa que és para te tornares na pessoa que queres ser.” E com esta sentença
 está mais ou menos escrita a ambição de Dexter Fletcher:
 não ser um realizador de biografias musicais como os outros e, ao invés do caminho habitual, explorar a importância artística para a música pop da transformação de Reginald Kenneth Dwight em Elton John através da interpretação de Taron Egerton. Pois. De boas intenções está o inferno cheio e o fogo de artifício abunda em Rocketman. O que, bem vistas as coisas, descontada a vulgaridade, quando não o mau gosto generalizado das canções, ainda é o melhor da película. Apesar de procurar a excepção, a espaços avistada em uma
ou outra sequência musical, a realização conformou-
se ao modelo. E pronto, aqui está mais uma história de rapaz desajustado e talentoso, que lutando contra o escárnio e o preconceito se vai chegando ao sonho, conhece o compositor Bernie Taupin (Jamie Bell) e, com altos e baixos, drogas e copos e sexo, a sua carreira, já francamente colorida, torna-se uma exibição de lantejoulas que fazem dos concertos e da vida uma celebração kitsch onde
a música, a bem dizer, é um acessório, pois o que interessa é a celebridade.

Por Rui Monteiro

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  • Acção e aventura
Árctico
Árctico

O brasileiro Joe Penna realiza este survival movie em que Mads Mikkelsen personifica Ovdergard, um piloto cujo avião caiu nos gelos árcticos e tem que lutar não só pela sua vida, como também pela da única sobrevivente do helicóptero que o vinha resgatar, e se despenhou também. Mikkelsen é o actor perfeito para interpretar o persistente e resistente Overegard, mas nem ele consegue distrair-nos do facto da fita coleccionar diligentemente todas as situações feitas (e logo, previsíveis) do "filme de sobrevivência".

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Através de um alter ego, o jovem Yoav (Tom Mercier), o realizador Nadav Lapid encena em Sinónimos a sua intensa, raivosa, desesperada rejeição do seu país, da sua identidade israelita, até mesmo do seu judaísmo. O que passa, logo a começar, pela recusa veemente de falar hebraico e pela adopção da língua do país onde foi procurar refúgio (a França) e no qual se quer, caotica e sofregamente, assimilar. Esta tentativa de "desnacionalização" e "desnaturalização", e de entrada (ilusória) noutro país, noutra língua e noutra cultura, é filmada por Lapid num permanente torvelinho visual, psicológico e emocional, que rapidamente exaspera e cansa o espectador.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Depois de Cartas da Guerra, Ivo Ferreira foi para Macau, onde tem vivido desde os anos 90, rodar esta fita em que Maria (Margarida Vila Nova), portuguesa ali nascida, muito endividada e dona, com o pai doente, de um hotel decrépito, resiste até às últimas à pressão dos especuladores que o querem comprar, demolir e construir um prédio vistoso no seu lugar. A atmosfera macaense é bem transmitida e Margarida Vila Nova é convincente na teimosa e melancólica Maria, mas a história de Hotel Império fica contada nos 15 minutos iniciais, o que vai acontecer inevitavelmente é adivinhado por antecipação e o filme arrasta-se em modorra dramática até ao final.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Este filme sobre a elaboração do primeiro Dicionário Oxford da Língua Inglesa, e a amizade entre o filólogo Sir Douglas Murray,
 o seu coordenador, e William Chester Minor, um cirurgião militar americano preso por assassínio em Inglaterra, num asilo para criminosos dementes, e que se tornou num dos maiores colaboradores da obra, era um velho projecto de Mel Gibson, que o produz e interpreta Murray. Mas na sequência de um litígio legal com outro produtor, o controlo do filme foi-lhe retirado, e este foi remontado à revelia de Gibson e o nome do realizador removido. Esta versão que se estreia, com Sean Penn a fazer de Minor, reflecte, na forma e no nexo, as atribulações por que O Professor e o Louco passou, e as boas interpretações dos dois actores não são suficientes para as ocultar.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

O primeiro filme de Cristina Pinheiro passa-se entre imigrantes portugueses em França poucos anos após o 25 de Abril, e põe
Luísa (Naomi Biton), de dez anos, às voltas com o mundo e com a família, nomeadamente o pai (Nuno Lopes), alcoólico e com uma doença grave que oculta aos seus, e à mãe (Beatriz Batarda), uma moura de trabalho. A realizadora apanha bem o ponto de vista da criança e a forma como ela tenta decifrar a realidade familiar e tudo o resto em seu redor, mas o filme é mal resolvido.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Vaiado em Cannes, este infeliz filme de Gus Van Sant é uma densa e indigesta confecção de pieguice e espiritualidade. Matthew McConaughey faz um professor cuja mulher morre e por isso vai ao Japão matar-se, numa floresta junto ao Monte Fuji onde se dão muitos suicídios, de nipónicos
e estrangeiros. E encontra um japonês que acaba de falhar uma tentativa de pôr cobro à vida. Só se aproveita a sugestiva fotografia de Kasper Tuxen de entre esta prolixa e pretensiosa lamechiche.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

László Nemes, realizador do elogiadíssimo e oscarizado O Filho de Saul, ambienta esta sua segunda longa-metragem na Budapeste de 1913, mesmo à beira do começo da I Guerra Mundial. Filmado como aquele, com a câmara seguindo como uma sombra a protagonista, uma jovem que procura emprego na luxuosa loja de chapéus de senhora que já foi dos pais, Anoitecer parece passar-se numa lógica de transe, ou de pesadelo acordado, o que poderia justificar a falta de coerência narrativa, as várias descontinuidades e a opacidade do enredo, que aparentemente se pretende simbólico ou alegórico do ambiente vivido na Europa antes do primeiro conflito mundial. Só que tudo aqui é demasiado vago, esbatido, inconsequente e sobretudo longo.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Jersey é um paraíso fiscal no Canal da Mancha. Esqueçam as congéneres caribenhas:
 esta ilha é austera, a alegria reside na família e no circuito fechado de amigos. Moll (Jessie Buckley) é uma jovem adulta sufocada por um pai demente e uma mãe rígida e controladora. Conhecemo-la pouco antes de ela fugir do seu aniversário, passar a noite a dançar com um estranho, e acabar a ser salva de uma possível violação por Pascal (Johnny Flynn), um “artesão” cadastrado, marginal e suspeito de ser um assassino em série. Moll apaixona-se e enfrenta toda a gente para o defender, criando uma tensão explosiva na pequena comunidade. Michael Pearce (Bafta para melhor estreia) não consegue dar à história o suspense que se exigiria e a força do filme perde-se na realização, no guião pouco subtil e na ineficaz direcção de actores.

Por Hugo Torres

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  • Filmes
  • Animação

Nada menos do que três realizadores assinam esta longa-metragem de animação brasileira. Tito é um miúdo de dez anos que vive com a mãe, depois de o pai, um inventor que construiu uma máquina para comunicar com os pássaros, ter sofrido um acidente que feriu também o filho e ter saído de casa e desaparecido.

O mundo é então atingido por uma epidemia de medo devido
a uma estranha doença que transforma as pessoas em pedras, e Tito e os seus melhores amigos, Sara e Buiu, que não fala, tentam encontrar o pai, para que ele os ajude a salvar a humanidade.

Além de óbvia, ingénua e insistentemente alegórica (os mercadores de sensacionalismo e de pânico nos media, os perigos da tecnologia, a esperança numa nova geração), e com uma narrativa laboriosa até
 ser confusa, Tito e os Pássaros é visualmente agressivo e berrante. Vê-se para registo, mas sem entusiasmo.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

O tipo falhou um penálti. Era a final do Mundial. Foi o seu último jogo. E o início
de uma vida nova e surpreendente (seja qual for o ponto de vista) em que um craque idolatrado (sim, quem está a pensar em Cristiano Ronaldo acertou) procura um devir para a sua nova existência fora dos relvados. É aí que começa esta espécie de brincadeira, que parece criada no recreio de uma escola de cinema, onde convivem crise de refugiados e manipulação genética, cães todos felpudinhos, culto da personalidade, os Documentos do Panamá e populismo pré-fascista. E onde tudo conflui, à maneira das comédias românticas, em romance improvável e redentor.

A ironia de pacotilha dos realizadores e argumentistas, para além de fascinar burros que nunca viram um palácio, tem os seus lenitivos nas interpretações de Carloto Cotta, capaz de mostrar o ridículo da sua personagem, e nas prestações de Anabela Moreira e Margarida Moreira, ilustrando
a ganância familiar com brilho. Mas três andorinhas não fazem a Primavera.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Drama

Desde A Revolução Francesa, realizado em 1989 pelo francês Robert Enrico e pelo americano Richard T. Heffron, que não se fazia um filme de grande espectáculo sobre este acontecimento histórico. É a isso que se propõe Pierre Schoeller com Uma Nação, Um Rei, que começa com a tomada da Bastilha e encerra com a execução de Luís XVI. O filme toma o ponto de vista de uma família popular fictícia, que vive à sombra da Bastilha, e segue de perto vários protagonistas reais da revolução, do monarca a Danton ou Robespierre. Ao pretender abranger e condensar, em duas horas, uma miríade de eventos e uma grande quantidade de personagens inventadas e históricas, Schoeller acaba por se dispersar e tratar quase tudo pela rama, pecando também pela omissão das barbaridade e dos desmandos então cometidos em nome da liberdade, da igualdade e da fraternidade. Entre outros, Uma Nação, Um Rei conta no elenco com Olivier Gourmet, Louis Garrel, Denis Lavant ou Noémie Lvovsky.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Um casal de Brooklyn teme pelo filho de quatro anos, o Jake do título, que só gosta de brinquedos de meninas e de se disfarçar de princesa da Disney. Realizado por Silas Howard e adaptado ao cinema por Daniel Pearle a partir da sua peça de teatro (e sente-se que estamos perante uma história vinda do palco), Uma Criança como Jake é um filme tão politicamente correcto como escasso em bom senso (ninguém pensa em dizer à mãe de Jake para parar de lhe dar DVD de filmes da Disney), com Claire Danes no papel da mãe aflita e um bocado insegura, e Jim Parsons, irremediavelmente prisioneiro do seu Sheldon Cooper de A Teoria do Big Bang, no pai boa pessoa mas demasiado chóninhas.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Uma comédia feminina feel good e inofensiva, passada no Texas e tendo como combustível musical as canções de Dolly Parton. Willodeen (Danielle Macdonald) é a filha gordinha de uma antiga rainha de beleza adolescente (Jennifer Aniston) que continua ligada a este meio. A rapariga decide então entrar num concurso dirigido pela mãe, com uma amiga rechonchudxa como ela e outra de imagem "rebelde", para combaterem os estereótipos de beleza lá vigentes. Realizado por Anne Fletcher, que tem feito várias comédias ligeiras com histórias de mulheres, Miss XL vê-se com um sorriso e esquece-se cinco minutos depois de sairmos do cinema.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Patrícia Sequeira procura explorar neste filme a personalidade de Snu Abecassis, a dinamarquesa que veio para Portugal fundar a Dom Quixote ainda durante o antigo regime, e a sua relação amorosa, após o 25 de Abril, com Francisco Sá Carneiro, que teve repercussões sociais e políticas dado serem ambos casados e terem filhos, e a mulher deste nunca lhe ter concedido o divórcio. A execução fica além do desejado, porque Snu irradia uma sensação de fragilidade, de pouca consistência e convicção, que vai da banalidade dos diálogos e da débil elaboração dramática, ao recorte telenovelesco da história. As duas personagens principais estão caracterizadas de forma superficial, Pedro Almendra é uma escolha desastrosa para personificar Sá Carneiro e Inês Castel-Branco uma Snu monótona com um sotaque instável. Os sonhos "nórdicos" desta mais parecem anúncios a perfumes de luxo, e são fatais de tão ridículos.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Escrito por Agustina a partir de uma obra de Robert Musil, este filme de Rita Azevedo Gomes passa-se no século XVI, em Itália, e envolve uma dama portuguesa casada com um nobre de ascendência germânica, que passa o tempo na guerra. A Portuguesa é uma daquelas fitas “autoristas”, feita sob a sombra de Manoel de Oliveira, laboriosamente estetizante, desesperadamente estática, aspirando a ser pintura, encenada como se fosse teatro,
 com a palavra a pesar toneladas, interpretações linfáticas ou declamadas e o ponteiro dramático parado no zero. Vale a soberba fotografia de Acácio de Almeida.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

A segunda longa-metragem de Barry Jenkins, que ganhou três Óscares com Moonlight, adapta um livro de James Baldwin escrito nos anos 70. E parece uma reiteração menor, formalmente, no tom e na elaboração dramática, do filme de estreia do realizador. É uma história de amor e de prepotência racista, passada no Harlem, sobre Tish e Fonny, amigos de infância que se apaixonaram e vão casar, até o rapaz ser acusado de violação e preso, ao mesmo tempo que a jovem descobre que está grávida. Jenkins perde-se, sobretudo quando os dois amantes estão em cena, num laborioso cima visual em "inho" que o realizador confunde com lirismo, e usa e abusa da música para nos dizer o que devemos sentir e em que alturas. Tudo isto acaba por instalar um sentimentalismo insistente e pegajoso, que nos cansa e afasta das personagens, em vez de nos manter ao lado delas.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Christian Bale personifica Dick Cheney, o poderoso ex-vice-presidente dos EUA, neste filme de Adam McKay (A Queda de Wall Street), com 20 quilos a mais e transfigurado por efeitos de maquilhagem (próteses, chumaços) e digitais, deixando-nos a perguntar se há um real valor dramático em toda esta manipulação, e onde realmente acaba a interpretação e começam os efeitos. Chegará o forçar fisica e tecnicamente uma parecença de "gémeo" para validar uma interpretação? O filme é uma execração em jacto contínuo de Cheney, dobrada de panfleto anti-Republicano, em que McKay usa, mas já sem o mesmo impacto e eficácia narrativa, o mesmo estilo pop, cool, deliberadamente desarrumado e cronologicamente desconjuntado do citado A Queda de Wall Street, e o biografado é pintado esquematicamente como parte Darth Vader à civil, parte vilão de desenho animado.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Ficção científica

Adaptado de uma manga de Yukito Kushiro, este filme de ficção científica cyberpunk que James Cameron nunca conseguiu realizar "passou" a Robert Rodriguez e é ambientado num futuro distópico, resulta um bocadinho melhor do que as bisarmas de super-heróis e está visualmente conseguido, mas não deixa de ser tão previsível, repetitivo e massacrante como estes. Rosa Salazar, modificada pelos efeitos digitais e com uns olhos esbugalhados de desenho animado, é a Alita do título, uma ciborgue com aspecto de adolescente que é salva da sucata e reconstruída por um bondoso médico (Christoph Waltz) e descobre o seu passado de super-arma de guerra sob forma humana. A fita tem pózinhos de Akira, Rollerball, Blade Runner e ainda de Pinóquio.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Continua a existir a ideia de que uma actriz bonita e cheia de glamour só é levada a sério e ganha prémios quando interpreta um papel em que está feia, desfigurada ou quase irreconhecível. É o que faz Nicole Kidman neste policial de Karyn Kusama, vivendo
a figura de Erin Bell, uma ex-agente do FBI e agora detective da polícia de Los Angeles: ela é um caco ambulante, um destroço de mãe, mulher e profissional. Arrastado, sonâmbulo e encardido,
o filme é dominado pelo descarado exibicionismo da devastação total da personagem de Kidman, a tentar pescar uma nomeação ao Óscar de Melhor Actriz que afinal não saiu.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia

Peter Farrelly assina este filme baseado num facto real, a digressão no Sul profundo dos EUA, feita em 1962 pelo sofisticado e erudito pianista negro Don Shirley, levando como motorista e guarda-costas Anthony “Lip” Vallelonga, um italo-americano da Bronx, segurança em clubes nocturnos. É um misto de road movie e de buddy movie, que quer entreter enquanto dá –com traço grosso, grosas de clichés, algum paternalismo e a devida moderação política–, uma lição de tolerância e convivência interracial. É um “Obama movie” em tempos de Trump. Mahershala Ali e Viggo Mortensen interpretam Shirley e Tony “Lip”, boa companhia numa jornada muito bem intencionada, mas previsível e demonstrativa, e com o inevitável e postiço final feel good.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
Serenidade
Serenidade

Baker Dill (Matthew McConaughey) é capitão de um barco de pesca, o Serenidade, numa pequena ilha. Um
dia, aparece-lhe a ex-mulher, Karen (Anne Hathaway) que lhe pede que a ajude a matar o marido, que a maltrata e ao filho que teve com Dill, e oferece-lhe 10 milhões de dólares para o fazer. Este filme de Steven Knight, autor do excelente Locke (2013) e argumentista de cinema (Aliados) e televisão (Peaky Blinders) aparenta ser um policial que remete para as séries B do género dos anos 40 e 50, mas Knight vai instalando um clima de gradual estranheza que arrasta a história para as bandas do fantástico. Serenidade é um filme de argumentista que o seu autor não tem competência cinematográfica para levar a bom porto. Fica carimbado “Falhanços interessantes”.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Há filmes que pecam por defeito, por dar pouco
 aos espectadores: pouco espectáculo, pouca história, pouca emoção, pouco que pensar, pouco que sentir. E há outros que pecam por excesso. Vox Lux, a segunda realização do actor Brady Corbet após A Infância de um Líder, pertence à segunda categoria. É um filme atarefadíssimo, que quer dizer e mostrar muitas coisas sobre muitos assuntos ao mesmo tempo, que corre a vários carrinhos de uma só penada, e procura ir do pessoal ao global. Mesmo a personagem principal, Celeste (Natalie Portman), caracteriza-se por ser muitas coisas em simultâneo. Sobrevivente traumatizada
 de um massacre no seu liceu quando era adolescente, mãe falhada, pop star planetária em recuperação de carreira, símbolo da superficialidade berrante, repetitiva e sexualizada da música pop de hoje, e consciente de o ser, e um compósito extremado de Madonna, Britney Spears, Beyoncé e Lady Gaga. O filme, narrado por Willem Dafoe, passa-se entre 1999 e agora. A jovem Celeste (Raffey Cassidy, uma revelação) escapa 
à morte num tiroteio sangrento na sua escola. A canção que entoa na cerimónia de homenagem às vítimas atira-a para a fama. Quase 20 anos depois, Celeste sobreviveu às drogas, à bebida, a um escândalo e à crueldade dos media e das redes sociais. Tem uma filha (também interpretada por Raffey Cassidy) e vai dar um grande concerto na sua cidade natal, quando um grupo terrorista faz um atentado usando iconografia de um videoclip seu. Com ferocidade mas em desorde

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  • Filmes
  • Documentários

Depois de ter feito duas curtas-metragens, Rhoma Acans e Balada de um Batráquio, esta vencedora do Urso de Ouro do Festival de Berlim na respectiva categoria, Leonor Teles aventurou-se a rodar a primeira longa, que tomou a forma de um documentário, Terra Franca, filmado na sua Vila Franca de Xira natal.

A realizadora escolheu fixar-se no dia-a-dia de Albertino Lobo, um pescador da zona, da sua mulher, 
que tem um pequeno café, e das duas filhas do casal,
 uma das quais está a preparar o casamento. Ao fim de
 20 minutos, Terra Franca esgota o seu tema, porque, sendo inegavelmente pessoas respeitáveis e de
 trabalho, o senhor Albertino e a sua família levam vidas normalíssimas, quotidianíssimas, repetitivas, sem um pormenor curioso ou um aspecto aliciante em particular, que dariam uma curta documental, mas são curtas, muito curtas, e sem interesse suficiente para justificar um filme de quase hora e meia. É como estar na companhia de pessoas às quais não temos mais nada a dizer pouco depois de as conhecermos. E nem sequer ficamos a saber seja o que for sobre o que é morar em Vila Franca ou viver da pesca no Tejo no século XXI.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Após O Testamento do Senhor Napomuceno da Silva Araújo (1997), Francisco Manso volta a filmar, em Cabo Verde, um livro de Germano de Almeida. É a história de um fratricídio, modesta e correcta, embora as interpretações sejam muito frágeis.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Uma comédia negra do islandês Haffsteinn Gunnar Sigurosson, com uma história que gira em redor de uma querela entre dois casais de vizinhos, por causa da árvore de grande porte que um deles tem no jardim. A Árvore da Discórdia tem os seus momentos, mas o realizador perde muito tempo com o subenredo do filho do casal da árvore, que foi posto fora de casa pela mulher por causa de um vídeo de sexo, quando devia ter dado mais tempo e mais atenção à escalada do confronto entre os vizinhos.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Ao princípio era um poeta do modernismo brasileiro Jorge de Lima escrito em 1938. Anos, muitos anos depois, em 1983, A Túnica Inconsútil tornou-se bailado (que passou com êxito por Portugal) sem vergonha, na versão do Ballet Teatro Guaira, de incorporar na dança, além da música popular de Chico Buarque e Edu Lobo, técnicas sacadas à ópera e ao circo e ao teatro. Agora, este enredo que atravessa cinco gerações da família Knieps, é obra de Carlos Diegues e foi candidato brasileiro à nomeação ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro.

Uma dúzia de anos depois da sua última longa-metragem, o realizador (que foi um figurão do cinema brasileiro, e teve o seu melhor desempenho em
 Xica da Silva, nos idos de 1976, conhecendo grande popularidade com Tieta do Agreste, uns 20 anos depois) parece ter perdido o jeito, tornando pardo o que no palco era luminoso.

Ainda assim, a banda sonora de Buarque e Lobo,
as interpretações de Bruna Linzmeyer e Mariana Ximenes, ou desempenho fundamental de Jesuíta Barbosa (Vincent Cassel, Albano Jerónimo e Nuno Lopes também andam pelo elenco em papéis pouco mais do que decorativos) amenizam a dor de ver uma história andar para um lado e para o outro sem chegar a lugar nenhum significativo. Mas umas andorinhas não fazem a Primavera.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Drama

A escritora francesa Colette já tinha tido um filme biográfico em 1991, Becoming Colette, com Mathilda May. Esta nova fita apresenta Keira Knightley no papel da autora e é um biopic convencional com uma costela feminista, que nos deixa um pouco confusos por ser uma produção britânica com actores ingleses, sobre uma escritora francesa e toda passada em França. Coisas dos “europudins” cinematográficos.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

O novo filme de António-Pedro Vasconcelos é uma evocação do Parque Mayer e da revista à portuguesa nos anos 30, e uma fita política sobre a repressão nos primeiros anos do Estado Novo. Como recriação do ambiente do Parque, e da revista nessa era, faltam mais plumas, mais fantasia e mais estaleca, e o tipo de humor dos quadros de palco soa falso para aquela década. parecendo pertencer muito mais à de 60.

Como filme político, Parque Mayer chove no molhado dos clichés odiosos e das personagens prontas-a-detestar. Daniela Melchior não tem material suficiente para mostrar o que vale, Francisco Froes está um pouco melhor e Miguel Gulherme é muito bom no empresário que tem de manter toda a gente contente e garantir que o espectáculo vai continuar. Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Podia ter sido um novo Shaun of the Dead, mas este Anna e o Apocalipse, do britânico John McPhail, fica-se por ser uma espécie de Glee com zombies. Posta perante uma praga de zombies na sua cidadezinha, em plena época natalícia, a jovem liceal Anna (Ella Hunt) tem que combater os mortos-vivos ao lado de amigos e colegas, enquanto procura o pai. Mesmo com canções enxertadas, Anna e o Apocalipse não passa de um banalíssimo zombie movie de juntar por números, onde o terror é bocejante, o riso é amarelo, o dramatismo é postiço e a música entra por um ouvido e sai pelo outro.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

O primeiro filme realizado por Iris Elba é baseado num romance de um autor anglo-jamaicano, Victor Headley, uma história étnica de vingança com fundo de acção, que começa na Jamaica dos anos 70 e prossegue na década seguinte, em Londres. O filme está aceitavelmente posto em cena por Elba (que preferiu ficar atrás das cãmaras), embora sejam visíveis, sobretudo na montagem, escorregadelas e imperfeições de uma primeira obra, o final seja atrapalhado e a história muito genérica e prejudicada por uma voz off redundante. Mesmo assim, ficamos com curiosidade de ver o que o actor fará numa próxima realização.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
Um Bilhete Para Longe Daqui
Um Bilhete Para Longe Daqui

O realizador e argumentista inglês Dominic Savage labuta afanosamente, em Um Bilhete para Longe Daqui, sobre o tema da mulher suburbana que parece ter tudo o que desejou, até descobrir que há um enorme vazio na sua vida e que nada nem ninguém em seu redor o poderá preencher. Mas Savage fá-lo contemplando todos os lugares comuns da insatisfação doméstica, familiar e existencial feminina, sem faltar o encontro sexual em Paris com um belo e sedutor francês. Com Gemma Arterton, Dominic Cooper e a veterana Marthe Keller num pequeno papel.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Terror

A nova versão, por Luca Guadagnino, do febricitante 
e visualmente exuberante clássico de terror realizado pelo seu compatriota Dario Argento em 1977, seria um filme medíocre, mesmo que o original nunca tivesse existido. A história da jovem americana que vai para a Alemanha frequentar uma prestigiada escola de bailado, e descobre que é uma fachada para uma congregação de bruxas, está agora cheia de distracções e alegorias políticas marteladas, como se em vez de Argento Guadagnino estivesse a homenagear um filme de Fassbinder.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura
Monstros Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald
Monstros Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald

O segundo filme da nova saga de feitiçaria criada por J.K. Rowling, ao mesmo tempo uma prequela e uma expansão do universo de Harry Potter, sofre da falta de experiência da autora na escrita de argumentos para cinema. A história é confusa, exposta  atabalhoadamente, com excesso de subenredos, descontinuidades, coisas mal explicadas e outras apressadas. O maléfico Grindelwald (Johnny Depp) evade-se da prisão onde foi metido no filme original, Monstros Fantásticos e Onde Encontrá-los, e instala-se em Paris para instaurar a ditadura dos feiticeiros no mundo da magia e no nosso, sendo perseguido por Newt Scamander (Eddie Redmayne), agora ajudado pelo jovem Dumbledore (Jude Law). David Yates volta a realizar, isto é, a dirigir os actores e a gerir os efeitos especiais digitais.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense

Steve McQueen, o realizador de Vergonha e 12 Anos Escravo, adapta aqui ao cinema, e transfere para os EUA, a série de televisão inglesa homónima dos anos 80, da autoria de Lynda LaPlante, ajudado no argumento por Gillian Flynn (Em Parte Incerta). O núcleo da história é o mesmo - as viúvas de três assaltantes mortos num golpe planeiam, com a ajuda de uma quarta mulher, um grande roubo que lhes permitirá viver desafogadamente -, mas além de um thriller, Viúvas quer também ser um filme sobre a corrupção, as ligações entre crime e política, a situação da mulher e o racismo. Ao disparar em todas estas direcções, dispersa-se e perde coesão e credibilidade. Resta um elenco farto de qualidade: Viola Davis, Michelle Rodriguez, Elizabeth Debicki e Cynthia Erivio nas viúvas assaltantes, mais Liam Neeson, Colin Farrell, Robert Duvall, Brian Tyree Henry e Daniel Kaluyaa, estes todos em personagens com múltipos podres.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Passado em 1919, pouco depois do fim da I Guerra Mundial, este filme de Jean Becker que adapta um livro de Jean-Christophe Ruffin é um melodrama pacifista muito didáctico e sensaborão, sobre um soldado que ganhou a Legião de Honra nas trincheiras, mas vai ser julgado por um insulto público à Nação. Com François Cluzet, Nicolas Duvauchelle e um cão que vai melhor que grande parte do elenco humano.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Uma história dos Queen e da vida de Freddie Mercury cuidadosamente passada pelo crivo da marca da banda (Brian May, Roger Taylor e Jim Beach, o seu manager, são produtores executivos e consultores) mais lendária do que factual. Assinado por Bryan Singer, que abandonou a rodagem antes da fita acabar, sendo substituído por Dexter Fletcher, Bohemian Rhapsody faz o contrário daquilo que, a certa altura, os membros do grupo dizem a um patrão da EMI que não querem fazer: seguir uma fórmula. É um encadeado de situações feitas e clichés pré-digeridos dos biopics, secção estrelas de rock brilhantes e excessivas. Rami Malek, que interpreta Mercury, esforça-se muito para entrar na pele da personagem, sobretudo quando o cantor está em palco, mas nunca consegue apagar-se nela.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Esta adaptação de Seara de Vento, o romance neo-realista de Manuel da Fonseca publicado em 1958, assinada por Sérgio Tréfaut, surge como que deslocada no tempo. É o tipo de filme que veríamos, por exemplo, ser feito nos anos seguintes ao 25 de Abril, por um Manuel Guimarães ou um Luís Filipe Rocha da fase inicial, de A Fuga e Cerromaior. O livro datou muito e a abordagem que o realizador faz à história, rebuscadamente "estética", compondo meticulosamente cada plano, acaba por atenuar a dureza do retrato social e instalar uma rigidez formal e emocional que drena o dramatismo do filme.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

Lisbeth Salander, a hacker da série Millennium, de Stieg Larsson, 
não podia ter regressado numa melhor altura, na senda do movimento #MeToo e do debate em curso sobre misoginia e questões de género. Não deixa de ser, por isso, um monumental falhanço ver que a adaptação de A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha, por Fede Álvarez, lima as arestas da personagem, perdendo-se pelo caminho tudo o que a tornava singular. O problema não reside na actriz principal (Claire Foy, a rainha Isabel II
de The Crown) nem na estética visual, estabelecida por David Fischer em Millennium 1: Os Homens Que Odeiam
as Mulheres, de 2011. O problema é que Fede Álvarez não vê nada de especial
 em Salander, que aqui mais parece uma personagem insípida de jogo de vídeo, sem qualquer complexidade psicológica. A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha é a primeira grande produção dirigida pelo realizador uruguaio, que assinou também de Evil Dead (2013) e Nem Respires (2016), mas falta-lhe sangue na guelra. É um tiro ao lado.

