Na sua busca desesperada por audiências, num mercado crescentemente “roído” pela internet, pelo streaming e pelos canais temáticos, as televisões generalistas apostam em programas da chamada “tele-realidade” (na verdade muito pouco “reais”, porque pesadamente produzidos, escritos e montados) cada vez mais delirantes e grotescos, e atentatórios da dignidade básica das pessoas (que, no entanto, continuam a oferecerse com gosto para imolação nos altares da exposição televisiva).
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Um concurso onde os participantes têm que se despojar de tudo o que possuem e ficar nus nas suas casas completamente vazias (o alibi “sociológico” é chamar a atenção para o consumismo desenfreado e o culto do supérfluo das sociedades contemporâneas. Pois, pois...). É como se Começar do Zero (TVI Dom 21.30) tivesse o alto patrocínio do Ministério das Finanças de Mário Centeno, de tal forma este está apostado, com a sua política fiscal, em deixar os portugueses tal como vieram ao mundo.
Começar do Zero é como que um gigantesco striptease ao contrário, dominado por um duvidosíssimo conceito de supérfluo, que até abrange as cuecas e os trocos do porta-moedas. No fim de contas, trata-se apenas de combinar o voyeurismo beócio e a exposição extrema da intimidade – características dos mais rasteiros programas da dita tele-realidade.
E o que há de mais extremo do que a nudez total num contexto de embaraço e ridicularização na praça pública? Em vez de Começar do Zero, o programa deveria chamar-se Chegar ao Zero.
É que o contador está a zero para todos os envolvidos, quer do lado da produção, quer dos participantes. Zero imaginação, zero decência, zero dignidade, zero pudor, zero noção do ridículo, zero amor próprio. E a taça vai para a concorrente que diz ter muitos complexos com o seu corpo, e depois se inscreve num programa de televisão em que tem de andar em pelota.