Por Joshua Rothkopt

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  • Animação

No verão de 1975, o jornalista polaco Ryszard Kapuscinski foi enviado pela agência de imprensa estatal do seu país para Luanda, numa altura em os portugueses fugiam em massa de Angola e MPLA, UNITA e FNLA combatiam pelo poder numa guerra civil sem quartel. Dessa estadia em que chegou a correr perigo de vida, Kapuscinski tirou, no ano seguinte, o seu primeiro livro de reportagens, publicado em Portugal como Mais um Dia de Vida – Angola 1975. Esta longa-metragem animada de Raúl de la Fuente e Damian Nenow vem na linha de outros filmes de animação realista, feitos sobre vivências pessoais ou a partir de bandas desenhadas e ficções, como A Valsa com Bashir, de Ari Folman, Persépolis, de Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi ou O Homem Duplo, de Richard Linklater. Se a qualidade da animação não compromete, Mais um Dia
de Vida fica bastante aquém da riqueza literária e descritiva,
e da complexidade humana e dramática do livro do grande repórter polaco, além de ser ainda mais pró-MPLA do que o próprio autor era na época.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Leitão de Barros realizou, em 1944, Inês de Castro, onde contou com a colaboração de dois poetas, um português (Afonso Lopes Vieira) e outro espanhol (Manuel Machado). Mais de 70 anos depois, o cinema nacional regressa à narrativa do mito inesiano do amor eterno, pela mão de António Ferreira, em Pedro e Inês, que adapta A Trança de Inês, de Rosa Lobato Faria e conta a história de D. Pedro e D. Inês em três tempos diferentes, unidos por uma mesma paixão trágica e transcendente: no século XIV em que foi vivida, no presente, e num futuro distópico. Os dois papéis principais são sempre interpretados pelos mesmos actores – Diogo Amaral e Joana de Verona – tal como as personagens secundárias.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

A velha história da subida à fama de uma jovem vedeta e da queda paralela no esquecimento do decadente veterano que a ajudou e amou, filmada pela primeira vez por William Wellman em 1937, é agora realizada por Bradley Cooper, que também interpreta, ao lado de Lady Gaga. O filme está no seu melhor durante a primeira hora. Depois, Assim Nasce Uma Estrela atola-se nos lugares comuns pirosos e caramelizados do seu surrado enredo, embrulhado numa banda sonora banal.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

“É presico acreditar”, lá diz a canção. Só que antes convém saber em que é que se acredita. E Jacques (Vincent Lindon), o grande repórter protagonista de A Aparição, do francês Xavier Giannoli, é contactado pelo Vaticano para fazer precisamente isso: integrar a comissão oficial da Santa Sé que vai investigar uma jovem francesa, Anna, que diz que a Virgem Maria lhe apareceu, e avaliar se há provas concretas suficientes para que a Igreja acredite nela – ou a considere uma fraude. Entretanto, já há milhares
 e milhares de pessoas que
 estão convictas da verdade
 das palavras da rapariga e invadiram a localidade onde ela vive, e começou também a ser produzido merchandising em massa da vidente. Esta, que parece totalmente sincera e desprovida de qualquer interesse oculto ou oportunista em que acreditem nela, é enquadrada por um padre que a apoia sem reservas e arrisca a suspensão, e por um missionário americano que a quer usar como máquina de angariar fundos.

Por Eurico de Barros

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  • Documentários

Pouca coisa há neste documentário sobre Ingmar Bergman que uma pessoa medianamente interessada nos filmes e na biografia do realizador sueco não saiba já. Margarethe von Trotta e Felix Moller, que assina com ela este pomposamente intitulado Ingmar Bergman – A Vida e Obra do Génio, feito para coincidir com os 100 anos do nascimento do autor de O Sétimo Selo e Sonata de Outono, ficam-se por chover no molhado, em termos biográficos, de achegas para a interpretação dos filmes e sua relação com a vida de Bergman, e até mesmo nas pessoas escolhidas para falar dele, que vão de Liv Ullmann a Olivier Assayas e Stig Bjorkman, que têm um importante livro de conversas com o cineasta.
E nomes com Carlos Saura ou Jean-Claude Carrière parecem estar aqui só para exibição, dado que não dizem nada de novo ou relevante. Faz muito falta, por exemplo, Woody Allen, admirador reverente do biografado, com quem teve, nos anos 80, um jantar em Nova Iorque, no qual, segundo Martin Scorsese, o terceiro conviva, ambos falaram única e exclusivamente de bilheteira.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Ao que parece, houve um apocalipse. Como não há sinais de destruição, poderá ter sido uma epidemia, súbita e arrasadora. O que é certo é que em Agora Estamos Sozinhos, Del (Peter Dinklage) acordou certa amanhã, e os quase dois mil habitantes da cidadezinha do interior dos EUA onde nasceu, vivia e trabalhava, estavam todos mortos. Em vez de se ir embora, Del ficou por lá. A trabalhar na biblioteca pública, como era seu hábito. E também, diligente e metodicamente, a limpar as casas dos mortos e a enterrá-los, e a recolher os livros que estes tinham requisitado e não haviam devolvido. É a sua forma de manter a ordem num mundo que deixou de fazer sentido. Um dia, aparece outra sobrevivente, Grace (Elle Fanning). Del tenta correr com ela, mas Grace vai ficando e tornam-se amigos. De repente, o realizador Reed Morano introduz mais duas personagens na história e arruína a fita com uma segunda parte totalmente dissonante da primeira, introduzindo uma nota tosca e inverosímil de ficção distópica, e acabando por levar Agora Estamos Sozinhos a um final telegrafado por antecipação.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense

O único motivo de curiosidade de Clube dos Bilionários é a presença de Kevin Spacey num dos seus últimos papéis no cinema, antes de ser alvo das acusações de assédio sexual por vários homens,
 que o levaram a ser apagado digitalmente de Todo o Dinheiro do Mundo, de Ridley Scott, e substituído por Christopher Plummer. E conduziram ainda
 a Netflix a cancelar a exibição e
 a distribuição do filme Gore, de Michael Hoffman, onde Spacey personifica o escritor Gore Vidal. Spacey interpreta aqui Ron Levin, um vigarista de alto coturno, com um estilo de vida milionário e íntimo de muitas celebridades, que nos anos 80 se envolveu em negócios fraudulentos com um grupo de meninos ricos de Beverly Hills,
 e teve um fim violento.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Eis um fime diligente e didáctico mas também banal e maçador sobre a forma como a administração de George W. Bush conseguiu controlar os media para servir os seus fins, após os atentados do 11 de Setembro e até à invasão do Iraque, transformando desde as televisões até títulos como o The New York Times e o Washington Post, em “estenógrafos da Casa Branca”, na definição feliz da personagem interpretada por Rob Reiner, que também assina a realização de Operação Shock and Awe. Reiner, Woody Harrelson e James Marsden são jornalistas da cadeia Knight-Ridder que nunca foram na conversa de Washington, fizeram o devido trabalho de investigação e perceberam o que estava a acontecer, entre a mistificação das “armas de destruição maciça” e o plano de ocupação do Iraque. O filme é tão aplicado e meritório como prosaico, inerte e explicativo até à exasperação.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Um veículo pobre e sofrível
para quatro actrizes de topo. Diane Keaton, Jane Fonda, Candice Bergen e Mary Steenburgen são quatro amigas cujas vidas sentimentais e sexuais vão mudar, depois
de lerem Cinquenta Sombras
 de Grey no clube do livro que formaram, como pretexto para
se encontrarem todos os meses
e beberem vinho. As quatro veteranas interpretam os seus papéis com uma perna às costas e mereciam muito mais do que esta comédia pálida, o primeiro filme de Bill Holderman. Do Jeito que Elas Querem tem todo o picante
e toda a ousadia de confecção de uma canja de galinha, ficando-se por um inofensivo humor de vertente eréctil e pseudo-erótica, que não faria corar uma freira.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

A segunda longa-metragem de Sandro Aguilar após A Zona (2008) radicaliza as premissas não-narrativas, sugestivas e de abstracção desta. De tal forma, que se perde na opacidade e na ilegibilidade.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Spike Lee revela aqui a história real de Ron Stallworth, o primeiro agente negro da polícia de Colorado Springs, que nos anos 70, com o seu parceiro Flip Zimmerman, infiltrou e neutralizou a representação local do Ku Klux Klan, contada num filme que por lado faz um estridente e indignado comício anti-racista, e pelo outro se mostra moderado e conciliador, no seu elogio da polícia e da colaboração entre agentes negros e brancos contra os supremacistas brancos e os revolucionários do Black Power. Reduzida ao essencial, a fita assemelha-se a uma série B policial que parece saída dos anos 70, com um cheirinho de blaxpoitation desses tempos, mais os aditivos de agitação e de actualidade política. John David Washington, filho de Denzel Washington, é formidável no papel de Stallworth, que interpreta com muita coolness e uma trunfa afro a condizer, bem coadjuvado por Adam Driver no de Flip.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Um decepcionante western tardio, com Jessica Chastain no papel de Caroline Weldon, uma pintora que em 1899 foi fazer o retrato do lendário chefe Touro Sentado (Michael Greyeyes) na reserva índia do Dakota onde este vivia, depois da sua rendição ao exército dos EUA. Além de pintar a relação entre a artista e Touro Sentado com tintas de fantasia romântica, a realizadora Susanna White, ao querer recordar as injustiças e prepotências feitas aos índios por Washington, distorce os factos históricos, ao ponto de fazer de Weldon a responsável pela revolta dos nativos da reserva e acabando por ser paternalista, condescendente e ofensiva para com eles. Mulher Que Segue à Frente é cinema sofrível e História deformada.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Na sua primeira longa-metragem a solo (as anteriores foram quase todas rodadas em colaboração com Walter Salles), Daniela Thomas leva-nos a Minas Gerais, no início do século XIX. A mulher de um fazendeiro português morre no parto, tal como a criança e pouco tempo depois, o homem casa-se com a irmã mais nova da morta, uma menor. Filmado a preto e branco,Vazante assume o ritmo da vida e o lento passar do tempo da época em que o enredo decorre, e apesar da rigorosa recriação histórica, incluindo as relações hierárquicas na fazenda, do patrão aos criados e escravos, o filme, uma co-produção luso-brasileira, não é propriamente rico em acontecimentos e conflitos, resultando numa poderosa estopada.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Nova versão do filme de 1973 realizado por Franklin J. Schaffner a partir do best-seller de Henri Charrière, um ex-condenado a trabalhos forçados na Guiana Francesa nos anos 30, com Steve McQueen e Dustin Hoffman nos principais papéis. Rodado na Europa, este remake é totalmente redundante e não consegue passar a competência rotineira, o ramerrame certinho, perdendo na comparação com o original em todos os departamentos, desde a qualidade da produção às interpretações e à presença na tela dos actores escolhidos para sucederem a McQueen e Hoffman, respectivamente Charlie Hunnam e Rami Malek. Hunnam assemelha-se assombrosamente àquele e Malek tem o físico e a voz de Hoffman, mas não são estrelas de cinema como eles e nem por sombras chegam para tirar Papillon da banalidade arrumadinha e dar-lhe vigor dramático, narrativo e comercial.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Valérie Massadian, autora do simpático e poético Nana (2011), filma aqui um jovem casal, a Milla do título (Severine Jonckeere) e Leo (Luc Chasset) que vivem de pequenos furtos, na rua ou em casas devolutas. Não têm água, luz, gás nem electrodomésticos, mas têm amor, carinho e cumplicidade. Romântico, mas nada prático. Um dia, Milla, que está grávida, fica sozinha e como se este filme já de si ténue se evaporasse, já que a realizadora passa a registar o dia-a-dia da protagonista como se estivesse a fazer home movies. Não há acção propriamente dita, nem voltagem dramática nem conflitos. Instala-se o vazio narrativo, que traz consigo um espesso tédio. Milla é só meio filme.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia

A primeira longa-metragem do argumentista espanhol Sergio Barrejón, 
com uma já longa carreira na televisão, é uma comédia negra sobre uma grande empresa
em dificuldades financeiras, dirigida pelo colérico César (Luis Callejo). Ele é um tipo insofrível que funciona à
base de cocaína e whisky, 
trata os outros directores
 e os empregados com sete pedras nas mãos e está em conflito com a mulher e o filho adolescente. O enredo de O Chefe envolve corrupção no interior da empresa e uma conspiração para derrubar César, e uma empregada da limpeza colombiana (Juana Acosta), por quem este se afeiçoa e que o vai ajudar na crise que enfrenta. A interpretação de Callejo, que corre do cómico ao patético e enche o filme, não é no entanto suficiente para compensar a previsibilidade da história desta co-produção entre Espanha e Portugal, que conta com Dalila Carmo no elenco.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Suspense
Sibéria
Sibéria

Além de principal intérprete, Keanu Reeves também produz este thriller rodado entre Canadá e a Rússia (mais naquele que nesta) e realizado por Matthew Ross. Embora esteja cheio de figuras, situações e lugares comuns do género, o filme não consegue fazer nada de minimamente original, interessante ou emocionante com eles, nem ser convincente na sua pose de policial com pretensões de autor, em que a acção é sacrificada à psicologia das personagens. É só tédio. Ao contrário dos diamantes falsos que a personagem de Reeves impinge a um mafioso russo, Sibéria nem por um momento nos persuade que não é fancaria.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Ficção científica
Mentes Poderosas
Mentes Poderosas

Um filme que inaugura uma nova franchise de ficção científica para o público adolescente, baseada nos livros da escritora Alexandra Bracken. Nos EUA, num futuro próximo, 90% das crianças morrem com uma estranha doença. As sobreviventes revelam ter poderes paranormais em vários graus, e o governo caça-as e fecha-as em campos de concentração, eliminando as mais perigosas. Só que há sempre quem se revolte e fuja, caso da heroína, Ruby (Amandla Stenberg). Jennifer Yu Nelson assina esta fita de sci-fi previsível e pouco elaborada, que não pretende ser mais do que é e conhece bem a clientela a que aponta.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Michael Haneke atira-se aos ricos, 
à sua maneira, ao mesmo tempo 
que volta a explorar as amarguras
 da vida em família em Happy End, passado em Calais, na casa apalaçada dos Laurent, gente em estado de ruína interior, emocionalmente anestesiada, moralmente indiferente e sem apresentar o menor traço 
de redenção, da neta pequena ao
 avô em cadeira de rodas. Mas este é um Haneke em piloto automático
 do seu pessimismo radical e impassível, forçando o estereótipo da dessensibilização causada 
pelas novas tecnologias e pelas 
redes sociais, e rematando a fita
com um clímax de uma facilidade decepcionante.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia

Quem tiver visto o primeiro Mamma Mia!, realizado por Phyllida Lloyd em 2008, sabe com o que contar neste segundo filme, dirigido desta feita por Ol Parker. O mais interessante acaba por ser o uso de flashbacks de Donna (a personagem de Meryl Streep) em jovem, interpretada aqui por Lily James, mas os cortes entre o passado e o presente acabam por ser um pouco foleiros. De resto,
 é o que espera: há paisagens de postalinho, romances airosos e músicas dos Abba cantadas com gosto, ainda que nem sempre com jeitinho, pelas estrelas. Uma distracção veraneante, a espaços prazenteira, mas frustrantemente kitsch.

Por Abbey Bender

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  • Filmes
  • Drama
No Coração da Escuridão
No Coração da Escuridão

Um homen solitário, torturado e que não vê qualquer sentido ou utilidade naquilo que faz, decide recorrer à violência como forma de corrigir aquilo que entender serem os males do mundo e castigar os responsáveis por eles, assumindo assim uma aura de anjo vingador e sacrificial.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Ian McEwan adaptou para o cinema o seu romance homónimo passado em Oxford, em 1962, sobre a tragédia que se abate sobre um jovem casal (Billy Howle e a sempre soberba Saoirse Ronan) na sua noite de núpcias, por uma combinação de factores sociais, de um segredo familiar inconfessável e de uma falha de carácter. O filme tem todas as qualidades das produções inglesas deste tipo, mais a respeitabilidade cultural conferida por McEwan, mas é traído por um final completamente diferente do do livro, condescendente para com o sentimentalismo pingão das plateias. E por um desastroso trabalho de maquilhagem no envelhecimento das duas personagens principais, que parecem fugitivos de um filme de terror de segunda ordem.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

A autora de clássicos da literatura de ficção científica e fantástica como Frankenstein e O Último Homem, mulher do poeta romântico Shelley, sua igual literária e proto-feminista, é aqui interpretada pela americana Elle Fanning (muito mais bonita que a verdadeira Mary Shelley), e a realização está a cargo da saudita Haifaa Al-Mansour, a primeira mulher a fazer um filme no seu país (O Sonho de Wadjda). Mas a escritora inglesa merecia um bocadinho melhor do que este filme sensaborão, monotonamente didáctico e televisivamente compostinho.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

A franchise realizada por Steven Soderbergh, encabeçada por George Clooney e Brad Pitt, e que durou três filmes neste século, é aqui transportada por Gary Ross para o universo feminino. Sandra Bullock é Debbie Ocean, irmã do Danny Ocean de Clooney, que sai da cadeia e junta uma equipa de mulheres, cada qual com a sua especialidade, para concretizar um grande golpe, aparentemente impossível. Ocean’s 8 não passa de uma mera e previsível transposição da fórmula da trilogia masculina para o seio de um grupo de mulheres assaltantes. Totalmente descartável. Também com Cate Blanchett, Rihanna ou Helena Bonham Carter.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

E já lá vão seis colaborações entre Benoît Jacquot e Isabelle Huppert, a sua actriz fetiche, desde As Asas da Pomba, em 1981. Este Eva é inspirado num livro do escritor inglês James Hadley Chase, já antes filmado por Joseph Losey em 1962, com o mesmo título e interpretações de Jeanne Moreau e Stanley Baker.

Se a versão de Losey se afastava bastante da obra de Chase, esta de Jacquot afasta-se ainda mais. O filme não é um dos mais felizes do realizador francês, nem de Huppert, que interpreta a Eva do título, uma prostituta de luxo cujo marido, ligado ao mercado da arte, está a cumprir uma pena de prisão. É por ela que se deixa enfeitiçar Bertrand (Gaspard -Ulliel), um jovem escroque que ficou famoso do dia para a noite como autor dramático, após ter roubado uma peça inédita a um escritor idoso e esquecido de quem tomava conta e morreu, e feito passar pelo autor da mesma.

O que não falta por aí são thrillers psicológicos sobre relações malsãs  e condenadas à partida, entre homens poucos escrupulosos e mulheres mais ou menos fatais. Eva funciona neste registo, embora com uma moleza dramática e uma morneza cinematográfica que nos  priva do necessário envolvimento emocional com as personagens  e com o enredo.  Até Huppert parece estar ali apenas a cumprir contrato.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Em mais um filme descartável como os que Wim Wenders anda a fazer há muitos anos, James McAvoy e Alicia Vikander interpretam, em Submersos, amantes literalmente separados por um oceano.

Ela é uma glamorosa bio-matemática que se mete num mini-submarino para ir explorar as profundezas abissais do Atlântico; ele finge ser engenheiro hidráulico numa ONG mas é na verdade um espião britânico, e fica preso na Somália por jihadistas locais, impossibilitado de comunicar com ela, de dizer que ama e que, a propósito, não lhe revelou a sua verdadeira identidade. Submersos só não é uma seca total, porque a história do lado da personagem de McAvoy tem um mínimo de interesse e de suspense. O resto, é palha bem filmada.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

À semelhança do primeiro filme, Deadpool 2 sabe bem quem é o seu público-alvo e o que quer – incessantes piscares de olho à banda desenhada e a outros super-heróis. Quem não tiver visto a anterior película, que revelava como o estouvado mercenário Wade Wilson se tornou no Deadpool, vai ter dificuldade em acompanhar esta continuação, com as suas sucessivas graçolas com rabos e as suas vísceras geradas por computador, intercaladas por centenas de piadas em circuito fechado e meta-comentários. O filme abre com o anti-herói de Ryan Reynolds a fumar um cigarro, antes de rebentar com ele próprio e com o seu apartamento.

Por David Leitch

  • Filmes
  • Drama

Se tivesse sido rodado nos anos 70 ou 80, Nunca Estiveste Aqui seria um filme de acção série B, pão pão, queijo queijo, interpretado por um Charles Bronson ou um Chuck Norris. Nas mãos da britânica Lynne Ramsey (Temos Que Falar Sobre Kevin), Nunca Estivemos Aqui é uma tentativa desajeitada de aproveitamento das convenções e das personagens-tipo desse género para tentar fazer um filme de “arte & ensaio”, mas que acaba por se assemelhar
a um arremedo tosco e amaneirado de Taxi Driver. Ramsey quer sol na eira e
 chuva no nabal, mas acaba por não ter nem um, nem outro. Joaquin Phoenix personifica Joe, um veterano do Iraque 
com um historial de abuso sexual quando era pequeno
 e que veio traumatizado da guerra (saem dois clichés com barbas bíblicas), que ganha a vida a fazer serviços violentos, usando um martelo em vez de armas de fogo (artesanal, mas nada prático).

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

As irmãa Delphine e Muriel Coulin basearam este 17 Raparigas num caso verídico ocorrido em Gloucester, nos EUA, em 2008, quando um grupo de liceais combinou uma gravidez colectiva, causando uma comoção a nível nacional. As realizadoras situaram a acção na cidade costeira francesa de Lorient, onde uma rapariga de 16 anos fica grávida e decide
 não abortar. Várias das colegas imitam-na, levadas por uma vaga ideia de criar as crianças juntas quando elas nascerem e formar uma espécie de comunidade feminina ideal. Claro que a realidade rapidamente se mete no caminho desta quimera adolescente. 17 Raparigas não deixa de ser simpático, sobretudo pela qualidade, graça e naturalidade das jovens actrizes, mas há no filme um excesso de condescendência em relação as personagens que acaba por o prejudicar.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Documentários

O artista chinês Ai Weiwei assina este documentário rodado ao longo de um ano 
em 23 países e dedicado aos refugiados e migrantes que fogem de guerras, de estados falidos, de regimes opressivos (a situação dos palestinianos não é esquecida, e muito bem), de más condições de vida e até das alterações climáticas, traçando um enorme mapa cinematográfico desta movimentação humana (o título original do filme é Human Flow). Sucedem-se as imagens dramáticas, os testemunhos comoventes e os depoimentos de figuras públicas e responsáveis de instituições internacionais, e o próprio Weiwei não se coíbe de aparecer no filme e interagir com algumas pessoas. Se Refugiados apresenta um excedente de bons sentimentos e das melhores intenções, falta-lhe o que costuma faltar a este tipo de documentários. Uma análise objectiva, rigorosa, sem interferência das emoções ou da indignação, às múltiplas causas de toda esta movimentação humana, bem como dos vários problemas que coloca nos países de acolhimento. Sem isto, o retrato desta realidade fica incompleto.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
Anon
Anon

Numa altura em que cada vez mais se discutem as ameaças à privacidade postas pelo digital, Andrew Niccol situa Anon
numa sociedade futura em que uma sofisticada tecnologia
veio substituir telemóveis e computadores, e as funções destes estão agora embutidas
no cérebro das pessoas. Isto permite às autoridades ter acesso imediato a todos os
dados e actos dos cidadãos, passados e presentes. Sob as roupas de um thriller de FC, Anon, interpretado por Clive Owen e Amanda Seyfried, é uma parábola sobre a impossibilidade de existência de um sistema de vigilância universal infalível e inviolável, mas falha por não explicar como surgiu esta tecnologia e foi permitido o seu uso e por uma exposição narrativa pouco clara e mastigada.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Um mar negro surge no ecrã. O tempo passa, parece que uma enormidade, até se ouvir uma voz de mulher, quase sussurrando. Não fora o texto introdutório, que parece indicar o início de um documentário, o lento alinhamento das imagens sugere antes experimentalismo. E mais ou menos é – embora o pretexto seja a resistência ao fascismo.

Luz Obscura é a continuação por outra forma de Natureza Morta (2005) e 48 (2010), todos criados à maneira memorialista de acordo com o mesmo processo de aglomeração de fotografias e depoimentos. Contudo, agora, Susana de Sousa Dias vai mais longe no apuramento da sua técnica de montagem e na elaboração das suas metáforas visuais para contar como o regime de Salazar determinou a vida familiar dos que o combatiam, para isso acompanhando a saga dos filhos do dirigente comunista Octávio Pato do nascimento até ao fim da ditadura. É um filme sentido, dorido, revelador de como o fascismo construiu o temor que o sustentou e de como marcava os indivíduos na sua mais profunda intimidade. Mas também é um filme monótono.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes

O actor Albert Dupontel realiza
 e interpreta um dos papéis principais desta ambiciosa adaptação do romance de Pierre Lemaitre que ganhou o Goncourt em 2013, passado no fim da I Guerra Mundial e nos loucos anos 20. Duponter quer que o seu filme seja uma denúncia da guerra e dos que se aproveitam dela para ficar ricos, uma comédia macabra e cínica com um toque de luta de classes, uma homenagem retro ao cinema clássico francês, tudo num estilo inspirado pelo de Jean-Pierre Jeunet, mas não consegue dar harmonia ao conjunto.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
A Maldição da Casa Winchester
A Maldição da Casa Winchester

Partindo de uma história real sobre a viúva do fabricante das lendárias espingardas de repetição Winchester,
que julgava ser assombrada pelos espectros de pessoas mortas por esta arma, os irmãos Michael e Peter Spierig rodaram um filme de terror com Helen Mirren no papel principal, mas que assenta numa história pateta, por vezes mesmo involuntariamente cómica, e sobretudo em sustos fáceis e pueris, de carregar pela boca. Estes não são os Spierig que fizeram O Último Vampiro (2009) e sobretudo 
O Predestinado (2014), um
dos melhores filmes de ficção científica dos últimos anos.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Cate Blanchett multiplica-se 
por 13 personagens em cenários os mais diversos, enunciando excertos de outros tantos manifestos políticos ou artísticos. Este filme do artista plástico
e realizador alemão Julian Rosenfeldt tem origem numa instalação de videoarte de sua autoria, também protagonizado por Blanchett. A ideia não deixa de ser curiosa, mas não passa muito bem fora do seu contexto experimental original.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

No tempo em que se desviavam aviões do seu rumo por razões políticas,
 um grupo independentista palestiniano tomou posse do voo da Air France que partira de Telavive em direcção a Paris. O piloto foi obrigado a rumar a Entebbe, no Uganda, os passageiros judeus separados dos restantes e feitos reféns. Em troca das suas vidas reivindicavam os raptores a libertação de algumas dezenas de militantes da sua causa. Israel não demorou a enviar um grupo de tropas especiais para resgatar os passageiros.

O ataque de um comando israelita ao aeroporto ugandês, há quase 42 anos, é o pretexto para José Padilha dirigir um filme de acção em jeito de reconstituição histórico-política. Como de costume
 no seu trabalho, apesar da intenção, o contexto político e as repercussões internacionais do caso são dadas como ilustrações, vinhetas para justificar a violência descabelada da acção.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Drama
Hostis
Hostis

Um western de Scott Cooper (Crazy Heart) em que Christian Bale interpreta um oficial de Cavalaria á beira da reforma, que tem que cumprir uma última missão, contra sua vontade: escoltar um velho
 e doente chefe índio, seu inimigo figadal, e a família dele, para o seu território de origem. Bale não convence 
a fazer de militar veterano
 e batido, e Cooper, que quer mandar uma mensagem sobre a violência inerente à “alma americana”, põe cara solene, arrasta a acção e transforma 
o filme numa estopada pretensiosa e interminável.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Todd Haynes adapta o livro infantil escrito e ilustrado 
por Brian Selznick (autor de A Invenção de Hugo), passado em Nova Iorque, em dois tempos diferentes (anos 20, filmados como no tempo do cinema mudo, e anos 70), sobre
uma rapariga surda-muda
 e um rapazinho surdo, que procuram resolver mistérios familiares. Há em O Museu das Maravilhas marcas do Haynes experimental e inimigo da rotina e do óbvio de Seguro
 ou Não Estou Aí, mas a fita padece de sentimentalismo em esguicho contínuo e de verborreia musical e visual.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

O documentarista brasileiro João Moreira Salles associa recordações pessoais e acontecimentos históricos nesta obra em que os filmes amadores feitos pela mãe durante uma viagem à China, na década de 60, durante a Revolução Cultural, remetem para uma evocação do Maio de 68 em França, da repressão da Primavera de Praga
pelo regime soviético e do assassínio de um estudante brasileiro no Rio durante
o regime militar. No 
Intenso Agora é um longo e melancólico lamento pelo falhanço daquilo a que se convencionou chamar a utopia, servido por uma narração pesadamente sonífera.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Um drama passado numa família da classe média de São Paulo, realizado por
 Laíz Bodansky, que também escreve o argumento com Luiz Bolognesi. Apesar 
da boa interpretação da expressiva Maria Ribeiro no papel principal, e de Clarisse Abujamra na mãe, o filme falha na sua capacidade de nos envolver na história, e tem um enredo que parece de telenovela, condensado em hora e meia e um bocadinho melhorado em termos de elaboração narrativa.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Mais uma história verídica, filmada por James Marsh, o autor do documentário Homem no Arame. Colin Firth faz o velejador inglês Donald Crowhurst, que
em 1968 se meteu numa corrida de barcos à volta do mundo sem escalas, para ganhar o prémio
e resolver as suas dificuldades financeiras. Só que tinha pouca experiência, estava mal preparado e o barco era desadequado para a prova. O que fica deste filme banal são as sequências marítimas e a interpretação contida de Firth no estóico mas infeliz navegador.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense
A Agente Vermelha
A Agente Vermelha

Eis um filme de espionagem parte anacrónico, pelo lastro narrativo do tempo da Guerra Fria que transporta, parte contemporâneo, pela violência física e sexual gráfica e pela “mensagem” anti-Rússia de Putin. Baseado no livro de Jason Matthews, um antigo agente da CIA, A Agente Vermelha tem Jennifer Lawrence desperdiçada no papel de uma antiga bailarina do Bolchoi reconvertida, contra vontade, em espia de alto coturno.
 Assinado por Francis Lawrence (que dirigiu a actriz na série de filmes Hunger Games), A Agente Vermelha faz um esforço para fugir aos clichés do género e parecer um filme de espionagem que faz alguma diferença, mas quanto mais tenta, mas se afunda neles, e num enredo que mete os pés pelas mãos. Entre os bons actores que acompanham Lawrence a fazer papéis de russos sortidos, e todos a falar inglês com sotaque russo cómico, aparecem Jeremy Irons, Charlotte Rampling e Joely Richardson.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Ficção científica

Num futuro próximo, poderemos escolher ser reduzidos a 13 centímetros de altura e ir ter uma nova vida em luxuosas mini-comunidades por todo o mundo. É o que faz Paul Safranek (Matt Damon), mas a mulher fica com medo à última hora, não o acompanha no processo de redução, divorcia-se e deixa-o sozinho no seu novo pequeno mundo. Alexander Payne parte de uma ideia de ficção científica para fazer o que parece ser uma sátira social futurista, mas a história torna-se entediante, previsível e moralista, e tanto faz passar-se num mundo em tamanho miniatura como no nosso.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense
Todo o Dinheiro do Mundo
Todo o Dinheiro do Mundo

O filme de Ridley Scott de onde Kevin Spacey foi “apagado”
na sequência das acusações
de assédio sexual feitas contra ele, é um thriller maçudo, lúgubre, átono e moralista, que reconstitui o rapto em Roma, em 1973, de Paul Getty III, neto e herdeiro do multimilionário J. Paul Getty (Christopher Plummer, no papel que foi de Spacey, e nomeado ao Óscar
de Melhor Actor Secundário), na altura o homem mais rico do mundo. E que se recusou a pagar o resgate, para espanto 
e revolta da antiga nora, Gail Getty (Michelle Williams). O melhor da fita, ironicamente,
é Plummer, fazendo render
 até à última gota a insondável 
e refinada sovinice do velho, egoísta e implacável Getty, 
que no entanto, a espaços, tem surpreendentes lampejos de humanidade.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Romance
Chama-me Pelo Teu Nome
Chama-me Pelo Teu Nome

O tradicional coming of age movie em que um adolescente é iniciado no sexo e no amor por uma mulher mais velha leva uma reviravolta nesta fita de Luca Guadagnino: o romance é gay.
A história passa-se num Verão do início de 80s em Itália, quando o jovem Elio (Timothée Chalamet) se envolve com Oliver (Armie Hammer), o novo assistente
do pai, um distinto professor
de Arqueologia. Guadagnino recenseia os lugares comuns visuais, sentimentais e sensuais do formato, com alusões óbvias à cultura clássica grega e algum simbolismo desastrado.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
Mudbound – As Lamas do Mississípi
Mudbound – As Lamas do Mississípi

Passado no delta do rio Mississípi após a II Guerra Mundial, este filme de Dee Rees adaptado de um romance de Hillary Jordan é monótono, penoso, atacado de astenia dramática, com personagens subdesenvolvidas, estereotipado e a transbordar de boas intenções sociais. Foi produzido originalmente para a Netflix, e devia ter ficado por lá.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Um Gary Oldman que desaparece na figura de Winston Churchill e resiste à tentação preguiçosa de o imitar, é a única razão para vermos este filme de Joe Wright, que dá uma no cravo da verdade histórica e 
uma na ferradura das liberdades dramáticas. A acção passa-se nos críticos dias seguintes à nomeação de Churchill para primeiro-ministro, na Primavera de 1940, quando teve que enfrentar o seu próprio partido e o avanço alemão na Europa.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Eis um road movie tailandês
em que um arquitecto em plena crise da meia-idade foge de Banguecoque para a sua aldeia natal, na companhia do elefante que ajudou a criar quando era pequeno. Simpático embora com a consistência de papel vegetal, Pop Aye é a estreia nas longas-metragens de Kirsten Tan.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

O grego Yorgos Lanthimos (Canino, A Lagosta) tenta recriar a atmosfera de fatalidade pesada e inelutável da tragédia grega (no caso, referenciando Ifigénia em Áulide, de Eurípedes, e o mito que lhe está associado) no seio de uma família da classe média alta dos nossos dias. Mas compromete tudo ao instalar uma solenidade pomposa e uma atmosfera de ominosidade monótona e laboriosa, e ao pedir aos actores que representem como se estivessem sob efeito de anestesia geral. Com Colin Farrell, Nicole Kidman e Barry Keoghan no estranho rapaz com poderes sobrenaturais.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

O novo título da saga criada por George Lucas há 40 anos teria sido bastante melhor se tivesse emulado o filme “paralelo” Rogue One e não o anterior desta terceira trilogia, O Despertar da Força. Rian Johnson fez o trabalho de casa, mas Os Últimos
 Jedi é um decalque aplicado, muito explicativo e de uma espectacularidade monótona, dos melhores filmes da saga. Só o regressado Luke Skywalker (Mark Hamill) lhe dá alguma gravidade e vibração épica no final.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Passado em grande parte na enorme e labiríntica casa de campo de um velho magnata
 de origem grega que foi envenenado, e cujos familiares tinham quase todos motivos para o querer ver morto, A Casa Torta apresenta uma história que se mantém fiel no essencial ao livro de Agatha Christie e uma realização utilitária, dedicada a juntar os pontinhos do enredo. É o tipo de filme digestivo que se vê para passar o tempo e entreter o tédio, e está esquecido meia hora depois de acabar. Ou como dizem no Brasil: médio.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

O trabalho televisivo de Louis C.K. mostra bem o 
seu humor autodepreciativo, suas virtudes e limitações, e é 
o que se encontra nesta longa-metragem: duas horas de humor autodepreciativo filmadas debaixo da asfixiante influência do cinema de Woody Allen. O preto e branco da fotografia, um par de panorâmicas sobre Manhattan, no centro da acção estar um comediante em crise de inspiração e um cineasta com queda para meninas, remetem tão depressa para Manhattan que nem é preciso o outro eixo da narrativa centrar-se nas preocupações do comediante interpretado por Louis C.K. acerca da relação da sua filha adolescente (Chloe Grace Moretz) com o perverso realizador criado por John Malkovich. Não fora o autor engordar recentemente a lista de abusadores sexuais e este seria apenas um filme – vá lá
– bem intencionado, embora medíocre. Assim, a película 
está já a ser dissecada como o exemplo, que se calhar é, de uma cultura de misoginia há muito silenciada por Hollywood.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes

Sexo, drogas e rock’n’roll. A receita é
 tão antiga e tão usada que a canção de Ian Dury já perdeu significado. Nem por isso uma história de sexo, drogas e rock’n’roll, para mais baseada em factos reais e chocantes da vida de uma adolescente, melhor, portuguesa, melhor ainda, de Cascais, deixou de ser produzida, de maneira sensacionalista e, pior, francamente moralista. Esta história de Inês, supostamente contada ao escritor Francisco Salgueiro, que dela fez um livro, em 2001, esteve para ser dirigida por Nicolau Breyner. A morte do actor atirou a realização para as mãos de Joaquim Leitão.
 E este, com, entre outros, Oksana Tkach, Joana Aguiar, Joana Barradas, Virgílio Castelo, Francisco Fernandez e Catarina Matos, não se afastou o suficiente do original. Daí que, apesar do esforço de introduzir alguma elegância à representação narrativa, Leitão se tenha deixado arrastar pela exploração dos aspectos mais sensacionalistas da vida adolescente na era pós-porno, sem reflexão e com olhar moralista.

Por Rui Monteiro

  • Filmes

Chico (Pedro Marujo), um recém-licenciado, ruma a Lisboa à procura de emprego e acaba por se meter numa roda viva de saídas a discotecas, festas e engates de Verão. Rodado em condições precárias e à 
base de muitas boas vontades, Verão Danado não pretende
 ser o retrato de uma geração portuguesa, antes o de uma juventude que vive no momento, para o imediato e da satisfação passageira, e se deixa ir na corrente de um quotidiano sem grandes perspectivas. Este filme de Pedro Cabeleira fica-se pela descrição superficial e repetitiva desse mesmo quotidiano, sem que haja um mínimo 
de elaboração dramática,
 de conflito e de interacção produtiva entre as personagens, que faça com que os espectadores se interessem por elas e se envolvam na história. Verão Danado tem os gestos, mas falta-lhe um discurso que o sustente, justifique e lhe dê significado e relevância.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Aqui está um filme sem dúvida estiloso. Oque,a bem dizer, é serviço mínimo, pois por detrás do argumento e da câmara e do guarda-roupa estão as irmãs estilistas Kate e Laura Mulleavy, proprietárias de marca e ocasionalmente figurinistas de algumas películas, filmando um assunto com tanto estilo como a utilização medicinal da marijuana. Todavia... Pronto, não é Tom Ford quem quer. A história, recheada
 de efeitos visuais tão vistosos quanto artificiais
 e desnecessários, criados como uma variedade de fogo de artifício, ou uma maneira de encandear o espectador e distraí-lo das insuficiências do argumento, centra-se na personagem interpretada por Kirsten Dunst. Actriz até versátil e geralmente capaz, contudo sem o material necessário
 para dar vida a uma narrativa preguiçosa, em que Theresa mistura o que não deve misturar à sua erva e deambula pela película, como a pequena cidade onde tudo se passa, como quem tem o cérebro obstruído por um manto de nevoeiro.


Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Acção e aventura
Liga da Justiça
Liga da Justiça

Joss Whedon sucedeu a Zack Snyder na realização desta primeira manifestação da Liga da Justiça da DC no cinema, após este ter deixado o projecto devido ao suicídio de uma das filhas, e reescreveu e refilmou muita coisa. O resultado é que, além de ter custado uns respeitáveis 300 milhões de dólares, Liga da Justiça é um filme mais escorreito, mais equilibrado e menos carregado, no contar da história, no tom geral e na gestão da acção, do que a média destas produções de super-heróis, embora continue a estar totalmente alinhado com a espectacularidade mastodôntica e as rotinas e convenções formais e visuais do género.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
England Is Mine – Descobrir Morrissey
England Is Mine – Descobrir Morrissey

Morrissey, o santo padroeiro dos jovens intelectuais desvalidos das décadas de 80 e 90, tem aqui sua inevitável biografia cinematográfica. É verdade que só cobre a juventude do poeta e cantor, ainda The Smiths eram uma quimera; e que se sente a falta das elaboradas postas de pescada que a fama lhe permitiu tornar públicas, sente. Mas, ainda assim, com boa vontade, há no filme de Mark Gill um vislumbre do artista enquanto jovem. Mas ainda não é desta que a biografia cinematográfica ultrapassa a comédia romântica em rotina e previsibilidade.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Acção e aventura

Taika Waititi, neozelandês
e realizador de filmes indie,
 ficou a cargo deste terceiro
 título da série Thor da Marvel,
 e decidiu aligeirar-lhe o tom, introduzindo-lhe alívio cómico, auto-irrisão e irreverência:
 Thor perde o martelo mágico 
e o cabelo louro, Hulk perde
 a memória e Loki tem que se portar bem. Apesar disto, e da presença de Cate Blanchett numa poderosa e maléfica deusa Hela muito S&M, Thor: Ragnarok acaba por ser mais do mesmo. Reservado aos devotos e zelotas dos filmes de super-heróis.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Um drama baseado no livro da jornalista americana Jeannette Walls, que juntamente com os irmãos, e por escolha dos pais, tão anti-sistema como irresponsáveis, viveu a infância e parte da juventude nas margens da sociedade, muitas vezes em casas devolutas, passando fome e sofrendo com o frio e o calor. O realizador Destin Daniel Creton atenua muito a história original e o filme torna-se melodramático, condescendente e forçado. O melhor são as interpretações de Brie Larson na Jeannette adulta e da pequena Ella Anderson, que a personifica dos 9 aos 13 anos.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
A Febre das Tulipas
A Febre das Tulipas

Um filme passado na Holanda do século XVII, tendo como pano de fundo a “febre das tulipas” que arruinou então muitos especuladores nos bolbos destas flores. Realizado por Justin Chadwick e interpretado por Alicia Vikander, Christoph Waltz, Dane DeHaan e Judi Dench, a fita andou a penar no limbo dos adiamentos de estreia e das remontagens durante três anos, ao sabor da vontade do produtor, Harvey Weinstein (sim, esse mesmo). Finalmente estreada, tem por toda a parte as marcas dessas vicissitudes, em especial na narrativa inverosímil e esburacada.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
Elis
Elis

Há uma grande felicidade 
no filme de Hugo Prata. Pela visão do realizador, Elis Regina (Andréia Horta) chegou, viu, venceu. Pelo meio teve umas chatices e uma tendência para a adição que acabou numa mistura de comprimidos e álcool e cocaína. Uma visão colorida e vaga, sempre incapaz de penetrar no espírito do
seu sujeito, que resulta num filme medíocre e delicodoce.
 O melhor é a prestação de Andréia Horta, ainda assim
um desperdício de talento entre a vulgaridade chã desta biografia.

Por Rui Monteiro

  • Filmes

Eternamente militante, Vanessa Redgrave anda agora a fazer campanha 
pelos refugiados e sentiu a necessidade de rodar um documentário para dar mais força à sua causa humanitária de eleição. Está no seu pleno direito. Só que Sea Sorrow, 
é um filme amador, mal atamancado, que se farta de confundir alhos com bugalhos e chapadamente unilateral, muito mais propaganda emocionada do que um documento objectivo, e que acaba por funcionar contra a causa que pretende advogar.

Há momentos embaraçosos de tão primários e sentenciosos, como aquele em que Redgrave, com uma enorme foto pronta-a- comover de crianças refugiadas em fundo, assume a pose de uma veneranda professora que debita datas e banalidades sobre a história dos direitos humanos para uma turma de alunos adolescentes e desinformados.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
Detroit
Detroit

Depois de dois filmaços, Estado de Guerra e 00.30 – Hora Negra, Kathryn Bigelow e o seu argumentista Mark Boal desperdiçam os seus talentos nesta fita que recorda um caso chocante de racismo ocorrido durante os motins de Detroit em 1967, para tentarem fazer paralelos que não colhem com a actualidade dos EUA. Repetitivo, ilustrativo, interminável
e cheio de má consciência liberal americana.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Um casal, ele (Javier Bardem) poeta em bloqueio criativo, ela (Jennifer Lawrence) a reconstruir e a redecorar a casa de campo onde vivem. Um belo dia, batem-lhe à porta um médico doente e fã da poesia dele (Ed Harris) e logo a seguir, a brusca mulher deste (Michelle Pfeiffer). De seguida instala-se um frenesim infernal, encena-se o fim do mundo dentro da casa e em redor do casal. Darren Aronofsky assina um filme em pandemónio exterminador e a abarrotar de citações religiosas, culturais e cinematográficas, mas que soçobra ao peso destas e do desregramento visual associado.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

A americano-iraniana Ana 
Lily Amirpour (Uma Rapariga Regressa de Noite Sozinha a Casa) assina esta história passada no Texas, num futuro distópico. E desperdiça quer o seu potencial de alegoria político-social, quer o de série B de exploitation, ficando-se pelas referências estéreis ao filme de FC pós-apocalíptico e de terror canibal, ou ao western com ácido. O elenco inclui Suki Waterhouse, Keanu Reeves, Jason Momoa e Jim Carrey num papel mudo.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
Barry Seal - Traficante Americano
Barry Seal - Traficante Americano

A carreira de Tom Cruise
 já teve melhores dias. Mas não se pode dizer que ele não tenha mostrado dotes de representação uma vez ou outra. São precisamente esses dotes que apresenta neste filme de Doug Liman que, ainda assim, é um acumular de cenas de acção e cujo argumento dá demasiadas voltas e ainda assim é bastante previsível.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Drama

James Franco interpreta, neste filme de Justin Kelly, Michael Glatze, um jornalista agnóstico e militante homossexual, que se tornou heterossexual, religioso e foi ser pastor numa terriola do interior dos EUA. Kelly aborda o tema com tais cuidados, para evitar melindrar seja quem for, que drena o filme de intensidade dramática e de sumo. Glatze sai da história como sendo uma pessoa tão simplista e influenciável enquanto gay activista, como enquanto cristão sentencioso.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Miguel tem 14 anos e não leva uma vida normal para um adolescente da sua idade. 
A mãe está desempregada, vive numa constante instabilidade emocional e psicológica e não consegue tomar conta do filho como devia. À beira de ter de voltar para o centro de acolhimento da Segurança Social onde já viveu, Miguel tem um dia-a-dia tão instável e imprevisível como o estado da sua mãe. Ora vai à escola, ora falta para vender embalagens de lenços de papel nas ruas e fazer alguns cobres, tentando sempre saber por onde anda
 a mãe, que diz estar à beira de conseguir arranjar um trabalho, ou contactá-la, sem sucesso, pelo telemóvel, já que ela nunca atende. Com a Segurança Social no seu encalce, o rapaz anda desatinado. E fica ainda mais, quando a mãe desaparece sem dizer água vai. Realizado, escrito e co-produzido pelo espanhol Alberto Morais, A Mãe é uma micro-história de desespero e desamparo juvenil, a que faltam mais densidade dramática e mais pulmão cinematográfico.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Joaquim Leitão adapta o livro homónimo de David Machado para assinar um filme sobre a crise onde nem tudo seja negrume e pessimismo, e
haja espaço para a esperança. Marco D’Almeida é um chefe de família que perde o emprego, o contacto diário com a família e a casa, mas num rasgo de generosidade, vai ajudar uma estranha a Andorra. E é nessa altura que de filme sobre a dureza da crise e o seu efeito sobre um pequeno grupo de pessoas comuns, Índice Médio de Felicidade se transforma numa história “inspiradora” inverosímil.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
O Guarda-Costas e o Assassino
O Guarda-Costas e o Assassino

Um filme de acção descomunalmente absurdo e inverosímil rodado na Europa. Ryan Reynolds é um antigo agente da CIA e especialista em segurança caído em tempos difíceis, que tem
que escoltar e manter vivo o assassino contratado interpretado por Samuel L. Jackson, para este depor na Haia contra um tirano genocida de Leste. Todo o mérito da fita vai para o impressionante trabalho dos duplos.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Fantasia
A Torre Negra
A Torre Negra

O dinamarquês Nicolaj Arcel assina este filme que lança a franchise de cinema e televisão baseada na saga de oito livros de Stephen King. Passada num mudo paralelo ao nosso, é um compósito
de fantasia, ficção científica, western e terror. A fita vai buscar elementos a várias obras da saga, fazendo uma síntese muito comprimida e apressada de um enredo muito denso de peripécias, personagens a referências a obras superiores. Com Iris Elba no herói, o Pistoleiro, e Matthew McConaughy no maléfico Homem de Negro.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
Atomic Blonde - Agente Especial
Atomic Blonde - Agente Especial

Charlize Theron dá o corpo ao manifesto e apanha tanta pancada quanto distribui, na figura de uma super-agente do MI6 que vai em missão a Berlim Leste, poucos dias antes da queda do Muro, em Novembro de 1989. O realizador David Leitch, um antigo duplo, tem a mão pesada, e a fita pouco mais de interesse tem do que Theron a aplicar-se no papel desta Jane Bond da Guerra Fria.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura
Baby Driver - Alta Velocidade
Baby Driver - Alta Velocidade

O novo filme de Edgar Wright é um pastiche pop, cool e laborioso dos velhos filmes de assaltos com grandes perseguições automóveis. O título, além de uma canção de Simon & Garfunkel, dá também o nome artístico ao jovem condutor do bando liderado por Doc (Kevin Spacey) e interpretado por Ansel Ergot. Baby anda sempre de fones postos por sofrer de tinido após ter estado envolvido, quando era miúdo, num desastre de automóvel onde morreram os pais, fazendo com que a música que ouve seja a própria banda sonora da fita (tem mais de 40 canções e melodias).

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Um convencionalíssimo filme de iniciação à adolescência passado na Inglaterra em polvorosa político-social de finais da década de 70, e onde a música dos Clash tem um lugar destacado. Até aparece Joe Strummer, interpretado por Jonathan Rhys Meyers. Está esquecido cinco minutos depois de ter sido visto.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia
Olha que Duas
Olha que Duas

Goldie Hawn e Amy Schumer são duas actrizes muito talentosas e estimáveis, duas comediantes de categoria, mas isso não chega. Olha Que Duas, que por vezes parece uma versão feminina de A Ressaca, é pouco mais do que uma sucessão de gags, umas vezes com graça, outras, a maioria, apenas desopilantes.

Por Rui Monteiro

  • Filmes

Passado na Itália dos anos 50 e adaptado de um livro do poeta e romancista italiano Silvio Raffo, Pedras Sombrias é uma história de atmosfera gótico-fantasmagórico-psicológica interpretada por Emilia Clarke (A Guerra dos Tronos), que não satisfaz em qualquer desses registos e recenseia todos os clichés deste formato.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Por uma vez, um filme sobre dança, dirigido à população em geral, não se centra no ballet mas na dança contemporânea, procurando,
 ou pelo menos ambicionando, registar a mudança, a busca por uma identidade artística de uma bailarina educada classicamente no Ballet Bolshoi, contudo irresistivelmente atraída pela dança contemporânea. Resumindo: Polina (Anastasia Shevtsova) é uma jovem bailarina que, perante uma coreografia moderna particularmente tocante, descobre que o seu destino artístico não pode ser a mais prestigiada companhia russa e ruma a Paris.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Acção e aventura
Planeta dos Macacos: A Guerra
Planeta dos Macacos: A Guerra

No terceiro filme
 da segunda saga de Planeta dos Macacos, César (Andy Serkis em mais uma convincente interpretação em motion capture) enfrenta um militar psicopata, o Coronel (Woody Harrelson), para salvar a sua tribo de símios. É o combate final entre macacos e humanos, travado num filme sisudo, enfático, autocondescendente e sobretudo longo demais para o pouco que tem para contar.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
Adeus Índia
Adeus Índia

Hugh Bonneville, da série Downton Abbey, está nas suas sete quintas aristocráticas no papel de lorde Mountbatten em Adeus Índia, uma co-produção anglo-indiana que pretende recriar os acontecimentos que levaram à independência da Índia e ao aparecimento do Paquistão, em 1947, supervisionados pelo último Vice-Rei do país.

Realizado por Gurinder Chadha (Joga como Beckham), o filme usa a residência oficial de Mounbatten como microcosmos do país e das relações, conflitos
 e tensões sociais, políticas, religiosas e étnicas relacionadas com o processo de transição de poder e as suas consequências, metendo a martelo, um simbólico romance “impossível” entre um hindu e uma muçulmana. 

É quase tudo muito simplificado, explicado e telegrafado nesta opulenta e a tarefada fita, em que Gillian Anderson surge completamente deslocada no papel de Edwina Mountbatten, da figura ao sotaque. 

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
All Eyez On Me
All Eyez On Me

O percurso de Tupac Shakur está reflectido nesta biografia. Mas o realizador Benny Boom jogou tanto pelo seguro que da exaltante vida e obra de Tupac sobra um retrato fosco na sua condescendência e tentativa de beatificação do rapper.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Suspense

Dois soldados americanos, um deles gravemente ferido, ficam encurralados atrás
de um muro, algures no deserto iraquiano, por um sniper loquaz e astuto. Doug Liman assina aqui o filme de guerra mais estático e anti-espectacular de sempre, que apesar de toda a tensão, acaba por se revelar muito teatral
e estacionar na monotonia
e na inverosimilhança:
o que diabo está a fazer aquele muro ali no meio de nenhures?

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Este filme de Jonathan Teplitzky, ao contrário
do costume, não é um 
filme sobre a II Guerra Mundial. Quer dizer, é, porque não se pode falar
 de Winston Churchill sem falar nela. Mas, como todos os aspirantes a biógrafo definitivo, o realizador procura o homem por detrás do estadista por uma via diferente e escolhe a depressão, o “cão negro”, como lhe chamava o primeiro-ministro inglês, que tantas vezes tolhia o espírito da personagem soberbamente interpretada por Brian Cox.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes

Antonio Banderas é um escritor e argumentista bloqueado que dá boleia a um vagabundo (Jonathan Rhys Meyers) que o defendeu
 de um camionista agressivo, e o acolhe na sua casa isolada
 nas montanhas. Mas começa a desconfiar que o homem pode 
ser um serial killer. Este filme tinha tudo para ser um apetecível thriller de série B, mas o realizador Brian Goodman borra a pintura toda ao abusar das surpresas forçadas e dos falsos finais.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
A Odisseia
A Odisseia

Lambert Wilson interpreta o comandante Jacques Cousteau nesta fita de Jêróme Salle, quesemlhenegartodos
os méritos, quer também mostrar as imperfeições do lendário pioneiro do mergulho, oceanógrafo, cientista e documentarista, e as querelas familiares. Só que A Odisseia nada em estereótipos e simplificações típicas do biopic e fica tudo pela rama.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
A primeira longa-metragem de Jonas Carpignano, Mediterrânea (2015), tinha tanto de carga
de boas intenções sobre os africanos que viajam ilegalmente para Itália em condições precárias e perigosas, como de carência de forma narrativa e fibra dramática. A Ciambra, a nova realização de Carpignano, passa-se na Calábria, a mesma zona de Itália a que aportavam os migrantes de Mediterrânea. Mas o realizador vira agora a sua atenção para uma comunidade cigana local, cujos membros interpretam versões ficcionadas deles próprios, e não convivem bem quer com os africanos, quer com os próprios italianos. São francamente racistas para com aqueles e desprezam estes, embora, para ter dinheiro, estejam às ordens dos mafiosos, que os usam como “infantaria” da delinquência de proximidade (roubo de automóveis, bagagem e mochilas, pequena extorsão, assaltos a casas, etc.). Se a Mediterrânea faltava também um ponto de vista firme, ele existe agora em A Ciambra, na pessoa de Pio (Pio Amato, que já aparecia naquele filme), um rapaz cigano de 14 anos. Pio ambiciona seguir o irmão mais velho na vida de crime e travou amizade com Ayvia, vindo do Burkina Faso. O curso dos acontecimentos irá pô-lo perante uma escolha que definirá o seu futuro. Inevitavelmente devedor
 da tradição neo-realista do cinema transalpino, A Ciambra é também representativo de um cinema independente e com preocupações políticas que se faz hoje na Europa. Tudo isto estaria muito 
bem se não sentíssemos que 
o realizador, além
  • Filmes
  • Acção e aventura

O quinto filme da série iniciada em 2003 (e que seria, em princípio, o último, embora pareça que já não vai ser) não traz nada de novo, senão a crescente ênfase nos efeitos especiais, dado o peso que o fantástico foi ganhando nas histórias. Até as facécias e as partes gagas do capitão Jack Sparrow de Johnny Depp já se tornaram mecânicas e enfadonhas, e a fita deixa uma sensação de espectacularidade vácua e de monotonia mastodôntica. Javier Bardem interpreta o vilão sobrenatural.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Não há nenhum planetário neste filme da francesa Rebecca Zlotowski (Grand Central), embora as personagens principais falem sobre as estrelas duas ou três vezes. Natalie Portman e Lily-Rose Depp (filha de Johnny Depp e de Vanessa Paradis, bonita e fina mas actriz apenas sofrível) interpretam Laura e Kate, duas irmãs americanas que fazem sessões de espiritismo
em clubes nocturnos, e também privadas, na França de antes da II Guerra Mundial. Numa dessas sessões, as irmãs conhecem André Korben, um produtor de cinema (Emmanuel Salinger) obcecado pela comunicação com o Além, que as contrata para fazerem um filme sobre o tema, intitulado Deadly Apparition. A ideia é que, apesar de ser uma ficção, o filme inclua uma sessão que capte um espírito verdadeiro e assim se “reinvente o cinema”. A premissa de Planetário 
teria pernas para andar se 
o argumento, da autoria da realizadora e de Robin Campillo, se assumisse como abertamente fantástico e investisse na componente sobrenatural. Mas Zlotowski prefere ficar numas meias tintas pouco satisfatórias 
e seguir as peripécias mais prosaicas das personagens, nomeadamente a carreira cinematográfica nascente de Laura, e o filme, além de errático e inerte, não convence na recriação da época.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
Música a Música
Música a Música

Apesar da presença de nomes como Iggy Pop, Patti Smith ou Lykke Li, a música é um adereço secundário no novo filme de Terrence Malick, que volta a bater nas teclas do costume: vazio de história, jiga-joga visual, personagens deambulantes e uma narração em off feita de banalidades superficiais a fingir que são meditações profundas.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

A dupla de realizadores de Actividade Paranormal 3 e 4 assina aqui mais uma entrada do subgénero de terror “vírus epidémico desconhecido que parasita os humanos e
os transforma em zombies”. Realizado com um orçamento de poupança que obriga a acção a ficar em grande parte confinada ao interior da casa das principais protagonistas, duas irmãs adolescentes, Viral não traz grande coisa de novo a um formato narrativo que David Cronenberg já minerou em profundidade nos anos 70, tirando o pormenor das heroínas serem filhas de um professor
de Ciências Naturais e saberem bastante sobre microorganismos deste tipo. O que não as impede de ter exactamente os mesmos comportamentos inconscientes característicos das personagens dos filmes de terror nas alturas decisivas da história. Viral 
não é mau, mas também não é suficientemente bom para ficar na memória.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
A Cidade Perdida de Z
A Cidade Perdida de Z

A história (romanceada) do militar e cartógrafo inglês Percy Fawcett, que nas duas primeiras décadas do século XX andou pela Amazónia à procura de uma cidade ancestral perdida a que chamou Z. James Gray realizou um filme sobre um homem levado por uma obsessão, mas que não é nem uma aventura na selva à antiga, nem uma deriva megalómana e febril em paragens inóspitas ao estilo de Werner Herzog. E Charlie Hunnam não tem o carisma necessário para interpretar uma personagem assim.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Terror
Foge
Foge

Este filme de terror, coqueluche da crítica nos EUA (E não só), realizado em estreia pelo actor negro Jordan Peele (Madtv, Fargo), surge como uma bizarra combinação de blaxploitation dos anos 70, quando realizadores militantes como Gordon Parks ou Melvin Van Peebles se serviam de géneros tradicionais para fazer comentário social e político sobre a situação racial nos EUA, e de fita gore série B. Daniel Kaluuya interpreta um jovem fotógrafo negro que vai passar o fim-de-semana ao campo, a casa dos pais obsequiosamente progressistas da sua namorada branca, e descobre que nada é o que parece naquela família. Foge é um produto tardio da era Obama, apontado aos liberais com complexos de culpa racial e aos fanáticos de sangueira brutalista à moda de Tarantino.

Por Eduardo de Barros  

  • Filmes
  • Suspense
O Círculo
O Círculo

Mae (Emma Watson), a empregada de uma superempresa de tecnologia, descobre que dois dos seus fundadores (interpretados por Tom Hanks e Patton Oswalt) conspiram para instalar um totalitarismo digital nos EUA, e projectá-lo a nível global, fingindo estar a trabalhar para o bem da comunidade e para promover a cidadania e a democracia online. A crescente implausibilidade do enredo e a previsibilidade da sua resolução comprometem este thriller baseado num livro de David Eggers.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

O filme anti-Frente Nacional e anti-Marine Le Pen de Lucas Belvaux, passado no norte de França durante umas eleições autárquicas, é um daqueles casos em que o engajamento político a todo o custo arruina o cinema: argumento demonstrativo, maniqueísmo galopante, personagens quase todas caricaturais, diabolização a martelo, história entre o previsível e o inverosímil. Escapa a excelente Émilie Dequenne no papel principal.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Bruno Dumont repete a receita de O Pequeno Quinquin em Ma Loute, mudando a história da nossa época para o início do século XX. Mas esta comédia negra sobre burgueses decadentes em férias devorados por pescadores canibais, sucumbe ao excesso de grotesco e ao exagero caricatural, e torna- -se apenas ridícula. Fabrice Luchini, Juliette Binoche e Valeria Bruni Tedeschi fazem tristes figuras nas suas personagens.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Membro de uma poderosa família muçulmana de Baku, a capital do Azerbaijão, Ali (Adam Bakri) está apaixonado por Nino (María Valverde), uma georgiana católica. Amor proibido, pelas razões religiosas e culturais e sociais do costume, porém prosseguido pela determinação dos amantes neste regresso à realização de longas-metragens de Asif Kapadia, quase uma década depois de Norte Hostil. Ali e Nino casam enquanto à sua volta a guerra prossegue e os amigos desaparecem em combate, mas as atribulações dos amantes estão em vias de piorar com a ascensão dos bolcheviques na Rússia e deslocação do cenário de guerra para a luta entre independentistas e comunistas. Acontece que a realização de Kapadia é frouxa e o mais das vezes hesitante, oscilando entre a relação dos amantes e a situação política, ou a evolução dos combates, o sentimento independentista e as dúvidas com que as circunstâncias apoquentam os protagonistas, como quem não sabe onde assentar o seu foco.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Drama

O novo filme do autor de O Desconhecido do Lago e O Rei da Evasão é uma deambulação sobre um cineasta chamado Léo (Damien Bonnard) que anda à procura de inspiração para o seu novo filme pela região da Lozère. Encontra uma pastora que vive com o pai e dois filhos numa quinta, engravida a rapariga, mas quando o bebé nasce, ela desinteressa-se da criança e vai-se embora. Léo mete-se à estrada com o menino, passando por uma série de incidentes entre o realista e o fantástico, enquanto que Guiraudie passa por uma série de assuntos, da situação dos pais solteiros à homossexualidade, passando pelos constrangimentos das leis sociais, mas sempre no quadro de uma narrativa dispersa e vaporosa, onde a liberdade formal parece esconder um certo desleixo. Na Vertical é um filme muito francês, muito de nicho “autorista”, e que finalmente, não tem grande coisa para contar ou para dizer.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Romance
A Bela e o Monstro
A Bela e o Monstro
A pior tradução até agora para imagem real de um clássico animado da Disney, e logo um dos mais bem-amados. Um filme artificioso, berrante, insosso, com buchas dispensáveis na história e mais prejudicado do que ajudado pelos efeitos digitais (ver a inexpressividade dos objectos animados no castelo do Monstro). A banal Emma Watson é uma Bela da segunda divisão, e Dan Stevens (Downton Abbey) um Monstro mais pingão que feroz. O realizador Bill Condon recuperou a banda sonora original de Alan Menken e Howard Ashman, mas os filmes não são só para os ouvidos. Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • Comédia
Ouro
Ouro

Nem Matthew McConaughey em mais um daqueles papéis em que muda de aspecto físico (aqui, pança e meia careca) consegue salvar esta estereotipadíssima fita de Stephen Gaghan (Siryana) passada nos anos 80 e 90. Ouro é uma história de riqueza súbita, subida aos cumes dos mercados e queda vertiginosa, centrada numa fraude com uma jazida de ouro na Indonésia.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
Denzel Washington realiza e interpreta este filme adaptado da peça homónima ambientada nos anos 50, escrita pelo falecido August Wilson em 1983, e pertencente a um ciclo de dez, todas passadas em Pittsburgh. Washington é Troy Maxson, um ex-jogador de basebol que trabalha na recolha do lixo, um homem revoltado e amargo, sobretudo com os dois filhos, um legítimo e outro ilegítimo. É uma interpretação bombástica, a fazer sinalefas ao Óscar (Denzel não o recebeu, Viola Davis sim). O filme está prisioneiro do palco de onde provém.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
Jackie
Jackie
O filme do chileno Pablo Larraín apanha Jackie Kennedy nos dias entre o assassinato do marido em Dallas e o seu funeral, a dar uma entrevista exclusiva à revista Life e a tratar da imagem de Jack Kennedy para a posteridade, e da sua própria iconografia de viúva dele. Natalie Portman deixa à vista todo o esforço posto na tentativa de a personificar e não consegue diluir-se nela.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
Elementos Secretos
Elementos Secretos
As boas intenções e a justiça retroactiva – recuperar do esquecimento e celebrar as mulheres negras que, mesmo em condições de segregação racial, trabalharam nos anos 50 e 60 para o programa espacial da NASA fazendo cálculos matemáticos – não chegam para resgatar da banalidade, e de um anonimato de telefilme, esta realização de Theodore Melfi, que também subaproveita um ramalhetes de bons actores e actrizes.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
Patriots Day - Unidos por Boston
Patriots Day - Unidos por Boston
O cenário é a maratona de Boston, aquela que um par de terroristas atacou, em 2013, deixando mortos e feridos e assustando ainda mais a América ainda traumatizada com o 11 de Setembro. E o filme, além de uma homenagem às vítimas civis do atentado, é o reconhecimento do trabalho das forças policiais que, a bem dizer, quase num ápice, apanharam os criminosos. O papel central da película de Peter Berg, o do tipo comum com um objectivo, pertence ao sargento de polícia interpretado por Mark Wahlberg, o qual, apesar de uma boa interpretação – para os seus recursos dramáticos, claro –, é incapaz de transportar a história, escrita pelo realizador com Matt Cook e Joshua Zetumer, para fora da rotina de uma narrativa destinada a elevar a moral. Isto, que parece uma especialidade do cineasta, desenvolve-se de maneira vulgar, em jeito de contagem descendente, saltitando entre sobreviventes, bombeiros, paramédicos e investigadores para contar como se apanha um terrorista, fazendo de conta estar a construir um mosaico social da tragédia pela introdução de subnarrativas irrelevantes.

Por Rui Monteiro
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  • Drama
Miss Sloane - Uma Mulher de Armas
Miss Sloane - Uma Mulher de Armas
A interpretação de Jessica Chastain como Elizabeth Sloane, uma temível lobista profissional, é mesmo a única razão para perdermos tempo com este filme de John Madden, que aborda o tema do controlo de armas nos EUA de forma moralista, previsível e tendenciosa.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
Poesia sem Fim
Poesia sem Fim
Ter visto A Dança da Realidade ou não é indiferente para a compreensão deste novo tomo da história de Alejandro Jodorowsky. Fiel a si próprio, a palavra-chave para usufruir a película do cineasta chileno é decifração, ou talvez aceitação. A aceitação de participar num jogo onde, quando pensamos ter compreendido as regras, verificamos que elas mudaram sem acrescentar qualquer mais-valia dramática ou visual. O que na verdade nem importa, pois estamos de facto perante o egocentrismo de um autor a tentar mostrar aos incréus como chegou a uma, digamos, filosofia de vida única e independente lutando contra a resignação e o preconceito. O que não deixa de ser, pronto, assim, estilo, sei lá… giro.

Por Rui Monteiro
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  • Drama
A Luz entre Oceanos
A Luz entre Oceanos
Michael Fasssbender e Alicia Vikander interpretam este melodrama realizado por Derek Cianfrance, baseado no livro de ML Steadman e passado numa ilha remota e deserta da costa australiana, logo após o fim da I Guerra Mundial. O filme parece querer estabelecer um novo recorde mundial de choradeira nos cinemas.

Por Eurico de Barros
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Rodado em Portugal e produzido por Paulo Branco, este filme do francês Benoît Jacquot tem um fantasma (Mathieu Amalric), mas que não é convencional nem usado para meter medo. Até Nunca é um drama de amor, perda e luto, parece escrito ás três pancadas e rodado contra-relógio, e não nos consegue mobilizar emocionalmente.

Por Eurico de Barros
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  • Ficção científica
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Passageiros
Passageiros
Um engenheiro mecânico (Chris Pratt) que vai numa viagem de 120 anos numa gigantesca nave, acorda 90 anos antes da chegada, por erro técnico. Um ano depois, vai despertar uma rapariga (Jennifer Lawrence) para ter companhia, mas esconde-lhe que o fez. Esta FC de Morten Tyldum até começa bem, mas acaba esburacada pelos clichés e pela inverosimilhança.

Por Eurico de Barros
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Todo o santo ano, Bruno (Benoît Poelvoorde) faz a sua rota de vinhos sem sair do Salão de Agricultura lá das berças em que vive com o pai. Ele e Jean (Gérard Depardieu) vivem apartados por aquelas divergências próprias de pais e filhos. Mas Jean não se conforma e tenta a aproximação pela via do alcoolismo, levando Bruno a uma verdadeira prova de vinhos através de França. Daqui sai uma variedade de filme de estrada, em que Benoît Delépine e Gustave Kervern são capazes de episódios de humor transgressivo, mas geralmente conformam-se à convencionalidade das regras narrativas.

Por Rui Monteiro
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O Benfeitor
O Benfeitor
Tudo começa com a dor e o que fazer dela depois de o filantropo Francis “Franny” Watts (Richard Gere) causar o acidente que matou os seus melhores amigos. O homem está, como se costuma dizer, um farrapo. A sua existência a dar para o excêntrico e para o exuberante desapareceu. Agora vive vida de rico fechado em hotel de luxo emborcando grandes quantidades de álcool e analgésicos. A possibilidade de redenção surge com o telefonema de Olívia (Dakota Fanning), a filha, anunciando casamento, gravidez e regresso a casa. O que desperta o protagonista do torpor e mantém o argumento vivo, até Andrew Renzi levar a película até à agonia moralista.

Por Rui Monteiro
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O Infiltrado
O Infiltrado
Adaptação ao cinema da autobiografia de Robert Mazur, um agente federal americano que nos anos 80 se infiltrou na rede de narcotráfico de Pablo Escobar. Brad Furman, o realizador, é um pezudo visual, a história recenseia cliché atrás de cliché do subgénero “filme de combate à droga”, e acaba por saturar. Com Bryan Cranston no papel principal.

Por Eurico de Barros
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Ora, aí pelo final do século XIX, Valentine casa com Jules. Cem anos depois, encontramos uma parente de Valentine, jovem de Paris em boa e feliz corrida para cair nos braços do homem que ama. Perdoe-se a vulgaridade do relato, mas é mesmo assim. Mais, Tran Anh Hung quer que se veja aqui, nestes dois momentos de encontro amoroso, uma espécie de desenlace de uma genealogia sentimental ao longo de 100 anos. Mas nem o trabalho suplementar de Audrey Tautou, Bérénice Bejo, Mélanie Laurent e Jérémie Renier safa o filme da monotonia.

Por Rui Monteiro
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Quando começa a acontecer alguma coisa em A Mãe É que Sabe é provável que o espectador esteja já um pouco, digamos, ausente, pois já lá vai meia película e não aconteceu coisa nenhuma. A não ser a história andar para trás de vez em quando para a protagonista (Maria João Abreu) se lembrar da mãe, dos seus conselhos e de mais umas miudezas que hão- -de ter a sua importância no resto de entrecho.

Por Nuno Henrique Luz
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Aliados
Aliados
Brad Pitt e Marion Cottilard fazem zero faísca juntos neste filme de Robert Zemeckis onde interpretam agentes aliados que se juntam para uma perigosa missão contra os nazis em Casablanca, e se apaixonam e casam. O argumento abusa das situações forçadas e tem crateras de verosimilhança.

Por Eurico de Barros
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Para muitos o secundário são uns anos de… Enfim, o secundário são os anos da adolescência, estado de demasiado tumulto hormonal e motivo de variadas chatices e múltiplos disparates. Tempo que só é recordado e admirado muito tempo depois, quando verificada a rotina monótona e as desagradáveis responsabilidades da vida adulta. Sendo assim, principalmente em escolas dirigidas por rígidos códigos de comportamento (portanto, muito pouco provavelmente, estabelecimentos públicos), quem pode de facto acusar os rebeldes? Quem pode dizer que substituir o sino da escola por uma máquina de emitir traques não foi um acto de rebeldia de Rafe Khatchadorian (Griffin Gluck) e não apenas uma piada de mau gosto? Enfim, moral à parte, o filme de Steve Carr, concentrando-se na acirrada disputa entre o jovem “desenquadrado” e o autoritário director Dwight (Andy Daly) que lá acaba por ver a luz, traça um retrato interessante e quase subversivo da vida escolar. O busílis é ser uma comédia, uma paródia às relações entre alunos e professores e às contradições entre os que querem ensinar e os que não têm a certeza de quererem ser ensinados. E aí a mediocridade – ou a conformidade – instala-se. As cenas cómicas vivem cada vez mais da javardice e da repetição de gagues, ou de suas variações, há muito explorados pelo subgénero do cinema sobre a adolescência como forma consentida de abardinar sem querer saber de consequências – e assim a graça descabelada inicial esvai-se sem glória.

Por Rui Monteiro
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O Número
O Número
Christopher Plummer é um idoso judeu canadiano atacado de demência que foge de um lar para ir matar o oficial nazi que lhe assassinou a família em Auschwitz. Este filme de Atom Egoyan é penoso, abusa da credibilidade e nem a cambalhota final o salva do esquecimento imediato.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
Animais Nocturnos
Animais Nocturnos
O segundo filme do estilista Tom Ford tem um enredo duplo, uma ficção dentro de outra ficção, e é só gesto sem discurso, pose sem substância, afectação oca, subaproveitando gente como Amy Adams, Jake Gyllenhaal, Michael Shannon ou Laura Linney.

Por Eurico de Barros
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  • Acção e aventura
O Protector
O Protector
Condenado em liberdade condicional, tatuador com pouca clientela a entrar e a sair da sua caravana, enfim, homem com passado não recomendável a procurar manter-se nos carris. Quando, de súbito, um telefonema, uma filha adolescente, um pedido de auxílio… Nada que perturbe – enfim, um bocadinho – um anti-herói interpretado por Mel Gibson movido pela adrenalina da acção.

Por Rui Monteiro
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  • Drama
Chocolate
Chocolate
Roschdy Zem realiza e Omar Sy interpreta este filme biográfico sobre Chocolate, que foi o primeiro palhaço negro na França do final do século XIX, fazendo um popularíssimo e inovador duo com o francês George Footit, personificado por James Thierré, neto de Charlot.

Por Eurico de Barros
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  • Drama
O estereótipo estafado da família disfuncional em estridente recriminação colectiva, eis ao que se resume o novo filme do canadiano Xavier Dolan, adaptado de uma peça de teatro do francês Jean-Luc Lagarce.

Por Eurico de Barros
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  • Acção e aventura
  • 3/5 estrelas
  • Recomendado
Jack Reacher: Nunca Voltes Atrás
Jack Reacher: Nunca Voltes Atrás
Jack (Tom Cruise) é um antigo polícia militar, dotado de elevada inteligência forense assim como de uma vincada tendência para querer controlar tudo, além de ter algo de psicopata. De volta à sua unidade, é acusado de um homicídio antigo. O filme de Edward Zwick é um simples e pouco imaginativo veículo para Cruise, sem mais.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Acção e aventura
Inferno
Inferno
Realizado pelo peso-pesado Ron Howard e interpretado pelo peso-pesadíssimo Tom Hanks a partir do último best seller do autor mais best seller de todos, Dan Brown –o Rodrigues dos Santos americano, mas sem o gig televisivo. O Dr Robert Langdon (Hanks) é uma espécie de Jason Bourne sem gadgets entretido com uma caça ao tesouro que se diria inspirada nas festas infantis, mas com Dante e Botticelli metidos a martelo.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Drama
Cézanne e Eu
Cézanne e Eu
Danièle Thompson recria a amizade entre dois gigantes da cultura francesa do século XIX, o pintor Paul Cézanne e o escritor Emile Zola, num filme que nunca se eleva acima da ilustração competente e didáctica.

Por Eurico de Barros
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Companheiros Improváveis
Companheiros Improváveis
Viúvo depois de um casamento de décadas, triste e perdido num apartamento agora grande demais, tudo muda para Hubert (André Dussolier) quando uma rapariga, Manuela (Bérengère Krief), lhe entra pela casa e pela vida dentro. O realizador de Um Pai Fora de Prazo, François Desagnat, dirige as operações desta comédia confiando que a inspiração que ele não tem virá dos actores.

Por Nuno Henrique Luz
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  • Drama
Um Editor de Génios
Um Editor de Génios
Editor durante muitos anos na Scribner’s, Maxwell Perkins revelou escritores como Scott Fizgerald, Ernest Hemingway, Erskine Caldwell e Thomas Wolfe, o autor de Look Homeward, Angel, cuja prosa torrencial conteve e disciplinou. Este filme de Michael Grandage sobre a relação entre o paciente Perkins e o grandíliquo Wolfe, baseado num livro de A. Scott Berg , simplifica-a e redu-la a clichés (o escritor “genial mas difícil”, os altos e baixos da fama literária). E se Colin Firth não convence no papel de Perkins, Jude Law arruina o filme com um overacting tão insuportável como a prolixidade de Wolfe.

Por Eurico de Barros
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  • Suspense
A Rapariga do Comboio
A Rapariga do Comboio
Adaptado do best seller com o mesmo nome de Paula Hawkins, o filme de Tate Taylor conta a história de Rachel (Emily Blunt), que depois do divórcio fica em péssimo estado e fixa-se num casal que vê diariamente no comboio, até que a mulher desaparece. Quando temos o rabo – esse crítico de cinema implacável segundo um velho produtor de Hollywood – a começar a torcer-se na cadeira é porque o filme não interessa por aí além. É o caso.

Por Nuno Enrique Luz
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  • Drama
A Aparição
A Aparição
“É presico acreditar”, lá diz a canção. Só que antes convém saber em que é que se acredita. E Jacques (Vincent Lindon), o grande repórter protagonista de A Aparição, do francês Xavier Giannoli, é contactado pelo Vaticano para fazer precisamente isso: integrar a comissão oficial da Santa Sé que vai investigar uma jovem francesa, Anna, que diz que a Virgem Maria lhe apareceu, e avaliar se há provas concretas suficientes para que a Igreja acredite nela – ou a considere uma fraude. Entretanto, já há milhares
 e milhares de pessoas que
 estão convictas da verdade
 das palavras da rapariga e invadiram a localidade onde ela vive, e começou também a ser produzido merchandising em massa da vidente. Esta, que parece totalmente sincera e desprovida de qualquer interesse oculto ou oportunista em que acreditem nela, é enquadrada por um padre que a apoia sem reservas e arrisca a suspensão, e por um missionário americano que a quer usar como máquina de angariar fundos. No seio da comissão de inquérito, que inclui desde um padre a um psiquiatra, a função de Jacques – que não é crente mas também não é hostil à religião organizada – é aplicar a metodologia do trabalho jornalístico ao caso de Anna. Coisa bicuda, já que estamos a falar de visões, do invisível, do inefável, da fé. A Aparição é parte filme de jornalismo, parte thriller (a certa altura, entra em cena, retroactivamente, um cadáver) e parte reflexão sobre a fé,
 sobre o impulso de acreditar sem reservas, interrogações ou provas i

Críticas de cinema - 1 Estrela

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  • Drama

Nelly, de oito anos, acaba de perder a avó e está a ajudar a mãe a limpar a casa onde ela cresceu. No bosque circundante, conhece Marion, uma menina igualzinha a ela (os dois papéis são interpretados pelas gémeas Joséphine e Gabrielle Sanz), e descobre que está perante a mãe quando era da sua idade. Este novo filme de Céline Sciamma (Retrato de uma Rapariga em Chamas) é daqueles que ou se entra nele à primeira, ou nada feito. A realizadora não se preocupa sequer em criar uma atmosfera superficialmente fantástica para sustentar ou justificar o paradoxo temporal, optando por um naturalismo seco, rígido e átono, e as duas meninas parecem estar numa peça da escola. O que Sciamma faz aqui não é minimalismo, é nanismo cinematográfico. E de que fala Petite Maman – Mamã Pequena? Da natureza única da ligação entre mãe e filha? Da continuidade das gerações? Ficamos em ponto de interrogação. E não é bom sinal que um filme que dura só 70 minutos ainda vá a meio quando começamos a desejar que acabe depressa.

  • Filmes
  • Acção e aventura

O realizador é novo (Matt Reeves), o intérprete também (Robert Pattinson) e a acção agora passa-se no início da carreira de Batman como combatente contra o crime. Mas, de resto, The Batman continua e acentua a atmosfera lúgubre, pessimista, de negativismo e anti-heróica instaurada por Christopher Nolan nos filmes da série O Cavaleiro das Trevas, bem como a caracterização sorumbática e torturada do Homem-Morcego e a pose grave e pseudo-importante de toda a coisa.

O enredo de The Batman é mais banal e estereotipadamente policial e detectivesco do que de acção, e forçadamente “esticado” para justificar as três horas de duração (e se dura, dura, dura, e finge que acaba mas afinal não acaba…). Um assassino em série está a matar de forma particularmente sádica vários altos dignitários de Gotham City, incluindo o presidente da Câmara, deixando mensagens sob a forma de enigmas (facilmente adivinháveis…) e postais para Batman, que ao investigar, juntamente com o comissário Gordon, descobre uma rede de corrupção, morte, fraude e tráfico de droga, que envolve retroactivamente o seu falecido pai. Nem a família de Batman escapa à degradação neste filme que patinha pesadamente no lugar-comum do negrume moral e da dissolução social. Para além de ser um dos mais escuros dos últimos tempos, parecendo ter sido rodado durante um eclipse do sol, ou uma longa greve da companhia de electricidade. É levar mesmo à letra o cliché do filme “dark”.

As personagens – sobretudo os vilões – estão vulgarizadas e descaracterizadas (o Riddler é agora um nerd psicopata e anarquista, o Pinguim um mero mafioso gordo e narigudo e a Catwoman de Zoe Kravitz debita frases da vulgata politicamente correcta, sendo sem dúvida a pior de todas, incluindo as da velha série de televisão com Adam West) e quando não está metido no uniforme de Batman (o que sucede, felizmente, durante grande parte da fita) Robert Pattinson parece um membro de uma banda gótica datada a imitar o pior Marlon Brando. Para mal dos nossos pecados, estão previstas duas continuações de The Batman e duas séries de televisão em modalidade de spin-off.

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Estreia na realização do actor italiano Pietro Castellitto, filho do também actor e realizador Sergio Castellitto, Os Predadores põe em cena duas famílias romanas, os Pavone, burgueses abastados, intelectuais e disfuncionais, e os Vismara, proletários, fascistas e ligados ao tráfico de armas, cujos caminhos se vão cruzar a certa altura. O filme tinha potencial para ser uma comédia social bem satírica e negra, se o argumento fosse decentemente escrito, coeso e coerente, e a realização segura. Mas, tal como está, é laborioso, desengonçado e errático, além de grosseiramente caricatural. Pietro Castellitto também assume um dos papéis principais, um jovem e frustrado professor de Filosofia que mais parece um desenho animado humano – como sucede, aliás, à maioria das personagens de Os Predadores.

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  • Acção e aventura

O fora da lei australiano Ned Kelly transformou-se numa figura com contornos mitológicos no seu país. É visto como um bandido megalómano por alguns, e como um revolucionário iluminado por outros, e já foi objecto de vários filmes, incluindo a primeira longa-metragem feita na Austrália, The Story of the Kelly Gang (1906). Neste novo filme sobre ele, Justin Kurzel adapta o romance de Peter Carey True History of the Kelly Gang, que combina factos e ficção sobre a vida e a história de Kelly. É um western australiano ora realista e conforme à factualidade, ora alucinogénico e disparatado, com George MacKay no papel principal (e muito pouco parecido com o verdadeiro Ned Kelly), que se desfaz em pirotecnia visual, histeria dramática e grotesco narrativo, sem que Kurzel consiga transmitir-nos com alguma clareza o seu ponto de vista sobre a personagem. Um bem pesadão Russell Crowe tem um pequeno papel como Harry Power, o homem que comprou Kelly à mãe (facto) e o iniciou no banditismo.

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  • Suspense

Depois de ter desfigurado Um Crime no Expresso do Oriente, Kenneth Branagh vai ainda mais longe neste pavoroso remake de Morte no Nilo: desfigura o próprio Hercule Poirot, ao “desconstruir” o imortal detective de Agatha Christie, na caracterização psicológica e física, e na forma de sentir e agir. E qualquer semelhança entre esta nova adaptação do livro com a soberba versão de John Guillermin para cinema, com Peter Ustinov, e a televisiva com David Suchet, é pura coincidência. Branagh e o argumentista Michael Green deturpam o enredo, eliminam e inventam personagens e adulteram outras, e criam anacronismos absurdos ao cederem à agenda politicamente correcta.

O elenco é uma parada de canastrões e canastronas quase todos desconhecidos, ou martelados em papéis onde não cabem (ver o par cómico French e Saunders a fazer pateticamente as personagens que foram de Bette Davis e Maggie Smith na fita de Guillermin em 1978) e a ideia de Branagh interpretar Poirot (sem ter, nem de perto nem de longe, o físico da personagem) é pôr um bigode falso e fazer um sotaque francês digno dos Monty Python. E dizer que este Morte no Nilo, abundante e toscamente encharcado em efeitos digitais, parece realizado por um robô, é insultar os robôs. Kenneth Branagh perpetrou um atentado à memória de Agatha Christie e a um livro que é património da literatura policial.

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  • Comédia

Um remake medíocre, apalhaçado e completamente desnecessário da comédia fantástica clássica com o mesmo título, realizada em 1945 por David Lean a partir da peça de Noel Coward. Esta é sobre um escritor e a sua mulher, que são assombrados pelo espírito da primeira mulher dele, após uma excêntrica médium o ter invocado inadvertidamente durante uma sessão de espiritismo. Dan Stevens, Isla Fisher, Leslie Mann e Judi Dench nem por um momento fazem esquecer o elenco do original: Rex Harrison, Constance Cummings, Kay Hammond e Margaret Rutherford.

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  • Suspense

Houve já uma época em que os ingleses eram, no cinema e na televisão, os mestres das histórias de espionagem, bem mais do que os americanos. A julgar por Seis Minutos para a Meia Noite, de Andy Goddard, os ingleses estão a perder esse toque especial que tinham para este género. À primeira vista, Seis Minutos para a Meia-Noite, passado nos primórdios da II Guerra Mundial, aparenta ser uma história de sabor retro, na veia das que eram escritas por especialistas clássicos do spy thriller, como John Buchan, o autor de Os 39 Degraus, ou Erskine Childers, que assinou O Mistério das Areias.

O filme é um projecto do actor Eddie Izzard, que colaborou no argumento, é um dos produtores e interpreta o papel principal, o de Thomas Miller, um agente secreto inglês de ascendência alemã, que se infiltra num colégio particular para raparigas situado à beira-mar, e que apresenta uma característica muito especial. Apesar de a directora ser inglesa (interpretada em piloto automático por Judi Dench), todas as alunas são alemãs e de famílias ligadas a altos dignitários nazis (o colégio existiu na realidade e na ficha técnica final do filme são mostradas várias fotografias tiradas nesses tempos).

Antecipando o eclodir da guerra com a Alemanha, o governo inglês quer garantir que as raparigas não deixam clandestinamente Inglaterra, para as poder usar eventualmente como moeda de troca ou elemento de pressão com o governo de Hitler, ao mesmo tempo que teme que a escola esteja a ser usada como um centro de espionagem pelos nazis. A premissa é um bocadinho forçada mas ainda se pode aceitar. Só que o argumento a desenvolve de uma forma tão desastrada, tão confusa, tão previsível, tão estereotipada e tão descaradamente inverosímil, que Seis Minutos para a Meia-Noite acaba por se tornar numa comédia involuntária, em que nada faz sentido, para que lado olhemos, e o ridículo depressa toma o lugar do suspense.

Só para dar um exemplo, este é um daqueles filmes onde o protagonista anda à vontade por todo o lado dentro do colégio, sem nunca ser visto ou apanhado (há uma cena de bradar aos céus passada no gabinete da directora, em que é pura e simplesmente impossível não darem por ele onde se escondeu). Além disso, para um herói de acção tradicional, a personagem de Izzard passa tempo demais a fugir de tudo e todos (de uma das vezes, vestido com o uniforme roubado a um membro de uma banda musical, que lhe fica tão mal que o faria ser imediatamente identificado e detido, mas nada sucede e ele anda no meio na rua sem que ninguém repare ou desconfie). E isto apesar de haver por toda a parte folhetos com a sua fotografia.

Entre outros clichés ambulantes, temos a bonita, simpática e aparentemente inofensiva jovem professora que revela ser na realidade a mais fanática nazi de todas, ou ainda o agente petulante do MI6 que parece chegar na hora para safar o herói, mas é na verdade um agente duplo. O clímax de Seis Minutos para a Meia-Noite, de nos fazer arregalar os olhos de incredulidade, tem lugar numa praia, noite cerrada, com as alunas do colégio a revelar que os exercícios de ginástica que faziam à beira-mar eram na realidade um treino para sinalizarem aviões à noite (embora o espaço entre elas nem por sombra seja suficientemente largo para um avião aterrar quando visto do solo, mas já é quando mostrado do ponto de vista do piloto...) e o filme acaba por ser omisso quanto ao destino dado às raparigas. Era bem mais adequado se, em vez de Seis Minutos para a Meia-Noite, a fita se chamasse Espiões Trapalhões.

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Um professor de astronomia e uma sua doutoranda descobrem que há um cometa do tamanho do Evereste a caminho da Terra, e que o impacto se dará daqui a seis meses, provocando o fim do mundo. Só que ninguém, do governo dos EUA aos media, passando pela redes sociais, parece querer ouvi-los ou acreditar neles. Adam McKay (A Queda de Wall Street, Vice) dispõe de um elenco de platina nesta sátira apocalíptica (Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence nos astrónomos, Meryl Streep na Presidente dos EUA, Cate Blanchett numa jornalista da televisão, entre outros) que não poupa ninguém, entre cientistas, políticos, jornalistas e cidadãos comuns. Falta-lhe é capacidade de comédia, subtileza e jogo de cintura cinematográfico para disparar certeiramente em tantas direcções, assim como poder de síntese: Não Olhem Para Cima demora duas longas horas e meia a resolver-se.

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O wendigo, uma criatura sobrenatural da mitologia dos índios americanos, imortalizado por Algernon Blackwood na sua novela clássica homónima, é o monstro de serviço neste medíocre filme de terror de Scott Cooper, passado numa cidadezinha do Oregon, onde uma professora da escola e o seu irmão, o xerife local, descobrem que um dos seus alunos daquela esconde um terrível segredo em casa. Faminto tem pouca imaginação, muita rotina de sustos e algum gore desnecessário. O wendigo está bem visualizado mas é completamente desperdiçado.

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Criados há 50 anos por Jack Kirby para a Marvel, os Eternos, uma raça de humanóides com superpoderes, vida longuíssima e assimilados às narrativas mitológicas humanas, são agora descaradamente adulterados pela própria Marvel neste filme de Chloé Zhao (Nomadland), e apresentados ao gosto politicamente correcto que predomina em Hollywood. Apesar da história de Eternos ser um tudo-nada mais elaborada que as da média dos filmes do género, Zhao cumpre um caderno de encargos familiar. Uma ameaça cósmica que vai desencadear o fim do mundo, um inimigo antigo e monstruoso, os Deviants, paixões, conflitos e traições entre os heróis, algum alívio cómico forçado e uma batalha final movida a efeitos especiais, que continuam a ser o obrigatório abono de família deste tipo de fitas, em que os realizadores estão reduzidos ao papel de gestores da feitiçaria computacional. Os actores parecem estar quase todos a competir entre si para ver quem é o maior canastrão.

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Se é daqueles que acha que The Crown toma liberdades a mais com a história e a intimidade da família real inglesa e é insidiosamente anti-monárquica, espere até ver esta fantasia em roda livre, em que Pablo Larraín segue a princesa Diana (uma afectadíssima Kirsten Dunst) ao longo de três dias de um Natal passado em Sandringham nos anos 90, quando a ruptura com Carlos estava iminente. Spencer parece encomendado pelo “Partido de Diana”, os defensores mais cegamente ferrenhos, de tal forma Larraín vitimiza e incensa a falecida princesa (que se identifica com Ana Bolena, que Henrique VIII mandou decapitar) e diaboliza a família real. Esta vive numa luxuosa redoma de privilégios, rituais e tradições absurdas, mantendo a linda, inocente e infeliz Diana – que tem “gostos de classe média”, segundo a própria – sob um regime de vigilância e controlo semi-totalitário e indutor de paranóia. Ao pé de Spencer, The Crown é História da mais rigorosa e um elogio rasgado da monarquia inglesa.

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Dantes, quando Hollywood fazia um filme com personagens desemparelhadas, recorria a um gordo e um magro, como Bucha e Estica ou Abbott e Costello, ou então juntava no mesmo apartamento Walter Matthau num desleixado crónico e Jack Lemmon num obcecado por limpeza e ordem. Agora, na era da tirania da Marvel no cinema, personagens desemparelhadas significa Tom Hardy no papel de Eddie Brock, um jornalista bedungoso de São Francisco, que vive em conflituosa simbiose com um monstro alienígena comedor de cérebros e de chocolate chamado Venom.

Tendo Venom (2018) sido um sucesso de bilheteira, era inevitável que sofrêssemos uma continuação, e ei-la, com o sugestivo título Venom: Tempo de Carnificina, realizada por Andy Serkis. Eddie continua a tentar adaptar-se a ser o hospedeiro de Venom, enquanto este tem dificuldade em cumprir as regras impostas por Eddie, nomeadamente a de não comer senão vilões. O que dá o tom à (doentia) modalidade de humor negro vigente em Venom: Tempo de Carnificina, em que Serkis procura, como no filme original, combinar a acção e a ultraviolência movidas a efeitos especiais com a comédia slapstick sanguinolenta. Não é, verdadeiramente, para todos os gostos. Sobretudo para quem aprecia os seus “buddy movies” à moda antiga.

O vilão de serviço nesta continuação é um serial killer, Cletus Kasady, descaradamente cabotinado por Woody Harrelson. Depois de ter mordido Eddie quando este o foi ver na cadeia antes de ser executado, Cletus ganha também um inquilino alienígena, o Carnificina do título, que é tão ou mais psicopata do que o seu hospedeiro humano, e vai em busca de Eddie para se vingar. Não sem antes ir libertar Frances (Naomi Harris), a mulher que ama e tem superpoderes vocais, e a única que o tratou bem na sua vida, do asilo psiquiátrico de alta segurança em que está internada.

Tudo na história de Venom: Tempo de Carnificina concorre para um apocalíptico duelo final entre os dois monstros alienígenas, o mau (Carnificina) e o menos mau (Venom), com dentuças afiadas a babar e tentáculos a voar por todos os lados, que se desdobra num confronto entre os seus respectivos hospedeiros, Eddie e Cletus, que retomam a forma humana sempre se manifestam fogo ou sons muitos intensos, a que são sensíveis.

Andy Serkis procura dar um ar de terror “gótico” à história ao encenar o combate decisivo numa catedral, mas nem isso consegue, e os efeitos digitais deixam muito a desejar, sublinhando a artificialidade e a factura tosca do filme em todos os seus aspectos. Venom: Tempo de Carnificina é estritamente reservado a fãs com um patamar de exigência muito baixo – e aos quais não repugna o excesso de matéria viscosa alienígena e com vida própria.

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  • Suspense

Vencedor do Festival de Cannes, Titane, o segundo filme de Julia Ducournau, é, tal como o primeiro, Grave (2016), um festival de provocação visceral e explícita em termos de body horror, embora muito menos sustentado do ponto de vista formal, de história e dramático, o que o leva a cair repetidamente no ridículo involuntário. Quanto mais Ducourneau nos quer chocar, mais nos consegue pôr a rir. Agathe Rousselle é Alexia, que quando era pequena teve um acidente de automóvel, o que levou a que lhe tivesse que ser colocada uma placa de titânio na cabeça. O efeito dessa cirurgia foi que Alexia passasse a ter sentimentos eróticos por carros. Adulta, torna-se dançarina em salões automóveis e serial killer, engravida de um automóvel, põe fogo à casa dos pais com eles lá e foge, assumindo uma identidade falsa, a do filho adolescente desaparecido em criança de um chefe de bombeiros (Vincent Lindon), em casa de quem se instala. Ducournau atira-nos com tudo que tem à mão (sexo com máquinas, mutações físicas de virar o estômago do avesso, ambiguidade sexual, sugestões homossexuais e incestuosas) a ver se alguma coisa cola, mas quanto mais tenta, mais Titane se torna embaraçosamente delirante e incoerente. E invocar David Cronenberg a propósito desta grotesca patetice é insultar o mestre.

  • Filmes
  • Drama

France de Meurs (Léa Seydoux), a protagonista do filme de Bruno Dumont que leva o seu nome, é a mais célebre e carismática jornalista da televisão francesa, onde pontifica diariamente num canal de notícias em contínuo, quer em estúdio, fazendo entrevistas, quer em reportagens nos pontos mais quentes do planeta, metendo-se em situações perigosas para obter a imagem inédita ou a entrevista exclusiva. France tem toda a França a seus pés. O Presidente da República vem comer-lhe à mão, as pessoas interpelam-na na rua para tirarem selfies, e a sua assistente pessoal, uma lambe-botas diplomada, encarrega-se de a manter permanentemente elogiada.

Apesar de toda a fama de que goza, da fortuna que ganha e do conforto em que vive, France não é feliz. Não se dá bem com o marido, escritor, e o filho pequeno prefere teclar o smartphone a estar com ela. Um dia, no meio de um engarrafamento em Paris, atinge com o carro a moto de um entregador que tem de ir para o hospital, decide que é tempo de dar uma volta à vida, deixa a televisão e vai fazer uma cura num exclusivo hotel na neve. Só que a mesma imprensa cor-de-rosa e sensacionalista que fez alarde do seu acidente, segue-a sem ela dar por isso.

“France” é a mais atípica realização de Bruno Dumont, autor de filmes agrestes, turvos e tudo menos consensuais (La Vie de Jésus, L’humanité, Hadewijch), desconcertantes (o musical Jeanette, l’enfance de Jeanne D’Arc), satírico-grotescas (a série de televisão O Pequeno Quinquin, Ma Loute) e ocasionalmente mais acessíveis, como o excelente Camille Claudel 1915. Através da personagem de France, e dos seus estados de alma atormentados, Dumont parece querer satirizar e denunciar o mundo da televisão contemporânea, da celebridade mediática e da informação 24 horas sobre 24, manipuladora, reducionista e alienante.

Só que o faz com traços grossos e com sublinhados mais que óbvios, recorrendo a situações estereotipadas (ver as sequências da reportagem no barco de migrantes ilegais ou da entrevista à mulher do pedófilo, sem falar nas domésticas, em que France confronta o marido e o filho) e a personagens caricaturais (o empresário que perora sobre as virtudes da generosidade e da pobreza no luxuoso jantar beneficente).

E também sem uma pinga de sentido de humor, instalando uma solenidade tão insistente e pomposa que se torna ridícula, e soçobrando numa demagogia antimediática fácil, que não se compagina com a crítica à demagogia do jornalismo televisivo que pretende pôr em cena. (E aquele interminável desastre de automóvel em câmara lenta perto do final, é para levar a sério ou é uma paródia falhada a um dos mais irritantes clichés do cinema?)

A personagem de France é falha de textura humana, veracidade dramática e complexidade psicológica. Ela é parte uma versão de Christiane Amanpour assaltada por angústias existenciais e profissionais prontas-a-sofrer, parte “famosa” arrogante do mundo dos media que passa a assumir uma pose de pietà exibicionista. Léa Seydoux interpreta-a quase sempre com a expressão de alguém que está a sofrer de problemas digestivos, e não de quem atravessa um intenso e doloroso processo de questionamento ético e de convulsão íntima. Bruno Dumont assina aqui um laborioso e enfadonho pastelão, para ser arquivado junto dos outros filmes antitelevisão desastrosamente falhados.

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  • Filmes

Uma revolução eclode em todo o México. Na capital, uma multidão em fúria invade uma casa num bairro rico em que se realiza um casamento, pilhando, vandalizando, matando e raptando os convidados, com a conivência de quase todos os empregados. O exército intervém para instaurar a ordem, mas há soldados feitos com os revoltosos, que pedem resgates milionários pelos sequestrados, enquanto maltratam e violam as mulheres. Este filme pretensamente “profético” do mexicano Michel Franco causou muita controvérsia no seu país de origem e ganhou o Grande Prémio do Júri no Festival de Veneza, mas é tão confuso e simplista do ponto de vista político, como implausível e desconjuntado no que respeita à história que é contada.

  • Filmes

O argumentista e realizador francês Jean-Marie Poiré e o actor Christian Clavier trabalham juntos faz muito tempo, desde os anos 80. Colaboraram nalgumas das melhores comédias populares do cinema francês, de quando Clavier estava ainda associado ao grupo de café-concerto Le Splendid, revelado na década de 70 nos palcos parisienses e que rapidamente começou a fazer filmes, como os da série Les Bronzés.

Entre as colaborações mais famosas entre Poiré e Clavier contam-se Pai Natal: Sarilhos (1982), Papy Fait de la Résistance (1983) ou a divertidíssima trilogia histórica e de viagens no tempo Os Visitantes, rodada entre 1993 e 2016, onde Christian Clavier interpreta o malcheiroso e burgesso escudeiro do senhor medieval de Jean Reno, que andam numa fona entre a Idade Média, o nosso tempo e a era da Revolução Francesa e de Napoleão.

Jean-Marie Poiré e Christian Clavier voltam agora a trabalhar juntos na comédia policial Mistério em Saint-Tropez, de Nicolas Benamou, escrita por aquele e onde o actor tem o papel principal, o do inspector Jean Boulin, da polícia de Paris. O filme passa-se em 1970, numa luxuosa vivenda daquela estância balnear francesa, cujo proprietário, Claude Tranchant, um barão multimilionário, está persuadido de que alguém quer matar a sua mulher, e mete uma cunha ao seu amigo Jacques Chirac, membro do governo, para que este lhe envie o melhor polícia da capital para resolver o caso antes que alguém morra.

Como é Verão e tempo de férias, o comissário tem apenas disponível o desastrado e bronco inspector Boullin, que é despachado para Saint-Tropez e para a vivenda dos Tranchant, onde finge ser um mordomo contratado para servir os hóspedes famosos do casal e poder investigar sem ser reconhecido. Como Mistério em Saint-Tropez se passa na década de 70, Jean-Marie Poiré tentou recriar no filme o tipo de comédia que se fazia nessa década e na de 80, e caracterizar Boullin como uma versão francesa do inspector Clouseau de Peter Sellers. Só que se espalha ao comprido.

Não só o argumento é pobre de pedir de graça, altamente deficitário em gags e árido de gargalhadas, como também Clavier personifica Boullin accionando a limitada rotina histriónica em que estacionou já há alguns anos. É dolorosamente penoso, sobretudo para quem segue as carreiras de argumentista e do actor desde os bons tempos das comédias com os membros do Le Splendid e do esplendor cómico de Os Visitantes, ver Mistério em Saint-Tropez, onde Poiré, ao pior estilo da comédia alarve americana, não hesita em tentar fazer rir com piadas envolvendo vomitado, secreções, mocas de erva ou objectos pontiagudos espetados no rabo das personagens.

No elenco aparecem também nomes como Benoît Poelvoorde, Thierry Lhermitte, Rossy de Palma ou Gérard Depardieu, este no papel do superior do Boullin, que pouco ou nada podem fazer para contrariar a malnutrição cómica do argumento de Mistério em Saint-Tropez. A triste verdade é que a outrora pujante comédia popular francesa arrasta-se hoje numa decadência popularucha, mesmo que se passe entre os ricaços e os famosos na Côte d’Azur.

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  • Filmes

Barb (Kristen Wiig) e Star (Annie Mumolo) são duas amigas quarentonas e solteiras que decidem fazer férias pela primeira vez em muito tempo, após terem sido despedidas da loja de móveis em que trabalham. Rumam a Vista Del Mar, na Flórida, onde encontram o amor e uma super-vilã (Wiig de novo) que quer matar toda a gente ali. Escrita por Wiig e Mumolo, autoras do super-sucesso A Melhor Despedida de Solteira (2011), As Férias Loucas de Barb e Star é uma comédia-Frankenstein (um bocado de sátira social, outro de nonsense, outro de paródia aos filmes de espionagem, outro de desenho animado “real”, outro de slapstick) desarrumada, descompensada, espalhafatosa e sem pinga de piada, muito próxima de ser o filme mais estúpido deste Verão.

  • Filmes

Se acharem este filme do colombiano Ciro Guerra (O Abraço da Serpente) demasiadamente semelhante a O Deserto dos Tártaros, de Valerio Zurlini (1976), é porque o escritor J.M. Coetzee, autor do livro em que ele se baseia, e do argumento, gosta muito da fita de Zurlini e quis homenageá-la. Só que O Deserto dos Tártaros é infinitamente superior a esta estopada cerrada.

Mark Rylance faz o pacífico e humano administrador de um remoto posto avançado de um império nunca referido, que recebe a visita de dois cruéis militares (Johnny Depp e Robert Pattinson, em papéis de uma nota só). Estes, para seu horror, começam a prender e torturar pessoas de forma arbitrária.

O filme pode ser visto como uma alegoria anticolonial ou anti-“guerra ao terror”, mas mesmo tão óbvio nisso, precisava de ser tão exasperantemente arrastado e chato? 

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  • Filmes
  • Drama

O actor e músico Johnny Flynn interpreta David Bowie neste filme de Gabriel Range que recria, com muita ficção à mistura, a primeira visita do cantor aos EUA, em 1971, quando se procurava promover neste país e dar um novo ímpeto à sua carreira. Range não pôde usar nenhuma canção de Bowie no filme, o que o amputa de uma dimensão musical fundamental; Flynn não consegue passar por Bowie e a história toma bastantes liberdades com os factos. Sobretudo quando vai buscar os problemas mentais de Terry, o meio irmão de Bowie para tentar explicar os medos e as angústias dele.

  • Filmes
  • Acção e aventura

Inaugurada há precisamente 20 anos com o filme original realizado por Rob Cohen, a série Velocidade Furiosa transformou-se numa das mais lucrativas de todos os tempos (ocupa a sétima posição na respectiva lista) e é a mais rentável da história dos estúdios Universal. Já foram feitas nove fitas e um spin-off, mais duas curtas-metragens e uma série de animação. Isto sem contar com as atracções temáticas do parque de diversões da Universal e ainda um espectáculo itinerante, Fast & Furious Live Tour.

Aquilo que começou, em 2001, com um filme policial de acção, sobre speed freaks, maluquinhos da velocidade, dos carros modificados e das corridas ilegais, acabou por evoluir com a sucessão dos títulos, acabando por se transformar num émulo das superproduções de espionagem, aventura e intriga internacional. Em Velocidade Furiosa 9, de Justin Lin, esta tendência atinge o seu apogeu. É um compósito hipertrofiado dos filmes de James Bond, da série Missão: Impossível e de fita de super-heróis à paisana. Não é por acaso que, a certa altura, Roman (Chris “Ludacris” Bridges), depois de ter escapado a uma saraivada cerrada de balázios de militares mexicanos, diz aos seus parceiros que está convencido de que os membros do grupo são invulneráveis. E a verdade é que em Velocidade Furiosa 9 essa capacidade dos protagonistas de saírem incólumes – ou apenas com dois ou três arranhões – das mais abracadabrantes situações de perigo sobre duas, quatro ou mais rodas, de campos minados, de tiroteios alucinantes e de mísseis lançados por drones, bem como de enormes ensaios de pancada e de quedas das mais variadas alturas, em especial de veículos em movimento para cima de outros, ou para a rua, é levada ao extremo mais delirantemente inverosímil.

Tal como sucede nos desenhos animados, as leis da Física não funcionam no mundo de Velocidade Furiosa. Neste novo filme, que é um verdadeiro apocalipse de chapa batida, o longo sonho húmido de qualquer sucateiro que se preze, chega-se ao ponto de pôr um carro equipado com foguetes a colidir com um satélite no espaço sideral, e os dois ocupantes sobrevivem e até conseguem obter uma boleia de volta à Terra graças à Estação Espacial Internacional. Já lá vão os tempos em que até os mais espectaculares filmes de acção procuravam manter sempre um mínimo de credibilidade. Mais do que os seus predecessores, Velocidade Furiosa 9 é insondavelmente disparatado, abissalmente estapafúrdio, pedindo aos espectadores que deixem o cérebro à entrada do cinema.

A história assenta numa trágica querela de juventude entre os irmãos Toretto, Dominic (Vin Diesel) e Jakob (John Cena, tão canastrão que, ao pé dele, Diesel faz figura de Sir Laurence Olivier) e usa como MacGuffin um dispositivo que permite a quem o detém controlar todos os sistemas de armas e informáticos do mundo. A coisa é cobiçada por um multimilionário vilão de Leste que recrutou os serviços de Jakob para a roubar, o que obriga Dominic e Letty (Michelle Rodriguez) a saírem da reforma e a juntarem-se ao resto do grupo para salvarem o mundo. A Cipher de Charlize Theron regressa, há mortos que voltam à vida porque afinal não morreram e novas personagens, todos eles a contribuir para o descomunal e absurdo charivari que é Velocidade Furiosa 9. E cujos verdadeiros heróis acabam por ser as dezenas e dezenas de “duplos” creditados na longa ficha técnica final, onde Justin Lin nos dá também um cheirinho do 10.º filme da série, alegadamente o último. Fiem-se nisso, fiem…

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  • Filmes

Esta longa-metragem de estreia da georgiana Dea Kulumbegashvili fez parte da Competição Oficial do Festival de Cannes de 2020, que acabaria por ser cancelado, e centra-se num casal de Testemunhas de Jeová com um filho pequeno, que são alvo de hostilidade, violência e de uma violação, no interior da Geórgia, onde se instalaram. A realizadora terá decerto coisas interessantes e pertinentes para dizer sobre a fé e a intolerância, mas a forma que escolheu para o fazer neste maneirado, entorpecente e apático O Começo não é a mais apelativa.

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  • Drama

Em Music, a estreia na realização da cantora e compositora Sia, a actriz e bailarina Maggie Ziegler, sua habitual colaboradora, interpreta a personagem do título, uma adolescente autista que vive com a avó em Nova Iorque. Quando esta morre de repente, entra em cena Zu (Kate Hudson), a meia-irmã de Music, chamada de urgência para tomar conta dela. Só que além de ser uma alcoólica em recuperação e estar em liberdade condicional, Zu ganha a vida a vender fármacos sem receita por baixo da mesa. E não faz a menor ideia de como é que deve lidar com a meia-irmã. Ainda por cima, o dinheiro que ela esperava que a avó tivesse deixado, não existe. Ficou apenas um caderno com instruções detalhadas sobre como tratar de Music.

A história do familiar ausente que aparece de súbito para ajudar, com segundas intenções, um parente próximo que sofre de uma deficiência, e acaba por se tornar numa pessoa melhor e encontrar uma segunda vida graças a este, não é nova no cinema. Pensemos apenas em Encontro de Irmãos, de Barry Levinson, de que Music parece ser uma versão no feminino e sem “estrelas” de primeiro plano no elenco. Mas o problema deste filme de Sia não é o ser tematicamente derivativo e nada original. É querer ser, além de um drama familiar, uma fantasia musical; e pior ainda, falhar rotunda, embaraçosa e grotescamente na representação de uma pessoa autista, das suas circunstâncias e da forma de cuidar dela.

Sia está constantemente a interromper a acção com números musicais, com os quais pretende visualizar a forma como Music percepciona o mundo que a rodeia e os vários estímulos que recebe dele. Só que, com as suas encenações extravagantes, as suas cores berrantes e as suas coreografias frenéticas, parecem mais o cruzamento de telediscos infantis com sketches psicadélicos da Rua Sésamo, e anúncios a marcas de tintas, do que qualquer coisa remotamente relacionada com o mundo interior dos autistas (as canções que os acompanham, também compostas por Sia, são de uma mediocridade monótona).

A cantora e realizadora foi atacadíssima, nos media e nas redes sociais, em especial por não ter usado uma actriz autista, ou uma pessoa autista sem experiência de representação, para interpretar Music em vez de Maggie Ziegler. Na controvérsia que se seguiu, Sia meteu os pés pelas mãos, afirmando primeiro que tinha inicialmente escolhido uma pessoa autista para o papel, e depois que havia escrito o filme (em parceria com a autora de livros infantis Dallas Clayton) expressamente para Ziegler, embora inspirando-se numa amiga autista semelhante a Maggie.

Independentemente de toda esta polémica, e ao contrário, por exemplo, de Dustin Hoffman no citado Encontro de Irmãos, ou de Mary Stuart Masterson no drama indie de 1993 Benny & Joon, onde personifica uma pintora autista, Maggie Ziegler é incapaz de um mínimo de autenticidade e de credibilidade na forma como vive Music, ficando-se por uma interpretação de pantomima, repetindo-se em maneirismos e tiques físicos e vocais, embora nem ela nem o filme – e felizmente! – cheguem ao ponto de vir mendigar a piedadezinha do espectador.

Pelo contrário, o tom dominante em Music é de um optimismo pueril e facilmente “inspirador”. Como se vê pela superficialidade com que é tratado o tema da deficiência, e do tipo de cuidados que pede, e que é confirmado pelo final inenarravelmente feel good, com todas as personagens, principais ou secundárias, bem realizadas, sorridentes e felizes – nem falta um cãozinho fofo para compor o quadro. Para onde quer que se olhe, e malgrado todas as boas intenções de Sia, Music é um filme que desafina, insistente e atrozmente.

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  • Filmes

Realizado em 18 dias numa Londres em pleno confinamento, e escrito por Steven Knight, criador, entre outros, da série Peaky Blinders, este Locked Down, estreado na HBO, usa o dito confinamento como cabide para uma banalíssima história de fim de relação, ao qual é depois colado um inverosímil enredo de “filme de assalto”, quando o casal em ruptura decide roubar um valiosíssimo diamante do Harrods, que se encontra em preparativos de encerramento. Isto depois de mais de uma hora de lugares comuns de desatino sentimental e de estenografia de inquietação individual (nem falta uma cena de dança nevrótica ao som de música do telemóvel). Tudo em Locked Down é implausível e forçado, a começar pelo próprio casal protagonista, tendo em conta o abismo sócio-económico que os separa – ela (Anne Hathaway), executiva de uma importante marca de artigos de luxo, ele (Chiwetel Ejiwofor), um motorista desempregado, amante de poesia e com cadastro –, e a acabar na absurda golpada, que parece pertencer a outro filme. Nomes como Ben Kingsley, Ben Stiller ou Claes Bang fazem rápidas aparições, quase todos via Zoom.

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Um falso documentário, que passa em revista em registo satírico o ano sinistro que acaba de se despedir, é uma boa ideia. Chamar, entre outros, os dois criadores da série Black Mirror para o escrever é outra boa ideia. Só que Death to 2020, o dito falso documentário, é a prova que duas boas ideias juntas não produzem necessariamente um bom resultado. Tendo como pivô Samuel L. Jackson num jornalista de um prestigiado e imaginário órgão de informação de Nova Iorque, Death to 2020 é quase tão deprimente e desolado de comédia como o ano que traz no título. Demasiadamente centrado nos EUA e no Reino Unido, e dando muito mais tempo de antena às eleições americanas do que à pandemia de covid, sem qualquer dúvida o acontecimento de 2020, pelo seu devastador impacto planetário, o filme é de uma pobreza abaixo de ordem mendicante em termos de humor, sátira, iconoclastia (veja-se como se põe sério e dobra o joelhinho quando fala do Black Lives Matter) e da mais elementar imaginação cómica (até quando se mete com a própria Netflix, que o produziu e onde se estreou, é nulo de piada). Arquivo morto, já!

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  • Filmes

Quando o cinema europeu tenta fazer filmes de acção e policiais à maneira americana, os resultados não costumam ser famosos. As coisas costumam funcionar melhor quando os europeus adaptam estes géneros americanos às suas realidades culturais, sociais e políticas. Como se pode ver pelo polar francês ou pelo giallo italiano, que, embora costumem seguir uma matriz americana, têm uma vincada identidade própria e idiossincrasias cinematográficas imediatamente reconhecíveis.

Não é o que acontece em A Besta, um thriller de acção italiano estreado na Netflix, segunda longa-metragem de Ludovico Di Martino, um nome da novíssima geração de realizadores transalpinos. Em A Besta, Di Martino cola-se completamente ao modelo hollywoodesco do género. Este é o tipo de fita de série B maneirinha e pão, pão, queijo, queijo, que se fazia em doses industriais nos EUA nas décadas de 70 e 80, e que depois passou a ser produzida essencialmente para alimentar o mercado de home video.

Rodado numa grande cidade italiana que o realizador nunca dá a conhecer, A Besta tem como protagonista Leonida Riva (Fabrizio Gifuni, que vimos em Capital Humano, de Paolo Virzi, ou Sonhos Cor-de-Rosa, de Marco Bellochio). Riva é um antigo capitão das forças especiais italianas que se reformou após uma desastrosa missão no Afeganistão, que o deixou profundamente traumatizado e a depender de fármacos, e o levou a divorciar-se da mulher e a alienar-se da família, facto que Mattia, o filho mais velho, nunca lhe perdoou.

Uma noite, Teresa, a filha mais pequena de Riva, desaparece de um restaurante de fast food onde estava com o irmão, que a deixou sozinha por alguns minutos. Suspeita-se de rapto porque uma empregada viu um jipe suspeito arrancar a toda a velocidade. A polícia é chamada ao local. Mattia, desesperado, telefona ao pai e este decide levar a cabo uma investigação paralela à das forças da ordem, valendo-se da sua experiência e dos seus conhecimentos de ex-membro de uma força militar de elite.

Logo no quarto de hora inicial, A Besta deixa bem claro que vai seguir à risca, e sem o menor atrevimento de originalidade, o formato do filme de acção brutalista à americana. E daquela alínea em que um tropa veterano com treino e tarimba muito acima da média, psicologicamente afectado por um trauma de guerra que o tornou num bicho do mato e o afastou dos seus, começa a funcionar em modo arrasa-quarteirões e esmigalha-vilões, para resgatar um membro da família das mãos de criminosos sem pinga de humanidade.

Não falta nenhum ingrediente na panela, a começar pelos polícias que estão sempre um passo atrás do herói na investigação, e a acabar na resistência sobre-humana deste, que sobrevive a facadas, sovas de meia-noite e balázios, passando pelas sequências de flashback da missão fatal que o marcou para sempre e pela salvação final mesmo em cima da hora. Tudo sem nenhuma surpresa, coleccionando estereótipos, situações feitas, coincidências convenientes, bastantes cadáveres e duas ou três inverosimilhanças de bradar aos céus. A Besta é um thriller de acção spaghetti com ingredientes adulterados, excesso de corantes e conservantes e indigesto até para o consumidor menos exigente.

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  • Comédia

Dantes, as crianças que se portavam mal recebiam no sapatinho, como castigo, um pedaço de carvão em vez de brinquedos. Ficavam tristes, choravam baba e ranho e prometiam portar-se melhor, para no Natal seguinte voltarem a ter presentes bonitos. Em Missão: Vingança, de Eshom e Ian Nelms, Billy Wenan, um rapaz de 12 anos rico, despótico, insuportavelmente mimado, com um pai ausente e que vive com a avó doente, recebe um bocado de carvão no Natal, e não faz a coisa por menos. Decide vingar-se e contrata um assassino profissional para descobrir onde vive o Pai Natal, ir lá matá-lo e trazer a cabeça do bom velhinho como troféu. (Billy também recorre ao dito assassino para aterrorizar colegas da escola.)

Este é apenas um dos aspectos mais sinistros de Missão: Vingança, que pretende ser uma comédia negra natalícia, mas mais não é do que um dos filmes de Natal mais desastrada e desagradavelmente grosseiros e infelizes já feitos. O Pai Natal (Mel Gibson) está desanimado, decadente e enfraquecido, porque a existência de cada vez mais crianças malcomportadas traduz-se em cada vez menos presentes, uma queda de produção na fábrica e uma situação financeira catastrófica. A crise é tão grande que ele e a mulher, Ruth (Marianne Jean-Baptiste), têm que se resignar a ceder às tentadoras propostas do governo e pôr os elfos a produzir material militar em vez de brinquedos (o único gag decente de toda a fita envolve precisamente os elfos, os seus hábitos alimentares e o menu da cantina da fábrica).

Entretanto, o assassino profissional (Walter Googins) vai deixando um rasto de cadáveres à medida que se aproxima da casa e da fábrica de brinquedos do Pai Natal, algures no Canadá. Uma vez lá chegado, começa a massacrar os militares que as protegem, tenta destruir as instalações com explosivos, deixa os elfos em polvorosa e protagoniza um sangrento duelo a tiro com aquele, deixando-o por morto e alvejando também a mulher. Como se tudo isto não bastasse, o jovem Billy tenta envenenar a avó, mas a intervenção atempada de um Pai Natal mais escalavrado do que Sylvester Stallone no final de um dos filmes da série Rambo, e tão ameaçador como o próprio John Rambo, impede o pior.

O que quer que os irmãos Nelms queriam fazer em Missão: Vingança (Fatman, no original), falharam em todas as declinações. Na ideia de história que a ele preside, na forma e no discurso, na intenção da “mensagem”, na violência verdadeiramente gratuita e totalmente autocomplacente, e da primeira à última imagem, este é um filme de um lamentável, incomensurável e insondável mau gosto. Está destinado a constar em todas as futuras listas de horrores cinematográficos com tema natalício. Até temos pena dos actores envolvidos, Mel Gibson à cabeça, que vão ficar para sempre com uma nódoa destas nas suas filmografias.

Se fosse um acidente, Missão: Vingança era uma colisão em cadeia numa auto-estrada em dia de chuva e hora de ponta. E se o Pai Natal existisse mesmo, Esholm e Ian Nelms passavam a ter no sapatinho, para o resto das suas vidas, fruta podre, baratas e arame farpado.

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Um falso documentário, que passa em revista em registo satírico o ano sinistro que acaba de se despedir, é uma boa ideia. Chamar, entre outros, os dois criadores da série Black Mirror para o escrever é outra boa ideia. Só que Death to 2020, o dito falso documentário, é a prova que duas boas ideias juntas não produzem necessariamente um bom resultado. Tendo como pivô Samuel L. Jackson num jornalista de um prestigiado e imaginário órgão de informação de Nova Iorque, Death to 2020 é quase tão deprimente e desolado de comédia como o ano que traz no título. Demasiadamente centrado nos EUA e no Reino Unido, e dando muito mais tempo de antena às eleições americanas do que à pandemia de covid, sem qualquer dúvida o acontecimento de 2020, pelo seu devastador impacto planetário, o filme é de uma pobreza abaixo de ordem mendicante em termos de humor, sátira, iconoclastia (veja-se como se põe sério e dobra o joelhinho quando fala do Black Lives Matter) e da mais elementar imaginação cómica (até quando se mete com a própria Netflix, que o produziu e onde se estreou, é nulo de piada). Arquivo morto, já!

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A vida de Rachel (Caren Pistorius), a heroína de Em Fúria, de Derrick Borde, não corre nada bem. Está a divorciar-se e o marido quer ficar-lhe com a casa, perdeu o salão de cabeleireiro de que era proprietária e agora tem que ir atender clientes ao domicílio, e o irmão e a noiva vieram morar com ela sem pagarem renda ou contribuírem para as despesas do dia-a-dia. E como se deixou dormir, perdeu a hora de levar o filho à escola e este vai ser castigado por chegar tarde; e perdeu também a sua melhor cliente, farta dos seus atrasos.

A vida de Rachel não está a correr mesmo nada bem. Mas vai passar a correr ainda pior, porque Tom Cooper (Russell Crowe), o condutor do jipe a quem Rachel deu umas valentes buzinadelas por nunca mais avançar depois de cair o sinal verde, e com o qual trocou a seguir umas palavras ríspidas, é a mesma pessoa de quem a polícia anda à procura desde madrugada, altura em que matou a ex-mulher, o namorado dela e depois pôs fogo à casa onde eles viviam. É que o homem vai centrar nela todas as suas frustrações e transformar-lhe a vida num filme de terror do departamento serial killer à solta.

Russell Crowe, que ainda não perdeu os muitos quilos que teve que engordar para interpretar Roger Ailes na minissérie The Loudest Voice, tem aqui um papel de assassino psicopata de aspecto quotidiano que não lhe exige grande esforço. Ao ponto de nos perguntarmos o que está ele a fazer nesta série B de terror rodoviário suburbano com pretensões a ter um discurso “importante” sobre a falência da civilidade nas sociedades contemporâneas e a sua expressão na raiva e na violência ao volante.

Se foi porque lhe apeteceu variar e interpretar um vilão odioso e descontrolado, então a escolha de Crowe foi infeliz. É que Tom Cooper é uma personagem de cartão e cola, um cliché ambulante do ressentimento masculino e da agressividade social extremados, transfigurado em máquina homicida. Ao nível, aliás, do estereótipo da vítima feminina representada por Rachel, que pouco mais dá a Caren Pistorius para fazer do que andar em pânico.

Vagamente reminiscente de outros filmes bem melhores que tocam nos mesmos temas, como Um Assassino Pelas Costas, de Steven Spielberg, Um Dia de Raiva, de Joel Schumacher, ou Manobra Perigosa, de Roger Michel, Em Fúria rapidamente abdica de toda e qualquer lógica e começa a acumular coincidências forçadas e inverosimilhanças em série (sendo a primeira o facto de Rachel não ter password no seu telemóvel), e a história torna-se de uma previsibilidade descarada. Embora aqui e ali o realizador nos consiga distrair com os aparatosos acidentes rodoviários (também eles esperados) que pontuam a acção.

Tudo considerado, Em Fúria chumba nas personagens, não satisfaz no argumento e é insuficiente na realização. Veredicto: multa pesada e carta apreendida.

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  • Filmes

Com base apenas em três filmes, Canções do Segundo Andar (2000), Tu, que Vives (2007) e Um Pombo Pousou Num Ramo a Reflectir na Existência (2014), o sueco Roy Andersson adquiriu, nalguns sectores da crítica e corredores dos festivais de cinema, a reputação de ser um dos mais “profundos” cineastas contemporâneos, autor, naquela trilogia, de uma importante e pertinente reflexão sobre o absurdo da condição humana e a angústia abissal da existência. Diz muito sobre os tempos que vivemos que um cineasta tão superficial, amaneirado e limitado seja referido em termos que habitualmente se reservam para pensadores a sério, e as bagatelas cinematográficas que mercadeja passem por uma qualquer reflexão pertinente. Laboriosamente construídos e encenados como uma sucessão de quadros rígidos, artificiais, descoloridos e lúgubres, povoados por personagens inexpressivas, monocórdicas e passivas até à exasperação, “distanciados e distanciadores”, como os descreveu o crítico americano J. Hoberman, os filmes de Andersson não passam de um lento e maçudo repositório de banalidades pseudo-filosofantes, rasamente surreais e absurdistas de babar na gravata, sobre a forma como a humanidade sofre a sua passagem por este mundo. E na visão do cineasta, ela sofre com uma inércia tristonha, trombuda e resignada, regada àquilo que no sentir de Andersson passa por humor negro, e decorada com algum simbolismo de carregar pela boca. No seu mais recente filme, Da Eternidade (só o título é todo um programa de presunção cabotina), Roy Andersson insiste no seu cardápio de trivialidades com maquilhagem poético-absurdo-trágica, e ainda mais destiladas de emoção, de consequência e de sentido do que é costume. Percebe-se que o realizador pretende que alguns dos sketches da fita sejam como que pequenas máximas visuais, miniaturas aforísticas, mas resultam ou desconcertantes (um trio de adolescentes pára à beira de um café de beira de estrada, saracoteia-se ao som da música ambiente deste, recebe uma salva de palmas e segue o seu caminho), ou pomposas (os prisioneiros de um exército derrotado arrastam-se pela neve). E o gag recorrente do padre que perdeu a fé, sonha que anda com uma cruz às costas pelas ruas enquanto uma multidão o apupa e agride, e consulta um psiquiatra muito rigoroso com os horários de atendimento, além de não ser particularmente cómico, rapidamente se gasta e começa a moer a rosca.

Mais do que na trilogia de fitas atrás referida, em Da Eternidade torna-se bastante óbvio que Roy Andersson tem muita dificuldade em ocultar que na verdade tem muito pouco para dizer. E o que tem é trivial, pretensioso, rente à inteligência e faltoso de profundidade. E ainda por cima, chatíssimo. Da Eternidade é uma das mais descaradas, vácuas e insofríveis estopadas do ano.

  • Filmes
  • Drama

O começo de Radioactivo, de Marjane Satrapi (Persépolis), não deixa espaço para dúvidas. Este filme sobre Marie Curie, a descobridora do rádio e do polónio, juntamente com o marido, Pierre Curie, única mulher a ganhar duas vezes um Prémio Nobel e única pessoa a receber o mesmo prémio em duas disciplinas diferentes, Física e Química, vai contemplar todos os lugares comuns do filme biográfico. Radioativo abre – obviamente! – com a cientista (interpretada por Rosamund Pike), já idosa, a desmaiar no seu laboratório e a ser hospitalizada, fazendo logo a seguir um enorme flashback da sua vida e da sua obra enquanto a levam numa maca. Seguem-se quase duas horas de aborrecido, sensaborão e previsível cinema do tipo Selecções do Reader’s Digest, durante as quais Satrapi não se esquece, num didactismo parolo, de recordar ao espectador as futuras aplicações boas e más da radioactividade, com os tratamentos contra o cancro na medicina, a bomba atómica e a energia nuclear (com recriação do bombardeamento de Hiroxima e do acidente de Chernobyl). Radioativo é abaixo de televisão medíocre.

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  • Filmes

Quando a grande revelação da história de um filme assenta numa coincidência ridiculamente inverosímil, e o realizador filma essa cena fulcral sem qualquer investimento emocional e no mesmo registo desprendido e sonâmbulo que caracteriza toda a fita, então não há salvação possível. É exactamente o que Atom Egoyan faz em Convidado de Honra, um enredado e inerte melodrama de família, com David Thewlis, que parece estar meio ausente no papel de um inspector sanitário de restaurantes, e com a inexpressiva Laysla De Oliveira como sua filha. Ela é uma professora de música que está na cadeia por um crime que não cometeu e se deixou condenar deliberadamente para se castigar por uma coisa que fez ao namorado. Ao mesmo tempo, pretende assim punir o pai por algo que ele terá feito à mãe, quando esta estava a morrer de cancro, e a ela própria, quando era pequena. O enredo de Convidado de Honra é demasiadamente emaranhado e forçado, além de emocionalmente zombie, para ser contado em detalhe, e quem conhece a obra de Egoyan ficará com a forte sensação de que o realizador já não consegue mais do que fazer auto-pastiches.

  • Filmes
  • Drama
O Bar Luva Dourada
O Bar Luva Dourada

Pode um filme resultar tão abjecto e detestável como a personagem que retrata? No caso de O Bar Luva Dourada, de Fatih Akin, a resposta é sim. O filme conta, com todos os detalhes sórdidos e deprimentes, a história de Fritz Honka, que na Hamburgo dos anos 70 matou e desmembrou várias prostitutas, guardando pedaços dos corpos em casa. Não havia mesmo necessidade.

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  • Filmes
  • Acção e aventura

Harley Quinn (Margot Robbie) surge aqui autonomizada do Joker e dos restantes anti-heróis de Esquadrão Suicida, protagonizando uma história que é uma fantasia "feminista" e brutalista, em que um grupo de personagens femininas recrutadas em ambos os lados da lei impõem a sua justiça num mundo cheio de homens que só as querem prejudicar, oprimir, magoar ou mesmo eliminar. Nenhum mal viria daí ao mundo se Birds of Prey não fosse tão boçal, piroso, sádico e visual e sonoramente massacrante. Ainda por cima, tem o vilão mais chóninhas do género, pessimamente interpretado por Ewan McGregor.

  • Filmes
  • Drama

A primeira longa-metragem de Ico Costa situa-se no Portugal rural. Um homem comete um crime na sua vila e foge para os bosques. Alva aparenta ir ser um filme movimentado, mas é na verdade um filme de inacção, já que o realizador se limita a seguir o criminoso nas suas deambulações na natureza, tentando transmitir o que lhe vai na alma e na consciência. Mas não consegue e o resultado é uma estuca inverosímil.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Fantasia

A adaptação ao cinema por Tom Hooper (O Discurso do Rei) do lendário musical de Andrew Lloyd Webber é uma catástrofe, por onde quer que se olhe para ela. Empapado em efeitos digitais que transformam os actores em criaturas estranhamente mutantes (gatos antropomórficos ou gatos que usam roupas de humanos), Cats é um objecto disforme e sem identidade, nem encenação tradicional de palco, nem animação parte "realista", parte virtual. que parece ter saído do laboratório do Dr. Moreau após uma experiência genética em grande escala que deu para o torto. Dos actores, salvam-se apenas os veteranos Judi Dench e Sir Ian McKellen, James Corden e a estreante Francesca Hayward, bailarina principal do Royal Ballet, apropriadamente felina e sexy na figura da gata Victoria.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
Sibyl
Sibyl

Nesta fita da francesa Justine Triet, uma psicanalista, Sibyl (Virginie Effira), envolve-se na vida pessoal e profissional de uma jovem actriz, Margot (Adèle Exarchopolous) que a contactou em desespero, e usa-a para o romance que está a escrever. À vulgata dos filmes sobre triângulos amorosos, Sibyl junta um aglomerado de clichés dos filmes com psicanalistas, tudo mal misturado num enredo forçadíssimo e insistentemente demonstrativo. Sibyl é presunçoso, desastrado e com espasmos de ridículo, uma francesada de digestão impossvel.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

Emile Hirsch e John Cusack interpretam este western básico e a abarrotar de lugares-comuns sobre um grupo de pistoleiros que toma de assalto e pandemoniza uma calma e ordeira cidadezinha. Hirsch é o pai de família e cangalheiro local e Cusack, entediadíssimo, faz o odioso chefe dos malfeitores.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Xavier Dolan volta a contemplar temas que lhe são queridos nesta fita sobre um miúdo de 11 anos que mantém uma correspondência secreta com o seu ídolo, um jovem actor em rápida ascensão: as relações difíceis entre filhos e mães, as formas de viver com as homossexualidade. Seja pela maneira confusa e desastrada com que Dolan lida com a história, seja pela dificuldade que tem em nos convencer da credibilidade das personagens (sobretudo o vácuo e caricatural Donovan), A Minha Vida com John F. Donovan redunda numa cerrada e inverosímil estopada, que não vai a lado nenhum.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Lisboa tem poucas avenidas tão ricas, com gente de tantas proveniências, extractos sociais e projectos de
vida. É uma fonte virtualmente inesgotável de histórias e leituras da sua angulosa realidade, de leituras longitudinais ou trabalhos menos densos. É por isso frustrante ver Avenida Almirante Reis em 3 Andamentos esconder a sua inépcia atrás de um título pomposo e da paciente bondade com que a cinefilia classifica este tipo de projecto: “filme ensaio”. Um ensaio pressupõe explorar uma ideia, um bem escasso por estas paragens. Recuando a Cândido dos Reis e à República, passando pelo 1.º de Maio de 1974, Renata Sancho propõe-se olhar para as mudanças em curso nesta avenida (a rodagem decorreu entre 2016 e 2018, quando os preços do imobiliário dispararam). Mas o resultado é uma sequência de planos desconexos, sem interesse nem narrativa, que parece feita só para iniciados. E sabe deus que interesse encontrarão esses por aqui.

Por Hugo Torres

  • Filmes
  • Acção e aventura

Esta superprodução com os campeões de bilheteira Dwayne Johnson e Jason Statham, extraídos à série Velocidade Furiosa para criar uma nova franchise de acção, quer ser, embrulhado num só, um spinoff daquela, um buddy movie de acção tradicional, um filme de James Bond e um filme de super-heróis. O resultado é uma bisarma híbrida, massacrante, repetitiva e muito bronca.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Inenarrável comédia “popular” francesa, com Christian Clavier no papel de um podólogo divorciado que quer agradar aos filhos da namorada (Mathilde Seigner), dois adolescentes insuportáveis. Quando o mais velho passa de ano no liceu, vão passar férias a Ibiza, onde se envolvem em peripécias escassa ou nulamente cómicas.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Realizado pelo mais que respeitável Jorge Pelicano (Ainda Há Pastores? Páre, Escute, Olhe), este documentário biográfico com rabo (muito comprido) de vanity project de fora, e duas muito longas horas de duração, é exclusivamente dedicado aos fãs de Tony Carreira. Agora que ele decidiu "parar" após 30 anos de carreira (nunca se percebe no filme se se reformou de vez, ou se é só uma pausa), eis um filme que conta a sua história oficial e apresenta-o sob a melhor e mais pura luz possível. Há momentos em que o cantor é representado quase como um sério candidato á beatificação, só lhe faltando mesmo fazer um milagre. E há um documentário fascinante a ser feito sobre o mundo das suas fãs - e daquele que é, aparentemente, o único admirador masculino de Tony Carreira).

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Ficção científica

Claire Denis recrutou Robert Pattinson e Juliette Binoche para este filme de ficção científica passado numa nave espacial tripulada apenas por criminosos condenados à morte, que em troca de não serem executados, aceitaram participar numa missão para explorar um buraco negro e submeterem-se a experiências de reprodução artificial. High Life não tem ponta por onde se lhe pegue, nem pelo lado "autoral", nem pelo das convenções do género. É um filme inverosímil, pretensioso, inadvertidamente cómico a espaços e narcotizado. É caso para dizer: no espaço, ninguém nos ouve bocejar.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

Esta continuação do colossal mas ainda assim aceitável Godzilla de Gareth Edwards (2016) "mete a carne toda no assador", como gostam de dizer os treinadores de futebol. Entram em cena não só toda a turma dos monstros criados nos anos 50 e 60 pelos japoneses dos estúdios Toho (além de Godzilla, Mothra, Ghidorah ou Rodan), como também uma civilização ancestral engolida pelos mares, a teoria da Terra Oca e os deuses antigos que, em vez de astronautas, eram monstruosidades. O enredo do filme abdica de qualquer lógica, credibilidade ou verosimilhança e é um cabide para pendurar descomunais e ensurdecedoras sequências de destruição e combate, umas atrás das outras. Godzilla II: Rei dos Monstros já nem é cinema, no sentido de ser feito com câmaras e actores, mas sim no computador.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

Uma das piores versões de filmes animados da Disney com actores e efeitos digitais. O Aladino de Mena Massoud não tem pinga de carisma, o Vizir maléfico de Marwan Kenzari é um vilão de Loja do Euro, Will Smith, que tinha a missão impossível de suceder a Robin Williams no Génio da Lâmpada, não tem genica cómica nem boas piadas no argumento para o conseguir, e só Naomi Scott na princesa Jasmine destoa de toda esta mediocridade. O realizador Guy Ritchie puxa os números musicais para o lado de Bollywood, mas com pé de chumbo, e defende-se com os efeitos digitais, que por serem - incrivelmente - mal amanhados, não chegam para dar aAladdin a dimensão mágica e de fantasia que o filme precisava para funcionar.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Mais um western sobre Billy the Kid, este realizado por um actor, Vincent D'Onofrio. O filme toma o ponto de vista de um adolescente, Rio (Jake Schur), que trava conhecimento com o jovem pistoleiro quando está em fuga, com a irmã, de um parente brutal.  Billy the Kid – A Lenda é filmado muito prosaicamente, sem faísca nem imaginação, por D'Onofrio e o seu único motivo de interesse é mesmo Dane DeHaan, que faz o Kid mais parecido de sempre com o original, que foi já interpretado por actores como Paul Newman, Kris Kristofferson ou Emilio Estevez. Ethan Hawke interpreta, sem muita convicção, o papel do xerife Pat Garrett.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Um lamentável Matthew McConaughey interpreta, neste deplorável filme de Harmony Korine, Moondog, um hippie velho, janado, bêbado, alarve e irresponsável, armado em poeta, que vive na Florida, tem uma mulher milionária e vai casar a única filha. A fita é tão caótica, errática e insuportável como a própria personagem principal, faz o elogio de um pseudo-hedonismo boçal e infantilóide, e foi rodada em cores ora pirosas, ora psicadélicas. Cinematograficamente miserável e ideologicamente infrequentável.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Um filme vácuo, ridículo e pretensioso da romena Adina Pintile, que pretende abordar temas como o desconforto
 de algumas pessoas com o próprio corpo e com a vivência da intimidade, o valor da imagem física ou a sexualidade. Mas Não Me Toques mais 
não é do que uma sucessão desastrada, afectada, por vezes involuntariamente cómica, e chatíssima, de sequências em que as personagens (?) falam interminavelmente sobre as suas emoções, traumas e inibições, enquanto fazem terapias à base do toque, dos gritos ou de muita conversa fiada. O mais incrível
é que isto ganhou o Festival de Berlim de 2018.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Vicente Alves do Ó faria bem em levar a comédia a sério. Quero-te Tanto não é um filme,
 é um passeio da fama para actores de telenovela,
 a desfilar no nível rasteiro a que anseiam ver os
 seus nomes encastrados numa rua qualquer. Personificam bonecos de cartão que não chegam
 a ser personagens, a ter espessura, vieses, sofisticação. O realizador dirá que estamos diante de uma rom-com ostensivamente cartunesca, mas nada justifica o texto preguiçoso, as caricaturas toscas, os estereótipos simplórios, as graçolas em esboço. Os protagonistas, Mia (Benedita Pereira) e Pepê (Pedro Teixeira), estão numa encruzilhada familiar, entre a alegria do filho que vem e a angústia do dinheiro que falta. O casal decide roubar “rapidinhas da sorte”, do interior da estátua do Marquês de Pombal, e acaba detido, julgado e encarcerado.

Por Hugo Torres

  • Filmes
  • Ficção científica

Um filme de ficção científica que acumula com thriller e é tão indescritivelmente mau, que se torna divertidíssimo. Keanu Reeves é Will Foster, um cientista que está a tentar transferir o cerébro de um humano para um robô. Uma noite, a mulher o filho e as duas filhas morrem num acidente de viação. Will nem sequer faz o luto. Pega nos corpos, leva-os para casa e, num feito tecnológico em ambiente doméstico, consegue não só clonar a mulher e o filho e a filha mais velha, como dotá-los do respectivo aparelho neurológico e deixá-los praticamente como novos. Aparece então o director do seu laboratório, que revela ser uma fachada do governo para pesquisas militares, e diz a Will para lhe entregar o algoritmo ressuscitador, ou mata-o e à família. Da história sem pés e cabeça à ciência de carregar pela boca, passando pela realização ausente em parte incerta, Réplicas é de rir até à dor de barriga, o chamado grande mau filme.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

“A minha vida gostaria de ser quanto muito o estilhaço de um espelho que se partiu sem querer”, diz o protagonista mal a coisa começa. Pronto. É assim, com esta platitude que procura colocar o filme naquele momento em que o sonhado choca de frente com a realidade, que Hugo Diogo mostra ao que vem na sua terceira longa-metragem. E depois é sempre em frente. Voltando ao enredo (inspirado em Saudades de Nova Iorque, de Pedro Paixão), o encontro com David dá-se quando este fotógrafo e escritor está existencialmente nas lonas, abandonado pelo seu grande amor, antes de regressar a Lisboa para enfrentar uma família que é como um fantasma do passado, e dedicar a vida à conspiração sentimental a pretexto de um projecto artístico que envolve polaróides e duas mulheres (Diana Costa e Silva, Ana Vilela da Costa). Podia ser o retrato do artista num enclave criativo e pessoal. Contudo é um chorrilho de frases feitas e situações padrão do cinema de festival, com o défice acrescentado de uma realização tão sossegadinha como monótona e previsível. Elmano Sancho, a única mais-valia no ecrã, ainda tenta, digamos, elaborar sobre o vazio do argumento e a lamentável direcção. Faz o que pode para tornar este pretensioso objecto cinematográfico menos doloroso de ver. E, de facto, a sua interpretação dá uma réstia de dignidade a Imagens Proibidas, mas, como diz o fado, uma andorinha não faz a Primavera.

Por Rui Monteiro

  • Filmes
  • Terror

Um filme de terror de série B sobre um exorcismo mal feito, que acaba num assassínio mas deixa a entidade infernal ainda no corpo da possuída, levado para a morgue de um hospital. Preguiçosamente previsível, A Possessão de Hanna Grace, realizado nos EUA pelo holandês Diederik Van Roojen alinha baques falsos, sustos de carregar pela boca e incongruências amadoras (o demónio é imune à água benta mas não aguenta uns quantos balázios.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Terror

Um grupo de jovens bailarinos
 e bailarinas contratados por
uma coreógrafa de renome para uma digressão fecha-se por
uns dias num local isolado, em pleno Inverno, para ensaiarem
e se conhecerem melhor. Mas um deles pôs LSD na sangria. Instala-se um inferno de histeria, promiscuidade e violência e não há como fugir, porque lá fora ruge uma tempestade de neve. Gaspar Noé instala um clima de histeria visual e sonora, submetendo
o espectador a um paroxismo colectivo massacrante, usando uma câmara que parece apostada em contrariar uma mão cheia de leis da Física.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Uma versão fantasiosa, simplista e cheia de distorções históricas grosseiras, com condimento politicamente correcto, do conflito entre Isabel I de Inglaterra, protestante, e a sua prima católica, Maria da Escócia, no século XVI. Saoirse Ronan (Maria), e em especial Margot Robbie (Isabel I), andam perdidas dentro dos seus respectivos papéis, e a realizadora Josie Rourke, vinda do teatro, não tem pinga de sensibilidade cinematográfica. Dizer que Maria, Rainha da Escócia, é uma sucessão de cenas filmadas às três pancadas e mal cosidas umas às outras é ser caridoso. Um pastelão interminável e insofrível.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

O americano Dennis Berry rodou em Lisboa este filme atroz, embaraçoso, despropositado e atontado, uma coisa informe, mal-ajambrada, desprovida de nexo, sem ponta
por onde se lhe pegue e olhemos para ela, por mais boa vontade que mobilizemos para encontrar algo que possa ser aproveitado. Catarina Wallenstein e Nadia Tereszkiewcz nem sequer têm personagens para interpretar e passam o tempo todo a saracotearem-se, zangarem-se, irem para a cama uma com a outra e a fazerem carinhas “dramáticas” e poses afectadas para a câmara. Um desastre.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense

Um dos piores filmes de Lars von Trier, e um dos mais execráveis que veremos este ano. Matt Dillon é o Jack do título, um arquitecto 
e serial killer cujos crimes Von Trier filma com um gosto sádico do detalhe sangrento e sem poupar nada ao espectador, procurando explicar, racionalizar e escorar intelectualmente esses actos recorrendo aos clichés e 
a várias referências culturais. Bruno Ganz é, durante parte do filme, uma voz em off, e quando 
a sua personagem finalmente
se manifesta, a sua identidade
 só vem acrescentar à pretensão pesporrente da fita. É tudo primário, superficial, ridículo
 e javardo, sobretudo a pose de enfant terrible com idade para
ter juízo de Von Trier. E também monumentalmente aborrecido. Uma provação interminável.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Suspense

Tudo o que David Robert Gordon Mitchell fez bem nos seus dois primeiros filmes, The Myth of
the Great American Sleepover, 
e sobretudo em Vai Seguir-te,
 faz mal em O Mistério de Silver Lake. Trata-se de um thriller conspiratório cravejado de referências cinéfilas (ou não se passasse em Los Angeles), a mitos urbanos e a artefactos vários da cultura pop, e interpretado por Andrew Garfield. Mas é como
se Mitchell tivesse filmado um argumento ainda em bruto, em vez de uma história devidamente peneirada e podada do que tinha a mais. Auto-indulgente, sinuoso, repetitivo, inconsequente e muito chato, O Mistério de Silver Lake afunda-se sem deixar rasto nem saudades.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense

Interpretado pela actriz e cantora Bella Thorne, e baseado num livro de Daniel Waters, um autor que escreve para adolescentes, esta fita de Scott Speer combina, de forma desastrada e incoerente, elementos de ficção científica e de fantástico, metendo ao barulho uma experiência governamental que causou uma catástrofe nos EUA, fantasmas, cientistas loucos e um assassino misterioso que mata jovens liceais, tudo atravessado pela inevitável intriga romântica. E ainda por cima, Sei que Estás Aqui não mete medo nenhum.

Por Eurico de Barros

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  • Suspense

Num país Latino-Americano não identificado, um punhado de guerrilheiros sequestra
 uma famosa cantora de
 ópera (Julianne Moore), um
 rico industrial japonês (Ken Watanabe) e diplomatas de várias nacionalidades que assistiam a um recital daquela. Os guerrilheiros fazem as suas reivindicações, o governo não responde, o tempo vai passando e, dentro do edifício, começam a tecer-se relações afectivas entre os sequestrados, mas também entre captores e reféns. Trabalhando sobre um livro de Ann Patchett, Paul Weitz quer mostrar como a música pode servir de traço de união entre pessoas completamente diferentes, postas numa situação extrema. O problema é que a história
 não demora a tornar-se chapadamente inverosímil, roçando o ridículo vezes demais, as personagens são transparentes e a visão de Julianne Moore a tentar fazer playback com a voz de Renée Fleming, entra para a lista dos momentos de cinema mais embaraçosos do ano. Antídoto para esta pepineira: rever Uma Noite na Ópera, com os Irmãos Marx.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Um camião de transporte
de mercadorias cheio de emigrantes clandestinos de Leste, um condutor (Vítor Norte) com problemas de consciência, mas que tem uma mulher e uma neta para alimentar, um mafioso russo (Dmitry Bogomolov) que chefia a rede de tráfico humano e que mata por dá cá aquela palha, um punhado de mulheres cujo destino é a prostituição. Se em Carga, primeira longa-metragem do português Bruno Gascon, o cinema estivesse à altura das nobres intenções humanitárias que ostenta de forma enfática, laboriosamente expostas no enredo e declinadas na ficha técnica final, no caso de o espectador ainda não ter percebido, este seria um filme perfeitamente aceitável. Tal como se nos apresenta, 
é uma repetitiva, maçuda e interminável colecção de clichés, personagens-tipo ou ridículas e situações mal desenhadas e resolvidas, com um final de bradar aos céus. Na sua tentativa de dramatização do tema do tráfico humano, Carga mostra-se incapaz de ir mais longe do que alinhar banalidades e pôr em cena estereótipos ambulantes, e falha como thriller e como libelo. É mais um título descartável para ir arder no inferno do cinema das boas causas.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Ficção científica

Os irmãos Jonathan e Joss Baker esforçam-se muito para dar a Kin-Arma Mortal estatuto instantâneo de filme de culto, mas nada feito. Adaptado e expandido de uma curta, Bag Man, que os Baker fizeram em 2014, a fita mistura caoticamente géneros e registos (aventura de ficção científica com muita acção, road movie, drama fraternal, história de iniciação à vida), e quanto mais se exibe, mais se lhe vêem as costuras e mais saltam á vista as incongruências. Tudo gira em redor de um miúdo que fica de posse de uma super-arma alienígena e se envolve numa intriga que mete ao barulho o irmão adoptivo recém-caído da cadeia, um gangue de criminosos a quem este deve dinheiro, uma stripper e dois aliens que querem recuperar a dita arma. E no final, ainda fica anunciada uma continuação.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

Hollywood e os seus parceiros de produção chineses foram aqui recuperar o Megalodonte, um tubarão monstruoso extinto há milhões de anos, com base num dos livros de uma série de terror marinho criada por Steve Alten
em 1997 e que já vai em sete títulos publicados. O poderoso canastrão Jason Statham interpreta
Jonas Taylor, um mergulhador especializado em salvamentos a grande profundidade, que tem que resgatar um mini-submarino e combater o monstro. Ao contrário dos filmes da franquia Sharknado, frontalmente disparatados, este Meg: Tubarão Gigante leva-se demasiado a sério para o altíssimo nível de absurdo a que o argumento chega, e para as delirantes proezas aquáticas do bicho. E para uma produção com um orçamento de 200 milhões de dólares, os efeitos digitais são surpreendentemente imperfeitos.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Versão para cinema de uma peça de teatro adaptada pelo seu autor, Sébastien Thiery, que também realiza com Vincent Lobelle e interpreta um dos papéis principais, Querida Mãezinha é uma infame, incompetente e embaraçosa mistura de baixa comédia e drama sentimentalão, que pretende fazer gargalhar e lacrimejar à custa de personagens deficientes.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense
Vendeta
Vendeta

A francesa Coralie Fargeat estreia-se nas longas-metragens com este "filme de vingança" no feminino, logo etiquetado de "feminista" pela crítica. A fita não adianta nada a este subgénero do filme de acção, como fica muito aquém de outras. E não é por ser mulher que Fargeat não olha e filma Matilda Lutz, a sua actriz, como o faria um homem, nem se abstém de carregar a fundo no pedal da "exploitation". Lutz faz uma rapariga violada e deixada por morta no deserto pelo amante e dois amigos, e que se vinga deles com requintes de malvadez. Tudo é excessivo e berrante em Vendeta, da boçalidade cruel dos homens á sobrenatural capacidade de recuperação e sobrevivência da rapariga, passando pela saturação visual e sonora e pela violência gráfica e monotonamente sádica.

Por Eurico de Barros

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  • Acção e aventura

É supostamente uma comédia de acção satírica trash, mas na realidade este filme de Sérgio Graciano e Manuel Pureza poderia ser descrito como um clone azeiteiro de um decalque trapalhão de uma fita de Quentin Tarantino. Escrito às três pancadas e realizado na mais completa desordem, órfão de estrutura, de nexo e de piada, desarticulado, disforme e grosseiro no gesto e no discurso, Linhas de Sangue nem sequer sabe quando e como acabar, e está repleto de actores e de "famosos" que andam a apanhar bonés porque não têm personagens para interpretar. Pretendemos ter cinema de "indústria", mas não temos a menor noção de como é que se faz.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

Um cruzamento de A Torre do Inferno e de Assalto ao Arranha-Céus, passado em Hong Kong e servida pelos mais sofisticados efeitos digitais que os orçamentos confortáveis podem comprar, esta
 nova super produção com Dwayne Johnson é mais um daqueles exercícios em gigantismo descerebrado em que Hollywood se especializou. Johnson é Will Sawyer, um ex-agente do FBI perito em segurança, encarregue de analisar as defesas do maior arranha-céus do mundo, construído por um magnata chinês. Quando um grupo de malfeitores provoca um incêndio no edifício, com a família dele presa lá dentro, Sawyer entra em acção.

Por Eurico de Barros

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  • Drama

Uma desastrosa estreia a filmar nos EUA para a cineasta turca Deniz Gamze Erguven, a autora de Mustang. Halle Berry interpreta uma mãe de acolhimento que tem várias crianças a seu cargo em Los Angeles, na Primavera de 1992, na altura em que rebentam os motins após a absolvição dos polícias envolvidos no caso da agressão a Rodney King. O filme limita-se a pôr
a personagem de Berry a
 andar numa roda viva pela cidade em caos, à procura
 da miudagem que foi ver a confusão ou não estava em casa na altura, acompanhada pelo seu prestável vizinho do lado (Daniel Craig, nada verosímil a fazer de americano). América em Chamas é básico, repetitivo e muito mal-ajambrado.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
A Lua de Júpiter
A Lua de Júpiter

Um refugiado sírio que tenta entrar na Hungria com o pai 
e mais um grupo é interceptado e alvejado por um polícia. Em vez de morrer, Aryan, assim se chama ele, adquire o poder de voar e é recolhido por um médico inescrupuloso, que o quer usar para ganhar dinheiro, fazendo-o passar por anjo milagreiro. Assinado pelo húngaro Kornél Mundruczó, autor do curioso Deus Branco (2014), A Lua de Júpiter é uma tentativa de fazer realismo mágico num quadro de denúncia política e social (o tratamento dos refugiados na Hungria e as redes de corrupção em seu redor), com acompanhamento de thriller. Só que o filme é inverosímil, errático, repetitivo e muito prolixo, usando e abusando das metáforas e 
do simbolismo de meter pelos olhos dentro, arrastando-se por mais de duas horas até um final pseudomístico risível.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

Poucos são os comediantes revelados 
no mundo do stand-up que Hollywood não consegue controlar e submeter às suas convenções. Amy Schumer não é excepção. Já tinha sucedido nos seus dois primeiros filmes de grande estúdio, Descarrilada e Olha Que Duas (sobretudo neste), e volta a acontecer
em Sou Sexy, Eu Sei!, uma comédiazinha chocha, feel good e de juntar os números. Schumer interpreta a rechonchudinha e sentimentalmente frustrada Renee Bennett, que tem o contador da auto-estima a roçar o zero. Um dia sofre um acidente no ginásio, bate com a cabeça e quando acorda, julga que se transformou numa “brasa”, passando a comportar-
se como tal. Os últimos dez minutos da fita, em que Renee debita o estafado discurso do “o que interessa é quem somos, não como parecemos”, são particularmente penosos e descaradamente fake.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama

Woody Harrelson interpreta
 o antigo presidente dos EUA Lyndon B. Johnson em LBJ,
e está tão estranhamente caracterizado para se assemelhar a ele, que parece mesmo uma daquelas vítimas de bisturis incompetentes
 que aparecem no programa Botched, sobre médicos que corrigem cirurgias plásticas que deixaram os pacientes com um aspecto grotesco. Rob Reiner não faz um filme potável desde Dizem Por Aí... (2005), e não é este verboso e insosso LBJ, que pretende reabilitar Johnson da imagem negativa que deixou (em grande parte por causa do Vietname), que lhe vai melhorar o currículo.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Terror

Não se sabe porquê, dá a
louca nos pais americanos,
que começam a assassinar os filhos usando tudo o que têm
à mão, e os dois insofríveis rebentos do casal Ryan (Nicolas Cage e Selma Blair) têm que fugir à fúria homicida dos progenitores. Escrito e realizado por Brian Taylor, com os pés em ambas as instâncias, a fita deixa Cage à solta para mais uma prestação em quinta velocidade de frenesim histriónico, que não pode ser confundida com representação. E se há aqui uma metáfora sobre a falência da família contemporânea, americana ou outra, não se vislumbra. Um forte candidato a Melhor Pior Filme do ano.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense

O filme original de 1974
 realizado por Michael Winner
e interpretado por Charles 
Bronson é típico dessa época 
e deste subgénero que então prosperou,e surgeno contexto social de uma Nova Iorque em que os índices de criminalidade eram muito elevados. Este remake de juntar os pontinhos assinado por Eli Roth com Bruce Willis no papel principal não tem sequer o pretexto de actualidade da fita de Winner.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura
Rampage – Fora de Controlo
Rampage – Fora de Controlo

O realizador Brad Peyton e Dwayne Johnson voltam a juntar-se neste monster movie risível, pezudo, completamente disparatado e insondavelmente descerebrado. Johnson enfrenta um lobo, um crocodilo e um gorila albino gigantes
e mutantes, enquanto tenta impedir que estes destruam Chicago. Realizado a camartelo e usando e abusando do fogo
de artifício dos efeitos digitais, o filme consegue a proeza de agredir a inteligência, os olhos e ouvidos ao mesmo tempo.
O pior de uma Hollywood em profundíssima crise de ideias e presa a um modelo de cinema desmesurado, que ameaça implodir.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Para a sua primeira longa-metragem, Miguel Clara Vasconcelos inspirou-se na tragédia envolvendo praxes universitárias que ocorreu no Meco, em Dezembro de 2013, provocando a morte por afogamento de seis estudantes. O realizador não quer fazer uma recriação documental nem uma ficção dramática, mas fica sem conseguir tornar minimamente claros os seus propósitos neste filme distante, opaco e gasoso.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Uma paupérrima comédia
 da francesa Amanda Sthers, que apesar de ter um elenco onde constam Harvey Keitel, Rossy de Palma e Toni Colette, não consegue convocar nem
 a sombra de uma gargalhada. Keitel e Colette fazem um casal de americanos ricos instalados em Paris, de Palma é a diligente criada a quem eles pedem para fingir ser uma conviva num jantar,
 para não estarem 13 à mesa. Vai daí, um amigo do casal apaixona-se por ela. Um tédio, sem ponta por onde se lhe pegue.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Animação

Em vida, Beatrix Potter Resistiu às propostas de Walt Disney para transformar os seus contos de Peter Rabbit num filme de animação. Se ela visse o que fizeram agora aos livros infantis que escreveu e ilustrou, morria segunda vez. Esta adaptação ao cinema das aventuras do coelho antropomorfizado de Potter combina actores e animação digital, e é realizada no estilo frenético, barulhento e agressivo daquelas comédias boçais americanas com Adam Sandler, não lhe faltando sequer a música cool (os passarinhos do campo inglês cantam rap) nem as citações irónicas ao cinema de acção. O que é verdadeiramente irónico é que um filme que homenageia Beatrix Potter fazendo dela uma das principais protagonistas, em versão modernizada, lhe deturpe a obra de forma tão grosseira.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Esta fita bíblica do australiano Garth Davis faz uma leitura
da figura de Maria Madalena alheia à ortodoxia católica, radicalizando-a através
de uma óbvia agenda
feminista de ressonâncias contemporâneas, e acabando
por propor uma representação desmesuradamente fantasiosa
e anacrónica da personagem. Rooney Mara tem uma interpretação mortiça no papel principal. Joaquin Phoenix
não se empenha muito a fazer
de Jesus Cristo, a produção é paupérrima, falta intensidade dramática e a realização de Davis é cerradamente maçuda.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Adaptação inexpressiva, tolhida e desarticuladíssima do romance homónimo e autobiográfico de Vergílio Ferreira, assinada por Fernando Vendrell, que se fica pela superfície da história e não consegue transmitir a substância intelectual do livro. O elenco inclui Jaime Freitas, Victoria Guerra, Ricardo Aibéo, Teresa Madruga e Rui Morrison, que não podem dar mais do que o pouco que a fita lhes pede.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

O genérico e os primeiros minutos desta fita parecem prometer uma homenagem aos filmes policiais de blaxploitation dos anos 70
 que tinham mulheres negras por heroínas, caso da Foxy Brown e da Coffy de Pam Grier, ou da Cleopatra Jones de Tamara Dobson, com
as quais nenhum homem fazia farinha. Mas rapidamente nos apercebemos que esta fita com Taraji P. Henderson no papel de uma assassina profissional, é mais uma bodega de acção, feita ás três pancadas e descartável como um lenço de papel usado.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Fantasia

Inexplicavelmente candidato a 13 Óscares, A Forma da Água, de Guillermo del Toro, é uma versão revisionista e politicamente correcta de O Monstro da Lagoa Negra, de Jack Arnold, com um enxerto de A Bela e o Monstro, de Jean Cocteau. Servida por um argumento de onde se ausentaram para parte incerta a mais elementar verosimilhança, coerência interna e sentido
 do ridículo, a fita falha como monster movie virado do avesso, como fábula poética e como distribuidora de milho cinéfilo para os pardais. A história tem mais buracos do que um queijo suíço, a criatura é pateta na concepção e na caracterização, as personagens são de juntar por pontos, da heroína muda e fofinha (Sally Hawkins) ao vilão odioso (Michael Shannon), e a realização é teleguiada. Uma pepineira sobrevalorizada até ao absurdo.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Basmati Blues, de Dan Baron, 
é uma comédia romântica e musical bollywoodesca, que milita contra os alimentos transgénicos. Brie Larson interpreta Linda, uma brilhante mas ingénua cientista que criou uma modalidade de arroz geneticamente modificado, e é enviada para uma Índia de estereótipos pelos patrões (Donald Sutherland e Tyne Daly) para a impingir aos agricultores locais, sem perceber que lhes vai dar cabo das colheitas, e da vida. Lá chegada, além de perceber a malvadez que ia cometer, Linda encontra também o amor, na pessoa de um moçoilo local. 
Um filme tão mau que é difícil perceber o que é pior aqui.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Este filme de Philippe Garrel fará as delícias de quem anda com ele nas palminhas há muitos anos. Mas O Amante
 de um Dia é uma bagatela sentimental, insossa e inconsequente, com muita conversa de chacha sobre as relações e vários momentos francamente ridículos, que repete a rotina minimalista, bocejante e visualmente lúgubre de Garrel, que insiste em filmar a preto e branco.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia
Suburbicon
Suburbicon

George Clooney pegou num argumento que os irmãos Coen escreveram nos anos 80, uma comédia negra passada num subúrbio dos EUA da década de 50, e enxertou-lhe um subenredo anti-racista para puxar pelas suas credenciais de estrela de cinema liberal e falar para os dias de hoje. O resultado é um filme que falha quer como entretenimento, quer como “mensagem”político-social.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
A Montanha Entre Nós
A Montanha Entre Nós

Diz o grande livro dos clichés do cinema que quando duas personagens de um filme estão retidas num aeroporto por causa do mau tempo, têm a máxima urgência em chegar aos seus respectivos destinos, alugam uma avioneta
 a um sujeito que se gaba que pilotou caças no Vietname e não tem medo de tempestades, e 
que não faz plano de voo antes de partir, é mais certo que a morte e os impostos que se vão espetar numa montanha remota, que o piloto morre no desastre e que elas terão que tentar não desesperar e sobreviver no meio do frio e da neve até que alguém as salve. É precisamente isto que acontece, em A Montanha Entre Nós, ao médico interpretado por Idris Elba e à fotojornalista personificada por Kate
 Winslet, com o extra de estarem acompanhadas pelo cão fofinho do dito piloto. Realizado pelo palestiniano-holandês Hany Abu-Assad, que antes de ter sido cooptado para esta pepineira assinou filmes que juntavam a qualidade à actualidade, como Rana’s Wedding, O Paraíso, Agora! ou Omar, A Montanha Entre Nós cumpre à risca, e descaradamente, com todos os clichés do filme de sobrevivência cruzado com o drama romântico. Elba, Winslet e o canídeo fazem o que podem, mas ao contrário das personagens, este filme não tem salvação possível.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes

Este mediocríssimo filme sobre J.D. Salinger, realizado em estreia por Danny Strong, parece uma versão Reader’s Digest de um qualquer Salinger para Totós, contemplando todos os clichés do biopic sobre escritores  ao mesmo tempo que omite uma série de factos relevantes sobre o autor de À Espera no Centeio, caso da sua amizade com Ernest Hemingway. Nicholas Hoult tem muito pouco para fazer no papel principal, e só Kevin Spacey, na figura de Whit Burnett, o professor de escrita criativa, mentor literário e editor do primeiro conto de Salinger, dá alguma vida à fita.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Suspense
Um Crime no Expresso do Oriente
Um Crime no Expresso do Oriente

Um desastre no Expresso do Oriente, isso sim. Kenneth Branagh compõe um Hercule Poirot fantasioso e adulterado, da farta bigodaça à personalidade e á psicologia, farta-se de mexer na história, sempre para mal, e realiza o filme às três pancadas, sem saber como usar o espaço limitado do comboio com fins dramáticos e de suspense. Mais vale rever o original de Sidney Lumet de 1974, ou o respectivo episódio da série Poirot com o genial e incomparável David Suchet no melhor Poirot de sempre.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama

Um dos filmes mais portentosamente chatos já feitos sobre artistas e arte, estranhamente assinado pelo estimável Jacques Doillon
e com o canastrão Vincent Lindon a interpretar Rodin em registo mumblecore. Pior que o mais convencional telefilme, maçudamente académico, cerradamente soporífero, Rodin envergonharia até o mais modesto tarefeiro do tempo do cinéma de papa.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

A seta indicando o caminho por baixo da palavra “suicídios” devia ser suficiente. Afinal é o segundo aviso do realizador à navegação, depois de ainda antes do genérico inicial se ver uma rapariga tristonha emborcar um frasquinho de veneno e deixar-se ir água abaixo. Contudo, logo a seguir, o encontro entre dois candidatos 
a largar a vida naquela floresta, iniciando um diálogo de aparência estimulante, leva a pessoa ao engano. José Pedro Lopes mostra, nesta sua primeira longa-metragem, estreada este ano no Fantasporto, ser um realizador inteligente, sensato na manipulação das imagens, capaz de escolher actores adequados (Jorge Mota e Daniela Love) aos papéis que lhes destina o argumento. O busílis está no argumento, iniciado como uma espécie
de farsa psicológica negra e,
por reviravolta tão manhosa quão previsível, vulgarizado, esvaindo-se como narrativa de perseguição e esfaqueamentos e mortes sortidas e gratuitas de um anjo tornado demónio, ou de um demónio disfarçado de anjo, tanto faz.

Por Rui Monteiro

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  • Filmes
  • Acção e aventura

No segundo filme da série, que volta a ser realizado por Matthew Vaughn, também autor do argumento com Jane Goldman, o quartel-general da Kingsman é destruído e todos os agentes mortos, menos Eggy e Merlin, que vão
à procura dos responsáveis.
Mais uma paródia/homenagem sobredimensionada aos filmes de espionagem, em que Vaughn não percebe que o que funciona nas páginas de um comic não passa necessariamente bem para o cinema.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Drama
Arranha-Céus
Arranha-Céus

Uma adaptação má de doer fundo do livro de 1975 de J.G. Ballard, hoje datadíssimo na sua alegoria arquitectónica da feroz luta de classes que o escritor previa para breve, nesses anos 70 politica e socialmente agitadíssimos na Grã-Bretanha. O filme é caótico, grotesco e sem ponta por onde se lhe pegue, coisa nada habitual no seu realizador, Ben Wheatley, autor de Uma Lista a Abater ou Assassinos de Férias.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
Hampstead: Nunca é Tarde Para Amar
Hampstead: Nunca é Tarde Para Amar

Uma viúva americana (Diane Keaton) apaixona-se em Londres por um homem (Brendan Gleeson) que vive há anos
num grande parque da cidade,
e defronta os especuladores imobiliários que o querem despejar para construir
prédios de luxo. Uma pífia
e pouco verosímil comédia dramática para tentar captar
os espectadores da faixa etária das personagens e dos seus intérpretes.

Por Eurico de Barros

  • Filmes

Um embaraçoso, escancarado 
e aberrante desastre cinematográfico, com Nicolas Cage no seu registo mais descontrolado e histérico no papel de Gary Faulkner, um maduro americano que em 2010 decidiu rumar ao Paquistão para matar Osama Bin Laden armado com uma espada de samurai. Larry Charles (Doido por Ti, Seinfeld, Borat) realizou, em dia mesmo muito, muito não.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Comédia

O filme tirado da série de
 televisão com David Hasselhoff 
e Pamela Anderson define-se
 pela negativa. Não tem ponta por onde se lhe pegue, do argumento às interpretações, da comédia à acção, não tem um neurónio que seja, não tem realizador e nem sequer tem continuidade, passa-se de um plano um sol radioso para outro com céu nublado na mesma sequência. Dwayne Johnson é um rochedo tatuado ambulante e faz ‘Hoff ’ parecer Marlon Brando.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
Políticos não se confessam
Políticos não se confessam

Uma reunião dos ministros das finanças do G8 num hotel de luxo da costa alemã é perturbada pelo suicídio do director do Fundo Monetário Internacional (Daniel Auteuil). Um monge italiano (Toni Servillo, preso num papel de uma nota só), um dos convidados especiais da cimeira, confessou-o na noite anterior ao suicídio, e começa a ser pressionado para revelar o que o morto lhe disse. Este filme do italiano Roberto Andò quer ser várias coisas e falha em todas. É um medíocre thriller ambientado num cenário improvável para o género; uma desastrada e primária “denúncia” do sistema político-financeiro mundial, dos “poderosos” que o controlam sob uma maquilhagem democrática, e da ganância, frieza e desumanidade que os caracteriza; e uma pouco menos que risível “meditação” sobre a importância fundamental do desapego das coisas materiais, da espiritualidade, da literatura infantil e do canto dos passarinhos. O sermão final sobre a necessidade de lermos os Evangelhos e sermos bonzinhos uns para os outros, seguido da misteriosa volatilização do monge, dá o golpe de misericórdia nesta pepineira pretensiosa, infantilóide e descaradamente moralista. 

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

O primeiro filme de uma nova série da Universal, baptizada Dark Universe, que pretende dar novo fôlego aos monstros clássicos do estúdio, é uma catástrofe, e entra no registo como um dos piores já feitos com
a personagem da Múmia, que aqui volta a ser uma mulher, uma princesa maléfica e maldita do antigo Egipto, desenterrada pela personagem de Tom Cruise. Assente numa matriz de blockbuster estereotipado, esta Múmia é um caso perdido narrativo e cinematográfico, para já não dizer arqueológico.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Comédia
Girls Night
Girls Night

A Reciclagem continua a fazer as vezes da criatividade em Hollywood. Girls Night, a realização de estreia de Lucia Aniello (também co-autora do argumento), é uma mistura de comédia de despedida de solteiras e de comédia negra tendência Fim-de-Semana com o Morto. E é igualmente um filme que mostra que uma mulher 
é capaz de fazer um filme tão desbocado, tão alarve e tão primário como um homem, e com ele dar das mulheres uma imagem tão lamentável como a dos homens. (E se isto for uma manifestação de “feminismo” e de empowerment das mulheres realizadoras no cinema americano, vou ali e já volto). Um grupo de amigas da faculdade junta-se dez anos depois da formatura, para fazer, em Miami, a despedida de solteira de uma delas, Jess (Scarlett Johansson), que está a concorrer a um cargo público e vai casar-se com um simpático totó. É claro que a festa dá para o torto quando uma delas, esporeada pela cocaína e pela excitação sexual, mata acidentalmente um stripper masculino. Girls Night é uma colecção de personagens obnóxias, situações estereotipadas e gags boçais, mais regurgitado do que filmado.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Acção e aventura

Realizado por Patty Jenkins (Monstro), este novo blockbuster de super-heróis, agora com a Rainha das Amazonas da DC, passa-se durante uma I Guerra Mundial em versão de comic book e, como os outros filmes desta categoria, desvaloriza a história (já de si pateta) para esmagar o espectador com sequências de acção desmesuradas e estoira-tímpanos. Metida num uniforme mais púdico do que o de Lynda Carter, sua antecessora no papel na televisão, a israelita Gal Gadot merecia um argumento bem melhor.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura
Rei Artur - A Lenda da Espada
Rei Artur - A Lenda da Espada

O Rei Artur e os Cavaleiros da Távola Redonda já sofreram muitos tratos de 
polé no cinema, nomeadamente às mãos dos Monty Python em Monty Python e o Cálice Sagrado (1975). Mas será difícil maltratá- -los e abastardá-los mais, e à matéria arturiana em geral, do que Guy Ritchie faz em Rei Artur: A Lenda da Espada. O realizador de Porcos e Diamantes pega em meia dúzia 
de elementos e de personagens da lenda e encaixa-os numa história de sword & sorcery descaradamente reminiscente de O Senhor dos Anéis, onde também há lugar para lutadores de kung fu e vikings, a “diversidade” é devidamente respeitada (um dos cavaleiros é negro) e os protagonistas falam todos como as personagens dos filmes de acção cockney do realizador (a certa altura, Artur dirige-se a um sujeito da seguinte forma: “Oi! You there, sunshine!”). O canastrão Charlie Hunnam interpreta Artur, que nesta versão foi criado num bordel da Londres de então para não ser assassinado pelo seu cruel tio Vortigern (Jude Law), que lhe matou a família para ficar com o trono, e volta a Camelot para se vingar, depois de ter tirado Excalibur da pedra. Há muita magia, muita pancada e anacronismos a dar com um pau neste filme absurdo, previsto para ser o primeiro de seis.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
A Cabana
A Cabana

Baseado no bestseller homónimo de William F. Young, A Cabana, de Sturat Hezeltine, é uma miscelânea muito simplista, muito kitsch, muito fungada e sobretudo muito ridícula de conversa fiada de auto-ajuda New Age, de doutrina cristã aguada e de clichés de melodrama de família, com um toquezinho politicamente correcto.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

A culpa não é do macaco, porque o King Kong em stop motion deste filme, o segundo da nova franchise intitulada MonsterVerse (iniciada com o Godzilla de Gareth Edwards, em 2014) até faz justiça expressiva ao gorila gigante da Ilha da Caveira. Mas o resto, meu Deus, o resto!... Kong: Ilha da Caveira consegue ser pior que o remake de King Kong feito por Peter Jackson em 2005. Passado em 1973, num mundo onde, aparentemente, ninguém viu o original de Cooper e Shoedsack, este reboot é uma descomunal e tonitruante mixorofada, parte filme de guerra do Vietname, parte filme de monstros, parte Parque Jurássico desvairado, passado numa Ilha da Caveira povoada por bichos gigantes e por uma espécie de lagartos mutantes vindos do centro da terra, que limpam o sebo ao atarantado elenco. Um filme sem rei nem roque de tamanho XXL.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
  • Drama
As Cinquenta Sombras Mais Negras
As Cinquenta Sombras Mais Negras

O segundo filme baseado na trilogia de livros pseudo- -escandalosos de EL James tem um novo realizador, James Foley. Mas nem o mais oscarizado dos cineastas salvava esta pepineira, agora com argumento do próprio marido da escritora (tão mau, que em casa vai ser castigado de certeza). Os actores continuam a canastrar militantemente, o défice de tau-tau é enorme e ver roupa de cama a secar é mais erótico do que isto.

Por Eurico de Barros

  • Filmes
  • Acção e aventura

O filme de Justin Kurzel transporta para a tela o jogo de vídeo homónimo e é uma mixorofada primária, maçadora, interminável, risível, visual e sonoramente agressiva e ultra-violenta. Vários actores que estimamos, como Jeremy Irons, Michael Fassbender, Marion Cotillard e Charlotte Rampling tentam não perder a dignidade no meio da confusão e dos diálogos atrozes.

Por Eurico de Barros

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  • Filmes
Um filme vácuo, sensaborão e penoso, adaptado por Wim Wenders de uma peça de Peter Handke, e inexplicavelmente filmado em 3D. Numa casa de campo, um autor escreve à máquina e visualiza as suas personagens, um homem e uma mulher, a dialogar a uma mesa no jardim. O tédio é espesso e pesado nesta natureza morta cinematográfica.

Por Eurico de Barros
  • Filmes
  • Terror
O Bosque de Blair Witch
O Bosque de Blair Witch
O hiper-realismo fantasiado de O Projecto de Blair Witch não podia ficar pelo filme-sensação de 1999, principalmente depois do falhanço de O Livro das Trevas: Blair Witch 2. Vai daí, agora aparece do nada um novo vídeo e o irmão de Heather parte à aventura na película de Adam Wingard, que conta a mesma história, mas com GoPros e um drone.

Por Rui Monteiro
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  • Filmes
  • Drama
Nos anos 70 e 80, a mina de Serra Pelada, no estado brasileiro do Pará, foi o cenário para uma das grandes corridas ao ouro do século 20. Inspirado em A Cidade de Deus, filme que também procurava fazer espectáculo da pobreza e que também tinha um narrador de nariz empinado para explicar às massas os códigos da bandidagem, Serra Pelada é uma espécie de O Padrinho de pé descalço, sem um grama do talento de Coppola e sempre com o olhar repelente de um comerciante da desgraça.

Por Nuno Henrique Luz
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